Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003292-29.2018.4.03.6119

RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. RENATO BECHO

APELANTE: THAIANI RIBEIRO DA SILVA GOMES

Advogado do(a) APELANTE: CRISTIANE TAVARES MOREIRA - SP254750-A

APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL

Advogado do(a) APELADO: JACKSON WILLIAM DE LIMA - PR60295-A

OUTROS PARTICIPANTES:

TERCEIRO INTERESSADO: EMGEA - EMPRESA GESTORA DE ATIVOS
 

ADVOGADO do(a) TERCEIRO INTERESSADO: JOAO PEDRO KOSTIN FELIPE DE NATIVIDADE - SP424776-A
ADVOGADO do(a) TERCEIRO INTERESSADO: GENESIO FELIPE DE NATIVIDADE - SP433538-A

 


 

  

 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003292-29.2018.4.03.6119

RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. RENATO BECHO

APELANTE: THAIANI RIBEIRO DA SILVA GOMES

Advogado do(a) APELANTE: CRISTIANE TAVARES MOREIRA - SP254750-A

APELADO: CAIXA ECONOMICA FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

R E L A T Ó R I O

 

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RENATO BECHO, RELATOR:

Trata-se de apelação interposta por THAIANI RIBEIRO DA SILVA GOMES contra a sentença (ID 5141988, pág. 119/124) proferida nos autos da Ação Ordinária movida em face da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF.

A apelante firmou com a CEF contrato de financiamento de imóvel, oportunidade na qual restou pactuado entre as partes o reajuste mensal de acordo com o Sistema de Amortização Constante – SAC. Entendendo que o sistema aplicado onera sobremaneira a parte contratante, THAIANI RIBEIRO DA SILVA GOMES ingressou com ação ordinária de revisão contratual com repetição de indébito.

Em sentença, o Juízo a quo julgou improcedente o pedido de revisão de contrato considerando inexistir ilegalidade ou inconstitucionalidade no procedimento adotado pela instituição financeira (ID 5141988, pág. 119/124).

Em suas razões recursais, e em breve síntese, insurge-se a apelante contra a aplicação da cláusula contratual que prevê a cobrança de juros acima de 10% e contra o Sistema de Amortização Constante - SAC. Pugna pela revisão de prestações e saldo devedor, restituição em dobro dos valores pagos indevidamente e aplicação do Código de Defesa do Consumidor na espécie.

Com contrarrazões da CEF (ID 5141992, pág. 24), vieram os autos a esta Corte.

A Empresa Gestora de Ativos S.A.- EMGEA manifestou-se nos autos requerendo a sua inclusão no polo passivo da demanda em substituição à Caixa Econômica Federal (ID 257429129, pág.01) em razão da cessão dos direitos creditórios habitacionais discutidos na demanda (257430232, pág. 1/8).

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003292-29.2018.4.03.6119

RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. RENATO BECHO

APELANTE: THAIANI RIBEIRO DA SILVA GOMES

Advogado do(a) APELANTE: CRISTIANE TAVARES MOREIRA - SP254750-A

APELADO: CAIXA ECONOMICA FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

V O T O

 

 O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RENATO BECHO, RELATOR:

Compulsando os autos, verifico que a apelante firmou com a CEF contrato de compra e venda de imóvel residencial no dia 26 de setembro de 2012 (ID 5141987, pág. 43). Em agosto de 2015 buscou provimento judicial alegando que o Sistema de Amortização Constante/SAC adotado nos reajustes mensais provocou onerosidade excessiva, gerando a incidência de juros sobre juros, ao ponto de levar a parte contratante à inadimplência (ID 5141987, pág 3/38).

Em suas razões, pleiteia o recálculo das prestações a cada 12 meses, anulando a cláusula que dispõe sobre o recálculo mensal, a exclusão dos juros capitalizados de forma composta (contrário à Sumula 121 do STF e ao Decreto 22.626/33) e a aplicação do Código de Defesa do Consumidor – CDC para que sejam reconhecidas a abusividade do método comercial e as cláusulas abusivas adotadas pela instituição financeira.

Código de Defesa do Consumidor

Anoto ser firme a jurisprudência do C. Supremo Tribunal Federal (ADI 2591) e do C. Superior Tribunal de Justiça (Súmula nº 297) pela aplicabilidade dos princípios do Código de Defesa do Consumidor aos contratos de mútuo bancário. O mesmo Superior Tribunal de Justiça, por outro lado, entende que nos contratos bancários é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas (Súmula nº 381).

Todavia, disso não decorre automática e imperativamente a nulidade de toda e qualquer cláusula tida como prejudicial ao interesse financeiro do consumidor, que firma livremente um contrato com instituição financeira. Mesmo nos casos em que se verifica o prejuízo financeiro, a nulidade pressupõe que o contrato ou cláusula contratual tenha imposto desvantagem exagerada ao consumidor (artigo 51, IV, do CDC), ofendendo os princípios fundamentais do sistema jurídico, restringindo direitos ou obrigações inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio, ou se mostrando excessivamente onerosa para o consumidor, considerada a natureza e o conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso (artigo 51, § 1º, do CDC).

Também não implica nulidade contratual a natureza adesiva dos ajustes. Com efeito, sendo a elaboração unilateral das cláusulas contratuais inerente ao contrato de adesão e encontrando-se esta espécie contratual expressamente autorizada pelo Código de Defesa do Consumidor (artigo 54), seria ilógico que a unilateralidade pudesse ser tomada, em abstrato, como causa suficiente ao reconhecimento da nulidade ou abusividade do ajuste.

Cumpre ao mutuário, portanto, demonstrar as causas concretas e específicas do suposto abuso ou nulidade das cláusulas dos contratos em testilha. Cabe ao autor, pretendendo a aplicação da teoria da imprevisão, demonstrar os fatos supervenientes à contratação que teriam tornado excessivamente oneroso o seu cumprimento, conforme o artigo 6º, V, do CDC. A suposta onerosidade excessiva pode decorrer do próprio conteúdo das cláusulas contratuais, não de fatos externos e posteriores à contratação, a autorizar a aplicação do referido dispositivo legal.

Ressalto, neste ponto, que os contratos de adesão firmados livremente com instituições financeiras não diferem dos contratos de adesão referentes a serviços essenciais, tais como o fornecimento de água, eletricidade, telefonia e outros imprescindíveis à dignidade da vida em ambiente urbano. Trata-se de contratos de empréstimo bancário cujo objeto, embora útil, não se revela imprescindível aos contratantes. Foram firmados, portanto, por vontade própria e não por inexigibilidade de outra conduta, decorrente da essencialidade - inexistente para o caso dos autos - de seu objeto.

A invocação, apenas na ocasião do cumprimento da obrigação, de suposta nulidade de cláusulas livremente aceitas no momento da celebração do acordo e da tomada do financiamento, viola a boa-fé contratual objetiva, por sua vertente do princípio do ne venire contra factum proprium. Em matéria de contratos impera o princípio pacta sunt servanda, notadamente quando as cláusulas contratuais observam legislação meticulosa e cogente. Também por essa razão, não se pode olvidar o princípio rebus sic standibus, por definição, requer a demonstração de que não subsistem as circunstâncias fáticas que sustentavam o contrato e que justificam o pedido de revisão contratual.

Capitalização de Juros. Anatocismo

A questão central dos autos repousa na alegada ocorrência de anatocismo no contrato de mútuo firmado no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação. Conforme se depreende da documentação colacionada, o contrato de financiamento firmado entre as partes adotou o sistema de amortização SAC (sistema de amortização constante) (ID 5141987, pág. 44).

Grande controvérsia envolve a interpretação e a aplicação das regras que disciplinam o anatocismo no Brasil. Não raro, defende-se que a legislação pátria proibiria a utilização de juros compostos, juros efetivos ou qualquer mecanismo que envolvesse "capitalização de juros".

Neste diapasão, estaria configurado o paroxismo de proibir conceitos abstratos de matemática financeira, prestigiando somente a aplicação de juros simples ou nominais, sem necessariamente lograr atingir uma diminuição efetiva dos montantes de juros remuneratórios devidos, já que a maior ou menor dimensão paga a este título guarda relação muito mais estreita com o patamar dos juros contratados que com a frequência com que são "capitalizados".

Em tempos modernos, a legislação sobre o anatocismo, ao mencionar "capitalização de juros" ou "juros sobre juros", não se refere a conceitos da matemática financeira ou a qualquer situação pré-contratual, os quais pressupõem um regular desenvolvimento da relação contratual. Como conceito jurídico, as restrições a "capitalização de juros" ou "juros sobre juros" disciplinam as hipóteses em que, já vigente o contrato, diante do inadimplemento, há um montante de juros devidos, vencidos e não pagos que pode ou não ser incorporado ao capital para que incidam novos juros sobre ele.

Em outras palavras, na data em que vencem os juros, pode haver pagamento e não ocorrerá "capitalização", em sentido jurídico estrito. Na ausência de pagamento, porém, pode haver o cômputo dos juros vencidos e não pagos em separado, ou a sua incorporação ao capital/saldo devedor para que incidam novos juros. Apenas nesta última hipótese pode-se falar em "capitalização de juros" ou anatocismo para efeitos legais.

A ilustrar a exegese, basta analisar o texto do artigo 4º do Decreto 22.626/33, conhecido como "Lei de Usura":

Art. 4º. E proibido contar juros dos juros: esta proibição não compreende a acumulação de juros vencidos aos saldos líquidos em conta corrente de ano a ano.

Se a redação da primeira parte do dispositivo não é das mais cuidadosas, a segunda parte é suficiente para delimitar o alcance do conceito e afastar teses das mais variadas em relação à proibição do anatocismo.

Feitas tais considerações, é de se ressaltar que não há no ordenamento jurídico brasileiro proibição absoluta para a "capitalização de juros" (vencidos e não pagos). As normas que disciplinam a matéria, quando muito, restringiram a possibilidade de capitalização de tais juros em prazo inferior a um ano. Desde o Artigo 253 do Código Comercial já se permitia a capitalização anual, proibindo-se a capitalização em prazo inferior, restrição que deixou de existir no texto do artigo 1.262 do Código Civil de 1916. O citado artigo 4º do Decreto 22.626/33, conhecido como "Lei de Usura", retoma o critério da capitalização anual.

A mens legis do art. 4º do Decreto 22.626/33, ao restringir a capitalização nestes termos, é evitar que a dívida aumente em proporções não antevistas pelo devedor em dificuldades ao longo da relação contratual. O dispositivo não guarda qualquer relação com o processo de formação da taxa de juros, como a interpretação meramente literal e isolada de sua primeira parte poderia levar a crer. Neste sentido é a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (Segunda Seção, EREsp. 917.570/PR, relatora Ministra Nancy Andrighi, DJe 4.8.2008 e REsp. 1.095.852-PR, DJe 19.3.2012).

Deste modo, tem-se o pano de fundo para se interpretar a Súmula 121 do STF:

É vedada a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada. (Súmula 121 do STF)

A súmula veda a capitalização de juros mesmo quando convencionada. Veda a capitalização de juros (vencidos e não pagos), mesmo quando convencionada (em período inferior ao permitido por lei).

A Súmula 596 do STF, mais recente e abordando especificamente o caso das instituições financeiras, por sua vez, prevê:

As disposições do Decreto 22.626/33 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o sistema financeiro nacional. (Súmula 596 do STF)

A jurisprudência diverge quanto ao alcance da Súmula 596 do STF no que diz respeito ao anatocismo. De toda sorte, a balizar o quadro normativo exposto, o STJ editou a Súmula 93, segundo a qual a legislação sobre cédulas de crédito rural, comercial e industrial admite o pacto de capitalização de juros.

Em outras palavras, nestas hipóteses admite-se a capitalização de juros vencidos e não pagos em frequência inferior à anual, nos termos da legislação específica. As normas legais que disciplinam cada tipo de financiamento passaram a ser um critério seguro para regular o anatocismo.

Deste modo, mesmo ao não se considerar como pleno o alcance da Súmula 596 do STF, há na legislação especial do Sistema Financeiro da Habitação autorização expressa para a capitalização mensal de juros desde a edição da Lei 11.977/09 que incluiu o Artigo 15-A na Lei 4.380/64.

Há que se considerar, ainda, que desde a MP 1.963-17/00, com o seu artigo 5º reeditado pela MP 2.170-36/01, já existia autorização ainda mais ampla para todas as instituições do Sistema Financeiro Nacional. A consequência do texto da medida provisória foi permitir, como regra geral para o sistema bancário, não apenas o regime matemático de juros compostos, mas o anatocismo propriamente dito.

O Supremo Tribunal Federal entendeu que não há inconstitucionalidade na MP 2.170-36/01 em razão de seus pressupostos:

CONSTITUCIONAL. ART. 5º DA MP 2.170/01. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS COM PERIODICIDADE INFERIOR A UM ANO. REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA EDIÇÃO DE MEDIDA PROVISÓRIA. SINDICABILIDADE PELO PODER JUDICIÁRIO. ESCRUTÍNIO ESTRITO. AUSÊNCIA, NO CASO, DE ELEMENTOS SUFICIENTES PARA NEGÁ-LOS. RECURSO PROVIDO.
1. A jurisprudência da Suprema Corte está consolidada no sentido de 
que, conquanto os pressupostos para a edição de medidas provisórias se exponham ao controle judicial, o escrutínio a ser feito neste particular tem domínio estrito, justificando-se a invalidação da iniciativa presidencial apenas quando atestada a inexistência cabal de relevância e de urgência.
2. Não se pode negar que o tema tratado pelo art. 5º da MP 2.170/01 é relevante, porquanto o tratamento normativo dos juros é matéria extremamente sensível para a estruturação do sistema bancário, e, consequentemente, para assegurar estabilidade à dinâmica da vida econômica do país.
3. Por outro lado, a urgência para a edição do ato também não pode ser rechaçada, ainda mais em se considerando que, para tal, seria indispensável fazer juízo sobre a realidade econômica existente à época, ou seja, há quinze anos passados.
4. Recurso extraordinário provido.
(STF, RE 592377 / RS - RIO GRANDE DO SUL, RECURSO EXTRAORDINÁRIO, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. TEORI ZAVASCKI, 04/02/2015)

Ressalte-se que tanto a legislação do SFN quanto a do SFH são especiais em relação à Lei de Usura e às normas do Código Civil.

A reforçar todo o entendimento anteriormente exposto, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 539, nos seguintes termos:

É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anual em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31/3/2000 (MP n. 1.963-17/2000, reeditada como MP n. 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada. (Súmula 539 do STJ)

Em suma, não ocorre anatocismo em contratos de mútuo pela simples adoção de sistema de amortização que se utilize de juros compostos. Tampouco se vislumbra o anatocismo pela utilização de taxa de juros efetiva com capitalização mensal derivada de taxa de juros nominal com capitalização anual, ainda quando aquela seja ligeiramente superior a esta. Por fim, a capitalização de juros devidos, vencidos e não pagos é permitida nos termos autorizados pela legislação e nos termos pactuados entre as partes.

Apenas com a verificação de ausência de autorização legislativa especial e de previsão contratual, poderá ser afastada a capitalização de juros devidos, vencidos e não pagos em prazo inferior a um ano. Nesta hipótese, em se verificando o inadimplemento de determinada prestação, a contabilização dos juros remuneratórios não pagos deve ser realizada em conta separada, sobre a qual incidirá apenas correção monetária, destinando-se os valores pagos nas prestações a amortizar primeiramente a conta principal.

Limites legais às Taxas de Juros.

A respeito dos limites legais à taxa de juros, há muito não se sustenta a argumentação baseada no artigo 192, § 3º da CF, como é autoexplicativo o texto da Súmula Vinculante nº 7 do STF:

A norma do § 3º do artigo 192 da Constituição, revogada pela Emenda Constitucional nº 40/2003, que limitava a taxa de juros reais a 12% ao ano, tinha sua aplicação condicionada à edição de lei complementar. (Súmula Vinculante nº 7, STF)

Tampouco se aplica o limite de 10% do artigo 6º, e, da Lei 4.380/64 para os juros remuneratórios, porque o artigo 6º, e, da Lei 4.380/1964 apenas tratou dos critérios de reajuste de contratos de financiamento, sem contudo, limitar a taxa de juros, conforme já pacificado pelo STJ na Súmula 422:

O art. 6º, e, da Lei nº. 4.380/64 não estabelece limitação aos juros remuneratórios nos contratos vinculados ao SFH. (Súmula 422 do STJ)

As taxas de juros no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação são reguladas pelo artigo 25 da Lei 8.692/93 e artigo 25 da Lei 4.380/64, os quais preveem o limite de 12% ao ano.

Art. 25. Nos financiamentos celebrados no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, a taxa efetiva de juros será de, no máximo, doze por cento ao ano. (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.197-43, de 24.8.2001)
1º (Vetado.)
2º Compete ao Banco Central do Brasil estabelecer a taxa de juros, até o limite estabelecido no caput deste artigo, em função da renda do 
mutuário, no caso dos financiamentos realizados com recursos oriundos de caderneta de poupança.
3º Compete ao Conselho Curador do Fundo de Garantia do Tempo de 
Serviço fixar a taxa de juros, até o limite estabelecido no caput deste artigo, em função da renda do mutuário, para operações realizadas com recursos deste fundo.

A constatação de que a taxa nominal foi fixada em 12% ao ano em determinado contrato, gerando uma taxa efetiva ligeiramente superior a 12%, mas seguramente inferior a 13%, não é suficiente para configurar abuso que justifique o recálculo das prestações, conforme já entendeu o Superior Tribunal de Justiça em sua Súmula 382:

A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade. (Súmula 382 do STJ)

Deste modo, não se vislumbra que a taxa de juros fixada no contrato configure abuso que justifique o recálculo da dívida.

A matéria já foi objeto de julgamento pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 973.827, nos termos do artigo 543-C, sendo esclarecer o voto da Ministra Maria Isabel Gallotti que orienta o presente julgado:

3. Teses para os efeitos do art. 543-C do CPC:
- "É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada."
- "A capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada".
[...]
(REsp 973827 RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Rel. p/ Acórdão Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 08/08/2012, DJe 24/09/2012)

Sistema de Amortização Constante (SAC)

O contrato de mútuo é um dos cernes da atividade empresarial praticada pelas instituições financeiras pela qual ofertam quantia em dinheiro em troca de remuneração por juros. Ao efetivar pagamentos parcelados, o mutuário tem de realizar o reembolso do capital que inicialmente lhe foi disponibilizado, além de remunerar o mutuante por meio de juros incidentes em função do tempo necessário para que a dívida seja extinta.

Três são os sistemas de amortização que são utilizados com mais frequência pelas instituições financeiras para operacionalizar a atividade: SAC, Sacre e Price.

A adoção do SAC adota amortização constante, mas para tanto trabalha com prestações variáveis, inicialmente mais altas e decrescentes ao longo do tempo, compreendendo uma quantia decrescente paga a título de juros a cada prestação, e uma quantia total menor paga a título de juros remuneratórios em relação ao Sistema Francês de Amortização.

Como se vê, a sua utilização, não implica, de per si, qualquer irregularidade, sendo ônus da apelante demonstrar a ocorrência de outros fatores, que, aliados a este sistema de amortização, supostamente provocaram desequilíbrio contratual. É de se ressaltar que mesmo nos contratos que se desenvolvem com uma grande disparidade entre os índices de correção monetária e os reajustes salariais do mutuário, em regra, há a previsão de cobertura pelo fundo de compensação de variações salariais que garantem o equilíbrio econômico financeiro da relação obrigacional.

O mero inadimplemento, reforçado por uma interpretação meramente literal e assistemática da Lei de Usura que questiona a própria lógica dos sistemas de amortização, não é favorável aos direitos do consumidor, ao princípio da transparência e à segurança jurídica, nem é suficiente para obter a revisão de contrato realizado dentro dos parâmetros legais.

PROCESSO CIVIL - SFH - REVISÃO CONTRATUAL - LEI 4.380/64 - LEI ORDINÁRIA - SACRE - JUROS - ANATOCISMO.
1 - (...).
2 - Não há nenhuma ilegalidade na adoção do Sistema de Amortização Crescente - SACRE, até porque referido sistema pressupõe a criação de uma planilha com uma taxa de juros previamente estabelecida e amortização progressiva do saldo devedor.
3 - A diferença de taxa de juros nominal e efetiva decorre do sistema de amortização eleito entre as partes que implica, na prática, o cálculo de juros sobre juros. Os juros embutidos nas prestações mensais, porém, não caracterizam anatocismo vedado por lei, já que esse método de cálculo define o valor das prestações destinadas à amortização do financiamento, mediante a aplicação de determinada taxa de juros e em certo prazo, com capitalização de juros que não encontra óbice na legislação vigente. A ocorrência de amortização negativa não constitui qualquer irregularidade, uma vez que provém de pagamento de valor de prestação que não se mostra suficiente sequer à quitação dos juros devidos.
4 - Apelação desprovida.
(TRF3, AC 00029879620094036103, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1753160, Relator Desembargador Federal Mauricio Kato, Quinta Turma, e-DJF3 Judicial 1 DATA:17/12/2015)

CIVIL - ALTERAÇÃO DE CLÁUSULA CONTRATUAL - CORREÇÃO MENSAL DAS PARCELAS PELO IPC A PARTIR DE JULHO DE 1994 - CORREÇÃO DO SALDO DEVEDOR PELA TR - PLANO REAL - SISTEMA FRANCÊS DE AMORTIZAÇÃO - APLICAÇÃO DO CDC - REDUÇÃO DO PLANO MENSAL DO SEGURO - RECURSO IMPROVIDO - SENTENÇA MANTIDA.
(...)
9. Não se vislumbra qualquer ilegalidade na adoção do Sistema Francês de Amortização - SFA ou Tabela Price, para regular o contrato de mútuo em questão. Trata-se de um sistema de amortização de dívida em prestações periódicas, iguais e sucessivas, cujo valor de cada prestação é composto de uma parcela de capital (amortização) e outra de juros, como previsto no art. 6º, "c", da Lei 4380/64.
10. Esse tipo de amortização, ademais, não acarreta incorporação de juros ao saldo devedor, já que os juros são pagos mensalmente, juntamente com as prestações, não havendo qualquer possibilidade de ocorrer anatocismo.
(...)
(TRF3, AC 00505420719984036100, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 882073, QUINTA TURMA, JUIZ CONVOCADO HELIO NOGUEIRA, e-DJF3 Judicial 2 DATA:13/01/2009)

CIVIL. SFH. PRESTAÇÕES. PES/CP. CES - COEFICIENTE DE EQUIPARAÇÃO SALARIAL. LEI Nº 8.692/93. REAJUSTES CONTRATUAIS. PLANOS ECONÔMICOS. CDC. NORMAS APLICÁVEIS AO CONTRATO DE FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO. TR. SUBSTITUIÇÃO PELO INPC. SALDO DEVEDOR. CORREÇÃO. AMORTIZAÇÃO. LEI Nº 4.380/64. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. DL 70/66. JUROS. CAPITALIZAÇÃO. SEGURO. RECURSO DE APELAÇÃO IMPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA.
(...)
Diversamente do que em geral acontece nos contratos de mútuo, os regidos pelo Sistema Financeiro da Habitação encontram previsão legal de amortização mensal da dívida, como se dessume do art. 6º, "c", da Lei n. 4.380/1964. Dessa disposição decorre para as instituições operadoras dos recursos do SFH a possibilidade de utilização da Tabela Price - bem como da SACRE e da SAC (atualmente os três sistemas mais praticados pelos bancos) - para o cálculo das parcelas a serem pagas, tendo em vista que, por esse sistema de amortização, as prestações são compostas de um valor referente aos juros e de um outro, referente à própria amortização. Os três sistemas importam juros compostos, que todavia encontram previsão contratual e legal, sem qualquer violação a norma constitucional. A capitalização de juros, quando prevista contratualmente, como no caso, tendo sido fixada a taxa de juros efetiva, não importa desequilíbrio entre os contratantes, que sabem o valor das prestações que serão pagas a cada ano.
(...)
Recurso de apelação improvido. Sentença mantida.
(TRF3, AC 00050589020034036100, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1570053, QUINTA TURMA, JUIZ CONVOCADO PAULO PUPO, e-DJF3 Judicial 1 DATA:16/03/2012)

No caso em análise, a apelante limitou-se a questionar a validade das cláusulas contratadas, as quais são regulares. Ademais, não logrou demonstrar que a CEF deixou de aplicá-las ou que sua aplicação provocou grande desequilíbrio em virtude das alterações das condições fáticas em que foram contratadas, apresentando fundamentação insuficiente. 

Não merece reforma a sentença objurgada. Como bem apontado em sentença, a perícia contábil foi conclusiva ao afirmar que as parcelas cobradas pela ré respeitam integralmente o pactuado em contrato (ID 5141988, pág. 78/96). Ademais, em resposta ao quesito 8, a perícia identificou a correta aplicação da taxa de juros e do sistema de amortização contratados ( ID 5141988, pág. 95).

Em suma, na ausência de comprovação de abuso ou desequilíbrio contratual, não havendo qualquer ilegalidade nas cláusulas contratadas, não há que se falar em compensação dos valores pagos a maior, repetição do indébito, enriquecimento sem causa ou devolução em dobro, não assistindo razão à apelante.

No que pertine ao pedido da Empresa Gestora de Ativos S.A.- EMGEA, a fim de que a CEF seja por ela sucedida no polo passivo do presente feito, inexiste prova de que a parte contrária tenha sido comunicada sobre a cessão do crédito, de modo que, na espécie, a Caixa Econômica Federal não pode ser excluída do polo passivo. Por outro lado, é permitido o ingresso da EMGEA como assistente litisconsorcial do cedente, conforme entendimento extraído artigo 109 do CPC:

Art. 109. A alienação da coisa ou do direito litigioso por ato entre vivos, a título particular, não altera a legitimidade das partes.
§ 1º O adquirente ou cessionário não poderá ingressar em juízo, sucedendo o alienante ou cedente, sem que o consinta a parte contrária.
§ 2º O adquirente ou cessionário poderá intervir no processo como assistente litisconsorcial do alienante ou cedente.

Este é o entendimento desta E. Corte Regional:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CESSÃO DE CRÉDITO. SUBSTITUIÇÃO DO POLO ATIVO. IMPOSSIBILIDADE. INGRESSO DA CESSIONÁRIA COMO ASSISTENTE LITISCONSORCIAL.

- No caso dos autos, a CEF não deve ser excluída do feito de origem e deferida a sucessão pela EMGEA,  uma vez que não foi comprovada a comunicação da parte contrária acerca da cessão de crédito objeto da demanda.

- Diante da autorização contida no art. 109, §2º, do CPC, vislumbra-se a possibilidade de inclusão da EMGEA no feito, na condição de assistente litisconsorcial da CEF.

- Agravo de instrumento provido em parte. Agravo interno prejudicado. (TRF 3ª Região, 2ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5021922-84.2023.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal JOSE CARLOS FRANCISCO, julgado em 07/12/2023, DJEN DATA: 15/12/2023)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. SFH. EXECUÇÃO DE TÍTULO JUDICIAL. CESSÃO DE CRÉDITOS. PEDIDO DE SUCESSÃO PROCESSUAL. CONCORDÂNCIA DA PARTE CONTRÁRIA. NECESSIDADE. RECURSO DESPROVIDO. 1. Em se tratando de contrato firmado originariamente com a Caixa Econômica Federal, e não havendo concordância da parte adversa quanto à sucessão processual, de rigor a manutenção da CEF no polo ativo. 2. Assim, tendo em conta que se cuida de cessão do crédito objeto da lide, cabe assinalar que, nos termos do art. 109, do CPC, a alienação da coisa ou do direito litigioso por ato entre vivos, a título particular, não altera a legitimidade das partes, sendo admitido o ingresso do adquirente ou cessionário, sucedendo o alienante ou cedente, apenas com o consentimento da parte contrária, o que não ocorreu no caso dos autos. 3. Agravo de instrumento desprovido. (AGRAVO DE INSTRUMENTO ..SIGLA_CLASSE: AI 5027717-42.2021.4.03.0000 ..PROCESSO_ANTIGO: ..PROCESSO_ANTIGO_FORMATADO:, Desembargador Federal LUIZ PAULO COTRIM GUIMARAES, TRF3 - 2ª Turma, DJEN DATA: 23/03/2022 ..FONTE_PUBLICACAO1: ..FONTE_PUBLICACAO2: ..FONTE_PUBLICACAO3:.)

Ressalto, por derradeiro, que a assistente litisconsorcial (no caso, a EMGEA), nos termos do art. 119, parágrafo único, do CPC, recebe o processo no estado em que se encontra.

Por fim, com a presente decisão, os honorários advocatícios devem majorados em 2%, nos termos do art. 85, § 11 do CPC, observados os benefícios da assistência judiciária gratuita.

Ante o exposto, nego provimento à apelação, com majoração da verba honorária, na forma da fundamentação acima.

É como voto.

  

 

 

 



EMENTA

 

PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO - SFH.  CDC. ANATOCISMO. SISTEMAS DE AMORTIZAÇÃO. APELAÇÃO IMPROVIDA.
 

 A questão central dos autos repousa na alegada ocorrência de anatocismo no contrato de mútuo firmado no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação. De acordo com os documentos colacionados, verifica-se que no contrato de financiamento firmado entre as partes foi adotado o sistema de amortização SAC.

O CDC se aplica às instituições financeiras (Súmula 297 do STJ), mas as cláusulas dos contratos do SFH observam legislação cogente imperando o princípio pacta sunt servanda. A teoria da imprevisão e o princípio rebus sic standibus requerem a demonstração de que não subsistem as circunstâncias fáticas que sustentavam o contrato, justificando o pedido de revisão contratual.

A legislação sobre o anatocismo, ao mencionar "capitalização de juros" ou "juros sobre juros", não se refere a conceitos da matemática financeira, sendo de todo regular a utilização de taxa de juros efetiva com capitalização mensal, derivada de taxa de juros nominal com capitalização anual, ainda quando aquela seja ligeiramente superior a esta. Tampouco se refere a juros compostos ou a sistemas de amortização que deles se utilizem. Como conceito jurídico "capitalização de juros" pressupõe o inadimplemento e um montante de juros devidos, vencidos e não pagos e posteriormente incorporados ao capital para que incidam novos juros sobre ele. Não há no ordenamento jurídico brasileiro proibição absoluta de tal prática, sendo permitida mesmo pela Lei de Usura (artigo 4º do Decreto 22.626/33), com frequência anual, sendo este o critério de interpretação da Súmula 121 do STF.

Na esteira da Súmula 596 do STF, desde a MP 1.963-17/00, atual MP 2.170-36/01, admite-se como regra geral para o sistema financeiro nacional a possibilidade de se pactuar capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano. Há na legislação especial do SFH autorização expressa para a capitalização mensal de juros desde a edição da Lei 11.977/09 que incluiu o Artigo 15-A na Lei 4.380/64. (REsp 973827/RS julgado pelo artigo 543-C do CPC). Ademais, a Súmula 539 do STJ reforçou a possibilidade de aplicação da capitalização de juros inferior a um ano para os contratos ligados ao SFH a partir da edição da MP 1.963-17/00, desde que expressamente pactuada. Apenas com a verificação de ausência de autorização legislativa especial e de previsão contratual, poderá ser afastada a capitalização de juros devidos, vencidos e não pagos em prazo inferior a um ano.

Não existe vedação legal à utilização do SAC, este sistema de amortização não provoca desequilíbrio econômico-financeiro no contrato, enriquecimento ilícito ou qualquer outra ilegalidade, cada um deles possui uma configuração própria de vantagens e desvantagens.
6.
A parte Autora limitou-se a questionar a validade das cláusulas contratadas, as quais são regulares. Ademais, não logrou demonstrar que a CEF deixou de aplicá-las ou que sua aplicação provocou grande desequilíbrio em virtude das alterações das condições fáticas em que foram contratadas.

Na ausência de comprovação de abuso ou desequilíbrio contratual, não havendo qualquer ilegalidade nas cláusulas contratadas, não há que se falar em compensação dos valores pagos a maior, repetição do indébito, enriquecimento sem causa ou devolução em dobro, não assistindo razão à apelante.

No que pertine ao pedido da Empresa Gestora de Ativos S.A.- EMGEA, a fim de que a CEF seja por ela sucedida no polo passivo do presente feito, inexiste prova de que a parte contrária tenha sido comunicada sobre a cessão do crédito, de modo que, na espécie, a Caixa Econômica Federal não pode ser excluída do polo passivo. Por outro lado, é permitido o ingresso da EMGEA como assistente litisconsorcial do cedente, conforme entendimento extraído artigo 109, do CPC.

 Apelação não provida. 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Primeira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação, com majoração da verba honorária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.