AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5028051-76.2021.4.03.0000
RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO
AGRAVANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
AGRAVADO: DANIEL VASCONCELOS TEODORO
Advogado do(a) AGRAVADO: DIOGO AUGUSTO DEBS HEMMER - MG126187
OUTROS PARTICIPANTES:
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5028051-76.2021.4.03.0000 RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO AGRAVANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL AGRAVADO: DANIEL VASCONCELOS TEODORO Advogado do(a) AGRAVADO: DIOGO AUGUSTO DEBS HEMMER - MG126187 OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de agravo interno (art. 1.021 do CPC) oposto por DANIEL VASCONCELOS TEODORO, contra decisão terminativa proferida pelo Desembargador Federal Carlos Muta em ID 268477245, que deu provimento ao agravo de instrumento da UNIÃO FEDERAL, afastando a incidência da prescrição intercorrente, durante o processo administrativo, de créditos tributários, inclusive das multas de ofício. Em razões recursais (ID 268477245), alega a parte agravante o desacerto da decisão impugnada, eis que é válida a aplicação da prescrição intercorrente no processo administrativo-fiscal, em respeito ao disposto no artigo 1, §1º, da Lei n. 9.873/99. Devidamente intimada, a União Federal se declarou ciente (ID 270508049). É o relatório.
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5028051-76.2021.4.03.0000 RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO AGRAVANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL AGRAVADO: DANIEL VASCONCELOS TEODORO Advogado do(a) AGRAVADO: DIOGO AUGUSTO DEBS HEMMER - MG126187 OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Trata-se de agravo interno, na forma prevista no artigo 1.021 do CPC, cujo propósito é submeter ao órgão colegiado o controle da extensão dos poderes do relator e, bem assim, a legalidade da decisão monocrática proferida. A decisão recorrida, de lavra do Desembargador Federal Carlos Muta, no que se refere à questão controvertida, foi proferida nos seguintes termos: "(…) Na espécie, conforme descrito na inicial da ação originária, "O Autor foi instado em agosto de 2021, via Carta Cobrança, a realizar o pagamento de débitos no valor de R$ 144.316,97 (cento e quarenta e quatro mil, trezentos e dezesseis reais, e noventa e sete centavos), correspondente a IRPF lançado de ofício, e R$ 108.237,37 (cento e oito mil, duzentos e trinta e sete reais, e trinta e sete centavos), referente a multa de ofício sobre o IRPF". Tanto decadência como prescrição de crédito tributário são disciplinadas por lei complementar, no caso o Código Tributário Nacional, nos termos da reserva constitucional a que alude o artigo 146, III, b, da Lei Maior, não admitindo, portanto, regência por lei ordinária como a Lei 9.873/1999, tanto que, expressamente, dispôs o respectivo artigo 5º, que "O disposto nesta Lei não se aplica às infrações de natureza funcional e aos processos e procedimentos de natureza tributária". O crédito tributário em si e as penalidades por infração à legislação tributária sujeitam-se ao regime do Código Tributário Nacional, que prevê regras de aplicação das respectivas normas (artigos 105 e 106), adotando, ainda, parâmetros específicos de interpretação da "lei tributária que define infrações, ou lhe comina penalidades" (artigo 112), respaldando, assim, a jurisprudência da Corte Superior, que destacou o entendimento de que "A multa fiscal subsume-se aos prazos de prescrição estabelecidos pelo direito tributário". O lançamento de ofício, com lavratura de auto de infração, abrangeu crédito principal e encargos, inclusive multa punitiva, conforme expresso na prova que acompanhou a inicial (ID 212205549), não se cindindo o processo administrativo em fiscal e administrativo estrito senso para ensejar regime diferenciado de prescrição, como suposto. A propósito, em convergência com a jurisprudência superior, assim tem decidido esta Corte: AI 5021916-19.2019.4.03.0000, Rel. Des. Fed. CONSUELO YOSHIDA, julgado em 21/02/2020: "AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSO ADMINISTRATIVO. AUSÊNCIA DE PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. ART. 1º, § 1º, LEI 9.873/99 E ART. 24, LEI 11.457/07. PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. INVIÁVEL ANÁLISE. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. 1. No curso do procedimento administrativo não corre prescrição, tampouco há se falar em prescrição intercorrente, com fundamento no art. 4º do Decreto n. 20.910/1932 e Decreto n. 70.235/72, regramento específico do processo administrativo fiscal. Precedentes do STJ e desta Corte Regional (REsp 840111/RJ, Rel. Ministro LUIZ FUX, 1ª Turma, j 02.06.2009, DJe de 01.07.2009; REsp 651198/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, 2ª Turma, j 21.06.2007, DJe de 30.09.2008; TRF3, 4ª Turma, Des. Fed. Rel. Mônica Nobre, AC 00358783020094036182, e-DJF3 Judicial 1 DATA:27/08/2015). 2. Em razão do princípio da especialidade, não se aplicam as normas gerais previstas no artigo 1º, § 1º da Lei n. 9.873/1999 nem no artigo 24 da lei 11.457/2007. 3. De outra parte, inviável a análise do pleito de reconhecimento do cerceamento de defesa na esfera administrativa, sob pena de supressão de instância, eis que o d. magistrado não se manifestou a esse respeito na r. decisão agravada. 4. Agravo de instrumento improvido." A prescrição intercorrente para créditos tributários, incluindo multas fiscais, não é prevista no âmbito do processo administrativo-fiscal, mas apenas no âmbito do processo de execução fiscal, nos termos do artigo 40 da Lei 6.830/1980, e em conformidade com o paradigma repetitivo firmado no julgamento do REsp 1.340.553, e teses jurídicas aprovadas (Temas 566 a 571). À luz da jurisprudência consolidada, não cabe cogitar, pois, de probabilidade do direito para efeito de tutela de urgência, a teor do artigo 300, CPC, razão pela qual cabe a reforma da decisão agravada. Ante o exposto, com esteio no artigo 932, CPC, dou provimento ao agravo de instrumento, nos termos supracitados." No que diz com o mérito, tenho por não demonstrado qualquer abuso ou ilegalidade na decisão recorrida. O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento consolidado no sentido de que “orecurso administrativo suspende a exigibilidade do crédito tributário, enquanto perdurar o contencioso administrativo, nos termos do art. 151, III do CTN (...), sendo certo que somente a partir da notificação do resultado do recurso ou da sua revisão, tem início a contagem do prazo prescricional, afastando-se a incidência prescrição intercorrente em sede de processo administrativo fiscal, pela ausência de previsão normativa específica”, conforme se verifica dos arestos a seguir transcritos: “PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AÇÃO ORDINÁRIA. ARGÜIÇÃO DE PRESCRIÇÃO ADMINISTRATIVA INTERCORRENTE. NÃO OCORRÊNCIA. TERMO INICIAL. CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. ARTIGO 174, DO CTN. MINISTÉRIO PÚBLICO. ILEGITIMIDADE PARA RECORRER. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. INOCORRÊNCIA. (...) 3. O recurso administrativo suspende a exigibilidade do crédito tributário, enquanto perdurar o contencioso administrativo, nos termos do art. 151, III do CTN, desde o lançamento (efetuado concomitantemente com auto de infração), momento em que não se cogita do prazo decadencial, até seu julgamento ou a revisão ex officio, sendo certo que somente a partir da notificação do resultado do recurso ou da sua revisão, tem início a contagem do prazo prescricional, afastando-se a incidência prescrição intercorrente em sede de processo administrativo fiscal, pela ausência de previsão normativa específica. (...) 14. Recurso especial desprovido.” (REsp n. 1.113.959/RJ, relator Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 15/12/2009, DJe de 11/3/2010.) (grifos nossos) “PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AÇÃO ANULATÓRIA FISCAL. INOVAÇÃO RECURSAL. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO DE MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL I - Trata-se de ação anulatória de crédito fiscal em que a parte autora pleiteia a anulação do crédito tributário que deu origem à CDA n. 05049/2014; por não reconhecer o referido débito, assim como que seja reconhecida a prescrição intercorrente do referido crédito do Fisco. Na sentença, reconheceu-se a ocorrência da prescrição da pretensão do Estado/Apelante de efetuar a cobrança da dívida tributária e, via de consequência, julgou extinto o processo com resolução do mérito. No Tribunal a quo, a sentença foi mantida. II - O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento pacífico no sentido de que somente a partir da notificação do resultado do recurso ou da sua revisão administrativa, tem início a contagem do prazo prescricional, afastando-se a incidência da prescrição intercorrente em processo administrativo fiscal, pela ausência de previsão normativa específica. III - Não é possível analisar questões não debatidas pelo Tribunal de origem, por caracterizar inovação de fundamentos; lembrando que mesmo as chamadas questões de ordem pública, apreciáveis de ofício nas instâncias ordinárias, devem estar prequestionadas, a fim de viabilizar sua análise nesta instância especial. Precedentes da Corte Especial: AgRg nos EREsp. 1.253.389/SP, relator Min. Humberto Martins, DJe 2.5.2013 e AgRg nos EAg 1.330.346/RJ, relatora Min. Eliana Calmon, DJe 20.02.2013. IV - Outrossim, o Superior Tribunal de Justiça tem entendimento pacífico de que, somente a partir da notificação do resultado do recurso ou da sua revisão administrativa, tem início a contagem do prazo prescricional, afastando-se a incidência da prescrição intercorrente em processo administrativo fiscal, pela ausência de previsão normativa específica. Nesse sentido: REsp 1.769.896/MG, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 13/11/2018, DJe 17/12/2018 e AgInt no AREsp 1.304.866/SP, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 17/10/2018, DJe 30/10/2018. V - Agravo interno improvido. (AgInt no REsp n. 1.856.683/ES, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 24/5/2021, DJe de 28/5/2021.) (grifos nossos) A Lei nº 9.873, de 23 de novembro de 1999, por sua vez, estabelece prazo de prescrição para o exercício de ação punitiva pela Administração Pública Federal, a saber: “Art. 1o Prescreve em cinco anos a ação punitiva da Administração Pública Federal, direta e indireta, no exercício do poder de polícia, objetivando apurar infração à legislação em vigor, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado. § 1o Incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho, cujos autos serão arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada, sem prejuízo da apuração da responsabilidade funcional decorrente da paralisação, se for o caso.” (grifos nossos) Em seu artigo 5º esclarece que o “disposto nesta Lei não se aplica às infrações de natureza funcional e aos processos e procedimentos de natureza tributária”, e, portanto, reforça o limite de aplicação do artigo 1º, §1º, restringindo-o à prescrição da ação punitiva da Administração no exercício do poder de polícia. Acerca da questão debatida neste feito - incidência da prescrição intercorrente no procedimento administrativo – há que se registrar, ainda, que o C. STJ, ao julgar o REsp nº 1.115.078/RS, sob a sistemática dos recursos repetitivos, firmou a seguinte tese jurídica (Tema Repetitivo nº 328): “É de três anos a "prescrição intercorrente" no procedimento administrativo, que não poderá ficar parado na espera de julgamento ou despacho por prazo superior, devendo os autos, nesse caso, serem arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada”. (REsp n. 1.115.078/RS, relator Ministro Castro Meira, Primeira Seção, julgado em 24/3/2010, DJe de 6/4/2010.) O Ministro Relator Castro Meira, em seu voto, fez importantes considerações sobre o âmbito de aplicação da Lei nº 9.873/99: “Pode-se afirmar que somente as ações administrativas punitivas desenvolvidas no plano da Administração Federal, seja direta, seja indireta, recebem a incidência do disposto nesta lei, como fica claro da parte inicial do seu art. 1º. Conjugam-se, pois, dois elementos na determinação do âmbito de aplicação da Lei 9.873/99, os quais serão úteis para se fixar, a contrário senso, as atividades dele excluídas: (a) a natureza punitiva da ação administrativa; e (b) o caráter federal da autoridade responsável por essa ação. Sob o prisma negativo, a Lei 9.873/99 não se aplica: (a) às ações administrativas punitivas desenvolvidas por estados e municípios, pois o âmbito espacial da lei limita-se ao plano federal; (b) às ações administrativas que, apesar de potencialmente desfavoráveis aos interesses dos administrados, não possuem natureza punitiva, como as medidas administrativas revogatórias, as cautelares ou as reparatórias; e (c) por expressa disposição do art. 5º, às ações punitivas disciplinares e às ações punitivas tributárias, sujeitas a prazos prescricionais próprios, a primeira com base na Lei 8.112/90 e a segunda com fundamento no Código Tributário Nacional.” Assim, impõe-se, necessariamente, o exame da natureza jurídica da penalidade imposta ao contribuinte, isto é, se a multa constante do Auto de Infração impugnado possui caráter estritamente administrativo ou se detém índole administrativo/fiscal (na medida em que guarda relação com a fiscalização e arrecadação de tributos), para fins de aplicação (ou não) da prescrição intercorrente disposta na Lei nº 9.873/99. E, no caso em debate, entendo que deva prevalecer a segunda opção, pelas razões a seguir expostas. Consta dos autos da demanda subjacente a íntegra do Termo de Verificação de Ação Fiscal que acompanhou o Auto de Infração elaborado pela Receita Federal (ID 121207586 - p. 63-68 do Processo n. 5028524-95.2021.4.03.6100), do qual é possível extrair os seguintes apontamentos: “(...) No exercício das funções de Auditor Fiscal da Receita Federal procedemos à fiscalização do contribuinte, acima identificado, determinada pelo Mandado de Procedimento Fiscal n° 08.1.90.00-2008-00210-9 de 24/01/2008, que objetiva apuração de movimentação financeira incompatível com os rendimentos declarados pelo contribuinte para os exercício de 2006 ano-calendário de 2005. 0 procedimento fiscal teve inicio em 14/02/2008, através da lavratura do Termo de Inicio de Fiscalização, anexado As fls.08, que foi enviado ao contribuinte via "Aviso de Recebimento". Em tal Termo de Inicio de Fiscalização solicitamos ao contribuinte, que no prazo de 20 ( vinte ) dias, apresentasse , basicamente, as cópias de seus extratos bancários que deram origem A sua movimentação financeira junto ao Banco do Brasil S/A e também a comprovação , mediante documentação hábil e legal, da origem dos recursos depositados/creditados em tal conta/corrente. (…) Por entender que os documentos apresentados pelo contribuinte e acima listados nos itens 1,2,3,4,5 e 6 são documentos comprobatórios insuficientes para justificar a origem dos depósitos/ créditos realizados via contrato de mútuo, pois não são embasados em escrituração fiscal da empresa e nem mesmo em extratos bancários da mesma ,onde constem quer os recebimentos dos empréstimos, quer os pagamentos efetuados ao Sr. Daniel Vasconcelos Teodoro, deixamos a priori de considerar tais depósitos/créditos como justificados. (…) Isto posto, lavramos o Auto de Infração de fls.132 a 137, em que tributamos mensalmente os valores depositados/creditados e não justificados na sua conta bancária, de acordo com art. 849 do RIR199 e art. 1° da Lei n° 11.119/05. (…)" (g.n.) Como se vê, a sanção aplicada derivou da ausência de apresentação pelo contribuinte de justificativa plausível para a origem de recursos creditados em sua conta bancária, o que levou o Fisco a concluir pela ocultação de rendimentos e, consequentemente, efetuar o lançamento de ofício do tributo devido, acrescido da multa prevista no artigo 44, I, da Lei n. 9.430/96. Em conclusão, é nítido que toda a atividade fiscalizatória que culminou na aplicação de penalidade na modalidade multa proporcional, possui como pano de fundo exatamente o não cumprimento de obrigação tributária vinculada à arrecadação de tributos. Assim, por se tratar de ação punitiva com caráter tributário, sujeita a prazo prescricional próprio, com fundamento no CTN (conforme, ademais, assentado no voto condutor do julgamento do Tema Repetitivo nº 328/STJ), resta afastada a alegação de incidência da prescrição intercorrente constante da Lei nº 9.873/99, cabendo destacar, ainda, a expressa ressalva ali contida quanto a não aplicação do instituto aos processos e procedimentos de natureza tributária. Dos documentos juntados pelos agravantes, observa-se que efetivamente já decorreu prazo considerável desde a interposição do recurso administrativo voluntário (17/05/2013 - ID 121207589 - p. 44-60 da ação subjacente) e o seu julgamento definitivo (15/04/2021 - ID 121207589 - p. 74-78 e 84 da ação subjacente). Todavia, conforme restou demonstrado pelos precedentes e pela legislação citados, não existe prescrição executória durante o processo administrativo fiscal (prescrição intercorrente administrativa), tendo em vista que, além da ausência de previsão legal que ampare qualquer pleito nesse sentido, o curso do prazo prescricional somente tem início com a constituição definitiva do crédito tributário, o que se efetiva apenas com o término do processo administrativo. No mesmo raciocínio, confira-se o entendimento desta Terceira Turma: “PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO ACESSÓRIA. PENALIDADE COM NATUREZA DE CRÉDITO TRIBUTÁRIO. INOCORRÊNCIA DE PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE NO CURSO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO. AGENTE DE CARGOS QUE SE REVESTE DE CONDIÇÃO DE SUJEITO PASSIVO. DENÚNCIA ESPONTÂNEA. INAPLICABILIDADE AO DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO ACESSÓRIA. 1. A questão posta nos autos diz respeito à exigibilidade multa por descumprimento de obrigação tributária acessória, prevista no art. 107, IV, e, do Decreto-Lei 37/66. 2. A penalidade imposta em face do descumprimento de obrigação tributária acessória possui natureza jurídica de crédito tributário, aplicando-se à hipótese as disposições dos art. 173 e 174 do Código Tribunal Nacional, relativas à prescrição e decadência. Isto porque, a obrigação acessória, pelo simples fato de sua inobservância, converte-se em obrigação principal relativamente à penalidade pecuniária, nos termos do art. 113, §3º, do referido diploma legal. No mesmo sentido, o §2º do art. 39 da Lei 4.320/64, menciona que integram a dívida ativa não tributária as multas de qualquer natureza, exceto as tributárias, do que se depreende logicamente que as multas tributárias integram a dívida ativa tributária por possuírem natureza jurídica de crédito tributário. 3. É posicionamento do Superior Tribunal de Justiça que, enquanto pendente o recurso administrativo, não correm os prazos prescricional e decadencial, sendo certo que, apenas a partir da data em que o contribuinte é notificado do resultado do recurso é que tem início a contagem do prazo de prescrição previsto no art. 174 do Código Tributário Nacional, de forma que não há falar em prescrição intercorrente em sede de processo administrativo fiscal. No mesmo sentido, o teor da Súmula 622 do C. Superior Tribunal de Justiça: a notificação do auto de infração faz cessar a contagem da decadência para a constituição do crédito tributário; exaurida a instância administrativa com o decurso do prazo para a impugnação ou com a notificação de seu julgamento definitivo e esgotado o prazo concedido pela Administração para o pagamento voluntário, inicia-se o prazo prescricional para a cobrança judicial. Não há que se falar em análise de prescrição intercorrente no curso do processo administrativo. 4. Quanto às demais teses suscitadas, o art. 37 do Decreto-Lei 37/66 prescreve que o transportador de cargas procedentes do exterior tem o dever legal de prestar informações à Receita Federal do Brasil sobre a chegada do veículo e sobre as cargas transportadas, na forma e no prazo estabelecidos pela Receita Federal. Com efeito, o fornecimento intempestivo das informações caracteriza descumprimento de obrigação acessória, sancionado nos termos do art. 107, IV, e, do mesmo diploma legal. 5. A Instrução Normativa 800/2007 estabeleceu que o prazo de 48 horas para a prestação das informações sobre as cargas transportadas deve se dar antes da atracação ou da desatracação da embarcação em porto no país. Igualmente, conforme disposto no art. 37, §1º, do Decreto-Lei 37/66, considera-se o Agente de Cargas qualquer pessoa que em nome do importador ou do exportador contrate o transporte de mercadorias, consolide ou desconsolide cargas e preste serviços conexos, também tem o dever de prestar as informações sobre as operações que executa e respectivas cargas. 6. Nesse contexto, a autuada reveste-se de todas as condições necessária para subsunção à tipicidade tributária. Também, não se cogita de hipótese de denúncia espontânea por se tratar de instituo inaplicável nos casos de descumprimento de obrigação tributária acessória. Por este entendimento, observa-se o precedente do C. Superior Tribunal de Justiça (REsp n. 1.860.115/SP, relator Ministro Mauro Campbell Marques, relator para AC 7. Tendo em vista a inversão sucumbencial, fixam-se honorários advocatícios nos percentuais mínimos do art. 85, §3º, do Código de Processo Civil, em prejuízo da demandante, incidentes sobre o valor atualizado da causa.órdão Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 9/5/2023, DJe de 27/6/2023). 8. Apelação provida para julgar improcedentes os pedidos.” (TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5004786-66.2021.4.03.6104, Rel. Desembargador Federal CONSUELO YATSUDA MOROMIZATO YOSHIDA, julgado em 09/10/2023, DJEN DATA: 16/10/2023) Assim, não demonstrado qualquer abuso ou ilegalidade na decisão recorrida, de rigor sua manutenção. Ante o exposto, nego provimento ao agravo interno oposto pela parte executada. É como voto.
E M E N T A
AGRAVO INTERNO. PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA PESSOA FÍSICA - IRPF. MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA ATÍPICA E NÃO JUSTIFICADA. OCULTAÇÃO DE RENDIMENTO. LANÇAMENTO DE OFÍCIO DO TRIBUTO DEVIDO. INCIDÊNCIA DE MULTA PROPORCIONAL. CARÁTER TRIBUTÁRIO DA SANÇÃO. NÃO INCIDÊNCIA DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE EM PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE OU ABUSO DE PODER. DECISÃO MONOCRÁTICA TERMINATIVA MANTIDA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
1 - O agravo interno tem o propósito de submeter ao órgão colegiado o controle da extensão dos poderes do relator e, bem assim, a legalidade da decisão monocrática proferida.
2 – O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento consolidado no sentido de que “orecurso administrativo suspende a exigibilidade do crédito tributário, enquanto perdurar o contencioso administrativo, nos termos do art. 151, III do CTN (...), sendo certo que somente a partir da notificação do resultado do recurso ou da sua revisão, tem início a contagem do prazo prescricional, afastando-se a incidência prescrição intercorrente em sede de processo administrativo fiscal, pela ausência de previsão normativa específica”. Precedentes.
3 - A Lei nº 9.873, de 23 de novembro de 1999, por sua vez, estabelece prazo de prescrição para o exercício de ação punitiva pela Administração Pública Federal, a saber: "(...) § 1o Incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho, cujos autos serão arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada, sem prejuízo da apuração da responsabilidade funcional decorrente da paralisação, se for o caso.”. Em seu artigo 5º esclarece que o “disposto nesta Lei não se aplica às infrações de natureza funcional e aos processos e procedimentos de natureza tributária”, e, portanto, reforça o limite de aplicação do artigo 1º, §1º, restringindo-o à prescrição da ação punitiva da Administração no exercício do poder de polícia.
4 - Acerca da questão debatida neste feito - incidência da prescrição intercorrente no procedimento administrativo – há que se registrar, ainda, que o C. STJ, ao julgar o REsp nº 1.115.078/RS, sob a sistemática dos recursos repetitivos, firmou a seguinte tese jurídica (Tema Repetitivo nº 328): “É de três anos a "prescrição intercorrente" no procedimento administrativo, que não poderá ficar parado na espera de julgamento ou despacho por prazo superior, devendo os autos, nesse caso, serem arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada”. (REsp n. 1.115.078/RS, relator Ministro Castro Meira, Primeira Seção, julgado em 24/3/2010, DJe de 6/4/2010).
5 - Assim, impõe-se, necessariamente, o exame da natureza jurídica da penalidade imposta ao contribuinte, isto é, se a multa constante do Auto de Infração impugnado possui caráter estritamente administrativo ou se detém índole administrativo/fiscal (na medida em que guarda relação com a fiscalização e arrecadação de tributos), para fins de aplicação (ou não) da prescrição intercorrente disposta na Lei nº 9.873/99. E, no caso em debate, deve prevalecer a segunda opção, pelas razões a seguir expostas.
6 - Consta dos autos da demanda subjacente a íntegra do Termo de Verificação de Ação Fiscal que acompanhou o Auto de Infração elaborado pela Receita Federal (ID 121207586 - p. 63-68 do Processo n. 5028524-95.2021.4.03.6100). Dele se extrai que a sanção aplicada derivou da ausência de apresentação pelo contribuinte de justificativa plausível para a origem de recursos creditados em sua conta bancária, o que levou o Fisco a concluir pela ocultação de rendimentos e, consequentemente, efetuar o lançamento de ofício do tributo devido, acrescido da multa prevista no artigo 44, I, da Lei n. 9.430/96.
7 - Em conclusão, é nítido que toda a atividade fiscalizatória que culminou na aplicação de penalidade na modalidade multa proporcional, possui como pano de fundo exatamente o não cumprimento de obrigação tributária vinculada à arrecadação de tributos.
8 - Assim, por se tratar de ação punitiva com caráter tributário, sujeita a prazo prescricional próprio, com fundamento no CTN (conforme, ademais, assentado no voto condutor do julgamento do Tema Repetitivo nº 328/STJ), resta afastada a alegação de incidência da prescrição intercorrente constante da Lei nº 9.873/99, cabendo destacar, ainda, a expressa ressalva ali contida quanto a não aplicação do instituto aos processos e procedimentos de natureza tributária.
9 - Dos documentos juntados pelo contribuinte, observa-se que efetivamente decorreu prazo considerável entre a interposição do recurso administrativo voluntário (17/05/2013 - ID 121207589 - p. 44-60 da ação subjacente) e o seu julgamento definitivo (15/04/2021 - ID 121207589 - p. 74-78 e 84 da ação subjacente). Todavia, conforme restou demonstrado pelos precedentes e pela legislação citados, não existe prescrição executória durante o processo administrativo fiscal (prescrição intercorrente administrativa), tendo em vista que, além da ausência de previsão legal que ampare qualquer pleito nesse sentido, o curso do prazo prescricional somente tem início com a constituição definitiva do crédito tributário, o que se efetiva apenas com o término do processo administrativo. Precedente.
10 - Assim, não demonstrado qualquer abuso ou ilegalidade na decisão recorrida, de rigor sua manutenção.
11 – Agravo interno oposto pelo contribuinte desprovido.