Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5031693-86.2023.4.03.0000

RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. RENATO BECHO

AGRAVANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

AGRAVADO: ASSOCIACAO DOS NOTARIOS E REGISTRADORES DO ESTADO DE SAO PAULO - ANOREG - SP

Advogado do(a) AGRAVADO: MAITE PENTEADO BARLEBEN - SP305847

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5031693-86.2023.4.03.0000

RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. RENATO BECHO

AGRAVANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

AGRAVADO: ASSOCIACAO DOS NOTARIOS E REGISTRADORES DO ESTADO DE SAO PAULO - ANOREG - SP

Advogado do(a) AGRAVADO: MAITE PENTEADO BARLEBEN - SP305847

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

R E L A T Ó R I O

 

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RENATO BECHO, RELATOR: Trata-se de agravo de instrumento interposto pela UNIÃO em face da decisão que, nos autos do mandado de segurança coletivo impetrado por ASSOCIAÇÃO DOS NOTÁRIOS E REGISTRADORES DO ESTADO DE SÃO PAULO – ANOREG-SP, concedeu a liminar determinando que a autoridade coatora se abstenha de exigir a apresentação de CND dos associados da parte impetrante para os atos registrais e notariais, em virtude da suposta inconstitucionalidade dos artigos 47 e 48 da Lei nº 8.212/91.

Sustenta a UNIÃO que não há correlação entre os artigos 47 da Lei nº 8.212/91, o qual exige a apresentação da Certidão Negativa de Débitos, e o artigo 1º, da Lei nº 7.711/88, já declarado inconstitucional em razão da exigência de prova da quitação de créditos tributários.

Afirma que “A distinção entre exigir a comprovação da quitação do tributo e exigir a regularidade fiscal foi bem analisada pelo C. STF e não foi verificada qualquer inconstitucionalidade em relação a regularidade fiscal exigida pela Lei nº 8.666/93, cujo entendimento pode ser analogicamente aplicado à norma do art. 47 da Lei 8.212/92, demonstrando que inexistem indícios que afastem a presunção de constitucionalidade das normas.”

Alega, ainda, que os artigos 47 e 48 da Lei nº. 8.212/91 se encontram interligados sob a lógica da acessoriedade, ou seja, tendo em vista que a exigência constante do artigo 47 da Lei nº. 8.212/91 não se mostra inconstitucional, a determinação de responsabilidade solidária pela inobservância de tal exigência, prevista artigo 48 da mesma lei, também não seria inconstitucional.

Requer o provimento do presente agravo de instrumento para que seja determinado à agravada a continuidade do cumprimento das exigências contidas nos arts. 47 e 48 da Lei nº 8.212/91.

O pedido de tutela de urgência foi deferida (ID 283158900).

Contraminuta – ID 283763856.

É o relatório.

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5031693-86.2023.4.03.0000

RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. RENATO BECHO

AGRAVANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

AGRAVADO: ASSOCIACAO DOS NOTARIOS E REGISTRADORES DO ESTADO DE SAO PAULO - ANOREG - SP

Advogado do(a) AGRAVADO: MAITE PENTEADO BARLEBEN - SP305847

OUTROS PARTICIPANTES:

 

V O T O

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RENATO BECHO, RELATOR: Verifico ser o caso de dar provimento ao agravo de instrumento.

Por ocasião da análise do pedido de antecipação da tutela recursal, foi proferida a seguinte decisão, in verbis:

"(...) In casu, pleiteia a agravante a suspensão da decisão proferida em sede de mandado de segurança coletivo que concedeu liminar para determinar que a autoridade coatora se abstenha de exigir a apresentação de CND dos associados do impetrante para os atos registrais e notariais, em virtude da suposta inconstitucionalidade dos arts. 47 e 48 da Lei nº 8.212/1991.

Consta da liminar deferida nos autos do mandado de segurança:

“os Tribunais de Justiça dos Estados têm entendido que a exigência de CND, por parte da empresa alienante de imóvel, para fins de registro, é indevida, considerando os julgados do Supremo Tribunal Federal nas ADI’s 394-1-DF e 173-DF. No mais, o Plenário do Conselho Nacional de Justiça, quando da análise de processos propostos pela União contra a Corregedoria de Tribunal de Justiça, afasta a exigência de ofício de CND, nas operações notariais. Assim, tratando-se o inc. I do art. 47 da Lei nº 8.212/91 de norma que é, do ponto de vista material e teleológico, idêntica à declarada inconstitucional pelo STF, na ADIN 394, e diante dos efeitos erga omnes e vinculante de que desta emanam, vislumbro a plausibilidade do direito e entendo que deve ser observado o posicionamento da Suprema Corte de modo a afastar a exigência de CND quando da alienação ou da oneração de bens imóveis, por possuir a mesma “mens legis”. Ante o exposto, DEFIRO A LIMINAR, para determinar que a autoridade coatora se abstenha de exigir a apresentação de CND dos da parte impetrante para os atos registrais, nos termos dos arts. 47 e 48 da Lei nº 8.212/1991.”

Neste momento, vale lembrar que por ocasião do julgamento das ADIs ns. 173-6 e 394-1, a Suprema Corte reconheceu, por unanimidade, a inconstitucionalidade, dentre outros dispositivos, do art. 1º, incisos I, II, IV, §§1º a 3º e art. 2º da Lei 7.711/88.

Extrai-se do julgamento que o Supremo Tribunal Federal entendeu que, exigir do contribuinte a apresentação de certidão de quitação de débito, caracterizaria sanção política, na medida em que tais normas obrigariam o contribuinte, por vias oblíquas, ao recolhimento do crédito tributário em aberto.

Todavia, a certidão de quitação fiscal não deve ser confundida com a certidão de regularidade fiscal, pois institutos distintos. Enquanto a certidão de quitação impõe ao contribuinte que todos seus débitos estejam quitados para a sua emissão, a certidão de regularidade fiscal exige do contribuinte apenas a regularidade de seus débitos para que seja emitida.

Vale dizer que, a emissão de certidão de regularidade fiscal pode ser expedida mesmo que o contribuinte tenha débitos pendentes de quitação, bastando que este providencie a sua regularização antes da emissão da certidão de regularidade fiscal.

Nos termos do artigo 205 do Código Tributário Nacional, a Certidão Negativa de Débito (CND) será expedida quando inexistir débito tributário constituído relativamente ao cadastro fiscal do contribuinte. Por sua vez, nos termos do artigo 206, do mesmo diploma legal, poderá ser expedida a Certidão Positiva com Efeitos de Negativa (CPEN) quando a exigibilidade do débito estiver suspensa, nos termos do artigo 151 do CTN, ou o débito em cobrança judicial esteja integralmente garantido nos autos fiscais.

Eis o teor dos mencionados artigos 205 e 206 do Código Tributário Nacional.

“Art. 205. A lei poderá exigir que a prova da quitação de determinado tributo, quando exigível, seja feita por certidão negativa, expedida à vista de requerimento do interessado, que contenha todas as informações necessárias à identificação de sua pessoa, domicílio fiscal e ramo de negócio ou atividade e indique o período a que se refere o pedido.

Parágrafo único. A certidão negativa será sempre expedida nos termos em que tenha sido requerida e será fornecida dentro de dez dias da data da entrada do requerimento na repartição.

Art. 206. Tem os mesmos efeitos previstos no artigo anterior a certidão de que conste a existência de créditos não vencidos, em curso de cobrança executiva em que tenha sido efetivada a penhora, ou cuja exigibilidade esteja suspensa.”

Destarte, resta evidente que enquanto a Certidão Negativa de Débitos (CND) é expedida se não existir nenhum crédito tributário vencido e não pago, a Certidão Positiva de Débitos com Efeitos de Negativa (CPDEN) pode ser expedida tanto na hipótese da existência de crédito objeto de execução fiscal integralmente garantida ou na hipótese de a parte ter alcançado a suspensão da exigibilidade do crédito tributário, nas hipóteses arroladas no art. 151 do CTN.

Em outras palavras, a certidão de regularidade fiscal pode ser comprovada pela certidão negativa de débito, que equivale a certidão de quitação, ou pela certidão positiva com efeitos de negativa (na hipótese de o contribuinte ter débitos não pagos, mas que integralmente garantidos ou com a exigibilidade suspensa)

Dentro dessa linha de entendimento, não é plausível supor que o inc. I do art. 47 da Lei nº 8.212/91, sob qualquer ângulo que seja analisado, seja idêntico àquela norma declarada inconstitucional pelo STF na ADIN 394.

Ademais, não se pode olvidar que os Notários e Registradores (associados da impetrante) na condição de delegatários do serviço público, devem exercer o cumprimento da norma legal, haja vista que, na forma prevista no artigo 236, caput da Constituição Federal, "os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público".

Assim, se dentre as atribuições impostas aos notários e registradores está a representação do Estado, com a finalidade dar forma legal e conferir presunção de autenticidade (“fé pública”) aos atos jurídicos extrajudiciais, não podem estes representantes descumprir normas jurídicas válidas sob o pretexto de que se “assemelham” a outras normas declaradas inconstitucionais.

Vale dizer que, até que seja declarada expressamente a inconstitucionalidade das disposições do artigo 47 e 48 da Lei nº 8.212/91, não é facultado a qualquer pessoa deixar de cumpri-la por reputá-la inconstitucional e menos ainda aos delegatários do serviço público, na condição de representantes do Estado.

Portanto, ausentes elementos que demonstrem que a exigência imposta pelos arts. 47 e 48 da Lei 8212/91, afrontam qualquer princípio constitucional ou que foram declarados inconstitucionais, regular e legitima a exigência de apresentação de certidão de regularidade fiscal como condicionante para a averbação de construção, alienação ou oneração de bem imóvel, registro e incorporação societária, etc., bem como a responsabilidade solidária dos contratantes e do oficial que praticarem atos com inobservância do disposto no mencionado artigo 47, da Lei nº 8.212/91.

Por fim, estando demonstrado, de forma robusta e fundamentada, que a manutenção da liminar concedida nos autos do Mandado de Segurança Coletivo possibilitará a efetivação de registros e lavraturas de atos notariais sem a necessária exigência da certidão de regularidade fiscal, na forma da lei vigente (art. 47 da Lei nº 8.212/91), o que pode resultar em grande prejuízo ao Estado, entendo que presentes as hipóteses previstas no artigo 300 e 301, do Código de Processo Civil, para a concessão da medida pleiteada pela agravante.

Ante o exposto, defiro liminarmente a tutela de urgência, nos termos formulados pela agravante, para determinar a suspensão da decisão que ordenou à autoridade coatora que se abstenha de exigir a apresentação de CND dos impetrantes para os atos registrais e notariais, nos termos dos arts. 47 e 48 da Lei nº 8.212/199, até o julgamento deste agravo de instrumento. (...)"

Verifico que não foi trazido argumento ou fato novo a ensejar a reforma da r. decisão que deferiu o pedido de antecipação de tutela recursal, sendo mister a sua manutenção.

Ante o exposto, dou provimento ao agravo de instrumento para que a agravada mantenha a continuidade do cumprimento das exigências contidas nos arts. 47 e 48 da Lei nº 8.212/91.

É como voto.



E M E N T A

 

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ASSOCIAÇÃO DOS NOTÁRIOS E REGISTRADORES. CERTIDÃO DE REGULARIDADE FISCAL. EXIGÊNCIA. ARTIGOS 47 E 48 DA LEI Nº 8.212/91. RECURSO PROVIDO.

1. A certidão de quitação fiscal não deve ser confundida com a certidão de regularidade fiscal, pois institutos distintos. Enquanto a certidão de quitação impõe ao contribuinte que todos seus débitos estejam quitados para a sua emissão, a certidão de regularidade fiscal exige do contribuinte apenas a regularidade de seus débitos para que seja emitida.

2. A certidão de regularidade fiscal pode ser comprovada pela certidão negativa de débito, que equivale a certidão de quitação, ou pela certidão positiva com efeitos de negativa (na hipótese de o contribuinte ter débitos não pagos, mas que integralmente garantidos ou com a exigibilidade suspensa). Dentro dessa linha de entendimento, não é plausível supor que o inc. I do art. 47 da Lei nº 8.212/91, sob qualquer ângulo que seja analisado, seja idêntico àquela norma declarada inconstitucional pelo STF na ADIN 394.

3. Os Notários e Registradores (associados da impetrante) na condição de delegatários do serviço público, devem exercer o cumprimento da norma legal, haja vista que, na forma prevista no artigo 236, caput da Constituição Federal, "os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público".

4. Se dentre as atribuições impostas aos notários e registradores está a representação do Estado, com a finalidade dar forma legal e conferir presunção de autenticidade (“fé pública”) aos atos jurídicos extrajudiciais, não podem estes representantes descumprir normas jurídicas válidas sob o pretexto de que se “assemelham” a outras normas declaradas inconstitucionais.

5. Até que seja declarada expressamente a inconstitucionalidade das disposições do artigo 47 e 48 da Lei nº 8.212/91, não é facultado a qualquer pessoa deixar de cumpri-la por reputá-la inconstitucional e menos ainda aos delegatários do serviço público, na condição de representantes do Estado.

6. Agravo de Instrumento provido.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Primeira Turma, por unanimidade, deu provimento ao agravo de instrumento para que a agravada mantenha a continuidade do cumprimento das exigências contidas nos arts. 47 e 48 da Lei nº 8.212/91, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.