Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma

REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 5002531-45.2021.4.03.6134

RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA

PARTE AUTORA: MUNICIPIO DE AMERICANA

Advogado do(a) PARTE AUTORA: PATRICIA CRISTINA PIGATTO - SP158975-A

PARTE RE: FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 5002531-45.2021.4.03.6134

RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA

PARTE AUTORA: MUNICIPIO DE AMERICANA

Advogado do(a) PARTE AUTORA: PATRICIA CRISTINA PIGATTO - SP158975-A

PARTE RE: DIRETOR PRESIDENTE DO FNDE, FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

A Exma. Senhora Desembargadora Federal MARLI FERREIRA (Relatora):

Cuida-se de remessa oficial a que foi submetida sentença que concedeu a segurança requerida pelo Município de Americana para determinar à autoridade coatora que se abstenha de promover qualquer ato sancionador ou que impeça repasses dos recursos do FUNDEB ao ente municipal impetrante, independentemente da instituição financeira contratada pelo ente municipal para fins de pagamento de seus servidores da educação.

Parecer ministerial opinando pelo conhecimento e desprovimento da remessa necessária.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 5002531-45.2021.4.03.6134

RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA

PARTE AUTORA: MUNICIPIO DE AMERICANA

Advogado do(a) PARTE AUTORA: PATRICIA CRISTINA PIGATTO - SP158975-A

PARTE RE: DIRETOR PRESIDENTE DO FNDE, FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

A Exma. Senhora Desembargadora Federal MARLI FERREIRA (Relatora):

O presente mandamus foi impetrado com o objetivo de compelir a autoridade impetrada se abstenha de promover qualquer ato sancionador ou que impeça repasses dos recursos do FUNDEB ao ente municipal Impetrante, independentemente da instituição financeira contratada pelo ente municipal para fins de pagamento de seus servidores, vinculados à Secretaria da Educação.

Aquilatando a matéria, o Juízo a quo houve por bem conceder a segurança pleiteada.

O provimento vergastado decidiu a questão vertida nestes autos nos seguintes termos:

"(...)

Nos termos da Lei federal n.º 12.016, de 2009, “[c]onceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça”.

A Lei federal nº 14.113, de 25 de dezembro de 2020, que “[r]egulamenta o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), de que trata o art. 212-A da Constituição Federal”, assim dispõe acerca dos recursos destinados aos Fundos instituídos nos âmbitos dos Estados e do Distrito Federal:

“Art. 20. Os recursos dos Fundos serão disponibilizados pelas unidades transferidoras à Caixa Econômica Federal ou ao Banco do Brasil S.A., que realizará a distribuição dos valores devidos aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios.

Art. 21. Os recursos dos Fundos, provenientes da União, dos Estados e do Distrito Federal, serão repassados automaticamente para contas únicas e específicas dos governos estaduais, do Distrito Federal e municipais, vinculadas ao respectivo Fundo, instituídas para esse fim, e serão nelas executados, vedada a transferência para outras contas, sendo mantidas na instituição financeira de que trata o art. 20 desta Lei.

§ 1º Os repasses aos Fundos provenientes das participações a que se refere o inciso II do caput do art. 158 e as alíneas a e b do inciso I e o inciso II do caput do art. 159 da Constituição Federal constarão dos orçamentos da União, dos Estados e do Distrito Federal e serão creditados pela União em favor dos governos estaduais, do Distrito Federal e municipais nas contas específicas a que se refere este artigo, respeitados os critérios e as finalidades estabelecidos nesta Lei, observados os mesmos prazos, procedimentos e forma de divulgação adotados para o repasse do restante dessas transferências constitucionais em favor desses governos.

§ 2º Os repasses aos Fundos provenientes dos impostos previstos nos incisos I, II e III do caput do art. 155 combinados com os incisos III e IV do caput do art. 158 da Constituição Federal constarão dos orçamentos dos governos estaduais e do Distrito Federal e serão depositados pelo estabelecimento oficial de crédito previsto no art. 4º da Lei Complementar nº 63, de 11 de janeiro de 1990, no momento em que a arrecadação estiver sendo realizada nas contas do Fundo abertas na instituição financeira de que trata o caput deste artigo.

§ 3º A instituição financeira de que trata o caput deste artigo, no que se refere aos recursos dos impostos e participações mencionados no § 2º deste artigo, creditará imediatamente as parcelas devidas aos governos estaduais, do Distrito Federal e municipais nas contas específicas referidas neste artigo, observados os critérios e as finalidades estabelecidos nesta Lei, e procederá à divulgação dos valores creditados de forma similar e com a mesma periodicidade utilizada pelos Estados em relação ao restante da transferência do referido imposto.

§ 4º Os recursos dos Fundos provenientes da parcela do IPI, de que trata o inciso II do caput do art. 159 da Constituição Federal, serão creditados pela União em favor dos governos estaduais e do Distrito Federal nas contas específicas, segundo os critérios e as finalidades estabelecidos nesta Lei, observados os mesmos prazos, procedimentos e forma de divulgação previstos na Lei Complementar nº 61, de 26 de dezembro de 1989.

§ 5º Do montante dos recursos do IPI de que trata o inciso II do caput do art. 159 da Constituição Federal, a parcela devida aos Municípios, na forma do disposto no art. 5º da Lei Complementar nº 61, de 26 de dezembro de 1989, será repassada pelo governo estadual ao respectivo Fundo e os recursos serão creditados na conta específica a que se refere este artigo, observados os mesmos prazos, procedimentos e forma de divulgação do restante dessa transferência aos Municípios.

§ 6º A instituição financeira disponibilizará, permanentemente, em sítio na internet disponível ao público e em formato aberto e legível por máquina, os extratos bancários referentes à conta do Fundo  incluídas informações atualizadas sobre:

I - movimentação;

II - responsável legal;

III - data de abertura;

IV - agência e número da conta bancária.

§ 7º Os recursos depositados na conta específica a que se refere o caput deste artigo serão depositados pela União, pelo Distrito Federal, pelos Estados e pelos Municípios na forma prevista no § 5º do art. 69 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996.

§ 8º Sem prejuízo do disposto na Lei nº 9.452, de 20 de março de 1997, serão disponibilizados pelos Poderes Executivos de todas as esferas federativas, nos sítios na internet, dados acerca do recebimento e das aplicações dos recursos do Fundeb.

(...)

Art. 47. Os repasses e a movimentação dos recursos dos Fundos de que trata esta Lei deverão ocorrer por meio das contas únicas e específicas mantidas em uma das instituições financeiras de que trata o art. 20 desta Lei.

§ 1º Os saldos dos recursos dos Fundos instituídos pela Lei nº 11.494, de 20 de junho de 2007, existentes em contas-correntes mantidas em instituição financeira diversa daquelas de que trata o art. 20 desta Lei, deverão ser integralmente transferidos, até 31 de janeiro de 2021, para as contas de que trata o caput deste artigo.” 

A referida lei foi regulamentada pelo Decreto federal nº 10.656, de 22 de março de 2021. No que interessa, o Decreto assim dispõe:

“Art. 16. A disponibilização de recursos ao Fundeb será realizada pelas unidades transferidoras a que se refere o art. 20 da Lei nº 14.113, de 2020, ao Banco do Brasil S.A. ou à Caixa Econômica Federal, que realizará a distribuição dos valores devidos aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios.

§ 1º A instituição financeira responsável pela distribuição dos recursos, na forma prevista no caput, deverá manter sistema operacional destinado a processar e distribuir os valores devidos a cada ente federativo beneficiário, em conta bancária única e específica, instituída para essa finalidade.

§ 2º As atribuições previstas no caput serão regulamentadas em ato conjunto do Presidente do FNDE e do Secretário do Tesouro Nacional da Secretaria Especial de Fazenda do Ministério da Economia.

Art. 17. As contas únicas e específicas dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, destinadas à movimentação dos recursos do Fundeb, serão abertas e mantidas no Banco do Brasil S.A. ou na Caixa Econômica Federal, nos termos do disposto no art. 21 da Lei nº 14.113, de 2020, a critério do Chefe do Poder Executivo ou deste em conjunto com o Secretário de Educação ou do dirigente máximo do órgão equivalente, gestor dos recursos da educação no ente federativo.

§ 1º Os recursos do Fundeb serão automaticamente repassados para as contas únicas e específicas de cada ente federativo beneficiário, e movimentados exclusivamente em uma das instituições financeiras referidas no caput, em conformidade com o disposto no art. 21 da Lei nº 14.113 de 2020.

§ 2º O repasse dos recursos deverá ser realizado de maneira automática e periódica, na mesma data em que ocorrer a disponibilização dos valores pelas unidades transferidoras, em conformidade com o disposto nos art. 20 e art. 21 da Lei nº 14.113, de 2020.

§ 3º Os recursos disponibilizados ao Fundeb pela União, pelos Estados e pelo Distrito Federal deverão ser registrados de forma detalhada no Siope, com a finalidade de evidenciar as respectivas transferências, conforme o disposto nos art. 20 e art. 23 da Lei nº 14.113, de 2020.

§ 4º Fica vedada a transferência de recursos do Fundeb provenientes da União, dos Estados e do Distrito Federal para contas-correntes diversas das contas únicas e específicas do Fundeb, abertas na forma prevista no caput.

§ 5º Excepcionalmente, será permitida a transferência de valores entre as contas únicas e específicas do Fundeb, quando realizadas pelas instituições financeiras de que trata o caput e destinadas exclusivamente a acertos de depósitos indevidos realizados nas referidas contas.

§ 6º As disposições de que tratam os § 1º, § 5º e § 8º deste artigo e o § 2º do art. 18 serão regulamentadas em ato conjunto do Presidente do FNDE e do Secretário do Tesouro Nacional da Secretaria Especial de Fazenda do Ministério da Economia.

§ 7º Os saldos existentes em 31 de dezembro de 2020 nas contas únicas e específicas dos fundos de que trata a Lei nº 11.494, de 20 de junho de 2007, e aqueles transferidos na forma estabelecida no § 1º art. 47 da Lei nº 14.113, de 2020, deverão ser aplicados em ações consideradas de manutenção e de desenvolvimento do ensino para a educação básica pública, conforme o disposto no art. 70 da Lei nº 9.394, de 1996.

§ 8º A movimentação dos recursos de que trata este artigo será realizada exclusivamente por meio eletrônico, mediante a realização de pagamentos identificados diretamente nas contas-correntes de titularidade dos respectivos fornecedores e prestadores de serviços do Fundeb.

§ 9º O Banco do Brasil S.A. e a Caixa Econômica Federal disponibilizarão no Siope os extratos das contas únicas e específicas dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, destinadas à movimentação dos recursos do Fundeb, por meio de arquivo em leiaute específico, para garantir a transparência, a integração de dados declarados e possibilitar a fiscalização e o controle social da utilização dos recursos.”

Em paralelo, o art. 26 da Lei federal nº 14.113/2020 permite a utilização de recursos do Fundeb para pagamento da remuneração dos profissionais da educação básica em efetivo exercício: “Excluídos os recursos de que trata o inciso III do caput do art. 5º desta Lei, proporção não inferior a 70% (setenta por cento) dos recursos anuais totais dos Fundos referidos no art. 1º desta Lei será destinada ao pagamento, em cada rede de ensino, da remuneração dos profissionais da educação básica em efetivo exercício”.

Essas previsões legais e regulamentares não impedem, sob certas condições, que valores da conta única e específica vinculada ao Fundeb sejam repassados para conta bancária do ente político unicamente para operacionalização de pagamento aos servidores no caso de gestão terceirizada da folha.

Para essa compreensão, é preciso recapitular que a Lei federal nº 11.494, de 20 de junho de 2007, antiga Lei do Fundeb, revogada pela Lei federal nº 14.113/2020, assim dispunha:

“Art. 16. Os recursos dos Fundos serão disponibilizados pelas unidades transferidoras ao Banco do Brasil S.A. ou Caixa Econômica Federal, que realizará a distribuição dos valores devidos aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios.

Art. 17. Os recursos dos Fundos, provenientes da União, dos Estados e do Distrito Federal, serão repassados automaticamente para contas únicas e específicas dos Governos Estaduais, do Distrito Federal e dos Municípios, vinculadas ao respectivo Fundo, instituídas para esse fim e mantidas na instituição financeira de que trata o art. 16 desta Lei.”

O Decreto federal nº 6.253, de 13 de novembro de 2007, revogado pelo Decreto federal nº 10.656/2021, regulamentava a Lei nº 11.494/2007 nos seguintes termos:

“Art. 8º Os recursos do FUNDEB serão automaticamente repassados para as contas únicas referidas no art. 17 da Lei no 11.494, de 2007, e movimentadas exclusivamente nas instituições referidas no art. 16 dessa Lei, conforme ato da Secretaria do Tesouro Nacional.

Parágrafo único. Os recursos dos Fundos, creditados nas contas específicas a que se refere o caput, serão disponibilizados pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios aos respectivos órgãos responsáveis pela educação e pela gestão dos recursos, na forma prevista no § 5o do art. 69 da Lei no 9.394, de 1996.”

Verifica-se da regulamentação antiga do Fundeb dispositivo semelhante ao atual (art. 21, Lei nº 14.113/2020), sendo que, naquela oportunidade, não havia óbice para que para os entes que mantivessem folha de pagamento em outras instituições financeiras transferissem o valor para outro banco para fins de pagamento dos profissionais da educação.

Com efeito, em 06 de dezembro de 2016, foi firmado Termo de Ajustamento de Conduta, entre o Ministério Público Federal e o Banco do Brasil S.A (publicado no Diário Oficial da União, em 15 de dezembro de 2016, Seção 3, página 80), com posteriores aditamentos, que contém a seguinte obrigação assumida pelo banco compromissário:

“CLÁUSULA SEGUNDA - Das obrigações assumidas pelo COMPROMISSÁRIO

Pelo presente termo, o COMPROMISSÁRIO se compromete a: (...)

b) impedir qualquer transferência de recursos repassados pela União às contas específicas de que tratam os Decretos n. 6.170/2007 e 7.507/2011 para outras contas do próprio ou de outros Entes Federados, por seus órgãos e entidades da Administração Direta e Indireta, cujos titulares possuam, na base de dados do CNPJ, uma das três naturezas jurídicas a seguir: Órgão Público do Poder Executivo Estadual ou do Distrito Federal (102-3), Órgão Público do Poder Executivo Municipal (103-1) ou Fundo Público (120-1) - o objetivo é impedir tanto a transferência da conta específica de um fundo ou Ente público municipal ou estadual para outra conta do fundo ou do próprio Ente, quanto a transferência de um Ente Federado para outro; (...)

b.2) nos casos de contas específicas do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação - FUNDEB (art. 1º, inciso IV, do Decreto n. 7.507/2011), considerando o disposto no art. 22 da Lei n. 11.494/2007, que trata do uso dos recursos do Fundo para o pagamento da remuneração dos profissionais do magistério da educação básica, o COMPROMISSÁRIO condicionará a liberação das transferências para outras contas do próprio ente público à indicação da finalidade "folha de pagamento", em seus sistemas.”

Ulteriormente, em 12 de janeiro de 2017, foi firmado Termo de Ajustamento de Conduta similar com a Caixa Econômica Federal, com subsequentes aditamentos.

Um dos objetivos expressamente buscados na formalização dos TAC’s foi garantir que os recursos do Fundeb, oriundos de repasses da União, não fossem retirados das contas específicas por meio de saques realizados na “boca do caixa” ou de transferências para contas intermediárias (vide cláusula primeira).

Nesse contexto, seria permitida a transferência dos recursos fundiários para conta, mantida em outras instituições financeiras pelo ente federativo, gestora de sua folha de pagamentos, devendo constar a indicação, no sistema, da finalidade "folha de pagamento", para fins de demonstrar que os recursos teriam como destinação final o pagamento da remuneração dos profissionais da educação.

O propósito da reforma legislativa de 2020 é reforçar a fiscalização e a transparência com os recursos destinados à educação básica, seguindo o espírito perseguido pela EC 108/2020. Nessa linha, em princípio, a sistemática preconizada nos TAC’s não impede a prática de governança contida no art. 21, §6º, da Lei nº 14.113/2020, porquanto a movimentação financeira seria registrada e sindicada sob a rubrica folha de pagamento, sendo possível a rastreabilidade a partir dos pagamentos efetivamente realizados no momento seguinte pela instituição financeira responsável pela gestão de folha.

Outrossim, quando da edição da Lei nº 14.113/2020, o impetrante já havia assinado contrato com o Banco Santander Brasil para explorar, com exclusividade, a gestão da folha de pagamento dos servidores da administração direta e indireta municipal (id. 150127787). Decorrente do Pregão Presencial nº 026/2020, o contrato foi assinado em 06 de outubro de 2020, com vigência de sessenta meses.

A interpretação da matéria, conferida pelo Ofício-Circular nº  135/2021/Diapo/ChefiaGabin/Gabin-FNDE, contudo, ignorou a maior autonomia, até então existente, dos entes federados sobre a operacionalização do pagamento da folha, desprezando os compromissos até então assumidos por Estados e Municípios com outras instituições financeiras, sem estabelecer qualquer regime de transição.

Assim procedendo, prima facie, o impetrado violou os direitos adquiridos pela instituição financeira (que, no caso, desembolsou R$ 11.000.000,00 – onze milhões de reais - para realizar a contratação) e os atos jurídicos já praticados pelo ente municipal, em ofensa ao art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal.

Além dos argumentos acima expostos, que também fundamentaram a concessão da medida liminar, cabe acrescentar que a Lei nº 14.276/21 incluiu o § 9º ao artigo 21 da Lei nº 14.113/2020, para permitir a contratação com outras instituições financeiras, a saber (parte promulgada em 24/03/2022):

“§ 9º A vedação à transferência de recursos para outras contas, prevista no caput deste artigo, não se aplica aos casos em que os governos estaduais, distrital ou municipais, para viabilizar o pagamento de salários, de vencimentos e de benefícios de qualquer natureza aos profissionais da educação em efetivo exercício, tenham contratado ou venham a contratar instituição financeira, que deverá receber os recursos em conta específica e observar o disposto no § 6º deste artigo.”

Em sendo assim, também em decorrência da alteração da lei, observados os requisitos estabelecidos no referido § 6º, do artigo 21, há possibilidade de contratação com outras instituições financeiras.

Dispositivo:

Ante o exposto, ratifico a decisão liminar e, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil e CONCEDO A SEGURANÇA para o fim de determinar à autoridade coatora que se abstenha de promover qualquer ato sancionador ou que impeça repasses dos recursos do FUNDEB ao ente municipal impetrante, independentemente da instituição financeira contratada pelo ente municipal para fins de pagamento de seus servidores da educação (adotando-se as cautelas na identificação dos repasses, conforme fundamentação).

(...)”

Conforme se extrai da transcrição supra, o provimento recorrido encontra-se devidamente fundamentado, tendo dado à lide a solução mais consentânea possível, à vista dos elementos contidos nos autos.

Registre-se, por oportuno, que a adoção, pelo presente julgado, dos fundamentos externados na sentença recorrida - técnica de julgamento "per relationem" -, encontra amparo em remansosa jurisprudência das Cortes Superiores, mesmo porque não configura ofensa ao artigo 93, IX, da CF/88, segundo o qual "todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade (...)". Confiram-se, nesse sentido, os seguintes julgados:

"EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - INOCORRÊNCIA DE CONTRADIÇÃO, OBSCURIDADE OU OMISSÃO - PRETENDIDO REEXAME DA CAUSA - CARÁTER INFRINGENTE - INADMISSIBILIDADE - INOCORRÊNCIA DE CONSUMAÇÃO, NA ESPÉCIE, DA PRESCRIÇÃO PENAL - INCORPORAÇÃO, AO ACÓRDÃO, DAS RAZÕES EXPOSTAS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MOTIVAÇÃO "PER RELATIONEM" - LEGITIMIDADE JURÍDICO-CONSTITUCIONAL DESSA TÉCNICA DE FUNDAMENTAÇÃO - DEVOLUÇÃO IMEDIATA DOS AUTOS, INDEPENDENTEMENTE DA PUBLICAÇÃO DO ACÓRDÃO, PARA EFEITO DE PRONTA EXECUÇÃO DA DECISÃO EMANADA DA JUSTIÇA LOCAL - POSSIBILIDADE - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS.

 (...)

 - Reveste-se de plena legitimidade jurídico-constitucional a utilização, pelo Poder Judiciário, da técnica da motivação "per relationem", que se mostra compatível com o que dispõe o art. 93, IX, da Constituição da República. A remissão feita pelo magistrado - referindo-se, expressamente, aos fundamentos (de fato e/ou de direito) que deram suporte a anterior decisão (ou, então, a pareceres do Ministério Público ou, ainda, a informações prestadas por órgão apontado como coator) - constitui meio apto a promover a formal incorporação, ao ato decisório, da motivação a que o juiz se reportou como razão de decidir. Precedentes." (destaquei)  (STF, AI 825520 AgR-ED, Relator Ministro CELSO DE MELLO, Segunda Turma, j. 31/05/2011, DJe 09/09/2011)

"AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. FUNDAMENTAÇÃO PER RELATIONEM. POSSIBILIDADE.

1. Consoante o entendimento pacificado do Superior Tribunal de Justiça, não há que se falar em nulidade por ausência de fundamentação ou por negativa de prestação jurisdicional a decisão que se utiliza da fundamentação per relationem. Precedentes. Incidência da Súmula n° 83/STJ.

2. Não se admite o recurso especial quando a questão federal nele suscitada não foi enfrentada no acórdão recorrido. Incidem as Súmulas 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal (STF).

3. Agravo interno a que se nega provimento." (destaquei) (STJ, AgInt no AREsp 1322638/DF, Relatora Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, j. 11/12/2018, DJe 18/12/2018)

"AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DENUNCIAÇÃO CALUNIOSA. TEMPESTIVIDADE DO RECURSO ESPECIAL COMPROVADA NO AGRAVO. POSSIBILIDADE. ACÓRDÃO COM FUNDAMENTAÇÃO PER RELATIONEM. AUSÊNCIA DE NULIDADE. PROCESSO ADMINISTRATIVO INSTAURADO. TIPICIDADE. DOLO. NECESSIDADE DE INCURSÃO VERTICAL NA ANÁLISE DAS PROVAS. SÚMULA 7. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.

1. Não há cogitar nulidade do acórdão por ausência de fundamentação ou ofensa ao artigo 93, IX, da Constituição Federal 1988, se o órgão julgador na origem, ao apreciar a apelação, se utiliza de trechos de decisão anterior ou de parecer ministerial como razão de decidir, não configura ofensa ao princípio constitucional da motivação das decisões judiciais (APn n. 536/BA, Corte Especial, Dje 4/4/2013).

(...)

5. Agravo regimento não provido." (destaquei) (STJ, AgRg no REsp 1482998/MT, Relator Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, j. 13/11/2018, DJe 03/12/2018)

"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. INOCORRÊNCIA. OMISSÃO E CONTRADIÇÃO. NÃO CARACTERIZAÇÃO. MOTIVAÇÃO PER RELATIONEM. LEGITIMIDADE JURÍDICO-CONSTITUCIONAL DESSA TÉCNICA DE FUNDAMENTAÇÃO. VALIDADE. DIREITO AMBIENTAL. ART. 10 DA LEI N. 6.938/81. COMPETÊNCIA PARA LICENCIAMENTO. PODER FISCALIZATÓRIO. IBAMA. POSSIBILIDADE. ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. DIREITO ADQUIRIDO. FATO CONSUMADO EM MATÉRIA AMBIENTAL. AUSÊNCIA. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7/STJ. INCIDÊNCIA. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. AUSÊNCIA DE PROVAS. INCOMUNICABILIDADE DAS ESFERAS ADMINISTRATIVA E PENAL. ARGUMENTOS INSUFICIENTES PARA DESCONSTITUIR A DECISÃO ATACADA. HONORÁRIOS RECURSAIS. NÃO CABIMENTO. APLICAÇÃO DE MULTA. ART. 1.021, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. DESCABIMENTO.

 (...)

 IV - O Supremo Tribunal Federal chancelou a técnica da motivação per relationem, por entender que se reveste de plena legitimidade jurídico-constitucional e se mostra compatível com o que dispõe o artigo 93, IX, da Constituição Federal. A remissão feita pelo magistrado - referindo-se, expressamente, aos fundamentos (de fato e/ou de direito) que deram suporte à anterior decisão (ou, então, a pareceres do Ministério Público ou, ainda, a informações prestadas por órgão apontado como coator) - constitui meio apto a promover a formal incorporação, ao ato decisório, da motivação a que o juiz se reportou como razão de decidir. Precedentes.

 (...)

 XII - Agravo Interno improvido." (destaquei) (AgInt no REsp 1283547/SC, Relatora Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, j. 23/10/2018, DJe 31/10/2018)

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à remessa oficial.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

ADMINISTRATIVO.  REPASSE DE RECURSOS DO FUNDEB. ABSTENÇÃO DE ATO SANCIONADOR. JULGAMENTO PER RELATIONEM. POSSIBILIDADE. SENTENÇA MANTIDA.

1. O provimento recorrido encontra-se devidamente fundamentado, tendo dado à lide a solução mais consentânea possível, à vista dos elementos contidos nos autos, sendo certo, ainda, que o recurso apresentado pela apelante não trouxe nada de novo que pudesse infirmar o quanto decidido, motivo pelo qual a sentença recorrida deve ser mantida por seus próprios fundamentos.

2. Registre-se, por oportuno, que a adoção, pelo presente julgado, dos fundamentos externados na sentença recorrida - técnica de julgamento "per relationem" -, encontra amparo em remansosa jurisprudência das Cortes Superiores, mesmo porque não configura ofensa ao artigo 93, IX, da CF/88, que preceitua que "todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade (...)". Precedentes do E. STF e do C. STJ.

3. Nos termos da sentença recorrida, deve a autoridade impetrada se abster de promover qualquer ato sancionador ou que impeça repasses dos recursos do FUNDEB ao MUNICÍPIO DE AMERICANA, independentemente da instituição financeira contratada pelo ente municipal para fins de pagamento de seus servidores da educação.

4.  Remessa oficial desprovida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, à unanimidade, decidiu negar provimento à remessa oficial, nos termos do voto da Des. Fed. MARLI FERREIRA (Relatora), com quem votaram a Des. Fed. MÔNICA NOBRE e o Des. Fed. MARCELO SARAIVA. Ausente, justificadamente em razão de férias, o Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE (substituído pelo Juiz Fed. Convocado SIDMAR MARTINS), nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.