Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003373-09.2022.4.03.6128

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: NOVA SIPACK - PRODUTOS PLASTICOS LTDA

Advogado do(a) APELANTE: TOSHINOBU TASOKO - SP314181-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003373-09.2022.4.03.6128

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: NOVA SIPACK - PRODUTOS PLASTICOS LTDA

Advogado do(a) APELANTE: TOSHINOBU TASOKO - SP314181-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

R E L A T Ó R I O

 

 

O Exmo. Desembargador Federal Carlos Francisco (Relator): Trata-se de embargos de declaração opostos por NOVA SIPACK - PRODUTOS PLÁSTICOS LTDA. em face de acórdão deste colegiado.

Em síntese, a parte embargante afirma que o julgado incidiu em omissão. Por isso, pede que seja sanado o problema que indica.

A União apresentou contrarrazões.

É o relatório.

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003373-09.2022.4.03.6128

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: NOVA SIPACK - PRODUTOS PLASTICOS LTDA

Advogado do(a) APELANTE: TOSHINOBU TASOKO - SP314181-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

V O T O

 

O Exmo. Desembargador Federal Carlos Francisco (Relator): Nos termos do art. 1.022 do CPC/2015, os embargos de declaração podem ser opostos contra qualquer decisão judicial para esclarecer obscuridade, eliminar contradição, suprir omissão de ponto ou questão, e corrigir erro material. E, conforme dispõe o art. 1.025 do mesmo CPC/2015, consideram-se incluídos no acórdão os elementos que o embargante suscitou, para fins de pré-questionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade.

Embora essa via recursal seja importante para a correção da prestação jurisdicional, os embargos de declaração não servem para rediscutir o que já foi objeto de pronunciamento judicial coerente e suficiente na decisão recorrida. Os efeitos infringentes somente são cabíveis se o julgado tiver falha (em tema de direito ou de fato) que implique em alteração do julgado, e não quando desagradar o litigante.

Por força do art. 1.026, §§2º e 3º, do CPC/2015, se os embargos forem manifestamente protelatórios, o embargante deve ser condenado a pagar ao embargado multa não excedente a 2% sobre o valor atualizado da causa (elevada a até 10% no caso de reiteração), e a interposição de qualquer recurso ficará condicionada ao depósito prévio do valor da multa (à exceção da Fazenda Pública e do beneficiário de gratuidade da justiça, que a recolherão ao final). E a celeridade e a lealdade impõem a inadmissibilidade de novos embargos de declaração se os 2 anteriores forem considerados protelatórios.

No caso dos autos, a parte embargante alega que o julgado incorreu em omissão, pois não teria se manifestado sobre as alegações relacionadas à utilização de crédito objeto de precatório ou de decisão judicial com trânsito em julgado como passíveis de utilização no procedimento de transação, frisando que as questões suscitadas não estão relacionadas a compensação. Cita ainda precedente jurisprudencial e pede o acolhimento dos embargos de declaração.

A decisão recorrida tem o seguinte conteúdo:

Inicialmente, julgo prejudicado o pedido de antecipação da tutela recursal, haja vista o presente julgamento.

Prosseguindo, afasto a preliminar de cerceamento de defesa porque o juízo manifestou-se sobre os argumentos trazidos pela parte autora de forma suficiente, quer em relação à alegada certeza e liquidez do crédito que fora cedido à apelante, ou no tocante aos créditos decorrentes de base de cálculo negativa da CSLL ou de prejuízos fiscais. Ademais, órgão julgador deve solucionar as questões relevantes e imprescindíveis para a resolução da controvérsia, não sendo obrigado a rebater (um a um) todos os argumentos trazidos pelas partes quando abrangidos pelas razões adotadas no pronunciamento judicial. A esse respeito, exemplifico com os seguintes julgados do E.STJ: AgInt nos EDcl no AREsp 1.290.119/RS, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe 30/08/2019; AgInt no REsp 1.675.749/RJ, Rel. Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 23/08/2019; REsp 1.817.010/PR, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 20/08/2019; AgInt no AREsp 1.227.864/RJ, Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 20/11/2018; e AREsp 1535259/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 07/11/2019, DJe 22/11/2019. Passo ao exame do mérito.

Porque as obrigações tributárias são regidas por leis orientadas por primados do Estado de Direito (notadamente a igualdade), o regular cumprimento das exigências legítimas impõe pagamento tempestivo de cada tributo devidamente lançado, razão pela qual a inadimplência coloca o contribuinte no âmbito da irregularidade. E mesmo que parcelamentos, remissões e transações também sejam regidas pela legalidade, essas medidas devem ser compreendidas como excepcionais em vista da regra geral do pagamento tempestivo de obrigações tributárias, daí porque não podem ser interpretadas para além do que o titular da competência normativa concedeu. Vale dizer, os inadimplentes e o agente administrativo executor não podem ditar as regras de parcelamentos, remissões e transações, e o direito subjetivo (que, porventura, possa derivar dos atos legislativos que preveem esses benefícios) terá a extensão restrita aos comandos do titular da competência normativa, ainda mais se implementadas com redução da dívida fiscal decorrente da concessão de anistia ou de remissão.

Nos moldes das normas gerais do CTN, a transação é hipótese de extinção da obrigação tributária (art. 156, III) que, nas condições estabelecidas pelo legislador ordinário do ente estatal competente, permite que concessões mútuas ponham fim a litígio administrativo ou judicial (art. 171). Nesse contexto, foi editada a Lei nº 13.988/2020 dispondo sobre transação de dívidas junto ao Poder Público (tributárias ou não) pertinentes a litígios administrativos e judiciais, sobre a qual destaco as seguintes regras gerais e requisitos descritos no art. 1º e no art. 3º desse diploma legislativo:

Art. 1º Esta Lei estabelece os requisitos e as condições para que a União, as suas autarquias e fundações, e os devedores ou as partes adversas realizem transação resolutiva de litígio relativo à cobrança de créditos da Fazenda Pública, de natureza tributária ou não tributária.

§ 1º A União, em juízo de oportunidade e conveniência, poderá celebrar transação em quaisquer das modalidades de que trata esta Lei, sempre que, motivadamente, entender que a medida atende ao interesse público.

§ 2º Para fins de aplicação e regulamentação desta Lei, serão observados, entre outros, os princípios da isonomia, da capacidade contributiva, da transparência, da moralidade, da razoável duração dos processos e da eficiência e, resguardadas as informações protegidas por sigilo, o princípio da publicidade.

§ 3º A observância do princípio da transparência será efetivada, entre outras ações, pela divulgação em meio eletrônico de todos os termos de transação celebrados, com informações que viabilizem o atendimento do princípio da isonomia, resguardadas as legalmente protegidas por sigilo.

§ 4º Aplica-se o disposto nesta Lei:

I - aos créditos tributários não judicializados sob a administração da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Economia;

II - à dívida ativa e aos tributos da União, cujas inscrição, cobrança e representação incumbam à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, nos termos do art. 12 da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993; e

III - no que couber, à dívida ativa das autarquias e das fundações públicas federais, cujas inscrição, cobrança e representação incumbam à Procuradoria-Geral Federal, e aos créditos cuja cobrança seja competência da Procuradoria-Geral da União, nos termos de ato do Advogado-Geral da União e sem prejuízo do disposto na Lei nº 9.469, de 10 de julho de 1997.

§ 5º A transação de créditos de natureza tributária será realizada nos termos do art. 171 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional).

(...)

Art. 3º A proposta de transação deverá expor os meios para a extinção dos créditos nela contemplados e estará condicionada, no mínimo, à assunção pelo devedor dos compromissos de:

I - não utilizar a transação de forma abusiva, com a finalidade de limitar, de falsear ou de prejudicar, de qualquer forma, a livre concorrência ou a livre iniciativa econômica;

II - não utilizar pessoa natural ou jurídica interposta para ocultar ou dissimular a origem ou a destinação de bens, de direitos e de valores, os seus reais interesses ou a identidade dos beneficiários de seus atos, em prejuízo da Fazenda Pública federal;

III - não alienar nem onerar bens ou direitos sem a devida comunicação ao órgão da Fazenda Pública competente, quando exigido em lei;

IV - desistir das impugnações ou dos recursos administrativos que tenham por objeto os créditos incluídos na transação e renunciar a quaisquer alegações de direito sobre as quais se fundem as referidas impugnações ou recursos; e

V - renunciar a quaisquer alegações de direito, atuais ou futuras, sobre as quais se fundem ações judiciais, inclusive as coletivas, ou recursos que tenham por objeto os créditos incluídos na transação, por meio de requerimento de extinção do respectivo processo com resolução de mérito, nos termos da alínea c do inciso III do caput do art. 487 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil).

§ 1º A proposta de transação deferida importa em aceitação plena e irretratável de todas as condições estabelecidas nesta Lei e em sua regulamentação, de modo a constituir confissão irrevogável e irretratável dos créditos abrangidos pela transação, nos termos dos arts. 389 a 395 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil).

§ 2º Quando a transação envolver moratória ou parcelamento, aplica-se, para todos os fins, o disposto nos incisos Ia VI do caput do art. 151 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966.

§ 3º Os créditos abrangidos pela transação somente serão extintos quando integralmente cumpridas as condições previstas no respectivo termo.

A Lei nº 13.988/2020 previu três modalidades de transação: 1) na cobrança de exigências da União e de suas autarquias e fundações públicas federais (art. 10 ao art. 15), envolvendo créditos inscritos em dívida ativa, trazendo benefícios para o devedor na celebração (art. 11), cuja competência regulamentar foi confiada ao PGFN e ao AGU (art. 14 e art. 15); 2) por adesão no contencioso tributário e aduaneiro de relevante e disseminada controvérsia jurídica (art. 16), com reduções definidas (art. 17), e regulamentação pelo Ministro de Estado da Economia (art. 21) e, no que couber, pelo PGFN (art. 17) e pelo Secretário Especial da Receita Federal do Brasil (art. 22); e 3) por adesão no contencioso tributário de pequeno valor (lançamento fiscal ou controvérsia não superior a 60 salários mínimos, art. 23), com benefícios (art. 25) e regulamentação pelo Ministro da Fazenda, e, no que couber, pelo PGFN e pelo Secretário Especial da Receita Federal do Brasil (art. 23 e art. 27).

Há vários atos normativos regulamentares editados (dentre eles as Portarias PGFN nº 14.402/2020 e nº 9.924/2020) estabelecendo requisitos e condições para que a União Federal, suas autarquias e fundações e os devedores ou partes adversas realizem transação resolutiva de litígio relativo à cobrança de créditos da Fazenda Pública, de natureza tributária ou não tributária.

No caso dos autos, trata-se de ação de procedimento comum ajuizada pela apelante, visando à declaração do direito à transação tributária, tendo afirmado na inicial que não se valeu anteriormente de pedido administrativo. Nesse sentido, afirma, que possui os seguintes débitos (id nº 276225591, pág. 02):

 

1. Débitos parcelados junto a PGFN – R$ 4.417.547,06:

• Parcelamento 4649327, saldo devedor em 08.08.2022 de R$ 3.550.592,10 (parcelamento com desconto de 35% aplicado ao débito);

• Parcelamento 6374917, saldo devedor em 08.08.2022 de R$ 117.563,59 (parcelamento com desconto de 0,16% aplicado ao débito);

• Parcelamento 6374941, saldo devedor em 08.08.2022 de R$ 233.607,12;

• Transação 6374870, saldo devedor em 08.08.2022 de R$ 515.784,25.

 

2. Débitos não parcelados na PGFN – R$ 70.284,30:

• CDA 80 3 22 002463-07 no valor de R$ 70.284,30 – (doc. 8).

 

3. Débitos pendentes de liquidação junto a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil – R$ 720.226,00:

• Total de R$ 720.226,00, valor atualizado até 08.08.2022, conforme apresentado no DARF expedido pela própria RFB – (doc. 9) e (doc. 10).

 

Alega que tem como aptos para transação créditos relativos a prejuízo fiscal (R$ 4.098.662,31) e a base de cálculo negativa da CSLL (R$ 4.098.662.31). Além disso, também seria titular de direito de crédito, decorrente de ação judicial já transitada em julgado, que lhe fora cedido por TASOKO, LOTURCO E ALMEIDA SOCIEDADE DE ADVOGADOS.

Quanto aos créditos decorrente dos prejuízos fiscais e da base de cálculo negativa da CSLL, decidiu o juízo de origem que faltaria à parte autora interesse processual, tendo em vista que, nos termos do art. 74 da Lei Federal nº 9.430/1996, poderiam em tese, ser objeto de compensação pelo próprio contribuinte, ressaltando, todavia, que em se tratando de débitos já encaminhados à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, essa compensação seria vedada (art. 74, § 3º, III, da Lei nº 9.430/96).

A apelante argumenta que, no caso, não se discute a compensação, mas a possibilidade de transação, por iniciativa do devedor, conforme disposto nos arts. 10 e 10-A da Lei nº 13.988/2020 e mediante a utilização dos créditos mencionados conforme previsto no art. 11, IV, da mesma lei. 

Embora, a meu ver, ao presente caso não seja aplicado o art. 74 da Lei nº 9.430/1996, na verdade, o que pretende a recorrente é que se imponha à apelada que aceite a transação nos termos mencionados, o que não é possível, uma vez que a Lei nº 13.988/2020 prevê, expressamente, que é dado à União Federal, em juízo de oportunidade e conveniência, aceitar, ou não, a sua realização, e desde que atendido o interesse público (art. 1º, § 1º). Em outras palavras, foi reservada à União, a discricionariedade quanto à celebração ou não do acordo, de modo que não há direito subjetivo de a transação ser realizada nos termos pretendidos pelo devedor, se o ente estatal justificar a ausência de interesse.

Por outro lado, embora não se possa impor à União que realize a transação nos termos propostos pela apelante, também é certo que o juízo de discricionariedade tem limites jurídicos (formais e materiais), mesmo quando instituída por conceitos jurídicos indeterminados, cabendo o controle judicial apenas se houver manifesta violação desses limites. E, no caso dos autos, ainda que não se dispense a manifestação da autoridade competente, é possível afirmar, conforme o disposto no art. 14, parágrafo único, da Lei nº 13.988/2020, que um dos fatores a serem sopesados quanto à aceitação da transação diz respeito ao grau de recuperabilidade das dívidas, além do “...insucesso dos meios ordinários e convencionais de cobrança e a vinculação dos benefícios a critérios preferencialmente objetivos que incluam ainda a sua temporalidade, a capacidade contributiva do devedor e os custos da cobrança”

Com isso, conclui-se que são vários os fatores a serem considerados pela autoridade competente diante de uma proposta de transação, não sendo possível ao Poder Judiciário substituir-se à Administração para impor a sua realização.

Os mesmos fundamentos são suficientes para se concluir pela improcedência do pedido quanto à alegação da recorrente de que dispõe de crédito líquido e certo, objeto de cessão, apto a obrigar a União a aceitar a proposta de transação. Conforme exposto, além da existência de vários requisitos a serem considerados discricionariamente pela autoridade competente, o que por si só leva a rejeição do pedido formulado por meio desta ação, o crédito mencionado pela recorrente, de fato não se reveste dos atributos necessários à liquidação dos débitos, quer em relação ao valor ou mesmo quanto à sua titularidade, revelando-se inoportuna a discussão quanto ao fato de a recuperação do indébito ser efetivada mediante compensação ou restituição, eis que isso nada acrescenta à análise do cabimento, ou não, da transação no caso concreto.

Acerca das questões em apreciação, transcrevo julgado deste Tribunal:

 

DIREITO TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. PARCELAMENTO. SISPAR. MIGRAÇÃO PARA A TRANSAÇÃO EXCEPCIONAL. LEI 13.988/2020. RECUPERABILIDADE E CAPACIDADE ECONÔMICA. DISCRICIONARIEDADE ADMINISTRATIVA. REVISÃO JUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE. PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA. INEXISTÊNCIA.

1. A Lei 13.988/2020 estipulou, por critérios de conveniência e oportunidade, hipóteses em que seria admissível “transação resolutiva de litígio relativo à cobrança de créditos da Fazenda Pública, de natureza tributária ou não tributária”, disciplinando benefícios concedidos e vedações aplicáveis. A transação excepcional é destinada à recuperação de créditos classificados como irrecuperáveis ou de difícil recuperação, em relação aos quais a Administração Pública deve estabelecer, objetivamente e no cumprimento do interesse público, critérios de enquadramento da dívida.

2. O artigo 14 da citada lei atribuiu ao Procurador-Geral da Fazenda Nacional a regulamentação infralegal, editando-se a Portaria PGFN 14.402/2020, que “estabelece as condições para transação excepcional na cobrança da dívida ativa da União, em função dos efeitos da pandemia causada pelo coronavírus (COVID-19) na perspectiva de recebimento de créditos inscritos”. Examinado o ato normativo, vislumbra-se que a finalidade da edição da modalidade de transação não é apenas minorar efeitos fiscais negativos da pandemia em favor do contribuinte, mas oportunizar recebimento de créditos, até mesmo os reputados irrecuperáveis, em momento em que o erário foi altamente demandado e, em contrapartida, houve significativa redução da arrecadação. Não houve extrapolação do conteúdo legal, o qual não fixou todas as condições, exigências e circunstâncias formais e materiais para adesão à transação ou parcelamento, determinando apenas que fosse atendida pela regulamentação a previsão de critérios objetivos que observassem, entre outros, a idade da dívida inscrita, a capacidade contributiva do devedor e os custos da cobrança judicial.

3. Fixou-se, objetivamente, que o grau de recuperabilidade dos créditos inscritos em dívida ativa da União é mensurado a partir da verificação da situação econômica e da capacidade de pagamento dos devedores inscritos (artigo 3º), adotando-se, entre outros critérios: “I - para os devedores pessoa jurídica, quando for o caso: a) receita bruta e demais informações declaradas na Escrituração Contábil Fiscal (ECF); b) receita bruta e demais informações declaradas na Escrituração Fiscal Digital da contribuição para o PIS/PASEP, COFINS e Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta (EFD-Contribuições); c) informações declaradas na Escrituração Fiscal Digital de Retenções e Outras Informações Fiscais (EFD-Reinf); d) valores registrados em Notas Fiscais Eletrônicas (NF-e) de entrada e de saída; e) informações declaradas ao Sistema de Escrituração Digital das Obrigações Fiscais, Previdenciárias e Trabalhistas (eSocial); f) informações declaradas no Programa Gerador do Documento de Arrecadação do Simples Nacional (PGDAS) e na Declaração de Informações Socioeconômicas e Fiscais (DEFIS); g) massa salarial declarada nas Guias de Recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e Informações à Previdência Social (GFIP); h) débitos declarados nas Declarações de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF); i) valores de rendimentos pagos ao devedor e declarados por terceiros em Declarações de Imposto sobre a Renda Retido na Fonte (DIRF); j) receita corrente líquida informada à Secretaria do Tesouro Nacional por Estados, Municípios e pelo Distrito Federal. II - para os devedores pessoa física: a) valores dos rendimentos declarados na Declaração de Ajuste Anual do Imposto sobre a Renda das Pessoas Físicas (DIRPF); b) valores de bens e direitos declarados na Declaração de Ajuste Anual do Imposto sobre a Renda das Pessoas Físicas (DIRPF); c) valores de rendimentos pagos ao devedor e declarados por terceiros em Declarações de Imposto sobre a Renda Retido na Fonte (DIRF)” (artigo 4º).

4. Adicionalmente, expediu-se a Portaria 9.917/2020, que “regulamenta a transação na cobrança da dívida ativa da União”. Tal normativo, igualmente, elege, entre outros, a capacidade de pagamento como critério elegível aos pretensos aderentes.

5. No caso, consta que a impetrante pretendeu migração da transação extraordinária para a transação excepcional da Lei 13.988/2020. Para tanto, deduziu pedido de “Revisão de Capacidade de Pagamento para fins de transação”, em que impugnou os critérios de recuperabilidade dos créditos e da capacidade de pagamento, mormente porque alegou ter sofrido diminuição de tal capacidade pela pandemia. A autoridade tributária, observando o artigo 21 da Portaria 9.917/2000, determinou a juntada de documentos, não provando a apelante o atendimento satisfatório da solicitação fiscal.

6. Analisar a capacidade de pagamento do contribuinte, a partir de documentos contábeis, financeiros, fiscais e outros do contribuinte, exige conhecimento técnico, que extrapola mero exame jurídico, sendo incompatível com o rito especial do mandado de segurança. De toda sorte, a impetrante não juntou aos autos tais elementos, deixando de apresentar prova pré-constituída das alegações.

7. Descabe ao Judiciário, assumindo competência regulamentar discricionária própria do Executivo, definir qual conteúdo deveria constar do ato normativo ou mesmo, no caso, reputar, genericamente, cumpridos critérios de recuperabilidade fiscal ou enquadrar o contribuinte em tal ou qual situação econômica e capacidade de pagamento, permitindo, à míngua de qualquer previsão legal e apenas com fundamento abstrato na mens legis, adesão e concessão de benefícios no âmbito da transação excepcional da Lei 13.988/2020 e Portaria PGFN  14.402/2020.

8. Apelação desprovida.

(TRF3, Apel. Cível nº 5002521-88.2022.4.03.6126, 3ª Turma, j. 01/03/2023, v.u., Publ. 09/03/2023).

 

Ante o exposto, julgo prejudicado o pedido de antecipação da tutela recursal, afasto a preliminar suscitada pela apelante e nego provimento à apelação da parte autora.

Em vista trabalho adicional desenvolvido na fase recursal e considerando o conteúdo da controvérsia, com fundamento no art. 85, §11, do CPC, a verba honorária fixada em primeiro grau de jurisdição deve ser majorada em 10%, respeitados os limites máximos previstos nesse mesmo preceito legal, e observada a publicação da decisão recorrida a partir de 18/03/2016, inclusive (E.STJ, Agravo Interno nos Embargos de Divergência 1.539.725/DF, Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, 2ª seção, DJe de 19/10/2017). 

É o voto. (destaquei)

 

Conforme trechos destacados do voto, todas as questões suscitadas foram enfrentadas pelo julgado, pretendendo a embargante, na verdade, a sua rediscussão, o que não se mostra adequado por meio de embargos de declaração.

Em vista disso, constato que o acórdão recorrido tem fundamentação completa e regular para a lide posta nos autos. Ademais, o órgão julgador deve solucionar as questões relevantes e imprescindíveis para a resolução da controvérsia, não sendo obrigado a rebater (um a um) todos os argumentos trazidos pelas partes quando abrangidos pelas razões adotadas no pronunciamento judicial. A esse respeito, exemplifico com os seguintes julgados do E.STJ: AgInt nos EDcl no AREsp 1.290.119/RS, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe 30/08/2019; AgInt no REsp 1.675.749/RJ, Rel. Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 23/08/2019; REsp 1.817.010/PR, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 20/08/2019; AgInt no AREsp 1.227.864/RJ, Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 20/11/2018; e AREsp 1535259/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 07/11/2019, DJe 22/11/2019.

Ante o exposto, rejeito os embargos de declaração.

É o voto.

 

 

 

 



E M E N T A

 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. TRANSAÇÃO TRIBUTÁRIA. LEI 13.988/2020. PREJUÍZOS FISCAIS. CRÉDITO OBJETO DE CESSÃO. DISCRICIONARIEDADE DA ADMINISTRAÇÃO. PARÂMETROS LEGAIS. DIREITO SUBJETIVO DO DEVEDOR. INEXISTÊNCIA.

- Nos termos do art. 1.022 do CPC/2015, os embargos de declaração podem ser opostos contra qualquer decisão judicial para esclarecer obscuridade, eliminar contradição, suprir omissão de ponto ou questão, e corrigir erro material. E, conforme dispõe o art. 1.025 do mesmo CPC/2015, consideram-se incluídos no acórdão os elementos que o embargante suscitou, para fins de pré-questionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade.

- Embora essa via recursal seja importante para a correção da prestação jurisdicional, os embargos de declaração não servem para rediscutir o que já foi objeto de pronunciamento judicial coerente e suficiente na decisão recorrida. Os efeitos infringentes somente são cabíveis se o julgado tiver falha (em tema de direito ou de fato) que implique em alteração do julgado, e não quando desagradar o litigante.

- O acórdão recorrido tem fundamentação completa e regular para a lide posta nos autos. Ademais, o órgão julgador deve solucionar as questões relevantes e imprescindíveis para a resolução da controvérsia, não sendo obrigado a rebater (um a um) todos os argumentos trazidos pelas partes quando abrangidos pelas razões adotadas no pronunciamento judicial. Precedentes.

- Embargos de declaração rejeitados.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma decidiu, por unanimidade, rejeitar os embargos de declaração, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.