APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000732-35.2022.4.03.6003
RELATOR: Gab. 43 - DES. FED. ALI MAZLOUM
APELANTE: DOUGLAS RODRIGUES DE ASSIS
Advogado do(a) APELANTE: JOSE ROBERTO CURTOLO BARBEIRO - SP204309-A
APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL NO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000732-35.2022.4.03.6003 RELATOR: Gab. 43 - DES. FED. ALI MAZLOUM APELANTE: DOUGLAS RODRIGUES DE ASSIS Advogado do(a) APELANTE: JOSE ROBERTO CURTOLO BARBEIRO - SP204309-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL NO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL OUTROS PARTICIPANTES: ORIGEM: 1ª VARA DA JUSTIÇA FEDERAL DE TRÊS LAGOAS/MS R E L A T Ó R I O O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ALI MAZLOUM: Trata-se de apelação interposta pelo acusado Douglas Rodrigues de Assis (D.N.: 14.05.1992 – ID 271815372, p. 11), em face de sentença que o condenou, incurso no artigo 334-A, §1º, I, do Código Penal c.c. art. 3º, do Decreto-Lei nº 399/68, à pena privativa de liberdade de 02 (dois) anos de reclusão, em regime semiaberto. Não houve substituição da pena corporal por restritiva de direitos, em razão da reincidência. Mantida as medidas cautelares diversas de prisão fixadas em sede de audiência de instrução, com fundamento no art. 387, §1º, do CPP. Decretado o perdimento do veículo e mercadorias apreendidas, na forma do art. 91, II, ‘a’, do CP. Custas pelo réu, nos moldes do art. 804 do CPP (ID 271815577). Narra a denúncia, em síntese, que no dia 04.05.2022, na Comunidade Indígena Ofaié, localizada na Zona Rural de Brasilândia/MS, DOUGLAS RODRIGUES DE ASSIS, com consciência e vontade livres, teria transportado no veículo Fiat Palio Week Trekking, de placas CMW-7183, cor branca, mercadorias de procedência estrangeira e ingresso proibido no território nacional (diversos cigarros black, cigarros gudang garam, cigarros eletrônicos, papel de seda para fumo, tabaco para narguile, essências para narguile, essências de cigarro eletrônico, baterias para cigarro eletrônico, partes e peças de cigarros eletrônicos, e cigarros elegance), avaliados em R$ 72.847,80 (setenta e dois mil, oitocentos e quarenta e sete reais e oitenta centavos), infringindo as medidas de controle sanitário e fiscal editadas pelas autoridades competentes (ID 271815449, p. 02/04). O Ministério Público Federal deixou de propor acordo de não persecução penal (art. 28-A, do CPP), considerando a reiteração delitiva do denunciado (ID 271815449 e ID 271815450). A denúncia foi recebida em 26.05.2022 (ID 271815451) e a sentença publicada em 03.08.2022 (ID 271815577). A defesa, em suas razões de apelo, aduziu, preliminarmente, nulidade processual decorrente do flagrante, pela inobservância do art. 157 do CPP e art. 5º, caput, I, II, III e LVI, da CF e do entendimento firmado no tema 1.185 do STF, por não ter assegurado ao preso o direito ao silêncio. No mérito, alegou ausência de prova da materialidade delitiva, diante da inexistência da comprovação da origem e procedência estrangeira das mercadorias apreendidas. Postulou pela desclassificação da imputação para o art. 334, § 1º, II, do CP. Sustentou, ainda, ausência de dolo, uma vez que não tinha ciência da ilicitude da carga, devendo ser absolvido nos termos do art. 386, do CPP. Subsidiariamente, que seja fixado o regime aberto para o início do cumprimento da pena e substituída a pena corporal pela restritiva de direitos, fixando-se a pena pecuniária no seu mínimo legal, diante de sua hipossuficiência econômica (ID 272368118). Não houve apresentação de contrarrazões ao recurso. A Procuradoria Regional da República, em seu parecer, opinou pela rejeição da preliminar arguida e pelo desprovimento do recurso (ID 273912517). É o relatório. À revisão, nos termos regimentais.
APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000732-35.2022.4.03.6003 RELATOR: Gab. 43 - DES. FED. ALI MAZLOUM APELANTE: DOUGLAS RODRIGUES DE ASSIS Advogado do(a) APELANTE: JOSE ROBERTO CURTOLO BARBEIRO - SP204309-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL NO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL OUTROS PARTICIPANTES: ORIGEM: 1ª VARA DA JUSTIÇA FEDERAL DE TRÊS LAGOAS/MS V O T O O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ALI MAZLOUM: Trata-se de apelação interposta pelo acusado Douglas Rodrigues de Assis (D.N.: 14.05.1992 – ID 271815372, p. 11), em face de sentença que o condenou, incurso no artigo 334-A, §1º, I, do Código Penal c.c. art. 3º, do Decreto-Lei nº 399/68, à pena privativa de liberdade de 02 (dois) anos de reclusão, em regime semiaberto. Não houve substituição da pena corporal por restritiva de direitos, em razão da reincidência. Mantida as medidas cautelares diversas de prisão fixadas em sede de audiência de instrução, com fundamento no art. 387, §1º, do CPP. Decretado o perdimento dos veículos e mercadorias apreendidas, na forma do art. 91, II, ‘a’, do CP. Custas pelo réu, nos moldes do art. 804 do CPP (ID 271815577). Narra a denúncia, em síntese, que no dia 04.05.2022, na Comunidade Indígena Ofaié, localizada na Zona Rural de Brasilândia/MS, DOUGLAS RODRIGUES DE ASSIS, com consciência e vontade livres, teria transportado no veículo Fiat Palio Week Trekking, de placas CMW-7183, cor branca, mercadorias de procedência estrangeira e ingresso proibido no território nacional (diversos cigarros black, cigarros gudang garam, cigarros eletrônicos, papel de seda para fumo, tabaco para narguile, essências para narguile, essências de cigarro eletrônico, baterias para cigarro eletrônico, partes e peças de cigarros eletrônicos, e cigarros elegance), avaliados em R$ 72.847,80 (setenta e dois mil, oitocentos e quarenta e sete reais e oitenta centavos), infringindo as medidas de controle sanitário e fiscal editadas pelas autoridades competentes (ID 271815449, p. 02/04). Preliminarmente, a defesa aduziu nulidade processual decorrente do flagrante, pela inobservância do art. 157 do CPP e art. 5º, caput, I, II, III e LVI, da CF e do entendimento firmado no tema 1.185 do STF, por não ter assegurado ao preso o direito ao silêncio. Não merece acolhida tal alegação. Nos termos do depoimento do policial Gilson Albuquerque Garcia, em juízo, no momento da prisão em flagrante do réu foi dado ciência do direito ao silêncio e de não produzir provas contra si (ID 271815560). Outrossim, constou do termo de qualificação e interrogatório as garantias constitucionais, conforme pode ser verificado no doc. 271815272, p. 04/05. Cumpre registrar, que os depoimentos dos policiais, gozam de fé pública, sendo que em conjunto com demais provas dos autos, possuem fundamentos concretos a demonstrar a observância das garantias constitucionais ao acusado. Nesse sentido: “HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. NÃO CABIMENTO. TRÁFICO DE DROGAS. PRETENDIDA ABSOLVIÇÃO. PALAVRA DE POLICIAIS. PROVA PARA A CONDENAÇÃO. VALIDADE. INSUFICIÊNCIA DO ACERVO PROBATÓRIO. INVIABILIDADE DE ANÁLISE NA VIA ESTREITA DO HABEAS CORPUS. WRIT NÃO CONHECIDO. I - A Terceira Seção desta Corte, seguindo entendimento firmado pela Primeira Turma do col. Pretório Excelso, firmou orientação no sentido de não admitir a impetração de habeas corpus em substituição ao recurso adequado, situação que implica o não conhecimento da impetração, ressalvados casos excepcionais em que, configurada flagrante ilegalidade apta a gerar constrangimento ilegal, seja possível a concessão da ordem de ofício. II - O depoimento dos policiais prestado em Juízo constitui meio de prova idôneo a resultar na condenação do réu, notadamente quando ausente qualquer dúvida sobre a imparcialidade dos agentes, cabendo à defesa o ônus de demonstrar a imprestabilidade da prova, o que não ocorreu no presente caso. Precedentes. III - Ademais, no caso dos autos, constou do v. acórdão vergastado que os depoimentos dos policiais são corroboradas por outros elementos probatórios, notadamente a apreensão de considerável quantidade de crack, de forma a demonstrar que a droga tinha por destinação o tráfico ilícito. IV - Afastar a condenação, in casu, demandaria o exame aprofundado de todo conjunto probatório, como forma de desconstituir as conclusões das instâncias ordinárias, soberanas na análise dos fatos, providência inviável de ser realizada dentro dos estreitos limites do habeas corpus, que não admite dilação probatória. Habeas corpus não conhecido.”(HC - HABEAS CORPUS - 404507 2017.01.46497-9, FELIX FISCHER, STJ - QUINTA TURMA, DJE DATA:18/04/2018 ..DTPB:.) – Grifo nosso. “PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 289, § 1º, DO CÓDIGO PENAL. MOEDA FALSA. CRIME DE BAGATELA. INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DOLO DEMONSTRADO. VALIDADE PROBATÓRIA DOS DEPOIMENTOS POLICIAIS OUVIDOS COMO TESTEMUNHAS. PEDIDO DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DO ART. 289, §2º, CP. REJEIÇÃO. DOSIMETRIA. PENA SUBSTITUTIVA DESTINADA PARA A UNIÃO. APELOS DEFENSIVOS DESPROVIDOS. 1- O princípio da insignificância não se aplica ao crime de moeda falsa, uma vez que o objeto juridicamente tutelado pelo tipo penal é a fé pública e, por conseguinte, a confiança que as pessoas depositam na autenticidade da moeda, não sendo possível quantificar o dano causado à sociedade, já que a lei penal visa à segurança da circulação monetária, nada importando a quantidade de exemplares ou o valor representado pelas cédulas contrafeitas. 2- Materialidade e autoria do delito demonstradas pela prova documental, pericial e testemunhal produzida nos autos, tanto na fase policial quanto em Juízo. 3- Versão defensiva apresentada apenas no interrogatório judicial dos réus que restou isolada do restante do conjunto probatório. Dolo que se extrai das circunstâncias envolvendo o crime, em especial a quantidade de cédulas espúrias apreendidas (sete) e o fato de estar a moeda falsa ocultada no veículo conduzido pelos réus. 4- Os depoimentos prestados por agentes policiais têm valor probatório igual ao de qualquer outra testemunha. As declarações dos policiais, quando são coesas, uníssonas, coerentes e não desmentidas pelo restante da prova, conforme se verifica no caso concreto, são igualmente aptas a formar o juízo de culpa, pois a simples condição de policial não torna a testemunha impedida ou suspeita. 5- É ônus da defesa a demonstração de que os réus receberam de boa-fé as cédulas falsas que traziam consigo (art. 156 do Código de Processo Penal). Sem que a defesa se tenha desincumbido satisfatoriamente do fardo processual que lhe cabe, impossível acolher o pedido de desclassificação da conduta dos réus para o crime do art. 289, §2º, do Código Penal. 6- A pena pecuniária substitutiva da pena privativa de liberdade deve ser fixada de maneira a garantir a proporcionalidade entre a reprimenda substituída e as condições econômicas do condenado, além do dano a ser reparado, e, nos termos do §1º do art. 45 do Código Penal, deve ser revertida em prol da vítima. Pena de prestação pecuniária destinada, de ofício, para a União. 7- Apelos defensivos desprovidos.” (APELAÇÃO CRIMINAL - 74540 .SIGLA_CLASSE: ApCrim 0000009-38.2011.4.03.6181 ..PROCESSO_ANTIGO: 201161810000099 ..PROCESSO_ANTIGO_FORMATADO: 2011.61.81.000009-9, DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI, TRF3 - DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:03/10/2018) – Grifo nosso. Ademais, em juízo, com todos os direitos assegurados ao réu houve a confissão do transporte da carga, embora tenha alegado desconhecer a sua ilicitude (ID 271815 561 a 271815563). Assim, a versão apresentada pelo apelante, restou ilhada nos autos, não desincumbindo a defesa do ônus de provar o quanto alegado, nos termos do artigo 156, primeira parte, do Código de Processo Penal. Dessa forma, rejeito a preliminar arguida. Observo que a materialidade restou comprovada pelo conjunto probatório acostado aos autos – Boletim de Ocorrência, termo de apreensão, relação de mercadorias apreendidas, informação da polícia judiciária e laudo pericial (ID 271815372, p. 06/10, e 18/19, ID 271815441, p. 19, ID 271815462). A defesa alega ausência de tipicidade diante da ausência de proibição na importação e por não estar comprovada a origem e procedência estrangeira das mercadorias apreendidas. Subsidiariamente, pleiteia pela desclassificação da imputação para o art. 334, § 1º, II, do CP. Não assiste razão ao apelante. A conduta praticada pelo réu de transporte de mercadoria contrabandeada se enquadra perfeitamente na conduta prevista no art. 334-A, parágrafo 1º, inciso I, do Código Penal c.c. o art. 3º, do Decreto-lei nº 399/68: “Contrabando Art. 334-A. Importar ou exportar mercadoria proibida: (Incluído pela Lei nº 13.008, de 26.6.2014) Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos. (Incluído pela Lei nº 13.008, de 26.6.2014) § 1º Incorre na mesma pena quem: (Incluído pela Lei nº 13.008, de 26.6.2014) I - pratica fato assimilado, em lei especial, a contrabando; (Incluído pela Lei nº 13.008, de 26.6.2014) II - importa ou exporta clandestinamente mercadoria que dependa de registro, análise ou autorização de órgão público competente; (Incluído pela Lei nº 13.008, de 26.6.2014) III - reinsere no território nacional mercadoria brasileira destinada à exportação; (Incluído pela Lei nº 13.008, de 26.6.2014) IV - vende, expõe à venda, mantém em depósito ou, de qualquer forma, utiliza em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria proibida pela lei brasileira; (Incluído pela Lei nº 13.008, de 26.6.2014) V - adquire, recebe ou oculta, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria proibida pela lei brasileira. (Incluído pela Lei nº 13.008, de 26.6.2014).” – Destaque nosso. “Decreto-lei nº 399/68 Art. 3º Ficam incursos nas penas previstas no artigo 334 do Código Penal os que, em infração às medidas a serem baixadas na forma do artigo anterior adquirirem, transportarem, venderem, expuserem à venda, tiverem em depósito, possuírem ou consumirem qualquer dos produtos nele mencionados. Parágrafo único. Sem prejuízo da sanção penal referida neste artigo, será aplicada, além da pena de perdimento da respectiva mercadoria, a multa de R$ 2,00 (dois reais) por maço de cigarro ou por unidade dos demais produtos apreendidos. (Redação dada pela Lei nº 10.833, de 29.12.2003)” – Destaque nosso. Nesse sentido: “Acórdão: número 5006940-10.2019.4.03.6110 - APELAÇÃO CRIMINAL Relator(a): Desembargador Federal MAURICIO YUKIKAZU KATO Origem: TRF - TERCEIRA REGIÃO Órgão julgador: 5ª Turma Data: 23/06/2020 Data da publicação: 26/06/2020 Ementa: PENAL. PROCESSO PENAL. CONTRABANDO. TRANSPORTE DE CIGARROS DE ORIGEM ESTRANGEIRA. ALTERAÇÃO PARA O DELITO DO ART. 349 DO CP. NÃO OCORRÊNCIA. PENA-BASE. REGIME PRISIONAL. SUBSTITUIÇÃO DA PENA CORPORAL POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. INABILITAÇÃO PARA DIRIGIR VEÍCULO. RECOMENDAÇÃO 62/2020 DO CNJ. CRIME PRATICADO SEM VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA. APLICAÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO. 1. A figura do transportador se enquadra perfeitamente na conduta prevista no art. 334-A, parágrafo 1º, inciso I, do Código Penal c.c. arts. 2º e 3º, ambos do Decreto-lei nº 399/68, bastando o transporte das mercadorias contrabandeadas para que a conduta seja típica, não sendo necessário que o transportador tenha introduzido as mercadorias em solo nacional ou que seja o proprietário da carga. 2. O delito de favorecimento real não se aplica a quem praticou um dos verbos nucleares do delito do art. 334-A, § 1º, inciso I, do Código Penal (transportar), pois pressupõe que o agente que cometeu o crime não seja coautor ou receptador. 3. As circunstâncias do crime são realmente negativas, em razão da vultosa quantidade de cigarros apreendidos, fato que ofende de forma mais intensa o bem tutelado pela norma penal (saúde pública). 4. No tocante ao regime prisional devem ser observados os seguintes fatores: modalidade de pena de privativa de liberdade, ou seja, reclusão ou detenção (art. 33, caput, CP); quantidade de pena aplicada (art. 33, §2º, alíneas a, b e c, CP); caracterização ou não da reincidência (art. 33, §2º, alíneas b e c, CP) e circunstâncias do artigo 59 do Código Penal (art. 33, §3º, do CP). 5. Os critérios de aplicação das penas restritivas de direito obedecem ao teor do artigo 44, § 2º, do Código Penal. 6. A inabilitação para dirigir veículo deve ser afastada, já que, conquanto o direito ao trabalho e ao exercício de profissão não sejam absolutos, podendo sofrer restrições legais, entendo que estas devem ser proporcionais e razoáveis, o que ocorrerá somente no caso em que restar comprovado que o agente se vale da sua profissão para se dedicar ao crime de forma reiterada. 7. Para evitar a contaminação em grande escala no sistema prisional em razão da pandemia do novo coronavírus Covid-19 e a fim de garantir a saúde coletiva, deve ser aplicada as medidas cautelares alternativas em substituição à prisão preventiva nos casos em que o crime foi praticado sem violência ou grave ameaça. 8. Não conheço da apelação interposta no documento ID 130068271, dou parcial provimento à apelação das defesas para reduzir a pena-base, modificar o regime prisional, substituir a pena corporal por restritivas de direito e excluir a inabilitação para dirigir veículo em relação ao réu Carlos Henrique Vieira da Rocha, com fixação da pena privativa de liberdade individual dos acusados em 03 (três) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, em regime inicial aberto e com substituição da pena corporal por duas restritivas de direito consistentes em prestação de serviço à comunidade e prestação pecuniária de 1 (um) salário mínimo, bem como revogo a prisão preventiva dos réus com sua substituição pelas medidas cautelares constantes da fundamentação.” - Grifo nosso. Por outro lado, como bem constou do parecer ministerial: “(...) Igualmente, não há como ser acolhida a tese de que a conduta seria atípica por ausência de comprovação da “origem e procedência” das mercadorias, visto que atestado, pelos agentes policiais que promoveram a prisão em flagrante e a apreensão, que se tratava de mercadoria estrangeira, conforme Termo de Apreensão n.º 1596776/2022 (Id. 271815372 – pág. 6). Ademais, o próprio acusado afirmou que os produtos eram oriundos do Paraguai. Pelos mesmos motivos, resta prejudicado o pleito que objetiva a desclassificação da conduta para o tipo previsto no artigo 334, § 1º, II, do Código Penal (crime de descaminho). (...)” – ID 273912517. Dessa forma, afastada as alegações arguidas pela defesa. A autoria, igualmente restou demonstrada. Em audiência foram ouvidas as testemunhas, bem como colhido o interrogatório do réu Douglas Rodrigues Assis. A testemunha Gilson Albuquerque Garcia, policial, disse que a equipe policial recebeu informações da equipe de Bataguassu-MS de um veículo suspeito de cor branca; que foi feito bloqueio pela extensão da rodovia MS 040, abordando alguns veículos; o condutor de um dos veículos abordados informou que viu dois veículos entrando em estrada de terra em direção a aldeia indígena; foram atrás e visualizaram um carro branco escondido numa clareira, sendo que o motorista (réu) empreendeu fuga no mato e foi atrás dele e conseguiu alcança-lo; que no momento da prisão deu ciência do direito ao silêncio e de não produzir provas contra si; que não foi localizado o outro veículo (ID 271815560). A testemunha Milton Rosa da Silva Júnior, policial, informou que receberam informação de veículos suspeitos; fizeram barreira policial e começou a fazer abordagem; um sitiante informou que dois veículos haviam entrado na aldeia; em uma clareira avistou um veículo branco o qual foi abordado e foi verificado que tinha material de tabacaria sem nota; o condutor era o Douglas que informou que as mercadorias seriam de origem do Paraguai; foi atrás do outro veículo, mas não foi localizado (ID 271815564). Por sua vez, o réu em seu interrogatório, em juízo, afirmou ser motorista de caminhão, com renda mensal entre R$ 1.200,00 e R$ 3.000,00, tendo um irmão especial que auxilia. Sobre os fatos, disse que não teve seu direito ao silêncio alertado no momento da prisão; que foi contratado para um frete para retirar mercadoria em dourados, não sabendo que era produto sem nota fiscal, sem procedência; que não sabia que era ilícito; que sabia que a carga era de cigarros, mas pensava que era lícito (ID 271815561 a 271815563). Dessa forma, nos termos dos depoimentos testemunhais, bem como diante da confissão do acusado da realização do transporte das mercadorias proibidas, restou comprovada a autoria delitiva. Sustentou, ainda, o réu, em suas razões recursais, ausência de dolo, uma vez que não tinha ciência da ilicitude da carga, devendo ser absolvido nos termos do art. 386, do CPP. As provas e circunstâncias fáticas da prática delitiva, bem como o depoimento das testemunhas arroladas pela acusação, são elementos que conferem certeza do dolo do acusado. A alegada ausência de dolo na conduta do réu não merece acolhida. As circunstâncias do caso concreto demonstram que o agir do réu era voltado à ciência do transporte de produtos estrangeiros sem a documentação comprobatória de regular importação, consciente da ilicitude da conduta e com intuito de lesar o fisco mediante o não pagamento dos tributos devidos, conferindo, assim, a certeza do dolo do acusado. Como bem observou o Parquet Federal em suas alegações finais: “(...) Ademais, extrai-se do Laudo Pericial Veicular n.º 765/2022 que o automóvel FIAT/Palio Weekend Trekking, placas CMW7I83, o qual estava sendo conduzido pelo réu possuía molas adicionais e calços na suspensão traseira para disfarçar eventual excesso de carga no veículo, bem como a ausência do banco traseiro, demonstrando que DOUGLAS RODRIGUES DE ASSIS havia se preparado para realizar o transporte das mercadorias ilícitas. É o que narra o Laudo Pericial (ID 252610672 - Pág. 1/7): Quesito 1: O veículo sofreu adaptação de suas características originais que pudesse dissimular o transporte de produtos, substâncias e/ou mercadorias? (...) Salienta-se que a presença de molas adicionais e calços na suspensão traseira poderiam disfarçar eventual excesso de carga no veículo, bem como a ausência do banco traseiro proporcionava um maior espaço útil para o transporte de carga em seu interior. (ID 252610672 - Pág. 6). Dessa forma, não há que se falar em desconhecimento acerca da ilicitude da conduta praticada. (...)” – ID 271815570. No processo penal, para que haja uma condenação, é essencial que seja atingido o standard probatório minimamente satisfatório, obtendo-se “prova além da dúvida razoável”. É a situação que se verifica no presente caso, uma vez que a prova produzida corrobora a prática delitiva dolosa pelo acusado. Dessa forma, comprovadas a materialidade, autoria e o dolo, deve ser prestigiada a sentença condenatória ora recorrida. Passo à análise da pena aplicada ao réu. Na primeira fase, o juízo a quo fixou a pena-base no mínimo legal, ou seja, em 02 (dois) anos de reclusão, a qual conservo. Na segunda fase da dosimetria, o juiz singular observou a atenuante da confissão e a agravante da reincidência compensando-as. Verifico que houve a confissão do réu, conforme exposto acima, bem como a ocorrência da reincidência (Processo nº 0000189-66.2016.8.26.0632; art. 33, da Lei nº 11.343/06; transitado em julgado em 01.05.2018; segundo informações constantes dos docs. 271815571 e ID 271815572, confirmada em consulta ao site do TJSP). Assim, mantenho a compensação, conservando a pena em 02 (dois) anos de reclusão, nessa fase dosimétrica. Na terceira fase, não houve causas de aumento ou de diminuição identificadas, o que mantenho. Assim, mantenho a pena definitiva em 02 (dois) anos de reclusão. Outrossim, ainda que fosse realizada a detração, prevista no § 2º do artigo 387 do Código de Processo Penal, o que resultaria em um desconto de quase 03 (três) meses do tempo de prisão provisória da pena concretamente aplicada (data do fato/prisão em flagrante: 04.05.2022 e data da publicação da sentença: 03.08.2022, onde determinou-se a soltura do réu), o regime inicial da pena corporal deve ser mantido no semiaberto, consoante art. 33, § 2º, do CP e Súmula nº 269 do STJ: “É admissível a adoção do regime prisional semi-aberto aos reincidentes condenados a pena igual ou inferior a quatro anos se favoráveis as circunstâncias judiciais.” Nesse sentido: “AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. FURTO QUALIFICADO. ALEGADO CONSTRANGIMENTO ILEGAL EM RAZÃO DO REGIME PRISIONAL INICIALMENTE FIXADO. PACIENTE REINCIDENTE. PENA INFERIOR A 4 ANOS DE RECLUSÃO. REGIME PRISIONAL INICIALMENTE SEMIABERTO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Considerada a pena fixada, inferior a 4 anos de reclusão, mas, de outro lado, tendo em vista a reincidência do paciente, é correta a aplicação do regime prisional inicialmente semiaberto, conforme previsto no art. 33, §§ 2º e 3º, do Código Penal e o disposto no enunciado n. 269 da Súmula desta Corte. 2. Agravo regimental desprovido.” (AgRg no HC n. 808.216/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 23/3/2023, DJe de 28/3/2023.) O réu pleiteia a substituição da pena corporal por restritiva de direitos. Embora o inciso II do art. 44 do CP estabeleça como pressuposto para a concessão do benefício a não reincidência do condenado em crime doloso, tal restrição deve ser interpretada, considerando o disposto no § 3°, do dispositivo em comento. Na hipótese, a reincidência restou configurada em razão da prática do crime de tráfico de drogas (Processo nº 0000189-66.2016.8.26.0632; art. 33, da Lei nº 11.343/06; transitado em julgado em 01.05.2018; segundo informações constantes dos docs. 271815571 e ID 271815572, confirmada em consulta ao site do TJSP). Assim, possível a concessão da substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos, nos termos do § 3º do art. 44 do CP, diante do preenchimento dos requisitos (pena não superior a quatro anos, crime cometido sem violência ou grave ameaça à pessoa, réu não reincidente específico e circunstâncias judiciais favoráveis), e por reputar medida adequada e recomendável ao caso. Dessa forma, substituo a pena privativa de liberdade por 2 (duas) restritivas de direitos (art. 44, §2º, CP), consistentes em prestação de serviços à comunidade ou à entidades públicas pelo mesmo prazo da pena substituída, e prestação pecuniária, ambas em favor de entidade assistencial pública ou privada a ser designada pelo Juízo da Execução. Registra-se que o valor da pena de prestação pecuniária deve ser suficiente para a prevenção e reprovação do crime praticado, atentando-se ainda, para a extensão dos danos decorrentes do ilícito e para a situação econômica do réu, com a finalidade de viabilizar o seu cumprimento. No presente caso, o réu em seu interrogatório judicial afirmou ser motorista, com renda mensal entre R$ 1.200,00 e R$ 3.000,00, auxiliando um irmão especial (ID 271815561 a ID 271815563). Destarte, seguindo os parâmetros acima elencados, fixo o valor da pena pecuniária em 01 (um) salário mínimo. Por fim, mantenho a destinação dos bens apreendidos nos termos da r. sentença. Diante do exposto, REJEITO A PRELIMINAR ARGUIDA E DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO INTERPOSTA PELA DEFESA para substituir a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade ou à entidades públicas pelo mesmo prazo da pena substituída, e prestação pecuniária no valor de 01 (um) salário mínimo, ambas em favor de entidade assistencial pública ou privada a ser designada pelo Juízo da Execução, nos termos da fundamentação. É o voto.
E M E N T A
DIREITO PENAL. PROCESSO PENAL. CONTRABANDO. ARTIGO 334-A, §1º, I, DO CÓDIGO PENAL C.C. ART. 3º DO DECRETO-LEI Nº 399/68. GARANTIAS CONSTITUCIONAIS OBSERVADAS. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO CONFIGURADOS. DOSIMETRIA DA PENA. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS. RECURSO DA DEFESA PARCIALMENTE PROVIDO.
1– Inobservância das garantias constitucionais não demonstrada. Não desincumbiu a defesa do ônus de provar o quanto alegado, nos termos do artigo 156, primeira parte, do Código de Processo Penal. O depoimento do policial, goza de fé pública, sendo que em conjunto com demais provas dos autos, possuem fundamentos concretos a demonstrar a observância das garantias constitucionais ao acusado. Precedentes.
2- Materialidade, autoria e dolo comprovados pelo conjunto probatório acostado aos autos. Manutenção da condenação no artigo 334-A, §1º, I, do Código Penal, c.c. art. 3º, do Decreto-Lei nº 399/68.
3– Dosimetria da pena. Substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos (prestação de serviços à comunidade ou à entidades públicas e prestação pecuniária). Interpretação do art. 44, § 3º, do CP. O valor da pena de prestação pecuniária deve ser suficiente para a prevenção e reprovação do crime praticado, atentando-se ainda, para a extensão dos danos decorrentes do ilícito e para a situação econômica do réu, com a finalidade de viabilizar o seu cumprimento.
4 - Preliminar rejeitada. Apelação da defesa parcialmente provida.