Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002736-11.2019.4.03.6113

RELATOR: Gab. 47 - DES. FED. WILSON ZAUHY

APELANTE: CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SAO PAULO

Advogados do(a) APELANTE: ADRIANA TEIXEIRA DA TRINDADE FERREIRA - SP152714-A, OLGA CODORNIZ CAMPELLO CARNEIRO - SP86795-A, TOMAS TENSHIN SATAKA BUGARIN - SP332339-A

APELADO: SUZANA PENHA DE SOUZA, DONIZETI LOURIVAL CRUZ, ROBERTA TALIA DE SOUZA

Advogado do(a) APELADO: ELIZABETH CRISTINA ROCHA - SP393643-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002736-11.2019.4.03.6113

RELATOR: Gab. 47 - DES. FED. WILSON ZAUHY

APELANTE: CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SAO PAULO

Advogados do(a) APELANTE: ADRIANA TEIXEIRA DA TRINDADE FERREIRA - SP152714-A, OLGA CODORNIZ CAMPELLO CARNEIRO - SP86795-A, TOMAS TENSHIN SATAKA BUGARIN - SP332339-A

APELADO: SUZANA PENHA DE SOUZA, DONIZETI LOURIVAL CRUZ, ROBERTA TALIA DE SOUZA

Advogado do(a) APELADO: ELIZABETH CRISTINA ROCHA - SP393643-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo – CREMSP, em face da sentença proferida nos autos da presente ação ordinária, ajuizada por SUZANA PENHA DE SOUZA, DONIZETE LOURIVAL CRUZ e ROBERTA TALIA DE SOUZA, que julgou procedentes os pedidos formulados pela parte autora para autorizar a realização dos procedimentos médico-hospitalares necessários de reprodução assistida e fertilização in vitro para que se efetive a doação de óvulos entre as irmãs autoras; e determinar ao Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo – CRM-SP que se abstenha de adotar eventuais medidas ético-disciplinares ou aplicar infração disciplinar aos profissionais médicos e de saúde envolvidos no tratamento de reprodução assistida e fertilização in vitro entre as irmãs autoras.

O M.M Juiz a quo entendeu ainda, pelo deferimento da tutela de urgência, nos seguintes termos,

 “Diante da instrução probatória realizada nos autos, entendo que restou demonstrado a relevância dos fundamentos apresentados pela parte autora, bem como o evidente perigo de dano em caso de demora na realização dos procedimentos. Destarte, verifico estarem presentes os requisitos necessários para concessão da tutela de urgência requerida, mormente considerando que a demora no cumprimento do provimento jurisdicional pode tornar inócua a medida, ou, ainda, prejudicar o êxito na realização do procedimento de reprodução assistida buscado pelos requerentes.

Desse modo, DEFIRO A TUTELA DE URGÊNCIA requerida para se conceder AUTORIZAÇÃO JUDICIAL para realização dos procedimentos médico-hospitalares necessários de reprodução assistida e fertilização in vitro para que se efetive a doação de óvulos entre as irmãs autoras, observados os termos desta sentença. Comunique-se com urgência.

As partes deverão informar ao Juízo o efetivo cumprimento da tutela de urgência, comprovando-se documentalmente nos autos”.

Condenação do Conselho Réu ao pagamento de honorários sucumbenciais no valor de R$ 600,00 (seiscentos reais), o que faço com fundamento no art. 85, § 8, do CPC.

O Conselho alega em suas razões de Apelação, em síntese, (i)  que não se pode confundir planejamento familiar com gestação a qualquer custo, não se admitindo a adoção de qualquer medida que lhes garantam o direito à concepção, transpondo os princípios da ética e da moralidade; (ii) que a proteção do anonimato (CFM nº 2.121/15) se dá para evitar discussão sobre a paternidade, bem como para possibilitar a inserção da criança de maneira plena em sua família, sem qualquer forma de perturbação de ordem psicológica, inexistindo qualquer ligação de ordem afetiva com o doador de gameta; (iii) à vista da ausência de lei em sentido estrito a regulamentar as questões relacionadas à reprodução humana assistida, é plenamente aplicável o disposto na Resolução CFM nº 2.168/2017, inclusive quanto ao anonimato dos doadores de gametas; (iv) violar o anonimato do doador corresponderia à violação do próprio conceito de planejamento familiar. (Id. Num. 156864640)

Com contrarrazões dos autores (Id. Num. 156861646), os autos vieram conclusos.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 


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4ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002736-11.2019.4.03.6113

RELATOR: Gab. 47 - DES. FED. WILSON ZAUHY

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Advogados do(a) APELANTE: ADRIANA TEIXEIRA DA TRINDADE FERREIRA - SP152714-A, OLGA CODORNIZ CAMPELLO CARNEIRO - SP86795-A, TOMAS TENSHIN SATAKA BUGARIN - SP332339-A

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OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

A controvérsia fática e jurídica trazida a esta Eg. Corte diz com pretensão dos autores quanto à obtenção de autorização para realização de procedimento de fertilização in vitro mediante utilização de óvulos de doadora conhecida que, na hipótese, corresponde a irmã da receptora, Autora principal dessa ação, inclusive pata que o CREMESP que se abstenha de adotar quaisquer medidas ético-disciplinares contra os profissionais da saúde envolvidos na técnica médica de reprodução assistida.

Em síntese, a demanda gira em torno das exigências impostas pelo CREMESP, haja vista a ausência de legislação específica que regule a reprodução assistida heteróloga.

Acerca da reprodução heteróloga, os civilistas Carlos Alberto Dabus Maluf e Adriana Maluf,  a definem como

“[..] aquela realizada com material genético de doador, podendo ser de apenas um deles – o homem ou a mulher – ou de ambos, havendo, assim, a transferência de embrião doado. [...] Quanto às técnicas utilizadas, podem ser realizadas basicamente de quatro formas: com material genético de um doador; sob a forma de cessão temporária de útero; acessível à mulher sozinha; acessível nos estados intersexuais. O conflito é emergente, pois pode acarretar a interferência de um estranho na vida do casal; o desconhecimento da origem genética, uma segregação social, a coisificação do homem, a contratualização da família, ferindo o ser humano em sua dignidade”.

(Maluf, Carlos Alberto, D. e Adriana Caldas do Rego Freitas Dabus Maluf. Curso de Direito da Família. Disponível em: Minha Biblioteca, (4th edição). Editora Saraiva, 2021.p. 541)

Sobre o tema, a Resolução CFM nº 2.168/2017, revogadora da de nº 2.121/2015, apresentava as normas de conduta basilares que devem ser adotadas no momento em que se opta pela reprodução humana assistida, regulando até mesmo o número de embriões a serem transferidos nos ciclos mensais – para mulheres até 35 anos são transferidos dois embriões, para mulheres de 35 a 40 anos, três embriões e para mulheres de 40 anos ou mais, quatro embriões, tendo em vista a fertilidade da mulher.

Tais determinações visavam, segundo se depreende das alegações do Apelante, a preservação da privacidade e da integridade física e psicológica do doador e dos filhos, bem como evitar a criação de vínculo com os doadores e eventual disputa judicial pela guarda e direitos do menor.

No entanto, a edição da Resolução CFM n.º 2.320/2022, apresentou significativas alterações e atualizações,  em   defesa   do  aperfeiçoamento  das  práticas  e  da  observância  aos  princípios éticos e bioéticos que ajudam a trazer maior  segurança  e  eficácia  a  tratamentos  e  procedimentos  médicos, tornando - se o dispositivo deontológico a ser  seguido  pelos  médicos  brasileiros  e  revogando  a Resolução CFM nº 2.294, publicada no Diário Oficial  da União de 15 de junho de 2021, Seção I, p. 60.

A propósito, eis o teor da nova Resolução:

IV – DOAÇÃO DE GAMETAS OU EMBRIÕES

1. A doação não pode ter caráter lucrativo ou comercial.

2. Os  doadores  não  devem  conhecer  a  identidade  dos  receptores  e  vice - versa,  exceto  na  doação  de  gametas  ou  embriões  para  parentesco  de  até  4º  (quarto)  grau,  de  um  dos  receptores  (primeiro  grau:  pais  e  filhos;  segundo  grau:  avós  e  irmãos;  terceiro  grau:  tios  e  sobrinhos; quarto grau: primos), desde que não incorra em consanguinidade.

2.1. Deve constar em prontuário o relatório médico atestando a adequação da saúde física e  mental de todos os envolvidos.

2.2. A doadora de óvulos ou embriões não pode ser a cedente temporária do útero;

[...]

4. Deve ser mantido, obrigatoriamente, sigilo sobre a identidade dos doadores de gametas e embriões, bem como dos receptores, com a ressalva do item 2 do Capítulo IV. Em situações  especiais,  informações  sobre  o s  doadores,  por  motivação  médica,  podem  ser  fornecidas  exclusivamente aos médicos, resguardando a identidade civil do(a) doador(a).

Sob novo prisma, e levando em consideração o número o número significativo de decisões judiciais a favor da doação de gametas  entre  irmãs,  o CREMESP  mantém  a  determinação  de  anonimato  entre  doador  e receptor, exceto em doação de gametas ou embriões para parentesco de até quarto grau de um dos parceiros, desde que não incorra em consanguinidade.

Com efeito, esse já vinha sendo o entendimento firmado por esta Eg. Corte, com respaldo em dois binômios. O primeiro diz com o direito fundamental ao planejamento familiar, previsto no art. 226, §7º, da Constituição Federal e art. 1.565, §2º, do Código Civil, que reconhece a autonomia dos indivíduos em relação às suas escolhas reprodutivas, como corolário da própria dignidade da pessoa humana.

E em segundo plano, no no princípio da intervenção mínima do Poder Público nas famílias, consoante dispõe o art. 1513 do Código Civil, segundo o qual, o Estado somente intervirá para proteger os indivíduos, especialmente os vulneráveis.

Entende-se, desta forma, que eventual intervenção do Estado somente se justificaria para a promoção de direitos (modelo de apoio e assistência, e não de interferência).

Nesse sentido, observa-se a jurisprudência desta E. Corte:

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO - DOAÇÃO DE ÓVULOS ENTRE IRMÃS - RESOLUÇÃO/CFM Nº 2.121/2.015 - REGRA DO ANONIMATO - INAPLICABILIDADE.

1.  A garantia de sigilo, prevista na Resolução 2.121/2.015, do Conselho Federal de Medicina, objetiva proteger o doador e evitar-lhe futuras consequências pessoais, familiares ou jurídicas.

2. Não há vedação legal ao levantamento da regra do anonimato na doação de óvulos e, no presente feito, ambas as autoras, na qualidade de doadora e receptora, concordam com o afastamento de tal proteção.

3. Deve prevalecer, portanto, a solução que melhor dê cumprimento ao princípio da liberdade de planejamento familiar (artigo 226 da Constituição Federal). Precedentes deste Egrégio Tribunal.

4. É de rigor a manutenção da r. sentença que deferiu a fertilização e afastou a aplicação de punição aos médicos envolvidos no procedimento.

5. Apelações desprovidas.

(TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000378-07.2018.4.03.6114, Rel. Juiz Federal Convocado LEILA PAIVA MORRISON, julgado em 21/02/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 02/03/2020)    

 

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. FERTILIZAÇÃO IN VITRO. REPRODUÇÃO ASSISTIDA. DOAÇÃO DE ÓVULOS ENTRE IRMÃS. RESOLUÇÃO/CFM Nº 2.121/2.015. REGRA DO ANONIMATO. INAPLICABILIDADE. SENTENÇA MANTIDA.

1. A garantia de sigilo, prevista na Resolução 2.121/2.015, do Conselho Federal de Medicina, objetiva proteger o doador e evitar-lhe futuras consequências pessoais, familiares ou jurídicas.

2. Não há vedação legal ao levantamento da regra do anonimato na doação de óvulos e, no presente feito, ambas as autoras, na qualidade de doadora e receptora, concordam com o afastamento de tal proteção.

3. Deve prevalecer, portanto, a solução que melhor dê cumprimento ao princípio da liberdade de planejamento familiar (artigo 226 da Constituição Federal). Precedentes deste Egrégio Tribunal.

4. É de rigor a manutenção da r. sentença que deferiu a fertilização e afastou a aplicação de punição aos médicos envolvidos no procedimento.

5. Apelação improvida.

(TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5014354-60.2017.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal VALDECI DOS SANTOS, julgado em 20/09/2023, DJEN DATA: 26/09/2023)

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. REPRODUÇÃO ASSISTIDA HETERÓLOGA. DOAÇÃO DE ÓVULOS ENTRE IRMÃS. DIREITO AO LIVRE PLANEJAMENTO FAMILIAR. RESOLUÇÃO/CFM 2.121/15. EXIGÊNCIA DE ANONIMATO. INAPLICABILIDADE.

1. A questão posta nos autos diz respeito à exigência de anonimato do doador de material genético, para fins de reprodução assistida heteróloga.

2. O livre planejamento familiar é um direito fundamental, previsto no art. 226, §7º, da Constituição Federal e art. 1.565, §2º, do Código Civil, que reconhece a autonomia dos indivíduos em relação às suas escolhas reprodutivas, como corolário da própria dignidade da pessoa humana. Isto é, garante a autodeterminação das famílias em planejar a quantidade de filhos que pretendem ter, o espaçamento entre estes e até mesmo a opção de não os ter. Abrange ainda a escolhe livre e informada acerca de métodos contraceptivos ou conceptivos mais adequados para suas necessidades. Convive, no mesmo dispositivo constitucional, ao lado do poder-dever da parentalidade responsável, que atribui aos pais o comprometimento e colaboração na criação dos filhos, notadamente porque o núcleo familiar é o maior responsável pelo desenvolvimento da personalidade humana.

3. O princípio da intervenção mínima do Poder Público nas famílias (art. 1513 do Código Civil) implica que o Estado somente intervirá para proteger os indivíduos, especialmente os vulneráveis. Isto é, a intervenção se dá para a promoção de direitos (modelo de apoio e assistência, e não de interferência).

4. A reprodução assistida heteróloga é uma técnica de reprodução assistida em que os gametas (óvulos ou espermatozoides) de um doador são utilizados para fertilizar os gametas do parceiro do paciente. Sobre o tema, a Resolução 2.121/15 do Conselho Federal de Medicina, ao regulamentar a utilização de técnicas de reprodução assistida no Brasil, estabelece a exigência de anonimato na doação de material genético por terceiros. Ou seja, com a finalidade de preservar a privacidade e proteger a integridade física e psicológica do doador e dos filhos, o doador não poderá ser identificado pelos receptores do material genético nem pelos filhos que nascerem dessa doação.

5. Na hipótese, considerando-se a compatibilidade genética entre as irmãs e o fato de todos os envolvidos serem maiores, capazes e terem livremente manifestado seus consentimentos, deve prevalecer a viabilidade da doação de óvulos entre irmãs, em prestígios aos princípios constitucionais do livre planejamento familiar e da intervenção mínima do Poder Público nas famílias. Ademais, inexiste exigência legal, mas meramente infralegal, de anonimato à doação de material genético.

6. Verba honorária majorada em 1% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, §11, do Código de Processo Civil.

7. Apelação e remessa necessária improvidas.

(TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5014139-16.2019.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal CONSUELO YATSUDA MOROMIZATO YOSHIDA, julgado em 12/06/2023, DJEN DATA: 15/06/2023)

No caso concreto, há de se considerar a compatibilidade genética entre a receptora de óvulos (Suzana Penha de Souza) e sua irmã, bem ainda que todos os envolvidos são maiores, capazes e terem livremente manifestado seus consentimentos.

A propósito, consigno o entendimento exarado na sentença, acerca da compatibilidade entre as irmãs (receptora e doadora do gameta):

“Narram que a doadora Roberta, irmã da receptora, possui 22 (vinte e dois) anos e manifestou vontade em doar seus óvulos para o procedimento de fecundação in vitro, no entanto, foram informados sobre a impossibilidade de realização do procedimento na forma pretendida por afrontar a Resolução nº 2.168/2017 do Conselho Federal de Medicina, que impede os médicos de proceder à coleta de material genético identificado, que somente pode ser realizada com autorização judicial.

Defendem que Roberta realizou todos os exames necessários estando apta para a doação, bem como, que o companheiro de Suzana declarou expressamente não se opor a doação e à realização do procedimento, bem ainda, que por se tratarem de irmãs há uma maior compatibilidade fenotípica, imunológica e a máxima compatibilidade com a receptora, favorecendo o desenvolvimento do embrião”.

Resta evidente, portanto que nesse cenário de tutela da aspiração reprodutiva, como consequência do direito fundamental à saúde e ao planejamento familiar e, consequentemente, de autorização e facilitação de acesso às técnicas de procriação medicamente assistida, eventuais restrições, para se legitimarem, devem encontrar suporte lógico, científico e jurídico, não sendo essa a hipótese dos autos.                            

Nestes termos, é de rigor a manutenção r. sentença que deferiu a fertilização e afastou a aplicação de punição aos médicos envolvidos no procedimento, devendo prevalecer a viabilidade da doação de óvulos entre as Requerentes, diante da ausência de vedação legal, e com base no direito constitucional do livre planejamento familiar.

Por fim, considerando-se que os honorários advocatícios foram fixados por equidade, com fundamento no art. 85, § 8, do CPC, e que a apelação interposta não legrou êxito em alterar a decisão recorrida, majora-se a verba honorária em 1% sobre o valor atualizado da condenação, nos termos do art. 85, §11, do Código de Processo Civil.

Em face do exposto, nego provimento ao recurso de apelação.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

APELAÇÃO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO - DOAÇÃO DE ÓVULOS ENTRE IRMÃS - RESOLUÇÃO/CFM Nº Resolução CFM nº 2.294/2021 – SUPERADA REGRA DO ANONIMATO. PRINCÍPIO DA LIBERDADE DE PLANEJAMENTO FAMILIAR. PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS. APELO NÃO PROVIDO.

1. A controvérsia fática e jurídica trazida a esta Eg. Corte diz com pretensão dos autores quanto à obtenção de autorização para realização de procedimento de fertilização in vitro mediante utilização de óvulos de doadora conhecida que, na hipótese, corresponde a irmã da receptora, Autora principal dessa ação, inclusive pata que o CREMESP que se abstenha de adotar quaisquer medidas ético-disciplinares contra os profissionais da saúde envolvidos na técnica médica de reprodução assistida.

2.  A garantia de sigilo, prevista na Resolução 2.121/2.015, do Conselho Federal de Medicina, objetivava proteger o doador e evitar-lhe futuras consequências pessoais, familiares ou jurídicas.

3. A edição da Resolução CFM n.º 2.320/2022, apresentou significativas alterações e atualizações,  em   defesa   do  aperfeiçoamento  das  práticas  e  da  observância  aos  princípios éticos e bioéticos que ajudam a trazer maior  segurança  e  eficácia  a  tratamentos  e  procedimentos  médicos, tornando - se o dispositivo deontológico a ser  seguido  pelos  médicos  brasileiros  e  revogando  a Resolução CFM nº 2.294, publicada no Diário Oficial  da União de 15 de junho de 2021, Seção I, p. 60.

4. Prevalência da solução que melhor dê cumprimento ao princípio da liberdade de planejamento familiar (artigo 226 da Constituição Federal), e do princípio da intervenção mínima do Poder Público nas famílias (art. 1513 do Código Civil), que se admite somente para a promoção de direitos (modelo de apoio e assistência, e não de interferência).

5. Precedentes deste Egrégio Tribunal.

6. Inexistente qualquer vedação legal à doação direta de óvulos entre irmãs, e presente a livre vontade e consentimento de ambas as autoras, na qualidade de doadora e receptora, a procedência dos pedidos é medida que se impõe.

7.Apelação a que se nega provimento.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, à unanimidade, decidiu negar provimento ao recurso de apelação, nos termos do voto do Des. Fed. WILSON ZAUHY (Relator), com quem votaram o Juiz Fed. Conv. SIDMAR MARTINS e a Des. Fed. MARLI FERREIRA. Ausente, justificadamente, o Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE (em férias), substituído pelo Juiz Fed. Conv. SIDMAR MARTINS , nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.