APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001937-77.2010.4.03.6110
RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA
APELANTE: AUTOMEC COMERCIAL DE VEICULOS LTDA
Advogado do(a) APELANTE: FABRICIO HENRIQUE DE SOUZA - SP129374-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001937-77.2010.4.03.6110 RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA APELANTE: AUTOMEC COMERCIAL DE VEICULOS LTDA Advogado do(a) APELANTE: FABRICIO HENRIQUE DE SOUZA - SP129374-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL Advogado do(a) APELADO: ISMARIO BERNARDI - SP8240 OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O A Excelentíssima Senhora Desembargadora Federal MARLI FERREIRA (Relatora): Trata-se de recurso de apelação interposto da r. sentença monocrática que, em sede de mandado de segurança impetrado pela AUTOMEC COMERCIAL DE VEÍCULOS LTDA objetivando a suspensão da exigibilidade dos créditos tributários consubstanciados no PA nº 10855.000685/2007-71 denegou a segurança, sob o fundamento de que a manifestação de inconformidade apresentada pela impetrante não se ajusta às previsões dos §§ 9º e 11 do artigo 74 da Lei nº 9.430/96. Alega a recorrente que o processo administrativo obedece ao princípio constitucional da ampla defesa e contraditório, tal como a manifestação de inconformidade, quando da não homologação da compensação tributária, nos termos do artigo 151, inciso III do CTN, do artigo 74 da Lei nº 9.430/96 e ainda, do artigo 7°, I e 33 do Decreto n° 70.235/72. Acresce que a suposta irregularidade constatada pelo Fisco se deu por conta da apresentação da compensação em DCTF, da qual decorreu a cobrança do crédito tributário, sem sequer abrir prazo para defesa administrativa, atitude discricionária e ilegal. Destaca que a administração tributária, em total descompasso com a legislação aplicável à espécie, ignorou a manifestação de inconformidade apresentada, não suspendendo exigibilidade do crédito tributário controlado no processo n° 10855.000685/2007-71, fato este que além de obstruir a emissão da Certidão Conjunta de Regularidade Fiscal, poderá prejudicar ainda mais as atividades da recorrente como um todo. Sustenta que, inobstante não tenha declarado a compensação por meio de declaração de compensação, há créditos compensáveis que não foram considerados pelo Fisco, ou seja, este não nega a existência de crédito a compensar, mas tão somente o procedimento administrativo utilizado. Pede, por fim, a reforma da r. sentença recorrida, para que se determine o recebimento e processamento da manifestação de inconformidade manejada pela recorrente com a consequente suspensão da exigibilidade do crédito tributário. Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte para julgamento. O i. representante do Ministério Público Federal opinou pela manutenção da r. sentença monocrática. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001937-77.2010.4.03.6110 RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA APELANTE: AUTOMEC COMERCIAL DE VEICULOS LTDA Advogado do(a) APELANTE: FABRICIO HENRIQUE DE SOUZA - SP129374-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL Advogado do(a) APELADO: ISMARIO BERNARDI - SP8240 OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A Excelentíssima Senhora Desembargadora Federal MARLI FERREIRA (Relatora): Desde logo ressalte-se que o presente recurso foi interposto antes da entrada em vigor do Código de Processo Civil de 2015, razão pela qual será apreciado de acordo com a forma prevista no CPC de 1973, "com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça" (enunciado nº 2º do E. STJ). Cinge-se a controvérsia sobre se o recurso administrativo apresentado contra a decisão administrativa que não reconheceu da compensação levada a efeito pela recorrente em DCTF, teria o efeito de suspender a exigibilidade dos tributos objeto do pedido de compensação, controlados no PA nº 110855.000685/2007-71. Com efeito, colhe-se da informação fiscal juntada aos autos, que a impetrante não observou o artigo 49 da Lei nº 10.637, de 30/12/2002 que, ao dar nova redação ao artigo 74 da Lei nº 9.430/96, estabelece que a compensação será efetuada mediante entrega, pelo sujeito passivo, de declaração de compensação, razão pela qual os créditos foram objeto de cobrança. Assim, a recorrente apresentou manifestação de inconformidade, com fundamento no artigo 74 da Lei nº 9.430/96 e no artigo 151 do CTN, a qual, no entanto foi considerada incabível, por não se enquadrar nas previsões trazidas pela Lei nº 9.430/96, entendendo a administração tributária que tal recurso somente seria possível se todo o procedimento adotado pelo sujeito passivo atendesse ao referido artigo. Ocorre que esse entendimento contraria a jurisprudência pacífica do E. STJ no sentido de que, também quando veiculada via DCTF a compensação, deve ser oportunizado ao contribuinte, que teve a compensação não homologada ou indeferida, o direito à manifestação de inconformidade, no caso cerceado pela autoridade fiscal. A propósito: “PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. PRESCRIÇÃO. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ART. 1.022 DO CPC. INEXISTENTE. ACÓRDÃO EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA DO STJ. DESPROVIMENTO DO AGRAVO INTERNO. MANUTENÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA. I - Na origem, trata-se de mandado de segurança objetivando, em síntese, que seja concedida ordem a fim de excluir débitos tributários, por estarem extintos pela prescrição. Na sentença, julgou-se o pedido improcedente. No Tribunal a quo, a sentença foi mantida. II - Por ser incabível, não se deve conhecer do presente recurso no que concerne à matéria objeto do Tema n. 336 do STJ. III - No mais, a Corte de origem bem analisou a controvérsia com base nos seguintes fundamentos: ‘Sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial nº 1.157.847/PE, processado sob o rito do art. 543-C do CPC/73, firmou entendimento no sentido de que ‘o pedido de compensação e o recurso interposto contra o seu indeferimento suspendem a exigibilidade do crédito’ tributário, já que a situação enquadra-se na hipótese do art. 151, III, do CTN, nos seguintes termos: [...] Com efeito, depreende-se dos elementos acostados aos autos que os débitos que geraram os procedimentos de cobrança nº 13819.909.870/2009-10 e nº 13819.909.407/2009-78 estavam sendo apurados no âmbito dos processos administrativos nº 13819.908404/2009-17 e nº 13819.908403/2009-72, respectivamente, em análise de manifestações de inconformidade apresentadas pela própria parte autora, de cujas decisões definitivas teve ciência, em 23/11/15 e 22/10/15, encerrando-se a discussão administrativa. Desta feita, forçoso concluir que a exigibilidade dos créditos discutidos permaneceu suspensa na pendência dos correspondentes processos administrativos, na forma do art. 151, III, do CTN, impedindo a autoridade fiscal de promover quaisquer atos visando à sua percepção, motivo por que, diferentemente do quanto alegado pela apelante, não há que se falar em consumação da prescrição. [...]’ IV - Não há, portanto, violação do art. 535 do CPC/1973 (art. 1.022 do CPC/2015) quando o Tribunal a quo se manifesta clara e fundamentadamente acerca dos pontos indispensáveis para o desate da controvérsia, apreciando-a (art. 165 do CPC/73 e do art. 489 do CPC/2015), apontando as razões de seu convencimento, ainda que de forma contrária aos interesses da parte, como verificado na hipótese. V - Quanto à matéria de fundo, verifica-se que a Corte de origem analisou a controvérsia dos autos levando em consideração os fatos e provas relacionados à matéria. Assim, para se chegar à conclusão diversa seria necessário o reexame fático-probatório, o que é vedado pelo enunciado n. 7 da Súmula do STJ, segundo o qual ‘A pretensão de simples reexame de provas não enseja recurso especial’. VI - Ademais, verifica-se que o Tribunal de origem decidiu a matéria em conformidade com a jurisprudência desta Corte, segundo a qual ‘Enquanto há pendência de recurso administrativo, não correm os prazos prescricional e decadencial. Somente a partir da data em que o contribuinte é notificado do resultado do recurso é que tem início a contagem do prazo de prescrição previsto no art. 174 do CTN’. Incide, portanto, o disposto no enunciado n. 83 da Súmula do STJ, segundo o qual: "Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida". Nesse sentido: AgInt no REsp 1.626.695/RS, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 7/3/2017, DJe 13/3/2017. VII - Agravo interno improvido.” (AgInt no AREsp n. 2.097.150/SP, Relator Ministro Francisco Falcão, DJe de 16/2/2023) “PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO Nº 3/STJ. SUPOSTA OFENSA AO ARTIGO 535 DO CPC. INEXISTÊNCIA DE VÍCIO NO ACÓRDÃO RECORRIDO. COMPENSAÇÃO INFORMADA EM DCTF. REJEIÇÃO PELO FISCO. DESNECESSIDADE DE NOVO LANÇAMENTO QUANTO ÀS DCTFs APRESENTADAS APÓS 31.10.2003. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO DO CONTRIBUINTE. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS 282 E 356 DO STF. DECADÊNCIA NÃO CONFIGURADA NA ESPÉCIE. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. Na linha da jurisprudência desta Corte, não há falar em negativa de prestação jurisdicional, nem em vício quando o acórdão impugnado aplica tese jurídica devidamente fundamentada, promovendo a integral solução da controvérsia, ainda que de forma contrária aos interesses da parte. 2. A jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que no sentido de que antes de 31.10.2003 havia a necessidade de lançamento de ofício para se cobrar a diferença dos débitos apurados em DCTF decorrentes de compensação indevida; de 31.10.2003 em diante (eficácia da MP n. 135/2003, convertida na Lei n. 10.833/2003) o lançamento de ofício deixou de ser necessário para a hipótese. No entanto, o encaminhamento de débitos apurados em DCTF decorrentes de compensação indevida para inscrição em dívida ativa passou a ser precedido de notificação ao sujeito passivo para pagar ou apresentar manifestação de inconformidade, recurso este que suspende a exigibilidade do crédito tributário na forma do art. 151, III, do CTN (art. 74, §11, da Lei n. 9.430/96). 3. Na espécie, tratando-se de compensações informadas em DCTFs apresentadas nos anos de 2003 e 2004, apresentadas após 31.10.2003, não havia necessidade de lançamento de ofício. Constata-se a não ocorrência da decadência do crédito tributário. 4. A tese relativa à ausência de prévia notificação do contribuinte para pagar ou apresentar defesa não foi prequestionada na instância de origem, incidindo os óbices das Súmulas 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal neste ponto. 5. Agravo interno não provido.” (AgInt no REsp n. 1.604.375/PB, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, DJe de 26/2/2018) “TRIBUTÁRIO. COMPENSAÇÃO INDEVIDA INFORMADA EM DCTF. NECESSIDADE DE LANÇAMENTO DE OFÍCIO. CDAS. NULIDADE. PRESUNÇÃO DE CERTEZA E LIQUIDEZ AFASTADA. 1. Nos termos da jurisprudência do STJ, nos casos em que o contribuinte declarou os tributos via DCTF e realizou a compensação indevida nesse mesmo documento, é necessário o lançamento de ofício para se cobrar a diferença apurada, caso a DCTF tenha sido apresentada antes de 31.10.2003. A partir 31.10.2003 em diante é desnecessário o lançamento de ofício, todavia os débitos decorrentes da compensação indevida só devem ser encaminhados para inscrição em dívida ativa após notificação ao sujeito passivo para pagar ou apresentar manifestação de inconformidade, cujo recurso suspende a exigibilidade do crédito tributário. 2. Hipóteses em que as DCTFs foram entregues antes de 31.10.2003, logo indispensável o lançamento de ofício. 3. A Certidão de Dívida Ativa possui presunção de certeza e liquidez, mas admite prova em contrário, sendo afastada tal presunção se comprovado que o processo fiscal que lhe deu origem contém algum vício. Na espécie, o vício verificou-se anteriormente à própria inscrição, porquanto não realizado o lançamento. Assim, a sua ausência contaminou, por inteiro, o surgimento do crédito tributário, sendo nulas, portanto, as CDAs em questão. Recurso especial da PRODUQUÍMICA INDÚSTRIA E COMÉCIO LTDA. provido. Recurso especial da FAZENDA NACIONAL improvido.” (REsp nº 1.362.153/PE, Relator Ministro Humberto Martins, DJe de 26/5/2015) Ademais, o art. 74, § 9, da Lei 9.430/96 prescreve que “é facultado ao sujeito passivo, no prazo referido no § 7º, apresentar manifestação de inconformidade contra a ‘não - homologação da compensação”. Dessarte, a “Manifestação de Inconformidade” tem como precedente lógico pedido de compensação juridicamente possível. Ao reverso, ‘declaração de compensação não considerada’ ocorre naquelas hipóteses em que a lei aprioristicamente considera inidôneas determinadas categorias jurídicas (fattispecies) para essa finalidade. Em suma, compensação não homologada é figura jurídica distinta daquela tida por não declarada, notadamente quanto aos efeitos jurídicos. A primeira (compensação não homologada), pressupõe que o crédito é prima facie idôneo à pretensão compensatória. No entanto, eventual indeferimento do pedido ocorre por questão afeta ao próprio mérito da compensação (valor errôneo etc.). Noutro giro, ‘a declaração não considerada’ ocorre quando o contribuinte invoca direito creditório em relação ao qual a lei veda peremptoriamente. Por conta disso, o pedido do contribuinte não é cognoscível (juízo de prelibação), sendo-lhe defeso interpor a ‘manifestação de inconformidade’. Em análise subsuntiva, verifico que a hipótese dos autos, compensação levada a efeito em DCTF é passível de impugnação por meio de manifestação de inconformidade, com suspensão da exigibilidade, por se tratar de crédito compensável, tendo como fundamento a decisão proferida no mandado de segurança nº 2002.61.10.006223-2. É o que se extrai da informação fiscal prolatada no PA nº 10855.000685/2007-71 (id 84709530 - p. 68/72), segundo a qual os débitos de PIS, COFINS, IRPJ e CSLL deveriam ter sido compensados por meio da apresentação da declaração de compensação, em função das alterações procedidas pela Lei nº 10.637, de 30/12/2002, aplicada retroativamente. Ante o exposto, dou provimento à apelação para o fim de conceder a segurança. É como voto.
E M E N T A
TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. COMPENSAÇÃO INFORMADA EM DCTF. MANIFESTAÇÃO DE INCONFORMIDADE. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. POSSIBILIDADE. ARTIGO 74 DA LEI Nº 9.430/96.
Conquanto o artigo 151 do CTN estabeleça que o parcelamento, bem como as reclamações e os recursos suspendam a exigibilidade do crédito tributário, a teor do que dispõe o artigo 74, inciso I, do §12, e inciso III do §3º da Lei nº 9.430/96, observa-se que, por opção legislativa, somente nos casos em que foi apreciado o mérito do recurso administrativo é que a manifestação de inconformidade terá o condão de suspender a exigibilidade do crédito tributário. Assim, casos em que referido recurso foi interposto em face de compensação não homologada ou convalidada, não há falar em exigibilidade do tributo até que o recurso tenha sido definitivamente julgado.
A Manifestação de Inconformidade tem como precedente lógico pedido de compensação juridicamente possível. Ao reverso, “declaração de compensação não declarada” ocorre naquelas hipóteses em que a lei aprioristicamente considera inidôneas determinadas categorias jurídicas para essa finalidade. Em suma, compensação não homologada é figura jurídica distinta daquela tida por não declarada, notadamente quanto aos efeitos jurídicos. A primeira (compensação não homologada), pressupõe que o crédito é prima facie idôneo à pretensão compensatória. No entanto, eventual indeferimento do pedido ocorre por questão afeta ao próprio mérito da compensação (valor errôneo etc.).
Na hipótese dos autos, a compensação levada a efeito em DCTF é passível de impugnação por meio de manifestação de inconformidade, com suspensão da exigibilidade, por se tratar de crédito compensável, tendo como fundamento a decisão proferida no mandado de segurança nº 2002.61.10.006223-2. É o que se extrai, inclusive, da informação fiscal prolatada no PA nº 10855.000685/2007-71 (id 84709530 - p. 68/72), segundo a qual os débitos de PIS, COFINS, IRPJ e CSLL deveriam ter sido compensados por meio da apresentação da declaração de compensação, em função das alterações procedidas pela Lei nº 10.637, de 30/12/2002, aplicada retroativamente.
Apelação provida para conceder a segurança.