Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo
14ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5000294-89.2021.4.03.6311

RELATOR: 40º Juiz Federal da 14ª TR SP

RECORRENTE: BORGES MOREIRA DA SILVA

Advogados do(a) RECORRENTE: ALEX RAMOS OLIVEIRA RAMIREZ - SP374362-A, CESAR AUGUSTO DOS SANTOS - SP116687-N

RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
JUIZADO ESPECIAL FEDERAL  DA 3ª REGIÃO
TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO

 

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5000294-89.2021.4.03.6311

RELATOR: 40º Juiz Federal da 14ª TR SP

RECORRENTE: BORGES MOREIRA DA SILVA

Advogados do(a) RECORRENTE: ALEX RAMOS OLIVEIRA RAMIREZ - SP374362-A, CESAR AUGUSTO DOS SANTOS - SP116687-N

RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

 

 

R E L A T Ó R I O

 

 

Trata-se de recurso inominado interposto pela parte autora, em face da r. sentença que julgou IMPROCEDENTE o pedido que pretendia a condenação do INSS a reconhecer e averbar como tempo especial o período de 29/10/1989 a 06/1997 (como policial miliar exercido na Polícia Militar do Estado de São Paulo), bem como, para conceder o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, em favor da parte autora.

Nas razões recursais, a parte autora requer o reconhecimento da especialidade do período de 29/10/1989 a 06/1997, que trabalhou como policial miliar na Polícia Militar do Estado de São Paulo, que se enquadra na categoria profissional descrita no item 2.5.7 do Decreto 5.383/64, por estar sujeita ao gente nocivo periculosidade, em grau máximo. Por estas razões, pretende a reforma da r. sentença.

É o relatório.

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
JUIZADO ESPECIAL FEDERAL  DA 3ª REGIÃO
TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO

 

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5000294-89.2021.4.03.6311

RELATOR: 40º Juiz Federal da 14ª TR SP

RECORRENTE: BORGES MOREIRA DA SILVA

Advogados do(a) RECORRENTE: ALEX RAMOS OLIVEIRA RAMIREZ - SP374362-A, CESAR AUGUSTO DOS SANTOS - SP116687-N

RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

 

V O T O

Da Contagem Recíproca e Diferenciada de Tempo de Serviço:

A contagem recíproca é a possibilidade de aproveitamento do tempo de contribuição realizado em determinado regime previdenciário para fins de efetiva utilização em outro, hipótese em que haverá a compensação financeira entre os regimes, o que é previsto no art. 94 da Lei 8.213/91 e disciplinado pela Lei 9.796/99 (dispõe sobre a compensação financeira entre regimes), regulamentada pelo Decreto 10.188/2019.

A regra encontra seu fundamento de validade na Constituição Federal, no art. 201, § 9º, nos seguintes termos:

§ 9º. Para fins de aposentadoria, será assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição entre o Regime Geral da Previdência Social e os regimes próprios da previdência social, e destes entre si, observada a compensação financeira, de acordo com os critérios estabelecidos em lei (Redação dada pela EC nº 103, de 2019)

§ 9º-A. O tempo de serviço militar exercido nas atividades de que tratam os arts. 42, 142 e 143 e o tempo de contribuição ao Regime Geral de Previdência Social ou a regime próprio de previdência social terão contagem recíproca para fins de inativação militar ou aposentadoria, e a compensação financeira será devida entre as receitas de contribuição referentes aos militares e as receitas de contribuição aos demais regimes.”

A efetivação da contagem recíproca é feita por meio da emissão da Certidão de Tempo de Contribuição (CTC), a qual deve ser emitida pelo regime de origem e averbada no regime instituidor.

Além da compensação financeira, para que seja possível a contagem recíproca deve-se atender aos requisitos legais, que estão previstos no art. 96 da Lei 8.213/91, quais sejam: I) não será admitida a contagem em dobro ou em outras condições especiais; II) é vedada a contagem de tempo de serviço público com o de atividade privada, quando concomitantes; III) não será contado por um sistema o tempo de serviço utilizado para concessão de aposentadoria pelo outro; IV) o tempo de serviço anterior ou posterior à obrigatoriedade de filiação à Previdência Social só será contado mediante indenização da contribuição correspondente ao período respectivo, com acréscimo de juros moratórios de 0,5% ao mês, capitalizados anualmente, e multa de 10%; ..(...) IX ) para fins de elegibilidade às aposentadorias especiais referidas no § 4º do art. 40 e no § 1º do art. 201 da Constituição Federal, os períodos reconhecidos pelo regime previdenciário de origem como de tempo especial, sem conversão em tempo comum, deverão estar incluídos nos períodos de contribuição compreendidos na CTC e discriminados de data a data. (Incluído pela Lei 13.846 de 2019).

Destaque-se que são requisitos cumulativos, e não será permitida a contagem do período em dobro, na medida em que, por exigir a compensação financeira de cada competência, cada período deve corresponder a uma respectiva contribuição específica.

O Supremo Tribunal Federal submeteu a regime de repercussão geral o RE 1.014.286-SP, a seguinte questão: “Possibilidade de aplicação das regras do regime geral de previdência social para a averbação do tempo de serviço prestado em atividades exercidas sob condições especiais, nocivas à saúde ou à integridade física de servidor público, com conversão do tempo especial em comum, mediante contagem diferenciada”

Assim, STF finalizou o julgamento em 21.08.2020, e, por maioria, fixou a seguinte tese ao Tema 942: “Até a edição da Emenda Constitucional nº 103/2019, o direito à conversão, em tempo comum, do prestado sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física de servidor público decorre da previsão de adoção de requisitos e critérios diferenciados para a jubilação daquele enquadrado na hipótese prevista no então vigente inciso III do § 4º do art. 40 da Constituição da República, devendo ser aplicadas as normas do regime geral de previdência social relativas à aposentadoria especial contidas na Lei 8.213/1991 para viabilizar sua concretização enquanto não sobrevier lei complementar disciplinadora da matéria. Após a vigência da EC nº 103/2019, o direito à conversão em tempo comum, do prestado sob condições especiais pelos servidores obedecerá à legislação complementar dos entes federados, nos termos da competência conferida pelo art. 40, § 4º-C, da Constituição da República” (publicada em 24.09.2020).

No referido julgamento, o Supremo entendeu que é possível a aplicação das regras do Regime Geral de Previdência Social para a averbação do tempo de serviço prestado em atividades exercidas sob condições especiais, nocivas à saúde ou à integridade física de servidor público, com conversão do tempo especial em comum, mediante contagem diferenciada, sendo possível que os servidores públicos convertam o tempo especial trabalhado, ao menos até 13/11/2019, em comum, para fins de concessão de aposentadoria especial.

No citado julgamento, o Ministro Luís Roberto Barroso apresentou voto divergente do relator Luiz Fux (que votou contrariamente à tese), assim se manifestou: “Entendo que a vedação à contagem de tempo ficto (CF, art. 40, § 10) não proíbe o cômputo diferenciado de tempo de serviço especial, pois de tempo ficto não se trata. O art. 40, § 10, da Constituição, a meu ver, destina-se a proscrever a contagem, como tempo de contribuição, de férias não gozadas, licenças etc., em suma, de tempo não trabalhado. A necessidade de “requisitos e critérios diferenciados” no que diz respeito ao tempo de serviço prestado em condições prejudiciais à saúde e à integridade física decorre da letra do art. 40, § 4º, III, da Constituição”.

Assim, a partir do julgamento do Tema 942 do STF, o servidor público passa a ter direito a conversão de tempo especial em tempo comum, como o trabalhador da iniciativa privada (do Regime Geral da Previdência Social). No entanto, a conversão do tempo especial em comum é permitida somente para o trabalho realizado em condições especiais (agentes nocivos ou perigosos) até o dia 13/11/2019, pois a Emenda Constitucional vedou de forma expressa a conversão para períodos trabalhados após a aprovação da EC 103/2019.

Portanto, se é permitido ao servidor público converter tempo especial em tempo comum, no âmbito do Regime Próprio dos Servidores Públicos, assim, como ao trabalhador da iniciativa privada, no âmbito do Regime Geral da Previdência Social, não há que se dizer que tal regra também não é estendida ao ex-servidor público que migrou para o Regime Geral da Previdência Social, e nele pretende se aposentar.

Considerando que os sistemas previdenciários se comunicam, sobretudo a partir da perspectiva da contagem recíproca do tempo de contribuição, não se pode desprezar que esse tempo de atividade especial convertida em tempo de atividade comum possa produzir efeitos seja no RGPS, seja no RPPP, desde que processada, em momento oportuno e posterior, a compensação financeira entre os distintos regimes, nos moldes da Lei 9.796/98.

É que, existente prévia fonte de custeio que propicie a conversão do tempo de atividade especial em tempo de atividade comum, não estará caracterizado o famigerado tempo ficto.

Do mesmo modo, não há que se falar que o art. 96, I, da Lei 8.213/91, quando veda a “contagem em dobro” ou “em outras condições especiais”, proíbe a situação do caso presente, pois a esta não se amolda.

A conversão de tempo de atividade especial em tempo de atividade comum, equivale, mais precisamente, a uma forma de adaptação e flexibilização que o ordenamento jurídico franqueia àqueles que trabalharam durante toda sua carreira (ou em parte dela) em atividades que o exponham a agentes nocivos, assegurando, uma compensação previdenciária parcial diante da exposição aos agentes insalubres.

À medida em que a aposentadoria especial por exposição a fatores prejudiciais à saúde é reconhecida no RGPS e também no RPPS (ainda que pendente de regulamentação), não há razão para se impedir o aproveitamento do tempo de atividade especial convertido em tempo de atividade comum na contagem recíproca. Como dito, não se trata de óbice expresso previsto pelo ordenamento jurídico, mas de caso de lacuna normativa que deve ser compreendida em favor dos segurados.

Por fim, é importante frisar que a Lei 13.846/21019 inclui o inciso IX ao art. 96 da Lei 8.213/91 dispondo que para fins de elegibilidade às aposentadorias especiais referidas no § 4º do art. 40 e no § 1º do art. 201 da Constituição Federal, os períodos reconhecidos pelo regime previdenciário de origem como de tempo especial, sem conversão em tempo comum, deverão estar expressamente incluídos nos períodos de contribuição compreendidos (como especial) na Certidão de Tempo de Contribuição (CTC) e discriminados data a data.

Concluindo, o tempo de serviço especial reconhecido pelo regime de origem somente pode ser averbado no regime instituidor caso tenha ocorrido a contribuição com a discriminação das datas da competência no CTC. Ademais, tal período especial deve ser expressamente reconhecido na CTC pelo regime de origem. E caso não reconhecido, a atividade especial deverá ser efetivamente comprovada nos autos, através dos formulários próprios previdenciários. Ademais, devem ser cumpridos os requisitos dispostos no art. 96 da Lei 8.213/91, em especial, a compensação financeira, de acordo com os critérios estabelecidos na Lei 9.796/98.

Nessa linha, a TNU afetou o Tema 278, que fixou a seguinte tese: “I – O(A) segurado(a) que trabalhava sob condições especiais e passou, sob qualquer condição, para regime previdenciário diverso, tem direito à expedição de certidão desse tempo identificado como especial, discriminado de data a data, ficando a conversão em comum e a contagem recíproca à critério do regime de destino, nos termos do art. 96, IX, da Lei nº 8.213/1991; II – Na contagem recíproca entre o Regime Geral da Previdência Social – RGPS e o Regime Próprio da União, é possível a conversão de tempo especial em comum, cumprido até o advento da EC nº 103/2019”.

Do Caso Concreto:

Em sede recursal, a parte autora requer o reconhecimento do período especial de 29/10/1989 a 06/1997 (como policial miliar exercido na Polícia Militar do Estado de São Paulo).

Pois bem.

No que se refere ao período de 29/10/1989 a 30/06/1997, foi anexado aos autos a Certidão de Tempo de Contribuição (CTC), na qual consta que a parte autora exerceu o cargo efetivo de “SOLDADO PM”, com lotação na Polícia Militar do Estado de São Paulo, com regime jurídico estatutário dos militares do Estado de São Paulo, no período de 29/10/1984 a 06/07/1997.

Ainda, foi anexado aos autos o LAUDO DE INSALUBRIDADE, emitido pelo Governo do Estado de São Paulo, Secretaria de Estado de Segurança Pública, no qual consta que o autor atuou no cargo de SOLDADO PM, na Rádio Patrulhamento Padrão, sem exposição a agentes nocivos (físico, químico ou biológico). No entanto, na conclusão do laudo, informa a exposição ao grau de insalubridade MÁXIMO, na atividade e/ou operação e na unidade. Consta a presença do responsável técnico pelos registros ambientais como sendo o Dr. Wilson Carlos Silva Vieira, Médico do Trabalho – CRM 32.847. Por fim, o laudo foi assinado por José Josué Pereira - 2º Tenente da PM – P/1.

Consta a juntada do extrato do CNIS da parte autora, no qual consta a anotação de vínculo no período de 29/10/1984 a 01/07/1997 junto à SÃO PAULO SECRETARIA DE SEGURANÇA PÚBLICA, pelo regime próprio dos servidores públicos.

Como é sabido, o enquadramento por categoria profissional somente é possível até 28/04/1995.

A previsão de enquadramento para os bombeiros, investigadores e guardas, consoante item 2.5.7 do Anexo I ao Decreto 53.831/64, era prevista pela legislação: “2.5.7 - EXTINÇÃO DE FOGO, GUARDA. - Bombeiros, Investigadores, Guardas - Perigoso - 25 anos - Jornada normal”. Por seu turno, tal profissão não veio mais prevista no rol das “categorias profissionais” nos demais Decretos.

Desse modo, até 28/04/1995 é possível se reconhecer a similaridade da atividade do policial militar exercida no regime próprio dos servidores públicos à do guarda armado (item 2.5.7 do Anexo I ao Decreto 53.831/64), exercida no regime geral da previdência social, pois ambas possuem elementos que autorizam a conclusão de que de idêntica situação de insalubridade, penosidade ou periculosidade, justificando a semelhança entre a atividade do autor e a atividade paradigma, nos termos dispostos no Tema 198 da TNU.

Nesse sentido, a TNU julgou o Tema 198 fixando a seguinte tese: No período anterior a 29/04/1995, é possível fazer-se a qualificação do tempo de serviço como especial a partir do emprego da analogia, em relação às ocupações previstas no Decreto nº 53.831/64 e no Decreto nº 83.080/79. Nesse caso, necessário que o órgão julgador justifique a semelhança entre a atividade do segurado e a atividade paradigma, prevista nos aludidos decretos, de modo a concluir que são exercidas nas mesmas condições de insalubridade, periculosidade ou penosidade. A necessidade de prova pericial, ou não, de que a atividade do segurado é exercida em condições tais que admitam a equiparação deve ser decidida no caso concreto. (PEDILEF 0502252-37.2017.4.05.8312/PE, REL. BIANOR ARRUDA BEZERRA NETO- TURMA NACIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO, publicado em 03/09/2019).

Desse modo, viável o reconhecimento da especialidade do período de 29/10/1989 a 28/04/1995, por enquadramento na categoria profissional similar à de guarda armado.

Do mesmo modo, viável o reconhecimento da especialidade no período de 29/04/1995 a 30/06/1997, uma vez que foi comprovada a exposição ao agente nocivo insalubridade/periculosidade em formulário próprio (LAUDO DE INSALUBRIDADE).

Reconheço a regularidade do Laudo de Insalubridade apresentado, visto que consta a presença de responsável técnico pelos registros ambientais (Dr. Wilson Carlos Silva Vieira, Médico do Trabalho – CRM 32.847), atendendo, assim, o disposto no Tema 208 da TNU.

No que se refere ao agente nocivo periculosidade, é importante salientar que o Decreto 2.172/97 excluiu o trabalho perigoso do rol de agentes nocivos.

É bem verdade que o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.306.113/SC (DJ 7-3-2013), de que foi relator o Sr. Ministro Herman Benjamin, submetido ao regime de recursos repetitivos, definiu que as atividades nocivas à saúde relacionadas nas normas regulamentadoras são meramente exemplificativas, podendo o caráter especial do trabalho ser reconhecido em outras atividades desde que permanentes, não ocasionais e nem intermitentes.

É importante citar o art. 193 da CLT, que prevê que: “São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a:  I - inflamáveis, explosivos ou energia elétrica; II - roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial. (…)

Nessa linha, a NR-16 do MTb também trata das “Atividades e Operações Perigosas”, a serem comprovadas mediante laudo técnico elaborado por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho, nos termos do art. 195 da CLT, dentre elas, as atividades descritas nos Anexos, tais como: “atividades e operações perigosas com explosivos; atividades e operações perigosas com inflamáveis; atividades e operações perigosas com exposição a roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal e patrimonial; atividades e operações perigosas com energia elétrica; atividades perigosas em motocicleta; atividades e operações perigosas com radiações ionizantes ou substâncias radioativas”.

Portanto, a periculosidade pode ser reconhecida como agente nocivo, desde que comprovada por laudo técnico elaborado por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho, com exposição de forma habitual e permanente.

Nessa linha, a atividade de policial militar exercida no regime próprio, pode ser equiparada à atividade de guarda/vigilante no regime geral, de modo que ambas são exercidas com exposição ao agente nocivo periculosidade, visto que a vigilância de locais públicos e privados, a vigilância patrimonial, bem como a vigilância de pessoas, são atividades que sujeitam o agente a real perigo de integridade física e de sua própria vida.

No PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL 05020133420154058302, referente ao Tema Representativo de Controvérsia 128, foi revisado o Tema 87, firmando a seguinte tese: “é possível o reconhecimento de tempo especial prestado com exposição a agente nocivo periculosidade, na atividade de vigilante, em data posterior a 05/03/1997, desde que laudo técnico (ou elemento material equivalente) comprove a permanente exposição à atividade nociva. (PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL 05020133420154058302, JUIZ FEDERAL FREDERICO AUGUSTO LEOPOLDINO KOEHLER, DJ 04/10/2016.)

Novamente a questão foi afetada pelo STJ, no TEMA 1.031, no REsp 1831371/SP julgado em 09/12/2020, bem como, os Embargos de Declaração interpostos, em 28/09/2021, firmando a seguinte tese: “É possível o reconhecimento da especialidade da atividade de vigilante, mesmo após EC 103/2019, com ou sem arma de fogo, em data posterior à edição da Lei 9.032/95 e do Decreto 2.172/97, desde que haja comprovação da efetiva nocividade da atividade por qualquer meio de prova até 05.03.1997, momento em que se passa a exigir a apresentação de laudo técnico ou elemento material equivalente, para comprovar a permanente, não ocasional, nem intermitente, exposição a atividade nociva, que coloque em risco a integridade física do segurado”.

Portanto, deve-se levar em conta que a profissão de policial militar, expõe intuitivamente o trabalhador a riscos, nocividades, perigos, danos físicos e emocionais, acima da normalidade, especialmente, em localidades nas quais a violência urbana é demasiada, causando ao trabalhador ansiedade prolongada, medos constantes, inseguranças, as quais não são causadas a outros tipos de profissionais (que trabalham fora da área de segurança pública e privada), justificando, assim, o reconhecimento da especialidade da atividade, diante dos riscos à integridade física e à saúde do trabalhador, desde que comprovada a exposição a periculosidade de forma habitual e permanente, como no caso em concreto.

No que toga à contagem recíproca, é importante salientar que o Tema 942 do STF firmou a seguinte tese: “Até a edição da Emenda Constitucional nº 103/2019, o direito à conversão, em tempo comum, do prestado sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física de servidor público decorre da previsão de adoção de requisitos e critérios diferenciados para a jubilação daquele enquadrado na hipótese prevista no então vigente inciso III do § 4º do art. 40 da Constituição da República, devendo ser aplicadas as normas do regime geral de previdência social relativas à aposentadoria especial contidas na Lei 8.213/1991 para viabilizar sua concretização enquanto não sobrevier lei complementar disciplinadora da matéria. Após a vigência da EC nº 103/2019, o direito à conversão em tempo comum, do prestado sob condições especiais pelos servidores obedecerá à legislação complementar dos entes federados, nos termos da competência conferida pelo art. 40, § 4º-C, da Constituição da República” (publicada em 24.09.2020).

No referido julgamento, o Supremo entendeu que é possível a aplicação das regras do Regime Geral de Previdência Social para a averbação do tempo de serviço prestado em atividades exercidas sob condições especiais, nocivas à saúde ou à integridade física de servidor público, com conversão do tempo especial em comum, mediante contagem diferenciada, sendo possível que os servidores públicos convertam o tempo especial trabalhado, ao menos até 13/11/2019, em comum, para fins de concessão de aposentadoria especial.

Portanto, se é permitido ao servidor público converter tempo especial em tempo comum, no âmbito do Regime Próprio dos Servidores Públicos, assim, como ao trabalhador da iniciativa privada, no âmbito do Regime Geral da Previdência Social, não há que se dizer que tal regra também não é estendida ao ex-servidor público (como no caso concreto, o ex-policial militar) que migrou para o Regime Geral da Previdência Social, e nele pretende se aposentar.

Considerando que os sistemas previdenciários se comunicam, sobretudo a partir da perspectiva da contagem recíproca do tempo de contribuição, não se pode desprezar que esse tempo de atividade especial convertida em tempo de atividade comum possa produzir efeitos seja no RGPS, seja no RPPS, desde que processada, em momento oportuno e posterior, a compensação financeira entre os distintos regimes, nos moldes da Lei 9.796/98.

Portanto, no caso presente, é possível o reconhecimento da atividade especial do período de 29/10/1989 a 30/06/1997, por enquadramento na categoria profissional similar à de guarda armado e a exposição ao agente nocivo periculosidade, de forma habitual e permanente.

Por fim, tratando-se de pedido de revisão de benefício previdenciário, deve ser aplicado o Tema 102 da TNU: “Os efeitos financeiros da revisão da RMI de benefício previdenciário devem retroagir à data do requerimento administrativo do próprio benefício, e não à data do pedido revisional”.

Diante do exposto, dou provimento ao recurso da parte autora para o fim de condenar o INSS a reconhecer e averbar no regime geral da previdência social (RGPS) como tempo especial o período de 29/10/1989 a 30/06/1997, bem como, para revisar o benefício de aposentadoria programada (aposentadoria por tempo de contribuição), implantado em favor da parte autora, com DIB na data da DER do benefício originário.

Condeno o INSS, ainda, ao pagamento dos valores em atraso (parcelas vencidas), devidamente atualizado, em conformidade com a Resolução nº 784/2022 (Manual de Cálculos da Justiça Federal, expedido pelo Conselho da Justiça Federal), a qual incorpora a aplicação da taxa SELIC a partir de 12/2021, e os parâmetros fixados pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema 810 STF), obedecida a prescrição quinquenal.

Deixo de antecipar os efeitos da tutela, uma vez que a parte autora está em gozo de benefício.

Deixo de condenar a parte Recorrente ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios, visto que somente o(a) Recorrente integralmente vencido(a) faz jus a tal condenação, nos termos do art. 55, caput, da Lei 9.099/95.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REVISÃO. ATIVIDADE DE POLICIAL MILITAR. REGIME PRÓPRIO. EXPEDIÇÃO DE CERTIDÃO DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO (CTC). POSSIBILIDADE DE CONTAGEM RECÍPROCA. ENQUADRAMENTO POR CATEGORIA PROFISSIONAL SIMILAR À ATIVIDADE DE GUARDA.  ENQUADRAMENTO POR EXPOSIÇÃO AO AGENTE NOCIVO PERICULOSIDADE COMPROVADA POR LAUDO TÉCNICO. APLICAÇÃO DO TEMAS 942 DO STF E 278 DA TNU.

1.Trata-se de recurso interposto pela parte autora em face da sentença que julgou improcedente o pedido.

 2. No caso em concreto, a parte autora exerceu a atividade de policial militar, no regime próprio, no período de 1989 a 1997. Foi expedida Certidão de Tempo de Contribuição (CTC) para contagem recíproca, com averbação do tempo no regime geral e cômputo como tempo especial. Ainda, foi anexado aos autos Laudo de Insalubridade, comprovando a exposição ao agente periculosidade na atividade de policial militar.

 3. É possível a contagem recíproca e reconhecimento da especialidade no regime geral, efetuando-se a equiparação da atividade de policial militar com a de guarda armado, prevista no item 2.5.7 do Decreto 5.383/64. Reconhecer o enquadramento por categoria profissional a Lei 9.032/95, bem como, após, por exposição ao agente nocivo periculosidade/insalubridade, conforme constou do Laudo anexado aos autos.

4. Aplicação do Tema 942 do STF e Tema 278 da TNU (O(A) segurado(a) que trabalhava sob condições especiais e passou, sob qualquer condição, para regime previdenciário diverso, tem direito à expedição de certidão desse tempo identificado como especial, discriminado de data a data, ficando a conversão em comum e a contagem recíproca à critério do regime de destino, nos termos do art. 96, IX, da Lei nº 8.213/1991; II – Na contagem recíproca entre o Regime Geral da Previdência Social – RGPS e o Regime Próprio da União, é possível a conversão de tempo especial em comum, cumprido até o advento da EC nº 103/2019”).

5. Recurso da parte autora que se dá provimento.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Quarta Turma Recursal do Juizado Especial Federal da Terceira Região - Seção Judiciária de São Paulo decidiu, por unanimidade, dar provimento ao recurso da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.