Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5007592-52.2022.4.03.6100

RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR

APELANTE: ALLIANZ SEGUROS S/A

Advogados do(a) APELANTE: CRISTIANA GESTEIRA COSTA PINTO DE CAMPOS - SP205396-A, FERNANDA DORNBUSCH FARIAS LOBO - SP218594-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5007592-52.2022.4.03.6100

RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR

APELANTE: ALLIANZ SEGUROS S/A

Advogados do(a) APELANTE: CRISTIANA GESTEIRA COSTA PINTO DE CAMPOS - SP205396-A, FERNANDA DORNBUSCH FARIAS LOBO - SP218594-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

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R E L A T Ó R I O

 

 

Trata-se de apelação interposta por ALLIANZ SEGUROS S/A em ação ordinária ajuizada em face da União Federal com o objetivo de que seja determinado ao DETRAN do Estado de São Paulo que adote as providências necessárias à imediata transferência da propriedade do veículo Hyundai Creta Attitude 1.6, quatro portas, automático, ano/modelo 2020, placa DPM 1I39, RENAVAM 01223953260 para o nome da Autora, independentemente do recolhimento do IPI anteriormente dispensado, sob pena de multa diária e que seja suspensa a exigibilidade do IPI em razão da transferência do veículo acima indicado, até o julgamento final da presente ação.

Narra a autora que durante a vigência da apólice nº 5177202018310826464, em 05/10/2021, o segurado da autora, Sr. Nelson Campos,  apresentou aviso de sinistro, tendo a autora efetuado o pagamento da indenização integral, tornando-se responsável e proprietária dos salvados. Entretanto, ao requerer a transferência do veículo para o seu nome perante o DETRAN/SP, a autarquia condicionou a transferência do veículo ao pagamento do valor referente ao IPI dispensado na aquisição o automóvel. Aduz tal exigência restringe o livre exercício da atividade econômica da Autora. (ID 257868059)

O pedido de tutela antecipada foi indeferido. (ID 28146547)

A União Federal apresentou contestação. (ID 251462551)

O juízo de origem julgou improcedente o pedido, extinguindo o processo com julgamento do mérito, nos termos do artigo 487, I do CPC.  Condenou autora ao pagamento das custas e de honorários advocatícios em favor da União no percentual de 10% (dez por cento) do valor atribuído à causa. (ID 1462556)

Apelou a ALLIANZ SEGUROS S/A alegando a ilegalidade da  sanção política praticada pela apelada ao condicionar a transferência da propriedade do veículo ao pagamento do IPI. (ID 281462559)

Com contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.

É o relatório.

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5007592-52.2022.4.03.6100

RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR

APELANTE: ALLIANZ SEGUROS S/A

Advogados do(a) APELANTE: CRISTIANA GESTEIRA COSTA PINTO DE CAMPOS - SP205396-A, FERNANDA DORNBUSCH FARIAS LOBO - SP218594-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

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V O T O

 

 

Trata-se de apelação em ação ordinária ajuizada  com o escopo de afastar a exigência do pagamento de IPI, pela seguradora, para a transferência de veículo adquirido por pessoa portadora de deficiência física, nos termos da Lei nº 8.989/95.

Inicialmente, cumpre recordar o disposto na Lei nº 8.989/95, alterada pela Lei nº 10.182/2001 que concede isenção de IPI na aquisição de automóveis adaptados para pessoas portadoras de deficiência física:

Art. 1° Ficam isentos do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI os automóveis de passageiros de fabricação nacional de até 127 HP de potência bruta - SAE quando adquiridos por:

IV - pessoas portadoras de deficiência física, visual, mental severa ou profunda, ou autistas, diretamente ou por intermédio de seu representante legal;

§ 1o Para a concessão do benefício previsto no art. 1o é considerada também pessoa portadora de deficiência física aquela que apresenta alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função física, apresentando-se sob a forma de paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, amputação ou ausência de membro, paralisia cerebral, membros com deformidade congênita ou adquirida, exceto as deformidades estéticas e as que não produzam dificuldades para o desempenho de funções.

 

O mesmo diploma legal determina em seu artigo 6º que caberá ao alienante o pagamento do tributo dispensado, no caso em que o veículo adquirido com a isenção seja alienado antes do prazo de 2  anos:

“Art. 6 o A alienação do veículo adquirido nos termos desta Lei e da Lei nº8.199, de 28 de junho de 1991, e da Lei nº 8.843, de 10 de janeiro de 1994, antes de 2 (dois) anos contados da data da sua aquisição, a pessoas que não satisfaçam às condições e aos requisitos estabelecidos nos referidos diplomas legais acarretará o pagamento pelo alienante do tributo dispensado, atualizado na forma da legislação tributária.”

Essa regra tem por escopo evitar o enriquecimento sem causa por parte do adquirente que pretenda se utilizar da deficiência para comprar o veículo com isenção e vende-lo em seguida obtendo lucro indevido.

Contudo, no presente caso, não há uma operação comercial de compra e venda. A autora, em cumprimento à sua obrigação contratual, efetuou o pagamento da indenização integral ao seu cliente, tornando-se responsável e proprietária dos salvados, não havendo intenção de obtenção de lucro indevido.

O Tribunal Regional Federal da 3ª Região entende ser ilegal a exigência de comprovação de regularidade fiscal na hipótese do feito:

TRIBUTÁRIO. IPI. ISENÇÃO CONDICIONADA A DESTINAÇÃO DO PRODUTO. SINISTRO COM PERDA TOTAL. TRANSFERÊNCIA DA PROPRIEDADE À SEGURADORA. SUCATA REMOVIDA PARA LOCAL DIVERSO. EXIGÊNCIA DO TRIBUTO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Discute-se acerca da exigência, pelo Fisco, de IPI em razão da transferência e alteração da destinação de veículo albergado por benefício fiscal para uso dentro dos limites da Amazônia Ocidental, envolvido em sinistro que resultou em perda total, para o fim de pagamento de indenização estabelecida em cláusula contratual. 2. As normas que disciplinam os benefícios relativos à isenção do IPI para determinados produtos utilizados na Amazônia Ocidental (artigos 52 e 81, III do Decreto nº. 7.212/10) buscam elevar a situação econômica da região, propiciando o desenvolvimento das empresas lá situadas, e coibir o uso ilegítimo da benesse com a intenção deliberada de auferir lucro. 3. A vedação contida na lei que regulamenta a isenção do IPI se dirige à alienação voluntária e à conduta de utilizar a legislação tributária para fins de enriquecimento indevido, que não é o caso dos autos, que retrata transferência do veículo irrecuperável em favor da seguradora, por força contratual, a fim de poder efetuar pagamento da indenização integral, com a consequente retirada de mera sucata da área beneficiada. Precedente do STJ. 4. Quanto aos honorários advocatícios, cumpre salientar que o art. 85, caput, do Código de Processo Civil dispõe que o vencido pagará honorários ao advogado do vencedor, consagrando, como regra geral, a aplicação do princípio da sucumbência, notadamente porque somente nos casos em que houver perda do objeto os honorários advocatícios devem ser fixados segundo o princípio da causalidade, conforme previsão do art. 85, §§ 6º e 10º, do CPC, ou seja, apenas nas hipóteses em que não houver vencedor e vencido os honorários devem ser suportados por aquele que deu causa à demanda. 5. No caso, a pretensão formulada pela parte autora foi acolhida na sua integralidade, tendo havido resistência da União Federal, de modo que resta evidente o cabimento da condenação em honorários advocatícios arbitrada na r. sentença. 6. Em atenção ao disposto no artigo 85, § 11, do CPC/2015, determino o acréscimo do percentual de 1% (um por cento) a este importe a ser suportado pela apelante.    7. Apelação a que se nega provimento."  (APELAÇÃO CÍVEL ..SIGLA_CLASSE: ApCiv 0000147-44.2017.4.03.6100 ..PROCESSO_ANTIGO: ..PROCESSO_ANTIGO_FORMATADO:, ..RELATORC:, TRF3 - 3ª Turma, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 09/12/2019)

 

"DIREITO TRIBUTÁRIO. IPI. VEÍCULO SINISTRADO. RECUPERAÇÃO DE SALVADOS. AQUISIÇÃO COM ISENÇÃO DA LEI 8.989/1995. TRANSFERÊNCIA DA PROPRIEDADE À SEGURADORA. REQUISITO PARA RECEBIMENTO DA INDENIZAÇÃO. TRIBUTO INEXIGÍVEL.  1. Consolidado o entendimento da Turma no sentido de não ser exigível IPI na alienação de veículo sinistrado, adquirido com isenção prevista na Lei 8.989/1995, ao segurador. 2.É correto interpretar que a legislação veda que seja veículo adquirido por pessoa com deficiência para permitir a realização de lucro a qualquer tempo com renegociações comerciais, em deliberada burla à hipótese isentiva, que se destina a conferir, isonomicamente, mobilidade, autonomia e acessibilidade à parcela da população em situação especial, e não propiciar ganhos em detrimento do Fisco. 3. No caso, não cabe cogitar de alienação voluntária do veículo, passível de acarretar enriquecimento indevido da parte beneficiária, mas alienação de salvado de sinistro, em razão de avarias no veículo que superam 75% do valor do mesmo e em cumprimento à exigência contratual para efeito de recebimento de indenização integral. 4. Assim, deve ser afastada a aplicação literal do artigo 6º da Lei 8.989/1995, bem como dos artigos 11 e 12, da IN RFB 1.769/2017, em prol do reconhecimento de que o contribuinte isento, que contratou seguro, não se sujeita ao recolhimento do IPI na alienação ao segurador do bem objeto do sinistro como condição para o recebimento da indenização securitária pelo segurado. 5. Fixada verba honorária pelo trabalho adicional em grau recursal, em observância ao comando e critérios dos artigos 85, §§ 2º a 6º e 11, do Código de Processo Civil. 6. Apelação e remessa necessária desprovidas." (APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA ..SIGLA_CLASSE: ApelRemNec 5002357-75.2020.4.03.6100..RELATORC:, TRF3 - 3ª Turma, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 08/02/2021)

 

Nesse mesmo sentido já decidiu o C. Superior Tribunal de Justiça:

 

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC.DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA 284/STF. IPI. VEÍCULO UTILIZADO POR PROFISSIONAL TAXISTA. ISENÇÃO. ALIENAÇÃO EM PERÍODO INFERIOR AO ESTABELECIDO NA LEGISLAÇÃO. INCIDÊNCIA, RESSALVADA A HIPÓTESE EM QUE A TRANSFERÊNCIA DA PROPRIEDADE SE DÁ PARA O FIM DE INDENIZAÇÃO, PELA SEGURADORA, EM CASO DE SINISTRO QUE IMPLICA PERDA TOTAL DO BEM.

1. Não se conhece de Recurso Especial em relação a ofensa ao art. 535 do CPC quando a parte não aponta, de forma clara, o vício em que teria incorrido o acórdão impugnado. Aplicação, por analogia, da Súmula 284/STF.

2. Define o art. 6º da Lei 8.989/1995, em sua redação original, que perde o benefício da isenção do IPI o profissional motorista de táxi que o alienar, antes de três anos, a pessoas que não satisfaçam às condições e requisitos estabelecidos em legislação própria.

3. A suspensão do IPI, no ponto, tem finalidade extrafiscal, qual seja a de estimular os meios de transporte público - no caso, nas condições especificadas em lei, facilita-se a aquisição de veículo que é instrumento de trabalho do profissional taxista.

4. Cessa o benefício, contudo, se houver alienação antes do prazo definido na legislação tributária (originalmente, 3 anos; atualmente, 2 anos). O objetivo é coibir a celebração de negócio jurídico que, em caráter comercial ou meramente civil, atraia escopo lucrativo.

5. Na hipótese dos autos, contudo, a situação é diversa. A transferência da propriedade (no caso, sucata) decorreu do cumprimento de cláusula contratual, requisito para o recorrido receber a indenização devida pela companhia de seguro, após acidente em evento que implicou perda total do automóvel.

6. Nesse contexto, ausente a intenção de utilizar a legislação tributária para fins de enriquecimento indevido, deve ser rejeitada a pretensão recursal.

7. Recurso Especial não provido.

(REsp 1310565/PB, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/08/2012, DJe 03/09/2012).

 

Ante o exposto, dou provimento à apelação.

Condeno a ré ao pagamento de custas e honorários advocatícios fixados em 10% do valor atualizado da causa.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

TRIBUTÁRIO. IPI. ISENÇÃO CONDICIONADA A DESTINAÇÃO DO PRODUTO. SINISTRO COM PERDA TOTAL. TRANSFERÊNCIA DA PROPRIEDADE À SEGURADORA. . EXIGÊNCIA DO TRIBUTO. IMPOSSIBILIDADE.APELAÇÃO PROVIDA.

1-A Lei nº 8.989/95, alterada pela Lei nº 10.182/2001 concede isenção de IPI na aquisição de automóveis adaptados para pessoas portadoras de deficiência física.

2-O mesmo diploma legal determina em seu artigo 6º que caberá ao alienante o pagamento do tributo dispensado, no caso em que o veículo adquirido com a isenção seja alienado antes do prazo de 2  anos.

3-Essa regra tem por escopo evitar o enriquecimento sem causa por parte do adquirente que pretenda se utilizar da deficiência para comprar o veículo com isenção e vende-lo em seguida obtendo lucro indevido.

4-Contudo, no presente caso, não há operação uma operação comercial de compra e venda. A autora, em cumprimento à sua obrigação contratual, efetuou o pagamento da indenização integral ao seu cliente, tornando-se responsável e proprietária dos salvados, não havendo intenção de obtenção de lucro indevido.

5-Apelação  provida.

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, deu provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.