Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5005715-77.2022.4.03.6100

RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA

APELANTE: SIND ARTISTAS E TECNICOS EM ESPETACULOS DIVERS NO E S P, ORDEM DOS MUSICOS DO BRASIL CONS REG DO EST DE SAO PAUL

Advogado do(a) APELANTE: EDUARDO ANTONIO BOSSOLAN - SP308642-B
Advogados do(a) APELANTE: JOSE ROBERTO MAZETTO - SP31453-A, PATRICIA KAZUE NAKAMURA - SP226219-A

PARTE RE: SINDICATO DOS MUSICOS PROFISSIONAIS NO EST DE SAO PAULO, UNIÃO FEDERAL
APELADO: SALT CONTEUDO ARTISTICO LTDA

Advogados do(a) APELADO: ANNA FLAVIA DE AZEVEDO IZELLI GRECO - SP203014-A, THOMAS BENES FELSBERG - SP19383-A
Advogados do(a) PARTE RE: JOSE ROBERTO MAZETTO - SP31453-A, PATRICIA KAZUE NAKAMURA - SP226219-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5005715-77.2022.4.03.6100

RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA

APELANTE: SIND ARTISTAS E TECNICOS EM ESPETACULOS DIVERS NO E S P, ORDEM DOS MUSICOS DO BRASIL CONS REG DO EST DE SAO PAUL
REPRESENTANTE: DORBERTO ROCHA CARVALHO

Advogados do(a) APELANTE: BRUNO MARTINGHI SPINOLA - SP390511-A, SILVIO SARAIVA DE SOUZA - SP356845-A,
Advogados do(a) APELANTE: JOSE ROBERTO MAZETTO - SP31453-A, PATRICIA KAZUE NAKAMURA - SP226219-A

PARTE RE: COORDENADOR DA COORDENAÇÃO-GERAL DE IMIGRAÇÃO (CGIG), SINDICATO DOS MUSICOS PROFISSIONAIS NO EST DE SAO PAULO, UNIÃO FEDERAL
APELADO: SALT CONTEUDO ARTISTICO LTDA

Advogados do(a) APELADO: ANNA FLAVIA DE AZEVEDO IZELLI GRECO - SP203014-A, THOMAS BENES FELSBERG - SP19383-A
Advogados do(a) PARTE RE: JOSE ROBERTO MAZETTO - SP31453-A, PATRICIA KAZUE NAKAMURA - SP226219-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

 

 

A Excelentíssima Senhora Desembargadora Federal MARLI FERREIRA (Relatora):

 

Trata-se de apelações e remessa necessária em mandado de segurança, com pedido de liminar, impetrado por SALT CONTEÚDO ARTÍSTICO LTDA., contra ato praticado pelo COORDENADOR DA COORDENAÇÃO GERAL DE IMIGRAÇÃO - CGIG, pelo PRESIDENTE DA ORDEM DOS MÚSICOS DO BRASIL EM SÃO PAULO – OMBSP, pelo PRESIDENTE DO SINDICATO DOS MÚSICOS DO ESTADO DE SÃO PAULO – SINDIMUS/SP e pelo PRESIDENTE DO SINDICATO DOS ARTISTAS E TÉCNICOS EM ESPETÁCULOS E DIVERSÕES DE SÃO PAULO – SATED/SP.

Afirma a Impetrante, que atua no ramo de promoção de festas e eventos musicais, firmando diversos contratos com músicos, artistas e técnicos estrangeiros para realização de espetáculos em território brasileiro.

Salienta que para viabilizar o trabalho dos profissionais estrangeiros é necessária a emissão de visto pelo Ministério das Relações Exteriores, que está condicionada ao registro dos contratos perante a CGig, que exige o pagamento de taxas previstas nos artigos 53, da Lei nº 3.857/60 e 25, da Lei nº 6.533/78, bem como a averbação, pelas demais autoridades Impetradas, no respectivo contrato.

Alega que cada taxa corresponde a 10% (dez por cento) do valor do contrato e ela é requisito para o registro dos contratos dos profissionais estrangeiros na CGig, com base na Portaria nº 656/2018, do Ministério do Trabalho e Emprego.

Aduz que, além do registro, tal portaria também exige que o contrato esteja visado pela OMB e pelo Sindicato representativo de classe local. Sustenta que a exigência do recolhimento da taxa é inconstitucional, eis que não há vinculação da contraprestação e da destinação do produto da arrecadação ao ente que exerceu o poder de polícia, além dela ter a mesma base de cálculo do ISS.

Pede a concessão da segurança para que a OMB/SP e o SINDIMUS/SP se abstenham da cobrança da taxa prevista no artigo 53, da Lei nº 3.857/60, em relação aos músicos internacionais contratados pela Impetrante, bem como se abstenham de exigir o visto nos contratos firmados entre eles.

Solicita, ainda, que o SATED/SP se abstenha da cobrança da taxa prevista no artigo 25, da Lei nº 6.533/78, em relação aos artistas e técnicos internacionais contratados por ela, bem como se abstenha de exigir o visto nos contratos firmados entre eles.

Por fim, pede que o CGig se abstenha de exigir o pagamento de ambas as taxas e o visto das entidades de classe nos contratos pactuados entre a Impetrante e os músicos, artistas e técnicos estrangeiros para o registro dos seus contratos.

Foi dado à causa o valor de R$ 5.450,00 (cinco mil e quatrocentos e cinquenta reais).

A liminar foi deferida.

O MM. Juízo a quo julgou extinto o feito com resolução de mérito, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, e concedeu a segurança para determinar que a Coordenação Geral de Imigração proceda ao registro e autorização de atividade artística contratada entre a Impetrante e músicos, artistas e técnicos internacionais, independentemente da exibição de contrato de trabalho vistado pelas Autoridades Impetradas, bem como do comprovante de recolhimento das taxas previstas nos artigos 53 da Lei nº 3.857/60 e 25 da Lei nº 6.533/78.

Determinou que as Autoridades Impetradas se abstenham de exigir a taxa de 10% (dez por cento) incidente sobre os contratos celebrados por músicos, artistas e técnicos estrangeiros, em favor das Autoridades Impetradas e o visto nos contratos por ela firmados.

Sem honorários, conforme estabelecido no artigo 25, da Lei nº 12.016/09. Custas ex lege.

O SINDICATO DOS ARTISTAS E TÉCNICOS EM ESPETÁCULOS E DIVERSÕES DE SÃO PAULO – SATED/SP interpôs recurso de apelação alegando, em preliminar, ser incabível o mandado de segurança contra lei em tese, no mérito afirmou que teria restado demonstrado que a exigência prevista no artigo 25, da Lei nº 6.533/1978 teria guarida na Constituição da República, razão pela qual deveria a segurança pretendida ser indeferida, ante a suposta ausência de inconstitucionalidade e de ilegalidade.

A ORDEM DOS MÚSICOS DO BRASIL CONSELHO REGIONAL DO ESTADO DE SAO PAULO interpôs recurso de apelação arguindo, em preliminar, a inadequação da via eleita, por ser vedada a utilização do mandado de segurança como substitutivo de ação de cobrança, no mérito sustentou a constitucionalidade do artigo 53, da Lei nº 3.857/1960 e do artigo 25, da Lei nº 6.533/1978.

Com as contrarrazões, remeteram-se os autos a este Tribunal.

O representante do Ministério Público Federal em 2ª Instância se manifestou pelo desprovimento das apelações.

Sentença sujeita ao duplo grau de jurisdição.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


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4ª Turma
 

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REPRESENTANTE: DORBERTO ROCHA CARVALHO

Advogados do(a) APELANTE: BRUNO MARTINGHI SPINOLA - SP390511-A, SILVIO SARAIVA DE SOUZA - SP356845-A,
Advogados do(a) APELANTE: JOSE ROBERTO MAZETTO - SP31453-A, PATRICIA KAZUE NAKAMURA - SP226219-A

PARTE RE: COORDENADOR DA COORDENAÇÃO-GERAL DE IMIGRAÇÃO (CGIG), SINDICATO DOS MUSICOS PROFISSIONAIS NO EST DE SAO PAULO, UNIÃO FEDERAL
APELADO: SALT CONTEUDO ARTISTICO LTDA

Advogados do(a) APELADO: ANNA FLAVIA DE AZEVEDO IZELLI GRECO - SP203014-A, THOMAS BENES FELSBERG - SP19383-A
Advogados do(a) PARTE RE: JOSE ROBERTO MAZETTO - SP31453-A, PATRICIA KAZUE NAKAMURA - SP226219-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

 

 

A Excelentíssima Senhora Desembargadora Federal MARLI FERREIRA (Relatora):

 

As apelações e a remessa necessária não comportam provimento.

Preliminarmente, a alegação de inadequação da via eleita não merece acolhimento.

O mandado de segurança é regido pela Lei nº 12.016/2009, a qual, dentre outras providências, disciplina seus requisitos, hipóteses de cabimento e determina excepcionais circunstâncias nas quais a ordem não deve ser concedida.

Conforme cediço, é uma ação de rito célere, destinada a assegurar direito líquido e certo não amparado por habeas corpus ou habeas data e, por conseguinte, não admite dilação probatória. É requisito da impetração do writ prova pré constituída do alegado direito líquido e certo, devendo o Impetrante demonstrar desde logo, através de prova documental, a existência do direito pleiteado.

O Excelso Supremo Tribunal Federal já sumulou entendimento vedando a aplicação do mandado de segurança contra lei em tese (Enunciado nº 266), já que esta, enquanto norma abstrata de conduta, não lesa qualquer direito individual.

Insta consignar que, no caso em tela, a impugnação se dirige ao ato concreto e impositivo de cobrança de taxa pela contratação de artistas estrangeiros.

A ilegalidade e a inconstitucionalidade da cobrança da citada taxa surgem como fundamentação das razões do mandado de segurança, não havendo que se falar em impetração contra lei em tese.

Como bem acentuado na sentença, deve ser afastada a preliminar de inadequação da via eleita em razão e de se tratar de mandado de segurança contra lei em tese, eis que a Impetrante tem justo receio de ser impedida de apresentar a atividade artística contratada com os artistas estrangeiros.

Outrossim, não procede a preliminar levantada pela OMB/SP, pois a Impetrante não visa a cobrança de taxa, mas contra ela se insurge.

No mérito, melhor sorte não assiste aos Apelantes.

De acordo com o inciso III, do artigo 1º, da Constituição Federal de 1988, a República Federativa do Brasil tem como fundamentos basilares a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa.

Desse modo, todas as instituições públicas e privadas, ao agir, devem respeitar os direitos e garantias constitucionais.

No que diz respeito ao trabalho, a Constituição estabeleceu a liberdade do exercício de profissão e ofício em seu artigo 5º, inciso XIII, “é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações que a lei estabelecer”.

A exigência de qualquer qualificação, contudo, deve ocorrer nos exatos limites legais, até porque a regra é a liberdade do exercício, tratando-se, portanto, de norma constitucional de eficácia contida. Nesse sentido, observa-se o parágrafo único, do artigo 170, da Carta Maior.

Logo, percebe-se que a vontade do constituinte originário é a de viabilizar amplamente os meios ao exercício do consagrado direito ao trabalho, restringindo, tão somente, nos casos estritamente previstos em lei, quando existente um risco considerável no exercício da profissão.

No caso dos autos, as Leis nº 3.857/1960 e nº 6.533/1978 dispõem, respectivamente, sobre o exercício das profissões de músico e artista, estabelecendo os requisitos para o seu exercício e as correspondentes restrições.

As mencionadas leis preveem, em seus artigos 53 e 25, a necessidade de pagamento, pelo contratante, de taxas de 10% (dez por cento) sobre o valor dos contratos celebrados com músicos e artistas estrangeiros.

Assim, depreende-se dos precitados diplomas que aquele que pretende contratar músicos e artistas estrangeiros para atuarem em território nacional, fica sujeito ao pagamento de taxa no valor de 10% (dez por cento) do ajuste total.

Em 22/08/2018, foi editada pelo Ministério do Trabalho a Portaria nº 656, aprovando modelos de instrumentos para contratação de músicos, profissionais, artistas e técnicos de espetáculos de diversões, com vistas a regulamentar parte das disposições normativas existentes.

Contudo, em que pese a adequação formal da Portaria nº 656 ao teor das Leis nº 3.857/1960 e nº 6.533/1978, o Supremo Tribunal Federal já se posicionou, no julgamento da ADPF nº 183, pela desnecessidade da fiscalização da profissão de músico por parte do Conselho, não se sujeitando ao pagamento de taxas, tendo em vista tratar-se de atividade que não gera riscos a terceiros, raciocínio aplicável também à profissão de artista.

Confira-se a ementa do julgado, in verbis:

 

“CONSTITUCIONAL. LEI FEDERAL 3.857/1960. INSTITUI A ORDEM DOS MÚSICOS DO BRASIL CONFERINDO PODER DE POLÍCIA SOBRE A PROFISSÃO DE MÚSICO. LIBERDADES DE PROFISSÃO E MANIFESTAÇÃO ARTÍSTICA (ARTS. 5º, IX E XIII, DA CF). INCOMPATIBILIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE INTERVENÇÃO ESTATAL NESSE TIPO DE ATIVIDADE.

1. O art. 5º, XIII, parte final, da CF admite a limitação do exercício dos trabalhos, ofícios ou profissões, desde que materialmente compatível com os demais preceitos do texto constitucional, em especial o valor social do trabalho (arts. 1º, IV; 6º, caput e inciso XXXII; 170, caput e inciso VIII; 186, III, 191 e 193 da CF) e a liberdade de manifestação artística (art. 5º, IX, da CF).

2. As limitações ao livre exercício das profissões serão legítimas apenas quando o inadequado exercício de determinada atividade possa vir a causar danos a terceiros e desde que obedeçam a critérios de adequação e razoabilidade, o que não ocorre em relação ao exercício da profissão de músico, ausente qualquer interesse público na sua restrição.

3. A existência de um conselho profissional com competências para selecionar, disciplinar e fiscalizar o exercício da profissão de músico (art. 1º), para proceder a registros profissionais obrigatórios, para expedir carteiras profissionais obrigatórias (arts. 16 e 17) e para exercer poder de polícia, aplicando penalidades pelo exercício ilegal da profissão (arts. 18, 19, 54 e 55), afronta as garantias da liberdade de profissão e de expressão artística.

4. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental julgada procedente.”

(STF ADPF nº 183, Rel. Min. Alexandre de Morais – TP, DJe: 18/11/2019)

 

O referido precedente serviu como base para diversas decisões proferidas pela Corte Constitucional, que julgaram ilegítima a cobrança das taxas previstas no artigo 53, da Lei nº 3.857/1960 e no artigo 25, da Lei nº 6.533/1978. Eis o posicionamento do Tribunal:

“[...]

Na ocasião desse julgamento, o Pleno desta Corte sedimentou o entendimento de que a existência de um conselho profissional que regule a profissão de músico fronta as garantias da liberdade de profissão e expressão artística. Nesse contexto, assentou que limitações ao livre exercício das profissões serão legítimas apenas quando o inadequado exercício de determinada atividade possa vir a causar danos a terceiros e desde que obedeçam a critérios de adequação e razoabilidade, o que não ocorre em relação ao exercício da profissão de músico, ausente qualquer interesse público na sua restrição. Assim, não se afigura legítima a cobrança da taxa de fiscalização (art. 53 da Lei n. 3.857/1960) pela Ordem dos Músicos do Brasil, tendo em vista a ausência do fato gerador da taxa, a saber, o exercício do poder de polícia ou a utilização de serviço público específico e divisível. Do mesmo modo, não procede a cobrança de contribuição em favor da categoria profissional (art. 25 da Lei n. 6.533/1978), em razão da inexistência de contrapartida da atuação do sindicato na área.

[…]”.

(STF RE 1246804/PR, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe: 06/04/2020)

 

“[...]

Especificamente no tocante ao art. 53 da Lei 3.857/60, verifico que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE 795.467-RG/SP, Rel. Min. Teori Zavascki, reconheceu existente a repercussão geral da matéria constitucional igualmente versada na presente causa, e, na mesma oportunidade, reafirmou a jurisprudência desta Corte sobre o tema, proferindo decisão consubstanciada em acórdão assim ementado:

[…]

Assim, resta evidente que o acórdão ora impugnado está em consonância com a diretriz jurisprudencial que esta Suprema Corte estabeleceu quanto à matéria, no sentido da inexigibilidade do pagamento da taxa de 10% determinada no artigo 53 da Lei nº 3.857/60 em virtude da garantia da liberdade de expressão

[…]”

(STF ARE 1239646/RJ, Rel. Min. Edson Fachin, DJe: 27/02/2020) 

 

“[…]

Em caso como o dos autos, baseados em jurisprudência do STF, os tribunais vem decidindo como sendo indevida a cobrança de taxas sobre a atividade profissional de músicos, nacionais ou estrangeiros, uma vez que inexiste o exercício de poder de polícia ou de disponibilização de serviço público como fato gerador da ‘taxa’ em questão.

[…]

Dessa forma, não restou demonstrado o direito da parte autora, já que não se pode cobrar taxa dos músicos estrangeiros que, de passagem pelo país, não integram a base sindical, tampouco ensejam o policiamento administrativo realizado por Conselho.

[…]”

(STF Rcl 34819/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe: 16/08/2019)

 

Por conseguinte, haja vista do entendimento do Supremo Tribunal Federal sobre a questão, não se afigura possível a cobrança das taxas pela contratação de músicos e artistas estrangeiros, razão pela qual o Impetrante tem direito líquido e certo à sua inexigibilidade.

Do mesmo modo, não há necessidade de que os Apelantes vistem os contratos firmados entre a Impetrante e o artista internacional, haja vista que não cabe a eles a fiscalização de tais contratos.

Em consequência, a Impetrante está desobrigada de apresentar, perante a Coordenação de Geral de Imigração, o comprovante de recolhimento das taxas discutidas, bem como do contrato vistado pela OMB ou pelo Sindicato.

Acerca da matéria, trago o aresto de minha relatoria, in verbis:

                            

“CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. APELAÇÃO. EXIGÊNCIA DA EXIBIÇÃO DE CONTRATO VISTADO PELA ORDEM DOS MÚSICOS DO BRASIL E DO SINDICATO DOS MÚSICOS PROFISSIONAIS PARA REGISTRO E AUTORIZAÇÃO DE ATIVIDADE ARTÍSTICA CONTRATADA, MEDIANTE O RECOLHIMENTO DE TAXA DE 10% DO VALOR DO CONTRATO CELEBRADO. INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGO 53, DA LEI Nº 3.857/1960 NÃO RECEPCIONADO PELA ATUAL ORDEM CONSTITUCIONAL. OBRIGAÇÃO DE REGISTRO DOS CONTRATOS JUNTO AO MINISTÉRIO DO TRABALHO. MANUTENÇÃO.  APELAÇÃO E REMESSA OFICIAL. NÃO PROVIDAS.

1. O provimento recorrido encontra-se devidamente fundamentado, tendo dado à lide a solução mais consentânea possível, à vista dos elementos contidos nos autos.

2. O entendimento externado no provimento recorrido encontra-se conforme a jurisprudência pacífica das Cortes Superiores e deste Tribunal, no sentido de que a Constituição Federal assegura a liberdade de expressão artística, independentemente de censura ou licença, nos termos do artigo 5º, inciso IX, da CF/88.  

3. Por conseguinte, não há necessidade de que a OMB ou Sindicatos correspondentes viste o contrato firmado entre a Impetrante e os artistas, haja vista não caber a eles a fiscalização de tais contratos, pela não recepção do artigo 53, da Lei n.º 3.857/1960 pela atual ordem constitucional.

4. O Apelante sustenta que em relação ao registro dos contratos junto ao Ministério do Trabalho e regularização migratória, além da exigência contrariar a nova lei de migração, inexiste relação de trabalho com os músicos que permanecem no Brasil por até 90 dias.

5. Primeiramente, o dispositivo que prevê a exigência de registrar os instrumentos contratuais celebrados com músicos estrangeiros perante o órgão ministerial trabalhista, encontra-se vigente, não tendo sido declarado inconstitucional pelo Excelso Supremo Tribunal Federal que, na oportunidade, por unanimidade, julgou no sentido da desnecessidade de registro dos músicos junto à Ordem dos Músicos do Brasil, no julgamento do RE 414426.

6. Em segundo, a r. sentença também deve ser mantida quanto a este ponto, tendo em vista que além do fundamento utilizado pelo Juízo a quo, no sentido de que "Tal disposição não está em descompasso com a Lei n. 13.445 de 2017, e não há fundamento jurídico para afastá-la”, a matéria também deve ser analisada sob Lei nº 6.533, de 24 de maio de 1978, que dispõe sobre a regulamentação das profissões de Artistas e de técnico em Espetáculos de Diversões, e dá outras providências.

7. Ademais, cabe ressaltar que a finalidade da norma extrapola a simples arrecadação, uma vez que guarda estrita correlação com a fiscalização trabalhista, visando a preservação de direitos, em especial a segurança no trabalho.

8. Apelação e remessa oficial não providas.” 

(TRF 3ª Região, 4ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5010706-04.2019.4.03.6100, Rel. Desembargadora Federal MARLI MARQUES FERREIRA, julgado em 06/06/2022, Intimação via sistema DATA: 20/06/2022)

 

Nesse sentido, trago os arestos desta E. Corte, a respeito da matéria:

 

“DIREITO PROCESSUAL CIVIL. CONSTITUCIONAL. ORDEM DOS MÚSICOS DO BRASIL. MÚSICOS ESTRANGEIROS. TAXA. INEXIGIBILIDADE. ARTIGO 53 DA LEI 3.857/1960. NÃO RECEPÇÃO PELA ATUAL CONSTITUIÇÃO FEDERAL.

1. Rejeitada preliminar de ilegitimidade passiva arguida em contrarrazões, pois o recolhimento pretendido na espécie decorre não apenas do acordo firmado entre apelante e Instituto Brasileiro de Gestão Cultural, responsável pela gestão do Teatro Municipal de São Paulo, como da própria Lei 3.857/1960 (artigo 53), a que, em tese, sujeita a apelada.

2. A inexigibilidade da taxa prevista no artigo 53 da Lei 3.857/1960, em decorrência da tese firmada nos RREE 414.426 e 795.467, foi recentemente confirmada pela Suprema Corte (ARE-AgR 1.239.646, Rel. Min. EDSON FACHIN, DJE de 13/08/2020).

3. Considerando que o artigo 53 da Lei 3.857/1960 não foi recepcionado pela CF/1988, o acordo particular firmado para garantir a observância de tal dispositivo legal não é eficaz nem obriga as partes.

4. Fixada verba honorária pelo trabalho adicional em grau recursal, em observância ao comando e critérios do artigo 85, §§ 2º a 6º e 11, do Código de Processo Civil.

5. Apelação desprovida.” (grifo nosso)

(TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL, 5020834-20.2018.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal LUIS CARLOS HIROKI MUTA, julgado em 09/11/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 11/11/2020)

 

“DIREITO CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO RETIDO. REITERAÇÃO. INOCORRÊNCIA. NÃO CONHECIMENTO. ORDEM DOS MÚSICOS DO BRASIL. PROFISSÃO DE MÚSICO. ARTS. 5º, IX E XIII, DA CONSTITUIÇÃO. ART. 53 DA LEI N.° 3.857/1960. MÚSICOS ESTRANGEIROS. TAXA PELO REGISTRO DE CONTRATOS. NÃO RECEPÇÃO PELA ATUAL ORDEM CONSTITUCIONAL. LIVRE MANIFESTAÇÃO ARTÍSTICA. PRESCINDIBILIDADE DE CONTROLE PROFISSIONAL. VIOLAÇÃO DA REGRA DA CLÁUSULA DE RESERVA DE PLENÁRIO. INOCORRÊNCIA.

1. Não se conhece do agravo retido interposto, uma vez que a parte deixou de reiterá-lo expressamente nas razões ou na resposta de apelação, conforme disposição do art. 523, § 1º, do CPC/1973, vigente à época.

2. O livre exercício profissional é um direito fundamental assegurado na Constituição da República, em seu art. 5º, XIII, segundo o qual (...) é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer.

3. Em relação ao exercício da profissão de músico, a regulamentação deu-se por meio da Lei n.º 3.857/1960, cujo art. 53, caput, dispõe que (...) os contratos celebrados com os músicos estrangeiros somente serão registrados no órgão competente do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, depois de provada a realização do pagamento pelo contratante da taxa de 10% (dez por cento) sobre o valor do contrato e o recolhimento da mesma ao Banco do Brasil em nome da Ordem dos Músicos do Brasil e do sindicato local, em partes iguais.

4. O inciso IX do art. 5º da Carta Magna é categórico ao afirmar que é livre a expressão da atividade artística independentemente de licença.

5. A profissão de músico, diferentemente das demais como a de médico ou de advogado, que requerem controle rigoroso por colocarem em risco bens jurídicos de extrema importância (vida, liberdade, saúde, patrimônio), não é perigosa ou prejudicial à sociedade. Diante disso, a regulamentação legal da atividade não é necessária, pois não há interesse público a ser protegido.

6. Com o julgamento do RE n.º 414.426, submetido ao Plenário, o E. Supremo Tribunal Federal consagrou o entendimento quanto à desnecessidade de inscrição dos músicos na Ordem dos Músicos do Brasil, prescindindo, ademais, a atividade de controle, justamente em virtude da livre manifestação artística.

7. Sendo a filiação facultativa, o pagamento de taxa não pode ser exigido daqueles que optem por não se inscrever, do que se denota que o supracitado art. 53 da Lei n.° 3.857/1960 não foi recepcionado pela atual ordem constitucional.

8. Quanto à alegação de violação da regra da cláusula de reserva de plenário, em que pese a imprecisão terminológica, na verdade, cuidou-se do fenômeno da "não recepção", tendo em vista que as normas objeto do controle de constitucionalidade eram anteriores ao parâmetro (Constituição de 1988).

9. O próprio Pleno do Supremo já reconheceu a incompatibilidade constitucional da cobrança de tributo pela fiscalização da atividade profissional de músico, afigurando-se despicienda, assim, a sujeição do tema também ao Plenário ou Órgão Especial desta Corte, nos termos do art. 481, parágrafo único do CPC/1973.

10. Agravo retido não conhecido. Apelação desprovida.” (grifo nosso)

(TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL, 0014757-56.2013.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal CONSUELO YATSUDA MOROMIZATO YOSHIDA, julgado em 20/09/2019, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 26/09/2019)                                   

 

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO às apelações e à remessa oficial.

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. APELAÇÃO. ORDEM DOS MUSICOS DO BRASIL CONSELHO REGIONAL DO ESTADO DE SAO PAULO. SINDICATO DOS MUSICOS PROFISSIONAIS NO ESTADO DE SAO PAULO. SINDICATO DOS ARTISTAS E TÉCNICOS EM ESPETÁCULOS DE DIVERSÕES DO ESTADO DE SÃO PAULO. EXIGÊNCIA DO RECOLHIMENTO DE TAXA PREVISTA NO ARTIGO 53, DA LEI Nº 3.857/1960 E ARTIGO 25, DA LEI Nº 6.533/78. NÃO RECEPCIONADA PELA ATUAL ORDEM CONSTITUCIONAL. APELAÇÕES E REMESSA OFICIAL DESPROVIDAS.

1. A Constituição Federal assegura a liberdade de expressão artística, independentemente de censura ou licença, nos termos do artigo 5º, inciso IX, da CF/88. 

2. Em que pese a adequação formal da Portaria nº 656 ao teor das Leis nº 3.857/1960 e nº 6.533/1978, o Excelso Supremo Tribunal Federal já se posicionou, no julgamento da ADPF nº 183, pela desnecessidade da fiscalização da profissão de músico por parte do Conselho, não se sujeitando ao pagamento de taxas, tendo em vista tratar-se de atividade que não gera riscos a terceiros, raciocínio aplicável também à profissão de artista.

3. O referido precedente serviu como base para diversas decisões proferidas pela Corte Constitucional, que julgaram ilegítima a cobrança das taxas previstas no artigo 53, da Lei nº 3.857/1960 e no artigo 25, da Lei nº 6.533/1978.

4. Não há necessidade de que a OMB ou Sindicatos correspondentes vistem o contrato firmado entra a Impetrante e os artistas, haja vista não caber a eles a fiscalização de tais contratos, pela não recepção do artigo 53, da Lei nº 3.857/1960 pela atual ordem constitucional.

5. Por conseguinte, haja vista do entendimento do Excelso Supremo Tribunal Federal sobre a questão, não se afigura possível a cobrança das taxas pela contratação de músicos e artistas estrangeiros, razão pela qual o Impetrante tem direito líquido e certo a sua inexigibilidade.

6. Em consequência, a Impetrante está desobrigada de apresentar, perante a Coordenação de Geral de Imigração, o comprovante de recolhimento das taxas discutidas, bem como do contrato vistado pela OMB ou pelo Sindicato.

7. Apelações e remessa oficial desprovidas. 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, à unanimidade, decidiu NEGAR PROVIMENTO às apelações e à remessa oficial, nos termos do voto da Des. Fed. MARLI FERREIRA (Relatora), com quem votaram a Des. Fed. MÔNICA NOBRE e o Des. Fed. MARCELO SARAIVA. Ausente, justificadamente em razão de férias, o Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE (substituído pelo Juiz Fed. Convocado SIDMAR MARTINS) , nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.