REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 5002638-58.2021.4.03.6112
RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
PARTE AUTORA: NOVA LIMA ADMINISTRACAO INCORPORACOES E SERVICOS LTDA
Advogados do(a) PARTE AUTORA: FELIPE AUGUSTO RODRIGUES DE MELLO - SP423030-A, LEONARDO DANTAS DIAMANTE - SP391649-A, MURILLO BETONE DE LIMA - SP389297-A, VALDEMIR DE LIMA - SP184513-A
PARTE RE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 5002638-58.2021.4.03.6112 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO PARTE AUTORA: NOVA LIMA ADMINISTRACAO INCORPORACOES E SERVICOS LTDA Advogados do(a) PARTE AUTORA: FELIPE AUGUSTO RODRIGUES DE MELLO - SP423030-A, LEONARDO DANTAS DIAMANTE - SP391649-A, MURILLO BETONE DE LIMA - SP389297-A, VALDEMIR DE LIMA - SP184513-A PARTE RE: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM PRESIDENTE PRUDENTE//SP, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (Relator): Trata-se de remessa oficial em face da sentença que, em sede de mandado de segurança, julgou parcialmente procedente o pedido para o fim de declarar o direito da impetrante de considerar as remunerações pagas aos trabalhadores autônomos e abater os recolhimentos já efetuados na apuração de contribuições previdenciárias relativas à obra apontada na exordial, bem assim determinar à Autoridade Impetrada que se abstenha de qualquer procedimento tendente à cobrança de contribuições sobre referida base, ou mesmo glose eventual pedido de compensação procedido pela Impetrante pela via direta ou negue restituição na via administrativa com base no direito ora reconhecido. Intimada acerca da sentença, a União Federal peticionou nos autos informando que deixa de apelar pois, nos termos do processo administrativo, “Retificada de ofício a GPS recolhida pelo contribuinte para a competência 07/2020, temos por liquidado o valor devido no ARO, sendo assim, proponho seu arquivamento por perda de objeto.”, tendo sido essa informação comunicada à RFB para cumprimento. Pugnou pela extinção do feito, uma vez que o mandado de segurança não é substitutivo de ação de cobrança. Distribuído o feito nesta Corte, o Ministério Público Federal opinou por seu regular processamento. É o breve relatório.
REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 5002638-58.2021.4.03.6112 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO PARTE AUTORA: NOVA LIMA ADMINISTRACAO INCORPORACOES E SERVICOS LTDA Advogados do(a) PARTE AUTORA: FELIPE AUGUSTO RODRIGUES DE MELLO - SP423030-A, LEONARDO DANTAS DIAMANTE - SP391649-A, MURILLO BETONE DE LIMA - SP389297-A, VALDEMIR DE LIMA - SP184513-A PARTE RE: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM PRESIDENTE PRUDENTE//SP, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (Relator): Inicialmente, afasto a perda de objeto aduzida pela União Federal, uma vez que, tendo em vista o teor das manifestações da autoridade administrativa antes da prolação da sentença, a retificação da GPS e liquidação do valor devido no ARO somente ocorreu após a prolação da decisão que deferiu parcialmente a medida liminar postulada. Prosseguindo, consigno que a incidência de contribuição previdenciária sobre obras de construção civil, disciplinada pela Lei nº 8.212/1991 (notadamente o art. 15, parágrafo único, o art. 30, V a VIII, e o art. 33, §4º), tem os seguintes elementos básicos: o fato gerador é a atividade correspondente à construção, reforma ou ampliação de edificação, instalação ou qualquer outra benfeitoria agregada ao imóvel; o sujeito passivo é o proprietário e dono da obra, incorporador ou empresa construtora, quando contratada para executar a obra por empreitada total; e a base de cálculo é a remuneração de trabalho de todos os segurados empregados que participaram da execução da obra de construção civil (ressalvada a possibilidade de cálculo por estimativa ou arbitramento, se não houver documentação hábil para a apuração das remunerações). Trata-se de obrigação tributária principal, sob a regência da reserva absoluta de lei (estrita legalidade), consistente no pagamento da contribuição pelo prazo de duração das atividades voltadas à obra, ou seja, os fatos geradores da exação debatida advêm de pagamentos efetuados aos empregados em cada competência do interregno aludido. Como obrigação tributária acessória correspondente, o art. 49, § 1º da Lei nº 8.212/1991 dispõe que sujeito passivo (proprietário do imóvel, o dono da obra ou o incorporador da construção civil, pessoa física ou jurídica) deverá providenciar a matrícula da obra no Cadastro Específico do INSS (CEI), no prazo de 30 dias, contado do início das atividades, a fim de permitir à Administração Tributária o controle e a fiscalização da arrecadação das contribuições previdenciárias. Nesse contexto, e sob a regência da reserva relativa de lei (legalidade), a Instrução Normativa RFB nº 971/2009 (com alterações dadas pela IN RFB 1477/2014) complementa exigências pertinentes às obrigações acessórias em seu Capítulo IV, cuidando da regularização de obra por aferição indireta com base na área construída e no padrão de construção, para o que prevê a Declaração e Informação Sobre Obra (DISO) e o Aviso para Regularização de Obra (ARO): Subseção I Da Declaração e Informação Sobre Obra (DISO) Art. 339. Para regularização da obra de construção civil, o proprietário do imóvel, o dono da obra, o incorporador pessoa jurídica ou pessoa física, ou a empresa construtora contratada para executar obra mediante empreitada total deverá informar à RFB os dados do responsável pela obra e os relativos à obra, mediante utilização da Declaração e Informação sobre Obra (DISO), disponível no sítio da RFB na Internet, no endereço http://www.receita.fazenda.gov.br. (Redação dada pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1477, de 03 de julho de 2014) (...) § 5º A DISO estará vinculada à unidade de atendimento da RFB do domicílio tributário do estabelecimento matriz da empresa responsável pela obra ou da localidade da obra de responsabilidade de pessoa física. (Incluído(a) pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1477, de 03 de julho de 2014) (...) Subseção II Art. 340. Para as pessoas jurídicas sem contabilidade regular e para as pessoas físicas, a partir das informações prestadas na DISO, será emitido o ARO pela Internet, no endereço informado no caput do art. 339, com a seguinte finalidade: (Redação dada pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1477, de 03 de julho de 2014) I - informar ao responsável pela obra a situação quanto à regularidade das contribuições sociais incidentes sobre a remuneração aferida; e (Redação dada pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1477, de 03 de julho de 2014) (...) II - comunicar a existência do crédito tributário nele apurado, constituindo confissão de dívida e instrumento hábil e suficiente para a exigência do referido crédito. (Redação dada pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1477, de 03 de julho de 2014) § 1º Na impossibilidade de emissão pela Internet, o ARO poderá ser emitido na unidade da RFB, no momento do atendimento ao responsável pela obra ou ao seu representante legal, desde que as informações declaradas na DISO referentes à área, à destinação e à categoria da obra sejam as mesmas constantes em um dos documentos elencados nos incisos III ou IV do caput do art. 383, observado o disposto no § 5º do mesmo artigo. (Redação dada pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1477, de 03 de julho de 2014) (...) § 3º No caso de o ARO ter sido emitido na unidade da RFB, será considerada dada ciência pessoal, provada com a assinatura do responsável pela obra ou de seu representante legal. (Redação dada pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1477, de 03 de julho de 2014) § 4º Na hipótese prevista no § 3º, havendo recusa na assinatura do ARO, os documentos serão encaminhados ao setor de fiscalização da unidade da RFB para que seja efetuado o lançamento de ofício. (Redação dada pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1477, de 03 de julho de 2014) § 5º Para fins de cálculo da remuneração despendida na execução da obra e do montante das contribuições devidas, será considerada como competência de ocorrência do fato gerador o mês da emissão do ARO, devendo o valor das contribuições nele informadas ser recolhido até o dia 20 do mês subsequente ao da sua emissão, antecipando-se o prazo de recolhimento para o dia útil imediatamente anterior, se no dia 20 não houver expediente bancário. (Redação dada pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1477, de 03 de julho de 2014) § 6º Depois do prazo previsto no § 5º, não tendo sido efetuado o recolhimento nem solicitado o parcelamento, os débitos serão enviados para inscrição em Dívida Ativa da União (DAU) com os acréscimos moratórios devidos. (Redação dada pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1477, de 03 de julho de 2014) Em vista disso, e atendendo ao art. 142 e seguintes do CTN, bem como aos elementos da obrigação tributária principal descritos na Lei nº 8.212/1991, o art. 456, I, 1º, da Instrução Normativa RFB nº 971/2009 (também com alterações, inclusive pela IN RFB 1477/2014) considerada que a declaração em Aviso de Regularização da Obra (ARO) é modalidade de lançamento por homologação: Art. 456. Observado o disposto no art. 486-B, o crédito tributário relativo às contribuições de que tratam os arts. 2º e 3º da Lei nº 11.457, de 2007, será constituído: (Redação dada pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1867, de 25 de janeiro de 2019) I - pelo lançamento por homologação expressa ou tácita, mediante declaração do ARO, na forma do art. 340, ou da GFIP, comunicando a existência de crédito tributário; (Redação dada pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1477, de 03 de julho de 2014) II - pelo reconhecimento espontaneamente da obrigação tributária; (Redação dada pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1477, de 03 de julho de 2014) a) apresentar a GFIP e não efetuar o pagamento integral do valor confessado; (Suprimido(a) - vide Instrução Normativa RFB nº 1477, de 03 de julho de 2014) b) reconhecer espontaneamente a obrigação tributária; (Suprimido(a) - vide Instrução Normativa RFB nº 1477, de 03 de julho de 2014) III - pelo lançamento de ofício. (Redação dada pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1477, de 03 de julho de 2014) § 1º Os documentos de que trata o inciso I constituem confissão de dívida e instrumento hábil e suficiente para a exigência do crédito tributário neles comunicado. (Redação dada pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1477, de 03 de julho de 2014) § 2º Os documentos comprobatórios do cumprimento das obrigações devem ficar arquivados na empresa até que ocorra a prescrição relativa aos créditos decorrentes das operações a que se refiram. (Incluído(a) pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1477, de 03 de julho de 2014) Na hipótese em exame, discute-se a possibilidade de aproveitamento de valores pagos a trabalhadores autônomos na regularização de obra de construção civil. Para elucidar a questão, transcrevo o detalhado relatório da r. sentença proferida em primeiro grau: NOVA LIMA ADMINISTRAÇÃO, INCORPORAÇÃO E SERVIÇOS LTDA., qualificada na exordial, impetra mandado de segurança em face de ato praticado pelo DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM PRESIDENTE PRUDENTE a fim de que lhe seja assegurado direito líquido e certo quanto à compensação de todo e qualquer valor recolhido a título de contribuição previdenciária incidente sobre a remuneração paga a trabalhadores autônomos utilizados na obra de construção civil relativa ao prédio comercial no Lote 08 da Quadra B do Parque Residencial Damha II, localizado na Rua Ângela Faita David, nº 28, com área de 375,12 m2. Sustentou, em síntese, que edificou essa obra entre junho/2019 e julho/2020, para o que observou as normas da IN RFB nº 971/2009, tendo se utilizado de empregados contratados e de trabalhadores autônomos, os quais eram pagos mediante folha de pagamento e RPA – Recibo de Pagamento a Autônomo, respectivamente. Asseverou que, concluída a obra e em razão da necessidade de promover sua regularização e consequente averbação à margem da matrícula do imóvel junto ao CRI, requereu à RFB a “Regularização de Obra”, para o que, nos termos do que prevê o art. 339 dessa IN, apresentou a Declaração e Informação sobre a Obra – DISO, em face do que foi emitido o Aviso de Regularização de Obra – ARO nº 5251148, juntamente com a guia de recolhimento de contribuições previdenciárias em valor do qual discordou ao fundamento de que, embora correto por conta das remunerações pagas aos empregados e autônomos, não foram deduzidos pela Administração Tributária os recolhimentos sob o mesmo título efetuados durante a evolução da obra, regularmente informados por meio das GFIPs. Disse que apurou a inconsistência, derivada de erros de preenchimento dessas guias, e requereu as deduções pertinentes, que foram atendidas. Alegou que a RFB, ao apurar os valores remanescentes depois dessas retificações, cometeu novo equívoco ao desconsiderar os valores dos pagamentos efetuados aos trabalhadores autônomos, tendo observado apenas os valores gastos com empregados registrados em CTPS, o que gerou nova apuração indevida de contribuições previdenciárias, uma vez que procedeu à estimativa do custo da mão-de-obra pelo método de aferição indireta, de modo que requereu novamente a retificação por meio do procedimento administrativo nº 13032.12147/2021-08, o que restou indeferido ao fundamento de que “o sistema não aproveita a parte de autônomos informado na GFIP”. Afirmou ter calculado e recolhido o que entende devido a título de contribuições previdenciárias remanescentes. Requereu medida liminar a fim de que seja determinada à Autoridade Impetrada que se abstenha de promover a cobrança administrativa ou a inscrição em DAU das contribuições previdenciárias apuradas no Aviso de Regularização de Obra – ARO n° 5251148, bem assim que expeça a CND-Obra a fim de permitir a averbação da edificação junto à respectiva matrícula imobiliária. Invocou, a título de fundamento relevante, as próprias razões elaboradas para a sustentação do direito postulado, bem assim, como possibilidade de ineficácia da medida caso deferida ao final, o fato de que se encontra há mais de um ano sem obter essa CND para proceder à averbação da construção. Juntou documentos. Liminar foi parcialmente deferida, a fim de que a Autoridade Impetrada procedesse à análise dos documentos que demonstrem as remunerações pagas aos autônomos, deduzisse esse valor da RMT, apurasse as contribuições previdenciárias devidas e verificasse se o valor recolhido pela Impetrante é suficiente; em nada remanescendo, expedisse a CND-Obra. Até essa providência, restou suspensa eventual cobrança (ID 111313992). A União, pela Procuradoria da Fazenda Nacional, requereu intervenção nos termos do art. 7º, II, da Lei nº 12.016/2019 (ID 118134683), o que foi deferido (ID 130705652). Em suas informações, a Autoridade Impetrada aduz que, por força da liminar, encaminhou ao setor responsável para reanálise, o qual, feita a dedução da remuneração paga a autônomos, apurou diferença a recolher pela Impetrante (ID 118569012). Com vistas, a Impetrante rebateu as informações argumentando que o novo ARO apresenta valores de remuneração total próximos ao que havia ela própria apurado, mas não considerou o recolhimento complementar efetuado em agosto/2021, de forma que a diferença apontada não existiria (ID 130880241). Instada, a Autoridade apresentou informações complementares no sentido de que, de acordo com a IN nº 971/2009, na apuração são considerados apenas os valores de remuneração declarados em GFIP até a competência anterior à sua emissão, não se incluindo os recolhimentos destinados à quitação nos cálculos do valor originário devido. Acresceu que houve erro nos recolhimentos da Impetrante, porquanto teria se equivocado quanto a rubricas, o que não pode ser corrigido de ofício, carecendo de requerimento administrativo pela contribuinte, inclusive quanto a eventual restituição de valores recolhidos a maior (ID 24790777). A Impetrante se manifestou sobre as informações complementares. Aduziu que a Autoridade Impetrada deliberadamente descumpriu a ordem emanada liminarmente, omitindo-se quanto ao recolhimento final destinado à quitação e deixando de emitir a certidão negativa. Pede concessão da ordem com urgente expedição da CND-Obra e reconhecimento do direito à restituição de valores eventualmente pagos a maior (ID 248976017). Em nova manifestação, informou que procedeu ao requerimento administrativo preconizado, que restou indeferido (ID 251077929). O pedido deduzido no presente mandamus foi parcialmente acolhido pelo Juízo sob os seguintes fundamentos: Observo que a Autoridade Impetrada, em suas informações, se limitou a informar que dera encaminhamento à revisão do ARO originário por força da medida liminar, mas não apresentou qualquer fundamento de direito quanto ao acerto da desconsideração dos recolhimentos sobre a remuneração de autônomos no cálculo da contribuição previdenciária devida. De sua parte, a PFN igualmente nada falou nos autos quanto ao mérito do pedido. Nesses termos, prevalece o quanto já aduzido na análise do pedido de liminar, que ora reproduzo como fundamentação desta sentença: A norma administrativa que então regulava a matéria era a Instrução Normativa RFB nº 971, de 13 de novembro de 2009, revogada parcialmente pela Instrução Normativa RFB nº 2.021, de 16 de abril de 2021, justamente na parte relativa às “normas e procedimentos aplicáveis à atividade de construção civil”, previstas em seu Título IV. A questão controvertida trazida aos autos é anterior à alteração normativa, de modo que, ao menos para o momento, a análise liminar se dará de acordo com as antigas regras, em atenção ao princípio tempus regit actum. De sua parte, estabelece a Lei nº 8.212/91, na análise para o momento: “Art. 33. À Secretaria da Receita Federal do Brasil compete planejar, executar, acompanhar e avaliar as atividades relativas à tributação, à fiscalização, à arrecadação, à cobrança e ao recolhimento das contribuições sociais previstas no parágrafo único do art. 11 desta Lei, das contribuições incidentes a título de substituição e das devidas a outras entidades e fundos. (Redação dada pela Lei nº 11.941, de 2009). ... § 3º Ocorrendo recusa ou sonegação de qualquer documento ou informação, ou sua apresentação deficiente, a Secretaria da Receita Federal do Brasil pode, sem prejuízo da penalidade cabível, lançar de ofício a importância devida. (Redação dada pela Lei nº 11.941, de 2009). § 4º Na falta de prova regular e formalizada pelo sujeito passivo, o montante dos salários pagos pela execução de obra de construção civil pode ser obtido mediante cálculo da mão de obra empregada, proporcional à área construída, de acordo com critérios estabelecidos pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, cabendo ao proprietário, dono da obra, condômino da unidade imobiliária ou empresa corresponsável o ônus da prova em contrário. (Redação dada pela Lei nº 11.941, de 2009). ... § 6º Se, no exame da escrituração contábil e de qualquer outro documento da empresa, a fiscalização constatar que a contabilidade não registra o movimento real de remuneração dos segurados a seu serviço, do faturamento e do lucro, serão apuradas, por aferição indireta, as contribuições efetivamente devidas, cabendo à empresa o ônus da prova em contrário. ...” O fundamento essencial desta impetração é a desconsideração dos pagamentos feitos aos contribuintes individuais na apuração da Remuneração da Mão-de-obra Total (RMT) (art. 351 da IN 971/2009), segundo a Impetrante, no valor de R$ 35.560,00 (trinta e cinco mil, quinhentos e sessenta reais). Assim, embora a resposta administrativa apresentada ao requerimento da Impetrante tenha se resumido a um pouco esclarecedor “o sistema não aproveita a parte de autônomos informado na GFIP” (ID 91731787, p. 179), parece ser essa a conclusão adotada pela Administração Tributária. Acontece que, nessa análise inicial, apura-se que não há impedimento na lei ou mesmo expressamente na IN 971/2009 para o aproveitamento das remunerações pagas ou creditadas aos contribuintes individuais que prestem serviços na obra de construção civil (art. 22, III, da Lei nº 8.212/91), seja para deduzir os recolhimentos das contribuições previdenciárias porventura efetuados (art. 353 da IN 971/2009), seja para deduzir da RMT (arts. 354 e 359 IN 971/2009). Ainda que houvesse, despertaria a hipótese de ferimento à isonomia, por não se vislumbrar discrímen apto. Aliás, nesse sentido, chama a atenção as disposições dos arts. 353 e 354 dessa IN, uma vez que, enquanto o art. 354 fala expressamente em aproveitamento da “remuneração relativa à mão-de-obra própria, inclusive ao décimo terceiro salário, cujas correspondentes contribuições tenham sido recolhidas com vinculação inequívoca à obra,” e o art. 353 diz que “[c]aso haja recolhimento de contribuição relativa à obra, a remuneração correspondente a esse recolhimento será atualizada até o mês anterior ao da emissão do ARO com aplicação das taxas de juros previstas na alínea ‘b’ do inciso II e no inciso III do art. 402, e deduzida da RMT, apurada na forma do art. 351”, o que guarda congruência com as remunerações e contribuições relativas aos contribuintes individuais, ou assim chamados autônomos, sem qualquer distinção com empregados. Por fim, é de se observar que a redação original dessa IN 971/2009 trazia os arts. 361 e 362, com o seguinte teor: “Art. 361. Não se aplica o disposto nesta Seção à remuneração paga, devida ou creditada aos segurados não-vinculados à obra ou cuja função não integre o cálculo do CUB, ainda que constem de GFIP referente à obra.” “Art. 362. A remuneração da mão-de-obra relacionada aos serviços constantes no Anexo VIII, que não integram o CUB, ainda que tenha ocorrido a retenção, não poderá ser aproveitada no cálculo por aferição indireta da mão-de-obra com base no CUB.” Acontece que essas duas normas, que eventualmente serviram de base para a Autoridade quanto à possibilidade de aproveitamento da remuneração paga aos contribuintes individuais, foram revogadas pela Instrução Normativa RFB nº 980, de 17 de dezembro de 2009. Ademais, tratavam de casos em que o serviço prestado não integrasse o CUB, o que não é necessariamente o caso de autônomos, pois guarda relação com o tipo de serviço e não com a natureza da relação do prestador com o tomador. Como se vê, desde que haja fundamento bastante, a Lei de Custeio da Previdência Social prevê no art. 33, § 4º, o lançamento de acordo com área construída e natureza da obra, retificando-se o valor declarado pelo contribuinte se inferior à média experimentada pelo mercado; cabe ao contribuinte promover a prova do acerto de suas despesas, faculdade atribuída pelo próprio dispositivo. Registro que nestes autos não se discute o próprio cabimento do lançamento por estimativa e que, mais recentemente, a IN nº 971 foi integralmente revogada pela IN nº 2.110, de 17.10.2022. Resta claro, porém, que a base-de-cálculo do imposto é o valor real da mão-de-obra empregada, ao passo que a adoção do valor médio de mercado se destina somente a evitar subavaliação por parte do contribuinte. Trata-se de um sistema substitutivo do empregado pelo contribuinte, visando justamente à busca do real valor, mas que, por ser estimativo, prevê sua revisão por iniciativa deste. O sistema se justifica à vista da altíssima informalidade no setor, porquanto boa parte da mão-de-obra, especialmente quando a construção é empreendida por pessoas físicas, não tem os devidos registros, seja dos contratos de trabalho de operários “fixos”, seja da remuneração de autônomos nela empregados. Porém, na regulamentação dessa aferição indireta – ou na interpretação dessa regulamentação – acaba a Administração Tributária cometendo abusos, como o de desconsiderar esses trabalhadores autônomos, como se não existissem, ainda que declarados pelo contribuinte, descolando-se da realidade fática. Como é cediço, a visão do Fisco sempre foi a de que não há trabalhador autônomo em construção civil, bastando ver a completa omissão da IN nº 971 a respeito, porquanto quando tratava de terceirizados se referia apenas a “empreiteira” e a “cooperativa de trabalho”, cuja comprovação de despesas deveria ser realizada por “nota fiscal” (v.g. art. 355), o que exclui os contribuintes individuais pessoas físicas, pagos por RPA. Essa posição é absurda, porquanto é óbvio que muitos operários da construção civil não trabalham sob regime de contrato de trabalho celetista, em especial à falta de regularidade e à eventualidade na prestação do serviço, não caracterizando a hipótese do art. 3º da CLT. É sabido que muitos são necessários na obra apenas em determinados momentos, por curtos períodos, por vezes atendendo a vários clientes ao mesmo tempo, e a maioria não é organizada em cooperativa ou mesmo tem registro de CNPJ para expedição de notas fiscais de empreita. Não por outra razão, a mencionada IN nº 2.021, de 16.4.2021, veio a alterar esse quadro, trazendo racionalidade no trato da questão: Art. 31. Caso exista, em relação à obra, contribuição constituída por declaração, o valor da remuneração da mão de obra correspondente será atualizado pela taxa de juros Selic acumulada mensalmente a partir do 2º (segundo) mês subsequente à competência à qual se refere a declaração até o mês anterior ao da transmissão da DCTFWeb Aferição de Obras, acrescida de mais 1% (um por cento) no mês da transmissão, e aproveitada como dedução da remuneração apurada na forma prevista nas Seções II e III do Capítulo VI. ... § 2º As contribuições previdenciárias incidentes sobre a remuneração declarada para o contribuinte individual contratado para prestar serviços à obra, enquadrado como trabalhador autônomo ou como MEI de acordo com a tabela de categorias de trabalhadores aplicável, serão aproveitadas para deduzir as seguintes contribuições, apuradas na aferição: I - a contribuição patronal de 20% (vinte por cento), devida na contratação do MEI para prestar serviços de construção civil de hidráulica, eletricidade, pintura, alvenaria e carpintaria, consoante o disposto no § 1º do art. 18-B da Lei Complementar nº 123, de 2006; e II - a contribuição patronal de 20% (vinte por cento), devida na contratação do contribuinte individual da categoria de trabalhador autônomo, quer seja o contratante pessoa física ou jurídica, e, quando o contratante for pessoa jurídica, o valor correspondente a 11% (onze por cento) da remuneração devida, a título de contribuição de segurado. ...” Portanto, passou-se a admitir a dedução preconizada, sendo possivelmente essa a razão de não terem a Autoridade e a PFN defendido o ato apontado como coator, cometido anteriormente ao advento da nova norma. Desse modo, procede o pedido no aspecto, dado que a negativa de aproveitamento das remunerações pagas aos contribuintes individuais que prestaram serviços na obra de construção civil, bem assim, a cobrança das respectivas contribuições previdenciárias decorrentes, representam violação do direito líquido e certo da Impetrante. Entretanto, não é possível avançar para atestar o acerto dos recolhimentos efetuados, para o fim de atestar a quitação e restituição de valores, como pretende a Impetrante. Ocorre que neste ponto a impetração se mostra incabível, por inadequação da via, dado que o acerto ou desacerto de valores dependeria de apuração por perícia contábil, incabível neste procedimento. É que entre a Impetrante e a Receita Federal subsistem divergências quanto a esses valores, havendo inclusive indicação da Autoridade Impetrada que teriam ocorrido pagamentos sob rubrica equivocada, pois teria a Impetrante recolhido em favor de terceiros o que seria contribuição destinada à Previdência, carecendo de correção administrativa. Não há como proceder a essa verificação nestes autos, porquanto a ação mandamental não admite instrução probatória e seria necessária perícia, porquanto não se consegue com os elementos dos autos fazer relação direta dos valores recolhidos com o saldo apresentado pela Receita Federal, para atestar o acerto ou desacerto de uma ou outra apuração. Não vislumbro no procedimento da Autoridade descumprimento à medida liminar, visto como essa decisão já ressalvava a possibilidade de ser apurada diferença a ser recolhida. Mesmo considerando o recolhimento de agosto/2021, a RF ainda aponta saldo remanescente, o que se demonstra impossível de ser escrutinado nesta via angusta. Não se trata, portanto, de matéria de direito, mas essencialmente de fato, sendo incabível a impetração no aspecto. Consequentemente, impossibilitada a verificação da quitação, resta prejudicada a concessão de certidão negativa, ou mesmo positiva com esse efeito. Ainda que tenha a Impetrante procedido a uma primeira tentativa de regularização, que restou frustrada, fato é que foi apresentada alternativa, qual a compensação via PER/DCOMP, de modo que a via administrativa continua aberta; além dela, tem ainda as vias ordinárias para solução, às quais a remeto. III – Dispositivo: Ante ao exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido para o fim de declarar o direito da Impetrante de considerar as remunerações pagas aos trabalhadores autônomos e abater os recolhimentos já efetuados na apuração de contribuições previdenciárias relativas à obra apontada na exordial, bem assim determinar à Autoridade Impetrada que se abstenha de qualquer procedimento tendente à cobrança de contribuições sobre referida base, ou mesmo glose eventual pedido de compensação procedido pela Impetrante pela via direta ou negue restituição na via administrativa com base no direito ora reconhecido. Partilho dos fundamentos lançados na sentença, já que o acervo fático-probatório dos autos leva à conclusão de que a ora impetrante efetuou os pagamentos devidos aos trabalhadores autônomos que laboraram na obra indicada nos autos e informou-os nas competentes declarações. Assim, tais valores devem ser abatidos na apuração das contribuições devidas em virtude dessa obra, cabendo à autoridade administrativa verificar a regularidade e suficiência dos recolhimentos efetuados. Por fim, observo que, após a prolação da sentença, a União peticionou nos autos informando que deixa de apelar pois, nos termos do processo administrativo, “Retificada de ofício a GPS recolhida pelo contribuinte para a competência 07/2020, temos por liquidado o valor devido no ARO, sendo assim, proponho seu arquivamento por perda de objeto.", tendo sido essa informação comunicada à RFB para cumprimento, tendo obtido a resposta de que, após terem sido prestadas as informações complementares solicitadas, a demanda já foi resolvida. Ante o exposto, nego provimento à remessa oficial. É o voto.
Do Aviso para Regularização de Obra (ARO)
E M E N T A
PROCESSO CIVIL. TRIBUTÁRIO. REMESSA OFICIAL. MANDADO DE SEGURANÇA. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. CONSTRUÇÃO CIVIL. AVISO DE REGULARIZAÇÃO DE OBRA. VALORES PAGOS A AUTONÔMOS DEVIDAMENTE DECLARADOS. ABATIMENTO. POSSIBILIDADE.
- A incidência de contribuição previdenciária sobre obras de construção civil, disciplinada pela Lei nº 8.212/1991 (notadamente o art. 15, parágrafo único, o art. 30, V a VIII, e o art. 33, §4º), tem os seguintes elementos básicos: o fato gerador é a atividade correspondente à construção, reforma ou ampliação de edificação, instalação ou qualquer outra benfeitoria agregada ao imóvel; o sujeito passivo é o proprietário e dono da obra, incorporador ou empresa construtora, quando contratada para executar a obra por empreitada total; e a base de cálculo é a remuneração de trabalho de todos os segurados empregados que participaram da execução da obra de construção civil (ressalvada a possibilidade de cálculo por estimativa ou arbitramento, se não houver documentação hábil para a apuração das remunerações).
- Em razão de contribuições previdenciárias devidas em razão de obras de construção civil, o art. 49, § 1º da Lei nº 8.212/1991 e a Instrução Normativa RFB nº 971/2009 (com alterações dadas pela IN RFB 1477/2014) trazem obrigações acessórias, notadamente a Declaração e Informação Sobre Obra (DISO) e o Aviso para Regularização de Obra (ARO).
- Atendendo ao art. 142 e seguintes do CTN, bem como aos elementos da obrigação tributária principal descritos na Lei nº 8.212/1991, o art. 456, I, 1º, da Instrução Normativa RFB nº 971/2009 (também com alterações, inclusive pela IN RFB 1477/2014) considerada que a declaração em Aviso de Regularização da Obra (ARO) é modalidade de lançamento por homologação. Mesmo pela redação original do art. 456, da Instrução Normativa RFB nº 971/2009, o conteúdo do ARO já era suficiente para que o Fisco considerasse lançada a exigência tributária.
- Não há impedimento na Lei nº 8.212/1991 e na Instrução Normativa RFB nº 971/2009, inclusive em sua redação original, para o aproveitamento das remunerações pagas ou creditadas aos contribuintes individuais que prestem serviços na obra de construção civil (art. 22, III, da Lei nº 8.212/91) com vistas a deduzir os recolhimentos das contribuições previdenciárias porventura efetuados (art. 353 da IN 971/2009) ou para deduzir da RMT (arts. 354 e 359 da IN 971/2009). Os arts. 361 e 362 da mencionada instrução normativa (que foram revogados pela IN RFB nº 980/2009) excluem a remuneração relativa a segurados não vinculados à obra ou cuja função não integre o cálculo do CUB (parte do custo por metro quadrado da construção do projeto-padrão considerado, calculado pelos Sinduscon de acordo com a Norma Técnica nº 12.721, de 2006, da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), e é utilizado para a avaliação dos custos de construção das edificações – art. 344, § 1º, da IN 971/2009).
- A Instrução Normativa RFB nº 2021, de 16 de abril de 2021, que revogou a IN 971/2009, prevê expressamente em seu art. 31, § 2º, o aproveitamento das contribuições incidentes sobre a remuneração declarada para o contribuinte individual contratado para prestar serviços à obra, enquadrado como trabalhador autônomo ou como MEI de acordo com a tabela de categorias, para a dedução das contribuições indicadas.
- No caso dos autos, o acervo fático-probatório demonstra que o valor do débito apurado pela autoridade administrativa, após a entrega da DISO e das retificações das GFIPs para a correta identificação da obra e aproveitamento das contribuições pagas, decorre da desconsideração dos pagamentos efetuados a autônomos mediante RPA e devidamente declarados em GFIP. Ocorre que a ora impetrante efetuou os pagamentos devidos aos trabalhadores autônomos que laboraram na obra indicada nos autos e informou-os nas competentes declarações. Assim, tais valores devem ser abatidos na apuração das contribuições devidas em virtude dessa obra, cabendo à autoridade administrativa verificar a regularidade e suficiência dos recolhimentos efetuados.
- Após a prolação da sentença, a União peticionou nos autos informando que deixa de apelar pois, nos termos do processo administrativo, “Retificada de ofício a GPS recolhida pelo contribuinte para a competência 07/2020, temos por liquidado o valor devido no ARO, sendo assim, proponho seu arquivamento por perda de objeto.”, tendo sido essa informação comunicada à RFB para cumprimento, tendo obtido a resposta de que, após terem sido prestadas as informações complementares solicitadas, a demanda já foi resolvida.
- Remessa oficial desprovida.