APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5014912-27.2020.4.03.6100
RELATOR: Gab. 45 - DES. FED. ANTONIO MORIMOTO
APELANTE: APARECIDA DE LOURDES FERNANDES GONCALVES BIRCH
Advogado do(a) APELANTE: FABIANA CARVALHO DOS SANTOS - SP168547-A
APELADO: MARTINEZ & ASSOCIADOS S/S LTDA., INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL
Advogados do(a) APELADO: BRUNO MARTINEZ Y PELL - SP227592-A, LUIZ EDGARD MONTAURY PIMENTA - RJ46214-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5014912-27.2020.4.03.6100 RELATOR: Gab. 45 - DES. FED. ANTONIO MORIMOTO APELANTE: APARECIDA DE LOURDES FERNANDES GONCALVES BIRCH Advogado do(a) APELANTE: FABIANA CARVALHO DOS SANTOS - SP168547-A APELADO: MARTINEZ & ASSOCIADOS S/S LTDA., INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL Advogados do(a) APELADO: BRUNO MARTINEZ Y PELL - SP227592-A, LUIZ EDGARD MONTAURY PIMENTA - RJ46214-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO MORIMOTO (RELATOR): Trata-se de apelação interposta por APARECIDA DE LOURDES FERNANDES GONÇALVES em face da r. sentença proferida pelo MM. Juízo da 13ª Vara Cível Federal de São Paulo que, no bojo de ação ordinária proposta pela apelante em face de CAFÉ BRITT COSTA RICA S/A e do INPI, julgou improcedente o pedido. Cuida-se, na origem, de ação ordinária na qual busca a apelante a anulação de ato administrativo praticado pelo Instituto que indeferiu o pedido formulado sob o nº 910.648.778 de registro da marca "BRITS". Esclarece que atua no ramo de comércio de alimentos e que sua empresa é sediada na capital do Rio de Janeiro. Afirma que, preocupada com a identificação e distintividade de sua marca, criou o domínio "www.britsfood.com.br". Relata que os produtos comercializados são inspirados no sabor da Grã-Bretanha e na origem de seu sobrenome ("Birch"). Destaca que em 19/2/2016 solicitou o registro da marca mista "BRITS", o qual foi indeferido pelo INPI em 29/5/2018 sob o fundamento de que a marca reproduz a bandeira do Reino Unido da Grã-Bretanha, sendo irregistrável de acordo com o art. 124, I, da LPI, bem como por reproduzir ou imitar registros de terceiros (art. 124, XIX, da LPI). Interposto recurso em face de tal decisão, este restou indeferido. Cita que o Instituto apontou a marca "BRITT" (pedido nº 907.569.161) como impeditiva ao registro pleiteado pela apelante, empresa de titularidade estrangeira que atua na produção de cafés, chocolates em pó para bebidas, doces, caramelos e biscoitos. Sustenta que "Birch" advém de seu patronímico, considerado brasão, e que a dificuldade em se pronunciar o referido nome no Brasil fez com que alterasse sua marca para "Brits". Declara que o nome possui compatibilidade com o que produz, uma vez que comercializa sanduíches de origem britânica similares aos comercializados em lojas de conveniência do Reino Unido. Explica que "BRITS" é diminutivo de "britânicos", pois sua família é de origem britânica e que o ordenamento jurídico brasileiro permite a utilização do sobrenome como marca. Defende que a proteção oferecida pelo registro se limita às inovações impostas em todo o seu conjunto e não apenas para uma sílaba, prefixo, sufixo ou palavras que compõem a marca. Argumenta que, em consulta ao INPI, constatou marca registrada composta pelo elemento figurativo da bandeira do Reino Unido, sem que houvesse qualquer impedimento e/ou indicação de infração ao art. 124, I, da LPI, com patente violação do princípio da isonomia. Justifica que o indeferimento da marca "BRITS" é indevido diante da distinção entre os produtos oferecidos e do fato de as marcas possuírem público-alvo diferenciado. Pondera que o próprio INPI tem concedido registros de marcas idênticas para serviços diferentes e até dentro mesmo da mesma classe, com base no princípio da especialidade. O INPI apresentou contestação na qual alegou: a) a impossibilidade de registro de marcas que reproduzam símbolos e/ou monumentos oficiais em razão de a marca sub judice destacar em seu aspecto figurativo, mais especificamente no ponto do “i” do termo “Brits”, o desenho da bandeira do Reino Unido, característica que vai de encontro direito ao impedimento legal previsto art. 124, I, da LPI; b) que o sinal proposta pela autora reproduz elementos essenciais e característicos dos sinais depositados pela Café Britt Costa Rica S/A, notadamente, o uso de forma geométricas, cores e/ou combinações de cores semelhantes contribuem para gerar ou aumentar o risco de confusão ou associação indevida entre os conjuntos marcários; c) que a similaridade gráfica também contribui para gerar ou aumentar o risco de confusão ou associação indevida; c) que a sonoridade das palavras e o aspecto ideológico são outros fatores determinantes para caracterizar a colidência entre os dois conjuntos; d) que, além do setor alimentício comum, as especificações de ambas as marcas sugerem que assinalam produtos complementares (café, líquidos e sanduíches) aptos a gerar confusão ou associação indevida dos sinais; e) que a mesma empresa titular da marca “Britt” possui ainda um outro registro concedido para a marca “BRITT SHOP” (pedido n° 907565611), enquadrado na classe 35, por meio do qual realiza a venda de produtos próprios e terceirizados, dentre eles produtos alimentícios afins (id 284322075). A Café Britt Costa Rica S/A apresentou contestação na qual alegou: a) ilegitimidade passiva, uma vez que a ação busca a anulação do indeferimento ao pedido de registro de marca da autora; b) é apenas a titular do registro apontado como impeditivo pelo INPI; c) que a ação não busca anular a marca "Britt" ou os direitos emanados deste registro; d) que o Instituto agiu de maneira correta ao indeferir o pedido da autora, uma vez que são irregistráveis, na forma do art. 129, I, da LPI; e) que a proteção ao patronímico expressa em lei diz respeito ao exato nome de família, não sendo garantido o direito ao registro de uma variação, subtração ou acréscimo; f) que o conjunto como um todo da marca da autora impossibilitou o pedido de registro, seja em razão da logomarca contendo a bandeira do Reino Unido, seja em razão da reprodução da marca "Britt" anteriormente registrada; g) que apenas duas letras distinguem as marcas "Britt" e "Brits"; h) a possibilidade de confusão ou associação indevida entre as marcas (id 284322078). Em 29/9/2023, proferida a r. sentença que julgou improcedente o pedido autoral sob o fundamento que a marca claramente se vale da utilização da bandeira do Reino Unido da Grã-Bretanha, sendo, portanto, irregistrável, nos termos do art. 124, inciso I, da LPI. À ocasião, fixou-se a verba sucumbencial em 10% sobre o valor atualizado da causa (id 284322096). A parte autora apelou alegando: a) que a r. sentença afastou a aplicação do art. 124, XIX, da LPI, em razão de ter declarado que a marca seria irregistrável tão somente em razão do art. 124, I, da referida lei; b) que a parte irregistrável da marca "Brits" no que se refere ao uso da bandeira do Reino Unido da Grã-Bretanha em sua logo pode ser excluída conforme o Manual de Marcas do INPI. Requer o provimento do recurso para que possa excluir a bandeira de sua logomarca, nos termos do Manual de Marcas, uma vez que o uso da imagem não afeta a sua distintividade (id 284322098). O INPI (id 284322104) e a Café Britt Costa Rica S/A (id 284322105) apresentaram contraminuta. Vieram os autos à conclusão. É o relatório. jsg
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5014912-27.2020.4.03.6100 RELATOR: Gab. 45 - DES. FED. ANTONIO MORIMOTO APELANTE: APARECIDA DE LOURDES FERNANDES GONCALVES BIRCH Advogado do(a) APELANTE: FABIANA CARVALHO DOS SANTOS - SP168547-A APELADO: MARTINEZ & ASSOCIADOS S/S LTDA., INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL Advogados do(a) APELADO: BRUNO MARTINEZ Y PELL - SP227592-A, LUIZ EDGARD MONTAURY PIMENTA - RJ46214-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO MORIMOTO (RELATOR): Dos fatos Busca a apelante a reforma da r. sentença que declarou a sua marca como irregistrável com base no art. 124, inciso I, da LPI. Sustenta que é possível, de acordo com o Manual de Marcas do Instituto, a exclusão da bandeira do Reino Unido da Grã-Bretanha de sua logomarca a tornar registrável a marca "Brits" sem que esbarre em nenhuma violação legal. Cinge-se a controvérsia, portanto, em verificar se é possível o acolhimento do pedido da apelante consistente na exclusão da bandeira do Reino Unido de sua logomarca, a fim de tornar a sua marca registrável. Do mérito Da manutenção da r. sentença - irregistrabilidade de logomarca que utiliza bandeira (art. 124, I, LPI) A apelante inaugura a peça recursal alegando o seguinte: "necessário salientar que a r. sentença de fls. brilhantemente afastou a aplicação do artigo 124 inciso XIX da LPI, pois o indeferimento perante o Apelado Réu aplicou a irregistrabilidade da marca da Apelante com base no artigo 124 incisos I e XIX da LPI" (id 284322098, fls. 4). Ao contrário do exposto pela recorrente, em verdade, a r. sentença, ao considerar como preenchido o óbice trazido pelo art. 124, inciso I, da Lei 9.279/96, julgou improcedente o pedido por este motivo, não tendo, em momento algum, afastado o outro motivo impeditivo declarado no ato administrativo impugnado (inciso XIX - anterioridade registral). Adiante, conforme bem delineado pelo juízo de origem (id 284322096): "No presente caso, o indeferimento se deu em razão de considerar o INPI que a marca que a autora pretendia registrar reproduz a bandeira do Reino Unido da Grã-Bretanha, irregistrável de acordo com o inciso I do art. 124 da citada LPI, nos seguintes termos: Art. 124. Não são registráveis como marca: I - brasão, armas, medalha, bandeira, emblema, distintivo e monumento oficiais, públicos, nacionais, estrangeiros ou internacionais, bem como a respectiva designação, figura ou imitação; Com efeito, a análise de liceidade do sinal marcário é uma das etapas do exame substantivo e considera sua interdição legal por motivos de ordem pública ou por razão moral e dos bons costumes, nos termos das proibições legais previstas nos incisos I, III, XI e XIV do art. 124 da LPI. Analisando a marca constante no documento de ID36626765, de fato, verifica-se claramente a utilização da bandeira do Reino Unido da Grã-Bretanha, tratando-se, portanto, de marca irregistrável, nos termos do art. 124, inciso I, da LPI". Por certo, a utilização da bandeira na logomarca esbarra na proibição constante no art. 124, I, da LPI, a tornar a marca irregistrável no ordenamento jurídico brasileiro, devendo ser mantida a r. sentença nesse ponto. Entendo desnecessário o enfrentamento da questão da anterioridade reconhecida pelo INPI, em seu ato de indeferimento do registro da marca Brits, pois não houve, aqui, reforma da sentença quanto à aplicação do inciso I do art. 124 da LPI. Apenas se tivesse havido o afastamento da incidência do inciso I se tornaria imprescindível a análise do outro motivo administrativo de impossibilidade registral, contido no inciso XIX do art. 124 da LPI (art. 1.013 do CPC). Ademais, o recurso de apelação não trouxe fundamentação quanto ao tema da anterioridade, limitando-se, como já dito, a afirmar que a sentença já havia afastado a aplicação do inciso XIX, o que não ocorreu. Pedido de retirada da parte irregistrável da marca A apelante requer, no bojo da apelação, que lhe seja deferida a oportunidade de retirada da bandeira da Inglaterra de sua logomarca, a fim de que sua marca se torne registrável, nos termos do Manual de Marcas. Sustenta que, de acordo com Parecer INPI/PROC nº 48/2003, caso o requerente do pedido, em sua defesa, solicite a retirada do termo ou elemento irregistrável do sinal atacado, será admitida a possibilidade de alteração do mesmo, se atendidas certas condições. Tratando-se de ação declaratória de nulidade de ato de indeferimento de registro de marca pelo INPI, cujo pedido administrativo não abarcou, de forma subsidiária, a possibilidade de retirada da bandeira do Reino Unido da Grã-Bretanha, entendo que o pleito de exclusão da bandeira trazido no apelo se consubstancia em inovação recursal, não admitida no ordenamento, motivo pelo qual deixo de conhecê-lo. Além disso, nova proposta de registro da marca, sem a bandeira, deve ser apresentada junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial, a fim de que o Instituto analise tal possibilidade. Verba honorária Em razão da sucumbência recursal, instituída no artigo 85, §11, do CPC/2015, desprovido o apelo, os honorários fixados na sentença devem, no caso, ser majorados em 2%. Conclusão Ante o exposto, não conheço de parte do apelo e, na parte conhecida, nego-lhe provimento, observada a majoração recursal acima explicitada. É como voto.
E M E N T A
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E EMPRESARIAL. PEDIDO DE DECLARAÇÃO DE NULIDADE DE ATO ADMINISTRATIVO DO INPI QUE INDEFERIU O REGISTRO DA MARCA POR ANTERIORIDADE REGISTRAL E USO DE BANDEIRA DE ESTADO ESTRANGEIRO NA LOGOMARCA DA EMPRESA. SENTENÇA QUE JULGOU IMPROCEDENTE O PEDIDO DECLARANDO QUE A MARCA SERIA IRREGISTRÁVEL EM RAZÃO DO USO DA BANDEIRA DA GRÃ-BRETANHA EM SUA LOGOMARCA. APELO QUE PEDE A EXCLUSÃO DA BANDEIRA DE SUA LOGOMARCA PARA TORNAR A MARCA REGISTRÁVEL. INOVAÇÃO RECURSAL. NOVA PROPOSTA DE REGISTRO DE MARCA DEVE SER APRESENTADA JUNTO AO INPI.
- Busca a apelante a reforma da r. sentença que declarou a sua marca como irregistrável com base no art. 124, inciso I, da LPI. Sustenta que é possível, de acordo com o Manual de Marcas do Instituto, a exclusão da bandeira do Reino Unido da Grã-Bretanha de sua logomarca a tornar registrável a marca "Brits" sem que esbarre em nenhuma violação legal.
- Cinge-se a controvérsia em verificar se é possível o acolhimento do pedido da apelante consistente na exclusão da bandeira do Reino Unido de sua logomarca, a fim de tornar a sua marca registrável.
- Ao contrário do exposto pela recorrente, a r. sentença, ao considerar como preenchido o óbice trazido pelo art. 124, inciso I, da Lei 9.279/96, julgou improcedente o pedido por este motivo, não tendo, em momento algum, afastado o outro motivo impeditivo declarado no ato administrativo impugnado (inciso XIX - anterioridade registral). A utilização da bandeira na logomarca esbarra na proibição constante no art. 124, I, da LPI, a tornar a marca irregistrável no ordenamento jurídico brasileiro, devendo ser mantida a r. sentença nesse ponto.
- Desnecessário o enfrentamento da questão da anterioridade reconhecida pelo INPI, em seu ato de indeferimento do registro da marca Brits, pois não houve, aqui, reforma da sentença quanto à aplicação do inciso I do art. 124 da LPI. Apenas se tivesse havido o afastamento da incidência do inciso I se tornaria imprescindível a análise do outro motivo administrativo de impossibilidade registral, contido no inciso XIX do art. 124 da LPI (art. 1.013 do CPC). O recurso de apelação não trouxe fundamentação quanto ao tema da anterioridade, limitando-se a afirmar que a sentença já havia afastado a aplicação do inciso XIX, o que não ocorreu.
- A apelante requer que lhe seja deferida a oportunidade de retirada da bandeira da Inglaterra de sua logomarca, a fim de que sua marca se torne registrável, nos termos do Manual de Marcas. Sustenta que, de acordo com Parecer INPI/PROC nº 48/2003, caso o requerente do pedido, em sua defesa, solicite a retirada do termo ou elemento irregistrável do sinal atacado, será admitida a possibilidade de alteração do mesmo, se atendidas certas condições.
- Por se tratar de ação declaratória de nulidade de ato de indeferimento de registro de marca pelo INPI, cujo pedido administrativo não abarcou, de forma subsidiária, a possibilidade de retirada da bandeira do Reino Unido da Grã-Bretanha, entende-se que o pleito de exclusão da bandeira trazido no apelo se consubstancia em inovação recursal, não admitida no ordenamento, motivo pelo qual não se conhece do pedido.
- Nova proposta de registro da marca, sem a bandeira, deve ser apresentada junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial, a fim de que o Instituto analise tal possibilidade.
- Verba sucumbencial majorada.
- Apelo conhecido em parte e, na parte conhecida, improvido.