Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004749-80.2023.4.03.6100

RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. RENATO BECHO

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

APELADO: BEATRIZ SILVA DE DEUS

Advogado do(a) APELADO: BEATRIZ SILVA DE DEUS - SP140211-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004749-80.2023.4.03.6100

RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. RENATO BECHO

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

APELADO: BEATRIZ SILVA DE DEUS

Advogado do(a) APELADO: BEATRIZ SILVA DE DEUS - SP140211-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

R E L A T Ó R I O

 

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RENATO BECHO, RELATOR: Trata-se de apelação interposta por BEATRIZ SILVA DE DEUS em face da sentença proferida nos autos da ação declaratória cumulada com cobrança ajuizada contra a UNIÃO FEDERAL objetivando a conversão em pecúnia das horas extraordinárias não fruídas em razão de exoneração e, por conseguinte, a condenação da ré ao pagamento do saldo de horas credoras de 106 (cento e seis), bem como 6 (seis) dias prestados à Justiça Eleitoral, devidamente acrescido de correção monetária na forma estabelecida pelo Manual de Orientação de Cálculos da Justiça Federal, além de juros moratórios de 1% ao mês desde a data da citação.

A sentença julgou procedente a ação, nos termos do art. 487, I, do CPC, condenando a União ao pagamento em favor da autora do valor do saldo de horas trabalhadas e não compensadas de 106 (cento e seis) horas, acrescidas de 50% (cinquenta por cento), nos termos do art. 7º, inciso XVI, da Constituição Federal, bem como 6 (seis) dias de trabalhos prestados à Justiça Eleitoral, valores estes a serem apurados em liquidação de sentença. Determinou que os indexadores a serem aplicados são os constantes do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal (para as ações condenatórias em geral) vigentes à época da execução do julgado, observando-se como marco inicial da correção monetária o mês de competência da exoneração da servidora e a incidência de juros de mora da citação até o efetivo pagamento. Condenou, ainda, a União ao pagamento de custas e honorários advocatícios fixados com base no valor da condenação, sobre o qual devem incidir os percentuais mínimos fixados nos incisos do parágrafo 3º, do art. 85 do CPC, observando a regra de escalonamento prevista no parágrafo 5º do mesmo dispositivo legal. Sem remessa necessária (art. 496, §3º, I do CPC).

Apela a União pleiteando a reforma da r. sentença sustentando, em síntese, que, a partir das alterações implementadas por meio da Resolução CJF nº 173/2011 e aperfeiçoadas pelas posteriores Resoluções CJF nº 186/2012 e nº 379/2015, confirmou-se a possibilidade da conversão de horas extraordinárias em banco de horas, bem como, paulatinamente, foram estabelecidos limites temporais para fruição dessas horas trabalhadas em regime extraordinário, culminando na atual regra do art. 50-A da Resolução CJF nº 4/2008. Assim, as referidas Resoluções consistem basicamente na fixação de limites temporais para a fruição das horas trabalhadas e na revogação da vedação ao pagamento de hora extraordinária aos ocupantes de cargo em comissão. Quanto ao período de trabalho prestado à Justiça Eleitoral, a dispensa do serviço pelo dobro de dias por dia de convocação somente será válido enquanto durar o vínculo com o órgão/empregador, motivo pelo qual os afastamentos devem ser usufruídos pelo servidor em atividade, considerando, ainda, que não há previsão legal para a conversão em pecúnia. Desta forma, requer a improcedência da ação.

Com contrarrazões (ID 278789092), os autos subiram a esta Corte.

É o relatório.

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004749-80.2023.4.03.6100

RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. RENATO BECHO

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

APELADO: BEATRIZ SILVA DE DEUS

Advogado do(a) APELADO: BEATRIZ SILVA DE DEUS - SP140211-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

V O T O

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RENATO BECHO, RELATOR: Cuida-se de pedido de servidor público federal do TRF 3ª Região, para pagamento em pecúnia de horas extras (106 horas) e horas a disposição do serviço eleitoral (6 dias) não fruídas antes de sua exoneração.

Com efeito, nos termos do art. 7º, caput, XIII e XVI e do art. 39, § 3º, ambos da Constituição Federal, o serviço extraordinário deverá ser pago ao trabalhador, bem como aos servidores ocupantes de cargo público, com acréscimo de 50% sobre o valor da hora normal:

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

XIII - duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho;

XVI - remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em cinqüenta por cento à do normal;

Art. 39 - § 3º Aplica-se aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir.”

Na mesma linha se encontra o disposto no art. 73 da Lei n. 8.112/90:

“Art. 73. O serviço extraordinário será remunerado com acréscimo de 50% (cinqüenta por cento) em relação à hora normal de trabalho.”

In casu, conforme se depreende da documentação juntada aos autos (ID 278789075), à autora foi autorizado o exercício de atividade superior à jornada normal, restando acumulado no registro do sistema e-GP o total de 11 dias (ou 77 horas), sem vencimento para fruição; 5 horas vencidas em 31/12/2016, 1 dia (ou 7 horas) vencidas em 31/12/2023; 4 dias e 1 hora (ou 29 horas) com vencimento em 31/12/2023 e mais 6 dias de trabalho eleitoral, também sem vencimento para fruição.

Assim, resta claro das informações ali constantes que ao ser exonerada, a autora ainda deixou como “saldo em aberto” 77 (setenta e sete) horas (sem limite de fruição) e mais 29 (vinte e nove) horas (a vencer em 31/12/2023) e mais 6 dias relativos ao serviço eleitoral.

Destarte, em respeito à vedação do enriquecimento sem causa por parte da Administração e da proibição da prestação de serviços gratuitos, nos termos do artigo 4º da Lei nº 8.112/90, faz jus, a autora, à conversão em pecúnia das horas trabalhadas, visto não haver, após sua exoneração, outra maneira de recebê-las.

Nesse sentido, registro os seguintes precedentes:

“ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO. LICENÇAS-PRÊMIO NÃO-GOZADAS E NÃO COMPUTADAS EM DOBRO PARA APOSENTADORIA. INDENIZAÇÃO EM PECÚNIA. POSSIBILIDADE. ENTENDIMENTO PACIFICADO NO STJ. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. É assente nesta Corte Superior de Justiça que o servidor tem direito de converter, em pecúnia, as licenças-prêmios não gozadas e não contadas em dobro quando de sua aposentadoria. Precedentes.

2. É vedado a este Tribunal Superior, em Recurso Especial, apreciar a violação de dispositivos constitucionais, ainda que para fins de prequestionamento, uma vez que o julgamento de matéria de índole constitucional é reservado ao Supremo Tribunal Federal.

3. Agravo Regimental desprovido.”

(AgRg no REsp 1172750/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA TURMA, DJe 21/03/2011)

 

“CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. REEXAME NECESSÁRIO. APELAÇÃO. SERVIDOR PÚBLICO. REEXAME NECESSÁRIO NÃO CONHECIDO. INTERESSE RECURSAL. SERVIÇO EXTRAORDINÁRIO. BASE DE CÁLCULO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. LEI 11960/2009. APLICABILIDADE. APELAÇÃO PROVIDA EM PARTE.

1. (...)

5. Resta incontroverso que a autora possui o saldo de 494,26 horas extras no banco de horas, que não foram usufruídas quando em atividade, antes de sua aposentadoria.

6. A controvérsia a ser dirimida cinge-se ao pagamento das horas extraordinariamente laboradas, no caso de aposentadoria de servidor público federal.

7. A Constituição Federal assegura o direito ao adicional por serviço extraordinário, inclusive ao servidor público, com remuneração com acréscimo de 50% sobre o valor da hora normal (art. 7º, caput, XIII e XVI c/c art. 39, § 3º, da CF).

8. A Lei n. 8.112/90 também assegura ao servidor o pagamento de adicional por serviço extraordinário para atender a situações excepcionais e temporárias, com acréscimo de 50% (cinqüenta por cento) em relação à hora normal de trabalho (artigo 73), em respeito à vedação do enriquecimento sem causa por parte da Administração e da proibição da prestação de serviços gratuitos (artigo 4º).

9. Considerada a demonstração da existência de horas extraordinária não usufruídas, que a parte autora encontra-se aposentada, e em respeito ao princípio da proibição do enriquecimento sem causa por parte da administração, a parte autora faz juz à conversão das horas extraordinárias em pecúnia.

10. (...)

13. Remessa oficial não conhecida. Apelação da União provida em parte.”

(ApReeNec 5001355-63.2017.4.03.6104/SP, Relator Desembargador Federal HELIO EGYDIO DE MATOS NOGUEIRA, Primeira Turma, j. 19/12/2019, e - DJF3 Judicial 13/01/2020)

Na mesma linha de pensamento encontro guarida para a conversão em pecúnia das horas trabalhadas na Justiça Eleitoral e não usufruídas pela autora em tempo hábil, antes de sua exoneração.

Conforme bem lançado na r. sentença:

“A autora também faz jus ao pagamento das horas decorrentes do trabalho prestado à Justiça Eleitoral, que não foram fruídas como folgas compensatórias, senão vejamos: O art. 98 da Lei 9.504/97 dispõe: "Art. 98: os eleitores nomeados para compor as Mesas Receptoras ou Juntas Eleitorais e os requisitados para auxiliar seus trabalhos serão dispensados do serviço, mediante declaração expedida pela Justiça Eleitoral, sem prejuízo do salário, vencimento ou qualquer outra vantagem, pelo dobro dos dias de convocação." No que refere à conversão do período em pecúnia, sabe-se que a Resolução nº 22.747/2008, que regulamenta a aplicação do artigo 98 da Lei 9.504/97, expressamente veda no §4º, artigo 1º, tal possibilidade. Entretanto, considerando que a dispensa do trabalho sem prejuízo da remuneração não tem prazo para ser requerida e não foi usufruída durante a vigência do exercício do cargo em comissão, nada impede que tal anomalia seja reparada por ocasião da exoneração da servidora, tendo por fundamento a condenação por aplicação da responsabilidade aquiliana, conforme regra prevista no art. 186 e 927 do Código Civil.”

 

Dessa forma, imperiosa a manutenção da sentença nos moldes em que proferida. 

Por fim, com relação à verba honorária, em razão do desprovimento do recurso interposto, majoro em 2% os honorários advocatícios fixados na sentença em favor da parte autora, em observância ao disposto no art. 85, § 11 do CPC. 

Ante o exposto, nego provimento à apelação da União Federal, com majoração da verba honorária.

É como voto.



E M E N T A

 

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. HORAS EXTRAS NÃO USUFRUÍDAS. HORAS TRABALHADAS NA JUSTIÇA ELEITORAL. EXONERAÇÃO. CONVERSÃO EM PECÚNIA. POSSIBILIDADE. APELAÇÃO IMPROVIDA.

Nos termos do art. 7º, caput, XIII e XVI e do art. 39, § 3º, ambos da Constituição Federal, o serviço extraordinário deverá ser pago ao trabalhador, bem como aos servidores ocupantes de cargo público, com acréscimo de 50% sobre o valor da hora normal. Na mesma linha se encontra o disposto no art. 73 da Lei n. 8.112/90.

Conforme se depreende da documentação juntada aos autos, à autora foi autorizado o exercício de atividade superior à jornada normal, restando acumulado no registro do sistema e-GP o total de 11 dias (ou 77 horas), sem vencimento para fruição; 5 horas vencidas em 31/12/2016, 1 dia (ou 7 horas) vencidas em 31/12/2023; 4 dias e 1 hora (ou 29 horas) com vencimento em 31/12/2023 e mais 6 dias de trabalho eleitoral, também sem vencimento para fruição.

Resta claro das informações ali constantes que ao ser exonerada, a autora ainda deixou como “saldo em aberto” 77 (setenta e sete) horas (sem limite de fruição) e mais 29 (vinte e nove) horas (a vencer em 31/12/2023) e mais 6 dias relativos ao serviço eleitoral.

Em respeito à vedação do enriquecimento sem causa por parte da Administração e da proibição da prestação de serviços gratuitos, nos termos do artigo 4º da Lei nº 8.112/90, faz jus, a autora, à conversão em pecúnia das horas trabalhadas, visto não haver, após sua exoneração, outra maneira de recebê-las.

Na mesma linha de pensamento encontro guarida para a conversão em pecúnia das horas trabalhadas na Justiça Eleitoral e não usufruídas pela autora em tempo hábil, antes de sua exoneração.

Apelação da União Federal não provida.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Primeira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação da União Federal, com majoração da verba honorária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.