APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0009311-65.2010.4.03.6104
RELATOR: Gab. 48 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO
APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
APELADO: THIAGO BRAZ TAMBASCO
Advogados do(a) APELADO: ACI HELI COUTINHO - MG51588-S, ALEXANDRE LOPES LACERDA - MG54654-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0009311-65.2010.4.03.6104 RELATOR: Gab. 48 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: THIAGO BRAZ TAMBASCO Advogados do(a) APELADO: ACI HELI COUTINHO - MG51588-S, ALEXANDRE LOPES LACERDA - MG54654-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de mandado de segurança impetrado por THIAGO BRAZ TAMBASCO, em face do INSPETOR DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL DA ALFANDEGA DO PORTO DE SANTOS, objetivando a suspensão da pena de perdimento aplicada ao veículo CADILLAC, modelo SRX4 AWD PREMIUM, ano 2009, modelo 2010, autorizando o trânsito aduaneiro e o cancelamento da representação fiscal. A r. sentença proferida em 02/05/2011 (fls.12- id117421753) concedeu parcialmente a segurança para o fim de anular os efeitos da penalidade de perdimento aplicada ao veículo objeto do presente mandamus e autorizar o prosseguimento do despacho aduaneiro objetivando o trânsito no país (DTA n.10/0776995-7). Apela a União Federal arguindo, preliminarmente, a nulidade da sentença em razão do julgamento extra petita, por acolher questões de fato e de direito não suscitados na inicial, bem como a ausência de pressupostos processuais e condições da ação. Alega que o mandado de segurança não admite produção de prova, e que o conjunto probatório não demonstra a regularidade da operação, não estando demonstrado o direito líquido e certo à concessão da ordem pretendida. No mérito, sustenta, a legalidade do procedimento fiscal. Aduz que a sentença partiu de premissa equivocada já que o ato que decretou o perdimento do veículo importado não está alicerçado em um único fundamento (propositura de ação judicial implicando a renúncia administrativa), mas sim na conclusão da autoridade administrativa de que o apelado não possuía recursos próprios para promover a importação do veículo em questão, caracterizando a intermediação fraudulenta. Ressalta que a autoridade administrativa fiscal aduaneira agiu dentro dos limites da sua competência, pois caracterizada a renúncia à via administrativa com a interposição da ação judicial, agiu de acordo com o Ato Declaratório Normativo SRF n. 03/96, ou seja, negou seguimento ao processo administrativo por ausência de interesse de agir. Com contrarrazões. O Ministério Público Federal opinou pelo não provimento do apelo. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0009311-65.2010.4.03.6104 RELATOR: Gab. 48 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: THIAGO BRAZ TAMBASCO Advogados do(a) APELADO: ACI HELI COUTINHO - MG51588-S, ALEXANDRE LOPES LACERDA - MG54654-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O As preliminares confundem-se com o mérito e com ele será analisado. Passo à análise do mérito. Cinge-se a controvérsia acerca da legalidade da autuação pelo Fisco que impôs a pena de perdimento, em razão de atos que caracterizaram as infrações de interposição fraudulenta de terceiros em operação de importação. O art. 23 do Decreto-Lei nº 1.455/76 prevê a aplicação de pena de perdimento de bens na hipótese de estar configurada a interposição fraudulenta de terceiros em operações de importação, a qual é presumida no caso de não comprovação da origem, disponibilidade e transferência dos recursos empregados. Art. 23. Consideram-se dano ao Erário as infrações relativas às mercadorias: I – (...) V - estrangeiras ou nacionais, na importação ou na exportação, na hipótese de ocultação do sujeito passivo, do real vendedor, comprador ou de responsável pela operação, mediante fraude ou simulação, inclusive a interposição fraudulenta de terceiros.(Incluído pela Lei n. 10.637, de 30.12.2002) § 1º O dano ao erário decorrente das infrações previstas no caput deste artigo será punido com a pena de perdimento das mercadorias. (Incluído pela Lei n. 10.637, de 30.12.2002). § 2° Presume-se interposição fraudulenta na operação de comércio exterior a não -comprovação da origem, disponibilidade e transferência dos recursos empregados (Incluído pela Lei n. 10.637, de 30.12.2002). O art. 689 do Regulamento Aduaneiro prevê a aplicação da pena de perdimento de bens na hipótese de estar configurada a interposição fraudulenta de terceiros em operações de importação, a qual é presumida pela legislação no caso de não comprovação da origem, disponibilidade e transferência dos recursos empregados: Art. 689. Aplica-se a pena de perdimento da mercadoria nas seguintes hipóteses, por configurarem dano ao Erário (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 105; e Decreto-Lei nº 1.455, de 1976, art. 23, caput e § 1º, este com a redação dada pela Lei no 10.637, de 2002, art. 59): XXII - estrangeira ou nacional, na importação ou na exportação, na hipótese de ocultação do sujeito passivo, do real vendedor, comprador ou de responsável pela operação, mediante fraude ou simulação, inclusive a interposição fraudulenta de terceiros. § 6o Para os efeitos do inciso XXII, presume-se interposição fraudulenta na operação de comércio exterior a não-comprovação da origem, disponibilidade e transferência dos recursos empregados (Decreto-Lei nº 1.455, de 1976, art. 23, § 2º, com a redação dada pela Lei no 10.637, de 2002, art. 59). Da análise dos dispositivos em comento, extrai-se que a interposição fraudulenta não se afigura mera irregularidade formal sanável, mas sim infração que sujeita a mercadoria à pena de perdimento. No caso concreto. Instaurado o procedimento especial de controle aduaneiro (PAF n.11128.004108/2010-31), o impetrante foi intimado a prestar esclarecimentos sobre a origem dos recursos utilizados na operação de importação do veículo CADILLAC, modelo SRX4 AWD PREMIUM, ano 2009, modelo 2010 e demonstrar a sua capacidade financeira. No curso do processo administrativo o impetrante interpôs o Mandado de Segurança n. 0007780-42.2010.403.6104, perante a 4ª Vara de Santos, bem como Ação Declaratória com pedido de cautelar incidental n. 0063174-15.2010.401.3800 perante a Justiça Federal de Belo Horizonte- MG, ambas, objetivando, em síntese, a liberação do veículo para trânsito (PAF n.11128.004108/2010-31). Em consulta a sistema processual, observa-se que foi homologado o pedido de desistência do primeiro mandado de segurança, não havendo notícia acerca do resultado da ação perante a Justiça Federal de Belo Horizonte. No presente mandado de segurança o impetrante utilizando-se dos mesmos argumentos da ação anterior (0007780-42.2010.403.6104) pretende além das medidas para o desembaraço do veículo para trânsito, afastar a pena de perdimento tornada definitiva no curso do procedimento administrativo. In casu, de fato, foram apontados concretos indícios, pela autoridade aduaneira, para a instauração de procedimento especial de controle aduaneiro a fim de que fosse apurada a ocorrência de interposição fraudulenta. Confira-se a informação prestada pela autoridade impetrada com lastro no auto de infração (fls.49 – id117421764): “(...) Conforme se verifica nos autos n° 11128.004108/2010-31, o importador Thiago Braz Tambasco registrou a Declaração de Trânsito Aduaneiro (DTA) n° 10/0776995-7 em 04/05/2010, solicitando que a ALF/STS autorizasse o trânsito do veículo Cadillac para uma EADI em Betim/MG, sob jurisdição aduaneira da Inspetoria da RFB de Belo Horizonte. O despacho aduaneiro foi selecionado para aplicação dos procedimentos especiais de controle aduaneiro com base na IN SRF n° 206/2002, por ‘suspeita da ocultação do real adquirente, bem como da utilização de documento falso no despacho devido à análise pelo SEPEA das informações obtidas nos sistemas da RFB'. O bem foi retido, como medida acautelatória de eventual apreensão, e foram expedidas três intimações dirigidas ao importador, a primeira (10/05/2010), para que apresentasse os documentos originais de instrução do despacho, o certificado de título ou certificado de origem do veículo (original), e, a segunda (21/05/2010), para que apresentasse a cópia do contrato de câmbio, extrato bancário de conta corrente/aplicações de 2009 e 2010, e documentos que comprovassem a origem, disponibilidade e efetiva transferência do recurso necessário para o pagamento do veículo. O importador apresentou a documentação encartada às fls. 23/38. Após analisar os extratos bancários, a fiscalização intimou o importador novamente (28/05/2010), para que informasse e comprovasse documentalmente de que se tratavam os depósitos feitos na conta do importador por BH Veículos em 16 e 23/12/2009, nos valores de R$ 100 mil e R$ 47 mil. A resposta do importador foi encartada às fls. 39/54 do PAF. Como se pode verificar, o contribuinte limitou-se a apresentar documentos, e não deu explicações acerca da operação. (...)” Ao final concluiu: Conforme consta dos autos n° 11128.004108/2010-31, a fiscalização concluiu que "os recursos necessários para promover a operação de importação em análise não são oriundos do importador'. Em 16/12/2009 e em 23/12/2009 foram efetuadas transferências para a conta -corrente do Sr. Thiago Braz Tambasco pela empresa Líder BH Veículos L TDA, nos montantes de R$ 100 mil e R$ 47mil. A fiscalização considerou que antes dos depósitos no total de R$147 mil, o saldo da conta -corrente do importador era de R$ 645, e que a conta de investimentos também não tinha saldo 'suficiente para cobrir a liquidação do contrato de câmbio’ de pagamento do veículo. Nesse passo, a fiscalização concluiu que 'a disponibilidade dos recursos empregados na aquisição do veículo aqui discutido teve origem nos depósitos bancários realizados pela empresa Líder BH Veículos, o que demonstra o interesse dessa empresa na importação do bem'. Ainda nestes autos, o próprio Impetrante reafirma que o recurso para liquidação do câmbio da importação teve origem nas transferências da Líder BH Veículos LTDA e que operação foi "feita por intermédio da empresa Líder BH Veículos'. Nos termos do AITAGF n° 0817800/18344/10, "outro fato que vem confirmar o interesse da Líder BH Veículos no veículo objeto da DI em análise é a apresentação de Escritura Pública de Procuração dessa empresa para Thiago Braz Tambasco, conferindo-lhe poderes amplos e especiais para atividades administrativas e comerciais'. Nas importações processadas por conta e ordem de terceiros a origem dos recursos ‘avém do adquirente, que seria o verdadeiro sujeito passivo dessas operações, hipótese comprovada no caso aqui investigado, uma vez que o Sr. Tiago Braz Tambasco não possui recursos próprios para promover a importação do veículo em questão, desrespeitando a habilitação no regime simplificado para importação para fins próprios que lhe foi concedida. Esse fato leva à conclusão da ocorrência de uma interposição fraudulenta no caso vertente com o fito de esconder o real beneficiário dessa importação’. (...)” Diante desse panorama fático se revela correta a conduta da autoridade fiscal que instaurou procedimento especial de controle aduaneiro, pois diante das fundadas dúvidas acerca da capacidade financeira do importador, surgiu legítima suspeita quanto à ocorrência de interposição fraudulenta na importação, o que se confirmou nas apurações feitas, ensejando a aplicação da pena de perdimento nos moldes da legislação (art. 23 do Decreto-Lei n.º 1.455/76 e do art. 689 do Regulamento Aduaneiro). O procedimento administrativo que culminou com a pena de perdimento tramitou regularmente, sendo observados o contraditório e a ampla defesa. Houve, inclusive, oferecimento de impugnação e concessão de diversos prazos para apresentação de documentos anteriormente à decisão de imposição do perdimento, não havendo qualquer nulidade no processo. Da análise do conjunto probatório extrai-se que, de fato, não foram apresentados esclarecimentos satisfatórios por parte da autuada. Outrossim, tratando-se de desembaraço de mercadoria estrangeira apreendida pela autoridade fiscal em razão de haver constatado a prática de interposição fraudulenta de terceiro, a medida que ora se pleiteia demandaria produção de prova inequívoca para afastar as conclusões da autoridade fiscal, o que não foi cumprido pela documentação apresentada neste mandado de segurança. Nesse sentido: “TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. ART. 1.022 DO CPC. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. ART. 23 DO DECRETO-LEI N. 1.455/1976. EXEGESE. PESSOA FÍSICA QUE CONSTITUIU EMPRESA COM O EXCLUSIVO PROPÓSITO DE IMPORTAR UMA AERONAVE. ARRENDAMENTO MERCANTIL OPERACIONAL. ADMISSÃO TEMPORÁRIA DO BEM. SUSPENSÃO DO RECOLHIMENTO DE PARTE DO IPI. INTERPOSIÇÃO FRAUDULENTA CARACTERIZADA. PENA DE PERDIMENTO APLICADA PELO FISCO. CABIMENTO. PEDIDO DE RELEVAÇÃO DA PENALIDADE. CASO CONCRETO QUE NÃO SE ENQUADRA NAS HIPÓTESES NORMATIVAS AUTORIZADORAS DA RELEVAÇÃO. ... 2. A interposição fraudulenta é considerada presumida na hipótese de não comprovação da origem, disponibilidade e transferência dos recursos empregados em operação de comércio exterior (art. 23, V, § 2º, do Decreto-Lei 1.455/76). 3. De acordo com a jurisprudência do STJ, "as hipóteses previstas no art. 23 do DL n. 1.455/1976 e no art. 105 do DL n. 37/1966, que permitem a aplicação da pena de perdimento, veiculam presunção de ocorrência de prejuízo à fiscalização e/ou de dano ao erário, a qual pode ser ilidida pelo investigado no decorrer do processo administrativo fiscal". (AREsp 600.655/MT, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 17/2/2017). 4. No caso dos autos, é incontroverso que a pessoa física recorrente constituiu e se serviu da empresa recorrente (litisconsorte ativa) com o tão só propósito de possibilitar a importação da aeronave ao amparo do regime de admissão temporária, com a suspensão do recolhimento de parte do IPI, sem que, ao depois, restasse comprovado nem mesmo o efetivo funcionamento da pessoa jurídica, que tinha como objeto social a prestação de serviço de táxi aéreo. 5. Contexto em que não há como afastar a ocorrência da denominada interposição fraudulenta, ensejadora do perdimento da aeronave importada. 6. Pedido de relevação da pena de perdimento que não encontra amparo nos arts. 736 e 737 do Decreto 6.759/2009. 7. Recurso especial não provido.” (REsp n. 1.932.864/SP, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 22/6/2021, DJe de 29/6/2021.) No mesmo sentido, entendimento desta E. Corte: AÇÃO ANULATÓRIA. DESEMBARAÇO ADUANEIRO. PROCEDIMENTO ESPECIAL DE CONTROLE ADUANEIRO. INTERPOSIÇÃO FRAUDULENTA DE TERCEIRO. PENA DE PERDIMENTO. LEGALIDADE DO PROCEDIMENTO FISCAL. 1. Constam dos autos que a recorrente importou pares de luvas de poliéster utilizados como equipamento de proteção individual – EPI, os quais foram submetidos a Procedimento Especial de Controle Aduaneiro para a investigação de supostas irregularidades. Ao final do referido procedimento especial, a Receita Federal lavrou Auto de Infração e Termo de Apreensão e Guarda Fiscal nº 0817900/09006/14, contido no Processo Administrativo 15771.721475-2014-93, imputando à recorrente a pena de perdimento dos bens importados, prevista no art. 23, incisos IV e V e parágrafos e art. 24 ambos do Decreto-lei nº 1.455/76. 2. De acordo com o relatório do Auditor Fiscal da Receita Federal, carreado às fls. 61/92 dos autos, foi constatada a interposição fraudulenta na importação diante da não comprovação da origem, disponibilidade e transferência dos recursos empregados na operação. Restou constatado que a recorrente não possui capital próprio para realizar suas operações. 3. Ao contrário do alegado pela apelante, não há qualquer ilegalidade ou nulidade do procedimento adotado pelo Fisco, porquanto, a recorrente não comprovou a origem dos recursos utilizados na operação de importação, ao contrário, o que há nos autos é prova de que os recursos são provenientes de terceiros e não de seu patrimônio, o que caracteriza a presunção legal de fraude, punível com a pena de perdimento das mercadorias. 4. Restou comprovado que a recorrente utilizou para o pagamento dos tributos e despesas aduaneiras referentes à DI 13/1546136-8 recursos de Leandro Jacob Fernandes, não servindo de prova o instrumento particular de compromisso de cessão e transferência de quotas de participação societária, cuja data de assinatura é a mesma da transferência bancária, sem qualquer registro em cartório. Ademais, consta do contrato social, que é o documento que rege as normas da constituição de uma sociedade, que as sócias são Maria Isabel da Rosa Munhato e Viviane Munhato, não fazendo qualquer menção, ao tempo da importação, acerca da cessão de transferência de quotas de Leandro Jacob. 5. Também consta do Auto de Infração que houve falsa declaração de conteúdo da recorrente, ao declarar quantidade de mercadorias inferior àquela realmente importada, considerando que tais mercadorias não foram tributadas, não sendo minimamente crível que o importador, por erro, remeteu mais de 2.000 (dois mil) pares de luvas. 6. A recorrente não carreou aos autos documentos que pudessem afastar as irregularidades apontadas pela autoridade fiscal, limitando-se a argumentar a irregularidade do procedimento adotado pelo Fisco. 7. Da análise dos elementos trazidos aos autos, restou demonstrado o correto procedimento por parte do Fisco, ao instaurar o Procedimento Especial de Controle Aduaneiro, bem como ao decretar a pena de perdimento das mercadorias, considerando a ocorrência da infração de interposição fraudulenta de terceiros, nos termos do art. 23, incisos V, §§1º e 2º do Decreto-lei 1.455/76 e art. 689, do Decreto 6.759/09, 8. Cabe ao Judiciário analisar apenas a legalidade do ato administrativo, sendo que no caso em apreço não se vislumbra desrespeito à lei no procedimento fiscalizador por suspeita de fraude. Nota-se que, em se tratando de pretensão desconstitutiva de ato administrativo, o qual se reveste do atributo da presunção de legalidade, é de rigor a demonstração inequívoca da ilegalidade, o que não ocorreu no presente caso. 9. Apelo desprovido. (TRF 3ª Região, 4ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5022287-50.2018.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal MARCELO MESQUITA SARAIVA, julgado em 04/02/2022, DJEN DATA: 11/02/2022) ADUANEIRO. APELAÇÃO. IMPORTAÇÃO. INTERPOSIÇÃO FRAUDULENTA DE TERCEIROS. ARTIGO 689, §6º, DO DECRETO N.º 6.759/09. CAPACIDADE ECONÔMICO-FINANCEIRA NÃO COMPROVADA. RECURSO DESPROVIDO. - Cinge-se a questão ao exame da legalidade da instauração do processo administrativo fiscal, em razão da prática de interposição fraudulenta de terceiros nas operações de comércio exterior, nos termos dos artigos 23, inciso V, §1º, do Decreto-Lei n.º 1.455/76 e 689, §6º, do Decreto n.º 6.759/09. - De acordo com o levantamento realizado pela autoridade aduaneira junto aos sistemas informatizados da Receita Federal do Brasil, foram observados indícios da prática da interposição fraudulenta, tais como o capital social declarado inferior aos tributos recolhidos na importação, a inexistência de atividade empresarial no endereço declarado pela empresa como sede do estabelecimento e ausência de receitas tributáveis e emissão de notas ficais. - Relativamente à comprovação de a sua capacidade econômico-financeira para a realização da importação, limitou-se a apresentar atestado de idoneidade moral e financeira, no qual não há demonstração de ativos, mas apenas posição consolidada dos limites oferecidos pela instituição bancária, sem devida comprovação da alegada negociação dos bens no mercado interno e a da operação de mútuo que possibilitou o pagamento dos tributos, de modo que não se desincumbiu do ônus da prova, na forma do artigo 373, inciso II, do CPC. Precedentes - Apelação desprovida. (TRF 3ª Região, 4ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0016575-38.2016.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal ANDRE NABARRETE NETO, julgado em 06/07/2022, Intimação via sistema DATA: 12/07/2022). Importante salientar que a propositura de ação judicial impede a rediscussão ou a continuidade de discussão da matéria na esfera administrativa, posto que a matéria enfrentada pelo Poder Judiciário, operada coisa julgada material, não poderá ser revista naquela instância. Nesse sentido: TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. PIS. SEMESTRALIDADE. ATO COSIT N° 3/96. NULIDADE DO TÍTULO EXECUTIVO. CERCEAMENTO DE DEFESA NA ESFERA ADMINISTRATIVA. MULTA DE MORA. (...). 2. É de ser entendido como legal e constitucional o ato administrativo ou normativo que prevê seja determinada matéria só revista pela Administração, quando o fato não se encontre sub judice. 3. O entendimento de que há renúncia à esfera administrativa, em virtude do ajuizamento de ação judicial, questionando o crédito tributário, não significa que há renúncia ao direito postulado, ao contrário, seria um contra-senso submeter à análise o mesmo fato em órgãos distintos, quando o cumprimento desse comando será viabilizado tão somente pela decisão proferida em Juízo, última instância na situação posta. 4. A propositura de ações judiciais, seja de Mandado de Segurança, preventivo ou repressivo, ou de Ações de Conhecimento, ambas de natureza declaratória, impedem a rediscussão da matéria, pela esfera administrativa, posto que o objeto do pedido e a causa de pedir não poderão ser revistos naquela instância, porque se assim o fizesse a Administração estaria afrontando a eficácia do provimento judicial buscado pelo interessado. 5. Ademais, a opção, pelo contribuinte, de se valer do Poder Judiciário para impugnar atos administrativos, tidos por ilegais e abusivos, acarretará na sua revisão sob os aspectos intrínsecos da legalidade e legitimidade, os quais quando lesivos a direitos individuais, mostrando-se injurídicos, por infringência a princípios constitucionais, como os da impessoalidade, moralidade e publicidade ou praticados com excesso ou abuso de autoridade, como previsto pelo artigo 37 da Carta Magna, serão rechaçados e invalidados. (...) 11. Apelação da Embargante parcialmente provida e remessa oficial improvida. (APELAÇÃO CÍVEL - 936176 ApCiv 0007731-80.1999.4.03.6105 PROCESSO_ANTIGO_FORMATADO: 1999.61.05.007731-1, JUÍZA CONVOCADA ELIANA MARCELO, TRF3 - TERCEIRA TURMA, DJU DATA:29/11/2006 PÁGINA: 217 ) negritei No caso em apreço, a parte autora não logrou êxito em produzir provas suficientes para elidir a presunção de legitimidade e veracidade de que goza o auto de infração, mostrando-se hígida a decisão proferida no processo administrativo em epígrafe. Cumpre asseverar, ainda, que o auto de infração goza de presunção de legitimidade e veracidade, pois se trata de ato administrativo, subscrito por servidor dotado de fé pública, e somente que pode ser afastado caso sejam trazidos elementos probatórios suficientes para comprovar eventual ilegalidade, cabendo, assim, ao ora apelante, o ônus da prova quanto ao fato constitutivo do seu direito. Assim, tenho que as alegações da parte autora não foram comprovadas de forma suficiente para o deferimento de seu pleito, merecendo reforma a sentença. Ante o exposto, DOU PROVIMENTO à apelação, nos termos da fundamentação. É o voto.
E M E N T A
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. INTERPOSIÇÃO FRAUDULENTA. PENA DE PERDIMENTO. CABIMENTO. RECURSO PROVIDO.
- Cinge-se a controvérsia acerca da legalidade da autuação pelo Fisco que impôs a pena de perdimento, em razão de atos que caracterizaram as infrações de interposição fraudulenta de terceiros em operação de importação.
- O art. 23 do Decreto-Lei n.º 1.455/76 prevê a culminação de pena de perdimento de bens na hipótese de estar configurada a interposição fraudulenta de terceiros em operações de importação, a qual é presumida no caso de não comprovação da origem, disponibilidade e transferência dos recursos empregados.
- A interposição fraudulenta não se afigura mera irregularidade formal sanável, mas sim infração que sujeita a mercadoria à pena de perdimento.
- Instaurado o procedimento especial de controle aduaneiro (PAF n.11128.004108/2010-31), o impetrante foi intimado a prestar esclarecimentos sobre a origem dos recursos utilizados na operação de importação do veículo CADILLAC, modelo SRX4 AWD PREMIUM, ano 2009, modelo 2010 e demonstrar a sua capacidade financeira.
- O impetrante interpôs o Mandado de Segurança n. 0007780-42.2010.403.6104, perante a 4ª Vara de Santos, bem como Ação Declaratória com pedido de cautelar incidental n. 0063174-15.2010.401.3800 perante a Justiça Federal de Belo Horizonte- MG, ambas, objetivando, em síntese, a liberação do veículo para trânsito (PAF n.11128.004108/2010-31). Em consulta a sistema processual, observa-se que foi homologado o pedido de desistência do primeiro mandado de segurança, não havendo notícia acerca do resultado da ação perante a Justiça Federal de Belo Horizonte.
- No presente mandado de segurança o impetrante utilizando-se dos mesmos argumentos da ação anterior (0007780-42.2010.403.6104) pretende além das medidas para o desembaraço do veículo para trânsito, afastar a pena de perdimento tornada definitiva no curso do procedimento administrativo.
- In casu, de fato, foram apontados concretos indícios, pela autoridade aduaneira, para a instauração de procedimento especial de controle aduaneiro a fim de que fosse apurada a ocorrência de interposição fraudulenta.
- Diante do panorama fático, se revela correta a conduta da autoridade fiscal que instaurou procedimento especial de controle aduaneiro, pois diante das fundadas dúvidas acerca da capacidade financeira do importador, surgiu legítima suspeita quanto à ocorrência de interposição fraudulenta na importação, ensejando a aplicação da pena de perdimento nos moldes da legislação (art. 23 do Decreto-Lei n.º 1.455/76 e do art. 689 do Regulamento Aduaneiro).
- O procedimento administrativo que culminou com a pena de perdimento tramitou regularmente, sendo observados o contraditório e a ampla defesa. Houve, inclusive, oferecimento de impugnação e concessão de diversos prazos para apresentação de documentos anteriormente à decisão de imposição do perdimento, não havendo qualquer nulidade no processo.
- De fato, não foram apresentados esclarecimentos satisfatórios por parte da autuada.
- Tratando-se de desembaraço de mercadoria estrangeira apreendida pela autoridade fiscal em razão de haver constatado a prática de interposição fraudulenta de terceiro, a medida que ora se pleiteia demandaria produção de prova, o que é inviável em sede de mandado de segurança.
- A propositura de ação judicial impede a rediscussão da matéria na esfera administrativa, posto que a matéria enfrentada pelo Poder Judiciário, não poderá ser revista naquela instância.
- A parte autora não logrou êxito em produzir provas suficientes para elidir a presunção de legitimidade e veracidade de que goza o auto de infração, mostrando-se hígida a decisão proferida no processo administrativo em epígrafe.
- O auto de infração goza de presunção de legitimidade e veracidade, pois se trata de ato administrativo, subscrito por servidor dotado de fé pública, e somente que pode ser afastado caso sejam trazidos elementos probatórios suficientes para comprovar eventual ilegalidade, cabendo, assim, ao ora apelante, o ônus da prova quanto ao fato constitutivo do seu direito.
- As alegações da parte autora não foram comprovadas de forma suficiente para o deferimento de seu pleito, merecendo reforma a sentença.
- Apelação provida.