
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5022212-45.2017.4.03.6100
RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA
APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
APELADO: AMBEV S.A.
Advogados do(a) APELADO: GUILHERME LATTANZI MENDES DE OLIVEIRA - SP387792-A, MIRIAN TERESA PASCON - SP132073-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5022212-45.2017.4.03.6100 RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA APELANTE: UNIÃO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: AMBEV S.A. Advogados do(a) APELADO: GUILHERME LATTANZI MENDES DE OLIVEIRA - SP387792-A, MIRIAN TERESA PASCON - SP132073-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O A Excelentíssima Senhora Desembargadora Federal MARLI FERREIRA (Relatora): Trata-se de recurso de apelação interposto pela UNIÃO FEDERAL contra r. sentença que julgou procedente o pedido formulado pela AMBEV S.A., para anular os acórdãos prolatados pela 1ª Turma da CSRF do CARF, ante a inconstitucionalidade de aplicação da MP 1.858-6/99, referente ao aproveitamento de bases negativas de CSLL pela incorporação havida anteriormente a sua edição, além de reconhecer a inexigibilidade dos Autos de Infração objeto de Processos Administrativos. Como consequência, condenou a União Federal ao pagamento de honorários advocatícios fixados nos moldes do artigo 85, §3º, I a V e § 5º do CPC. Inconformada, a União Federal alega que antes da MP nº 1.858-6, de 30 de junho de 1999, não havia nem mesmo autorização legal para que se compensasse base negativa de CSLL apurada por terceiros (empresas incorporadas), de forma que a lei apenas autorizava a compensação de base negativa própria. Ainda que se considere que a Medida Provisória trouxe realmente uma inovação no sistema jurídico, vedando o que antes era permitido, não há dúvida de que essa vedação deve ser aplicada às compensações ocorridas depois de 28/09/1999 (data da vigência da referida MP), mesmo que o evento de incorporação tenha ocorrido antes dessa data. Declara também que a legislação tributária aplica à Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) as mesmas normas de apuração de pagamento estabelecido para o Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ), e tal legislação, vigente na data da incorporação, vedava expressamente a compensação de IRPJ das empresas sucedidas pelas empresas sucessoras. A parte autora apresentou recurso de Apelação adesivo sob o argumento que, em caso de provimento do recurso do ente federal, deve ser analisada a ilegalidade do julgamento administrativo realizado com vício do voto qualificado do Presidente do CARF Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte, para julgamento. É o relatório.
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5022212-45.2017.4.03.6100 RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA APELANTE: UNIÃO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: AMBEV S.A. Advogados do(a) APELADO: GUILHERME LATTANZI MENDES DE OLIVEIRA - SP387792-A, MIRIAN TERESA PASCON - SP132073-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A Excelentíssima Senhora Desembargadora Federal MARLI FERREIRA (Relatora): A presente ação foi proposta com o objetivo de anular os acórdãos 9101-002.558, 9101-002.586 e 9101-002.587, prolatados pela 1ª Turma da CSRF do CARF, quer em decorrência da ilegalidade de prolação com base no Voto de Qualidade duplo do Presidente da CSRF, quer em razão da ilegalidade e inconstitucionalidade de aplicação da MP 1.858-6 aos aproveitamentos de base negativa de CSLL decorrentes de incorporações havidas anteriormente a sua edição. Requer também o direito às compensações nas apurações de CSLL dos anos 1999, 2000 e 2001, extinguindo a parte remanescente em cobrança no Auto de Infração nº 19515.003475/2005-07 e no Processo nº 19515.001521/2006-14. Conforme se depreende dos autos, a parte autora foi autuada por supostas irregularidades praticadas no recolhimento de valores de CSLL, declarados e apurados em sua escrituração contábil e fiscal no período de janeiro de 1999 a dezembro de 2001. A divergência de valores deu-se pela tentativa de a Ambev S.A. compensar crédito tributário originado das empresas por ela sucedidas na data de 28 de abril de 1999. A glosa da compensação de base negativa resultou na redução do valor do saldo negativo de CSLL apurado pela contribuinte em 31/12/2000, de R$ 8.561.587,87 para R$ 3.364.040,42 (PA nº 19515.003475/2005-07), e em 31/12/2001 restou um débito de CSLL em aberto no ajuste anual no valor de R$ 844.858,78 (PA nº 19515.001521/2006-14). Além dessa redução no valor do saldo negativo em 31/12/2000, a autuação fiscal abrangeu também a aplicação de multa isolada por falta de recolhimento de estimativas mensais de CSLL em alguns meses do ano-calendário 2000. A atuação do Fisco se deu em virtude da edição da Medida Provisória nº 1.856-6/1999, que passou a estender o tratamento já previsto para o IRPJ também à CSLL, em razão do seu artigo 20, in verbis: “Art. 20. Aplica-se à base de cálculo negativa da CSLL o disposto nos arts. 32 e 33 do Decreto-Lei nº 2.341, de 29 de junho de 1987.” Por sua vez, assim dispõe os art. 32 e 33 do referido Decreto-Lei: “Art. 32. A pessoa jurídica não poderá compensar seus próprios prejuízos fiscais, se entre a data da apuração e da compensação houver ocorrido cumulativamente modificações de seu controle societário e do ramo de atividade. Art. 33. A pessoa jurídica sucessora por incorporação, fusão ou cisão não poderá compensar prejuízos fiscais da sucedida.” No julgamento em primeiro grau, o juiz a quo entendeu "assistir razão à autora, em observância ao princípio da irretroatividade da lei tributária disposto no artigo 150, inciso III, a, da Constituição Federal, não podendo ser imposta a limitação prevista no artigo 20 da Medida Provisória 1.858-6/1999 à utilização de créditos decorrentes de base negativa de CSLL de empresas sucedidas pelas empresas sucessoras, cuja incorporação, fusão ou cisão tenha se dado em momento anterior ao início da vigência da aludida Medida Provisória." Inicialmente, convém afastar a alegação da Fazenda Nacional de que, antes da MP nº 1.858-6/99, não havia autorização legal para compensação de base negativa de CSLL apurada por terceiros, havendo autorização legal apenas para a compensação de base negativa própria. A partir do momento em que foi efetivada a incorporação, não há se falar em patrimônio da empresa sucedida, uma vez que ocorreu a transferência tanto dos ativos quanto dos passivos, ou seja, os valores deixaram de ser "de terceiros" e passaram a ser "próprios". Em relação à questão de fundo, mostra-se indiferente o fato da incorporação ter ocorrido em abril de 1999, portanto, antes da edição da MP n° 1.858-6/99, que passou a vigorar a partir de outubro de 1999. A relevância da questão é que no momento da compensação, em dezembro de 1999, já havia norma vigente proibitiva da possibilidade de compensação dos prejuízos fiscais da empresa sucedida. Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça possui posicionamento consolidado no sentido de que a lei que regula a compensação tributária é a vigente à data do encontro de contas entre os recíprocos débito e crédito da Fazenda e do contribuinte, in verbis: "TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. COMPENSAÇÃO TRIBUTÁRIA. LEI APLICÁVEL. VEDAÇÃO DO ART. 170-A DO CTN. INAPLICABILIDADE A DEMANDA ANTERIOR À LC 104/2001. (REsp 1164452/MG. Relator Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI. Primeira Seção. Julgado em 25/08/2010) Dessa forma, como o pedido de compensação foi realizado ao final do ano-calendário de 1999, já estava em vigor o art. 20 da Medida Provisória 1.858-6/1999, que impossibilita o aproveitamentos de base negativa de CSLL decorrentes de incorporações realizada pela pessoa jurídica sucessora, impossibilitando a compensação de prejuízos fiscais. Em relação ao Recurso Adesivo interposto pela parte autora, é de se destacar que a dinâmica do voto de qualidade para as decisões colegiadas do CARF encontra amparo legal no próprio Regimento Interno do órgão, que prevê em seu artigo 54 que "as turmas só deliberarão quando presente a maioria de seus membros, e suas deliberações serão tomadas por maioria simples, cabendo ao presidente, além do voto ordinário, o de qualidade”. Tal mecanismo também está previsto no art. 25 do Decreto nº. 70.235/72, in verbis: Nota-se, pois, que essa técnica de decisão tem previsão legal e é largamente instituída pelos órgãos do Poder Judiciário e do Poder Executivo, não podendo presumir suspeição ou impedimento no voto de qualquer membro, seja ele representante da Fazenda Nacional ou dos contribuintes. Cabe a lembrança que o CARF é um órgão de composição paritária em que seus membros devem exercer sua função pautando-se por padrões éticos, no tocante à imparcialidade, integridade, moralidade e decoro. Dessa forma, não apenas no voto de qualidade, mas em qualquer outro, os conselheiros devem proferi-los de forma motivada, observando o princípio da legalidade e resguardando o interesse público. Logo, o voto de qualidade demonstra não ter natureza de representação, objetivando apenas solucionar situação excepcional de empate na votação de colegiados, dentro dos ditames legais. Ante o exposto, dou provimento à apelação e à remessa necessária, para reformar a r. sentença de primeiro grau. É como voto.
1. A lei que regula a compensação tributária é a vigente à data do encontro de contas entre os recíprocos débito e crédito da Fazenda e do contribuinte. Precedentes.
2. Em se tratando de compensação de crédito objeto de controvérsia judicial, é vedada a sua realização "antes do trânsito em julgado da respectiva decisão judicial", conforme prevê o art. 170-A do CTN, vedação que, todavia, não se aplica a ações judiciais propostas em data anterior à vigência desse dispositivo, introduzido pela LC 104/2001. Precedentes.
3. Recurso especial provido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/08."
“Art. 25. O julgamento do processo de exigência de tributos ou contribuições administrados pela Secretaria da Receita Federal compete:
I - em primeira instância, às Delegacias da Receita Federal de Julgamento, órgãos de deliberação interna e natureza colegiada da Secretaria da Receita Federal;
a) aos Delegados da Receita Federal, titulares de Delegacias especializadas nas atividades concernentes a julgamento de processos, quanto aos tributos e contribuições administrados pela Secretaria da Receita Federal.
b) às autoridades mencionadas na legislação de cada um dos demais tributos ou, na falta dessa indicação aos chefes da projeção regional ou local da entidade que administra o tributo, conforme for por ela estabelecido.
II – em segunda instância, ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, órgão colegiado, paritário, integrante da estrutura do Ministério da Fazenda, com atribuição de julgar recursos de ofício e voluntários de decisão de primeira instância, bem como recursos de natureza especial.
(...)
§ 9º Os cargos de Presidente das Turmas da Câmara Superior de Recursos Fiscais, das câmaras, das suas turmas e das turmas especiais serão ocupados por conselheiros representantes da Fazenda Nacional, que, em caso de empate, terão o voto de qualidade, e os cargos de Vice-Presidente, por representantes dos contribuintes.”
E M E N T A
TRIBUTÁRIO. CSLL. APROVEITAMENTO DE BASE NEGATIVA. EMPRESA SUCESSORA. MP 1858-6/99. COMPENSAÇÃO. LEI VIGENTE NO ENCONTRO DE CONTAS. PRECEDENTES STJ. VOTO DE QUALIDADE NO CARF. LEGALIDADE.
1. A presente ação foi proposta com o objetivo de anular os acórdãos prolatados pela 1ª Turma da CSRF do CARF em decorrência da ilegalidade de prolação com base no Voto de Qualidade duplo do Presidente da CSRF e em razão da ilegalidade e inconstitucionalidade de aplicação da MP 1.858-6 aos aproveitamentos de base negativa de CSLL decorrentes de incorporações havidas anteriormente a sua edição.
2. A parte autora foi autuada por supostas irregularidades praticadas no recolhimento de valores de CSLL, declarados e apurados em sua escrituração contábil e fiscal no período de janeiro de 1999 a dezembro de 2001. A divergência de valores deu-se pela tentativa de a Ambev S.A. compensar crédito tributário originado das empresas por ela sucedidas na data de 28 de abril de 1999.
3. A atuação do Fisco se deu em virtude da edição da Medida Provisória nº 1.856-6/1999, que passou a estender o tratamento já previsto para o IRPJ também à CSLL, nos termos do art. 33 do Decreto-Lei nº 2.341 de 1987, que dispõe "A pessoa jurídica sucessora por incorporação, fusão ou cisão não poderá compensar prejuízos fiscais da sucedida."
4. Convém afastar a alegação da Fazenda Nacional de que, antes da MP nº 1.858-6/99, não havia autorização legal para compensação de base negativa de CSLL apurada por terceiros. A partir do momento em que foi efetivada a incorporação, não há se falar em patrimônio da empresa sucedida, uma vez que ocorreu a transferência tanto dos ativos quanto dos passivos, ou seja, os valores deixaram de ser "de terceiros" e passaram a ser "próprios".
5. Em relação à questão de fundo, mostra-se indiferente o fato da incorporação ter ocorrido em abril de 1999, portanto, antes da edição da MP n° 1.858-6/99, que passou a vigorar a partir de outubro de 1999. A relevância da questão é que no momento da compensação, em dezembro de 1999, já havia norma vigente proibitiva da possibilidade de compensação dos prejuízos fiscais da empresa sucedida. Nesse sentido, o STJ possui posicionamento consolidado no sentido de que a lei que regula a compensação tributária é a vigente à data do encontro de contas entre os recíprocos débito e crédito da Fazenda e do contribuinte.
6. Em relação ao Recurso Adesivo interposto pela parte autora, é de se destacar que a dinâmica do voto de qualidade para as decisões colegiadas do CARF encontra amparo legal no próprio Regimento Interno do órgão (artigo 54), além de previsão no art. 25 do Decreto nº. 70.235/72. Cabe a lembrança que o CARF é um órgão de composição paritária em que seus membros devem exercer sua função pautando-se por padrões éticos, no tocante à imparcialidade, integridade, moralidade e decoro. Dessa forma, não apenas no voto de qualidade, mas em qualquer outro, os conselheiros devem proferi-los de forma motivada, observando o princípio da legalidade e resguardando o interesse público.
7. Apelação e remessa providas.