APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0010832-11.2011.4.03.6104
RELATOR: Gab. 47 - DES. FED. WILSON ZAUHY
APELANTE: W.Z. FELIPE ACESSORIOS LTDA - EPP
Advogado do(a) APELANTE: RONALDO PAULOFF - SP196738-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0010832-11.2011.4.03.6104 RELATOR: Gab. 47 - DES. FED. WILSON ZAUHY APELANTE: W.Z. FELIPE ACESSORIOS LTDA - EPP Advogado do(a) APELANTE: RONALDO PAULOFF - SP196738-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de ação anulatória ajuizada W.Z. FELIPE ACESSORIOS LTDA – EPP, em face da União Federal, objetivando tutela jurisdicional para anular o auto de infração n° 0817800/23781/10 por não obedecer ao princípio do devido processo legal insculpido no art. 5° LIV da C.F./1988 eis que lavrado com cerceamento de defesa, cancelando definitivamente a pena de perdimento e de destruição aplicada, liberando-se os produtos importados. Em sentença proferida aos 26 de outubro de 2012, o Juiz de Origem julgou improcedentes os pedidos, extinguindo o processo com julgamento do mérito, nos termos do artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil, concluindo, em síntese, que o conjunto probatório não se apresentou capaz de afastar a imputação de fraude, que deve ser rechaçada para efeito de autorizar a liberação da mercadoria. A empresa autora se insurge contra o julgado, suscitando preliminarmente o cerceamento de sua defesa, em razão do julgamento antecipado da lide, sem que lhe fosse dada a oportunidade de produzir a prova testemunhal anteriormente requerida. Quanto ao mérito, alega a (i) ocorrência de cerceamento de defesa a esfera administrativa, em decorrência da lavratura de auto de infração sem oportunidade de defesa ou, ao menos, de apresentar documentos que pudessem comprovar a regularidade da importação; (ii) a não ocorrência de subfaturamento, sendo que a estimativa dos preços pela fiscalização não teve como base qualquer laudo técnico de modo a proporcionar uma correta valoração; (iii) que as faturas comerciais utilizadas expressam verdadeiramente a transação comercial realizada, devendo ser aplicado o método da valoração aduaneira, previsto no Dec. 92.930/86, regulado pelo Dec. 1.355/94; (iv) que a tipificação foi lastreada no subfaturamento com falsidade ideológica; (v) que tratando-se apenas mera ocorrência de subfaturamento temos que a irregularidade não pode desencadear a pena de perdimento, mas apenas aplicação das multas e lançamento suplementar dos tributos; (v) que foram apresentados à fiscalização, os demonstrativos de origem de recursos e planilha com reIação de clientes, o fechamento de câmbio para o exportador constante na fatura e a disponibilidade de recursos utilizados. (Num. 102948471 - Pág. 158/183). Com contrarrazões da União Federal (Id. Num. 102948471 - Pág. 194/197), os autos subiram a esta Eg. Corte e vieram-me conclusos. É o Relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0010832-11.2011.4.03.6104 RELATOR: Gab. 47 - DES. FED. WILSON ZAUHY APELANTE: W.Z. FELIPE ACESSORIOS LTDA - EPP Advogado do(a) APELANTE: RONALDO PAULOFF - SP196738-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Diversas são as questões que se colocam no presente recurso de apelação, com o que passo a analisar cada uma das alegações do Apelante individualmente. 1. Do cerceamento de Defesa A Autora inconformada com o julgado interpõe suas razões de apelação, suscitando preliminarmente a nulidade da sentença, em razão do reconhecimento de cerceamento de defesa, determinando-se a devolução dos autos para oitiva das testemunhas arroladas e após isso prolação de novo julgamento em que reitera os termos da petição inicial. Nos termos do artigo 370 do CPC/15 (correspondente ao artigo 130 do CPC/73), caberá ao juiz de ofício ou a requerimento das partes determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias. Consoante jurisprudência firmada pelo C. Superior Tribunal de Justiça, revela-se evidente o cerceamento de defesa quando as instâncias ordinárias julgam antecipadamente o feito, indeferindo a produção de provas, e concluem pela não comprovação do fato constitutivo aduzido pelo demandante, a saber: "AGRAVO REGIMENTAL. PROCESSUAL CIVIL. CERCEAMENTO DE DEFESA. INEXISTÊNCIA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO PROTELATÓRIOS. MULTA DO ART. 538 DO CPC. CABIMENTO. NOVAÇÃO. PEDIDO ALTERNATIVO OU OBRIGAÇÃO ALTERNATIVA. ANÁLISE DO INSTRUMENTO DE CONFISSÃO DE DÍVIDA. SÚMULA N. 7⁄STJ. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Há cerceamento de defesa quando o juiz indefere a realização de prova requerida pela parte para comprovar suas alegações e julga antecipadamente a lide contrariamente a essa parte, fundamentando-se na ausência de provas. 2. Caracterizado o intuito protelatório dos embargos declaratórios, impõe-se a mantença da multa prevista no parágrafo único do art. 538 do CPC. 3. O recurso especial não é via própria para verificar se houve novação ou se há pedido alternativo formulado na demanda, se, para tanto, for necessário rever provas. Incidência da Súmula n. 7 do STJ. 4. A modificação do entendimento firmado pelo Tribunal de origem quanto à existência de litigância de má-fé demanda a incursão no acervo fático-probatório dos autos, a teor da Súmula n. 7⁄STJ. 5. Agravo regimental desprovido" (AgRg no AgRg no REsp 1.243.710⁄RJ, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 16⁄2⁄2016, DJe 22⁄2⁄2016). Não é essa a hipótese dos autos, em que a robusta prova documental trazida aos autos, compreendida, inclusive por cópia integral do processo fiscalizatório, forneceu ao Magistrado os elementos suficientes ao deslinde da causa, nos termos do artigo 373 do CPC/15. Assim, revela-se prescindível a oitiva de testemunhas ou realização de outras provas, consoante pretende a Apelante, de modo que o julgamento antecipado da lide não representou, em qualquer medida, ofensa à garantia constitucional à ampla defesa das partes litigantes (art. 5º, LV, da CF/88), devendo a questão preliminar arguida ser afastada. Portanto, não há que se cogitar, no presente caso, em qualquer espécie de nulidade. Superada essa questão, passo à análise do mérito recursal. 2. Da legalidade do auto de infração – Não ocorrência de cerceamento de defesa no processo administrativo Depreende-se da inicial que a parte autora, ora Apelante, importou diversas mercadorias, dentre as quais bolsas, aparelhos eletrônicos e de informática, ao amparo da Declaração de Importação n° 10/0948745-2, as quais foram retidas para fiscalização e posteriormente submetidas à penalidade de perdimento, sob o fundamento de contrafação, uso de documento inidôneo na importação, além de interposição fraudulenta. Compulsando os autos, mais especificamente o auto de infração lavrado pela Receita Federal do Brasil, foi procedida a autuação com fundamento no artigo 27 do Decreto-Lei 1.455/76, pela prática das seguintes infrações assim descritas: (001) Mercadoria que apresenta característica essencial falsificada; (002) se qualquer documento necessário ao desembaraço tiver sido falsificado e (003) interposição fraudulenta. (Num. 151297709 - Pág. 3) Assim, diferentemente do quanto argumentado pela Apelante, a fiscalização se embasou desde a lavratura do auto de infração, na aferição de elementos que ensejaram na constatação da ocorrência de contrafação, falsidade ideológica, prática de subfaturamento e de interposição fraudulenta. A propósito, transcrevo trechos elucidadores do caso concreto, conforme se extrai do Auto de infração e Termo de Apreensão e Guarda Fiscal n.º 0817800/23781/10: “[...] 3- Da Contrafação “De acordo com o que foi apurado por ocasião da abertura do contêiner (Doc. 02), parte das bolsas existentes na unidade de carga imitavam modelos da marca “Le Sport Sac” e também continham estampas com personagens infantis da linha “Hello Kitty” e outra parte imitava modelos da marca “Kipling”. Foram colhidas amostras de diferentes modelos dos referido produtos, com o intuito de enviá-las para análise e elaboração de laudo de autenticidade. Constatou-se que os representantes dos titulares das aludidas marcas no Brasil, que compareceram nesta Divig/Eqodi para retirada das amostras. Posteriormente, foram apresentados a esta Alfândega laudos, em que os representantes das marcas afirmam categoricamente que os produtos retirados estão fora das especificações, sendo, portanto, contrafeitos. (Doc. 12). Fora encontrados quatro grupo de bolsas, totalizando 4.878 unidades imitando modelos da marca Kipling conforme Termo de Guarda e um grupo, totalizando 980 bolsas da marca “Le Sport Sac”. Portanto, a manifestação do detentor do direito da marca, por meio de seu representante, torna irrefutável o fato de que os produtos que imitam a supracitada marca acondicionados a unidade de carga são falsificados, e materializada a hipótese infracional prevista no inciso VIII, ado art. 105, do Decreto-Lei nº 37/66, que impõe a pena de perdimento das mercadorias: Art. 105. Aplica-se a pena de perda da mercadoria: VIII - Estrangeira que apresente característica essencial falsificada ou adulterada, que impeça ou dificulte sua identificação, ainda que a falsificação ou a adulteração não influa no seu tratamento tributário ou cambial; Tendo em vista o exposto, lavrou-se Termo de Guarda indicando que os produtos apreendidos com alusão às renomadas marcas são produtos falsificados, imitação dos originais. Restando garantida ao impugnante a prova em contrário. [...] 4.DA APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTOS FALSOS [...] Em análise à Fatura Comercial e ao Packing List, a fiscalização constatou indício de falsificação, o que motivou uma análise mais aprofundada de tais documentos no que tange à veracidade das informações ali contidas. 4.1 – DOS VÍCIOS FORMAIS DA FATURA Analisando a fatura comercial, documento obrigatório à instrução do despacho aduaneiro de importação, a fiscalização da Receita Federal verificou flagrantes indícios de que o documento não representaria a transação comercial em análise [...] 4.2 – DA INSERÇÃO DE INFORMAÇÕES FALSAS Verificada a falsidade da fatura comercial e packing list apresentados, procurou-se o motivo da produção dos documentos falsos. Analisaram-se os preços informados na fatura, utilizando os valores usualmente praticados em importações de mercadorias idênticas ou similares, os valores indicados em cotações de preços internacionais, os valores de revenda no mercado interno, os custos de produção da mercadoria. Da análise, restou provado serem os valores inexequíveis, constituindo informação falsa com o objetivo de reduzir a base de cálculo dos tributos. [...] 5. DA INTERPOSIÇÃO FRAUDULENTA A empresa não comprova o fechamento de câmbio da maioria de suas operações de Comércio Exterior, incluindo a operação analisada nete Auto, alegando que não haveria ainda fechamento de câmbio, por ser financiada em 90 dias. Entretanto, não apresenta documentação idônea comprobatória desta alegação, alegando não haver garantias bancárias ou patrimoniais, apenas “acordos verbais”. Apresentou como comprovação de capacidade econômica e movimentação, apenas uma planilha de próprio punho, sem citação de fontes ou dados bancários, nem mesmo notas de entrada e saída que originassem os valores constantes da planilha. A empresa apresentou Contrato Social informando capital social apenas de R$ 50.000,00, também sem comprovar a integralização destes recursos. Ou seja, em resumo, a empresa estabelecid no Brasil e operadora do Comércio Exterior, após meses de espera da RFB, nega-se terminantemente a comprovar a origem lícita dos recursos empregadps em suas operações ou mesmo a origem dos recursos utilizados na sua constituição, no âmbito de procedimento regular de fiscalização da Receita Federal do Brasil. Diz o DECRETO-LEI N.º 1.455, de 7 de Abril de 1976: Art 23. Consideram-se dano ao Erário as infrações relativas às mercadorias: V - estrangeiras ou nacionais, na importação ou na exportação, na hipótese de ocultação do sujeito passivo, do real vendedor, comprador ou de responsável pela operação, mediante fraude ou simulação, inclusive a interposição fraudulenta de terceiros.(Incluído pela Lei nº 10.637, de 30.12.2002) § 2o Presume-se interposição fraudulenta na operação de comércio exterior a não-comprovação da origem, disponibilidade e transferência dos recursos empregados.(Incluído pela Lei nº 10.637, de 30.12.2002) [...] 6. DO ARCABOUÇO LEGAL SOBRE O SUBFATURAMENTO MEDIANTE UTILIZAÇÃO DE DOCUMENTO FALO OU ADULTERADO Ficou cabalmente comprovado, por dados de mercado, preços de atacado e varejo, média de importações, custo das matérias-primas, e DIs de artigos similares com origem idêntica, que o Importador apresentou à Receita Federal do Brasil uma fatura contendo um valor para as mercadorias inferior àquele efetivamente transacionado, “fabricada” por ele mesmo ou pelo exportador a seu pedido, e esta será usada como base para a declaração de importação das mercadorias: estamos diante da prática de subfaturamento mediante falsificação ou adulteração de documento instrutivo do despacho de importação. [...]”. Pois bem. Acerca da legalidade e validade do auto de infração, alega a Apelante a ocorrência de arbitrariedades dos agentes, ressaltando que não foi intimada da retirada de amostras, tampouco apresentada qualquer comprovação de pedido judicial de apreensão por parte da empresa detentora dos direitos sobre os produtos julgados similares e apreendidos, além de ter sido superado o prazo para conclusão do procedimento antes da efetiva autuação. No entanto, compulsando os autos, verifico que o procedimento administrativo fiscal de número 11128.00638712010-78 observou inteiramente os princípios constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, bem como as normas procedimentais prescritas nos artigos 605 a 608 do Decreto n° 6.759/2009 - Regulamento Aduaneiro, que assim dispõe: Art. 605. Poderão ser retidos, de ofício ou a requerimento do interessado, pela autoridade aduaneira, no curso da conferência aduaneira, os produtos assinalados com marcas falsificadas, alteradas ou imitadas, ou que apresentem falsa indicação de procedência (Lei n o 9.279, de 14 de maio de 1996, art. 198). Art. 606. Após a retenção de que trata o art. 605, a autoridade aduaneira notificará o titular dos direitos da marca para que, no prazo de dez dias úteis da ciência, promova, se for o caso, a correspondente queixa e solicite a apreensão judicial das mercadorias (Lei n o 9.279, de 1996, art. 199, e Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio, Artigo 55, aprovado pelo Decreto Legislativo n o 30, de 1994, e promulgado pelo Decreto n o 1.355, de 1994). § 1 o O titular dos direitos da marca poderá, em casos justificados, solicitar que seja prorrogado o prazo estabelecido no caput uma única vez, por igual período (Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio, Artigo 55, aprovado pelo Decreto Legislativo n o 30, de 1994, e promulgado pelo Decreto n o 1.355, de 1994). § 2 o No caso de falsificação, alteração ou imitação de armas, brasões ou distintivos oficiais nacionais, estrangeiros ou internacionais, sem a necessária autorização, a autoridade aduaneira promoverá a devida representação fiscal para fins penais, conforme modelo estabelecido pela Secretaria da Receita Federal do Brasil (Lei n o 9.279, de 1996, art. 191). Art. 607. Se a autoridade aduaneira não tiver sido informada, no prazo a que se refere o art. 606, de que foram tomadas pelo titular da marca as medidas cabíveis para apreensão judicial das mercadorias, o despacho aduaneiro destas poderá ter prosseguimento, desde que cumpridas as demais condições para a importação ou exportação (Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio, Artigo 55, aprovado pelo Decreto Legislativo n o 30, de 1994, e promulgado pelo Decreto n o 1.355, de 1994). Art. 608. O titular da marca, tendo elementos suficientes para suspeitar que a importação ou a exportação de mercadorias com marca contrafeita venha a ocorrer, poderá requerer sua retenção à autoridade aduaneira, apresentando os elementos que apontem para a suspeita (Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio, Artigos 51 e 52, aprovado pelo Decreto Legislativo n o 30, de 1994, e promulgado pelo Decreto n o 1.355, de 1994). Parágrafo único. A autoridade aduaneira poderá exigir que o requerente apresente garantia, em valor suficiente para proteger o requerido e evitar abuso (Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio, Artigo 53, parágrafo 1, aprovado pelo Decreto Legislativo n o 30, de 1994, e promulgado pelo Decreto n o 1.355, de 1994). Os documentos juntados pelas partes comprovam a devida intimação da empresa Apelante na pessoa de seu representante quando da lavratura do auto de infração, o que lhe ensejou a oportunidade de apresentar, tempestivamente, sua defesa e produzir provas. Constato, ainda, o integral cumprimento às normas procedimentais dispostas nos artigos 605 a 608 do Decreto no 6.759/2009 conquanto notificados os titulares da propriedade intelectual das bolsas contrafeitas, importadas pelo ora requerente que, inclusive, formalizaram suas queixas. A despeito de não ter sido promovida a queixa e a solicitação de apreensão judicial das mercadorias conforme determina e Regulamento Aduaneiro, consoante entendimento já firmado por esta Eg. Corte, “a solicitação de apreensão judicial de mercadorias falsificadas pelo titular da marca, prevista na Lei nº 9.278/96, embora constitua uma faculdade do titular dos direitos de propriedade industrial, é um poder-dever da autoridade aduaneira” (TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5001386-78.2020.4.03.6104, Rel. Desembargador Federal LUIS ANTONIO JOHONSOM DI SALVO, julgado em 09/09/2022, DJEN DATA: 14/09/2022). Desta feita, não procede a alegação de que a continuidade do despacho aduaneiro de importação somente poderia ser obstada se o titular da marca das mercadorias importadas requeresse e obtivesse decisão judicial. Há que se ressaltar, por fim, que os laudos consignados pelos representantes das marcas, demonstram de maneira inequívoca e categórica que os produtos retirados estavam fora das especificações, sendo, portanto, contrafeitos (Num. 102948471 - Pág. 42/52 e Num. 102948471 - Pág. 55/64). Ou seja, o auto de infração está lastreado em prova da falsidade da mercadoria importada. A Apelante, por sua vez, não impugna especificamente a contrafação e se limita à insurgência apenas quanto à aplicação da penalidade de perdimento. Em assim sendo, comprovada a contrafação, a mercadoria importada está sujeita à decretação de apreensão e decretação de pena de perdimento pela Autoridade aduaneira, nos termos dos arts. 105, VIII do Decreto-lei 37/66 e art. 23, IV, do Decreto-Lei nº 1.455/76, citem-se: “Art.105 - Aplica-se a pena de perda da mercadoria: (...) VIII - estrangeira que apresente característica essencial falsificada ou adulterada, que impeça ou dificulte sua identificação, ainda que a falsificação ou a adulteração não influa no seu tratamento tributário ou cambial; “Art 23. Consideram-se dano ao Erário as infrações relativas às mercadorias: (...) IV - enquadradas nas hipóteses previstas nas alíneas " a " e " b " do parágrafo único do artigo 104 e nos incisos I a XIX do artigo 105, do Decreto-lei número 37, de 18 de novembro de 1966. § 1o O dano ao erário decorrente das infrações previstas no caput deste artigo será punido com a pena de perdimento das mercadorias. ” (grifei) Ainda, conforme entendimento consolidado na jurisprudência pátria, a aplicação da pena de perdimento não atenta contra a Constituição Federal, quando observada a garantia do devido processo legal. Nesse sentido: DIREITO ADUANEIRO. APREENSÃO DE MERCADORIA (ROLAMENTOS) SOB SUSPEITA DE FALSIFICAÇÃO. AUTO DE INFRAÇÃO LASTREADO EM LAUDOS DE INAUTENTICIDADE FORNECIDOS PELO TITULAR DA MARCA E CONFIRMAÇÃO DO TITULAR NO SENTIDO DA FALSIDADE DOS CERTIFICADOS DE QUALIDADE E ORIGEM. ELEMENTOS QUE, NA ESPÉCIE PECULIAR DOS AUTOS, SÃO SUFICIENTES PARA A LAVRATURA DO AUTO DE INFRAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE NULIDADE POR VIOLAÇÃO AO DEVIDO PROCESSO LEGAL. CONTRAFAÇÃO CORROBORADA POR PERÍCIA JUDICIAL. LEGITIMIDADE DA APREENSÃO DA MERCADORIA SUJEITA À PENA DE PERDIMENTO. APELAÇÃO IMPROVIDA, COM IMPOSIÇÃO DE HONORÁRIOS RECURSAIS. 1. A leitura da r. sentença mostra que o d. Juízo perscrutou com intensidade a controvérsia posta em desate, deixando clara a configuração de contrafação, conforme comprovado no âmbito administrativo por laudos apresentados pelo procurador do titular da marca (SKF) e por afirmação categórica do Sr. Diretor Geral de Proteção de Marca da SKF no sentido de que os “Certificados de Qualidade e Origem” encontrados no interior dos contêineres são falsos, o que foi corroborado por perícia judicial, sujeitando-se a mercadoria importada apreendida à pena de perdimento, nos termos do art. 131 do Decreto-Lei nº 37/66 e art. 689 do Decreto nº 6.759/2009, sendo de nenhuma relevância a alegação de boa-fé diante da confirmação da falsidade. 2. A prova que fundamentou o auto de infração é suficiente para a sua lavratura com base na falsidade dos rolamentos importados, pois se trata de laudos de inautenticidade fornecidos pelo procurador do titular da marca e elaborados com base em amostras/fotos da mercadoria apreendida, bem como de afirmação categórica do Diretor Geral de Proteção de Marca da SKF no sentido de que os “Certificados de Qualidade e Origem” encontrados no interior dos contêineres são FALSOS. Consta no laudo de inautenticidade que a contrafação foi apurada com base nas “informações incorretas nas marcações do produto e da embalagem quando comparado com um produto e embalagem genuínos SKF”. Portanto, ao contrário do que sustenta a apelante, o auto de infração foi instruído com prova adequada e suficiente dos fatos, apta a lastreá-lo, não havendo que se cogitar, para efeitos de lavratura do auto de infração, de necessidade prova técnica para constatação de que o material era imprestável para o uso a que se destina ou para a comprovação da característica essencial que restou adulterada. Extrai-se da prova colhida pela fiscalização que os rolamentos importados têm marcações ilegais da trademark SKF, ou seja, são contrafeitos. Isso, por si só, já afasta a alegação de violação ao devido processo legal e torna infundado o questionamento acerca da lisura da atuação dos fiscais aduaneiros. 3. Nada obstante, a perícia realizada nos autos corrobora a falsidade, deixando claro que os rolamentos e os Certificados de Qualidade e Origem que acompanharam a mercadoria são falsos. O expert também deixa clara a lisura da autuação ao afirmar que “para poder atestar sobre a procedência da originalidade desses rolamentos, se faz necessário a análise de alguns sinais que existem nos próprios rolamentos e nas suas respectivas embalagens e identificação, bem como a análise da documentação de qualidade que foi apresentada, em comparação com as originais que o fabricante utiliza”. 4. Comprovada a contrafação, a mercadoria importada está sujeita à apreensão e à pena de perdimento, nos termos dos arts. 105, VIII e 131 do Decreto-Lei nº 37/66, sendo de nenhuma relevância a alegação de boa-fé diante da confirmação da falsidade. 5. É entendimento pacífico em nossa jurisprudência que uma vez instaurado o processo administrativo fiscal para apuração de fraude em operação de importação, cujo resultado possível é a aplicação de pena de perdimento às mercadorias, é legítima a apreensão e retenção destas até a conclusão do aludido procedimento (v.g., REsp 1141785/RS, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/03/2010, DJe 10/03/2010). 6. Isso porque a fiscalização da entrada e da saída de bens do país é poder-dever da Administração, cuidando não só da arrecadação tributária, mas também da economia popular, da saúde pública, do equilíbrio da balança comercial, da indústria nacional, do consumidor etc. Em outros termos, o dano ao erário advindo de importação mediante fraude não se limita a eventual prejuízo financeiro, restando configurado com o desrespeito à legislação e ao controle aduaneiro, em detrimento da política fiscal e alfandegária do país, razão pela qual a situação não se resolve com o mero recolhimento dos tributos devidos na operação ou com o oferecimento de caução no valor dos bens importados (v.g., TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0054934-75.2012.4.03.6301, Rel. Desembargador Federal LUIS ANTONIO JOHONSON DI SALVO, julgado em 25/01/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 04/02/2020; TRF 3ª Região, TERCEIRA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 2043845 - 0002363-91.2012.4.03.6119, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS MUTA, julgado em 17/12/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:14/01/2016). 7. Insubsistentes as razões do apelo, devem ser fixados honorários sequenciais e consequenciais, nesta Instância; assim, para a sucumbência neste apelo fixo honorários de 10% incidentes sobre a honorária já imposta (art. 85, § 1º, fine, combinado com o § 11 do CPC/15). 8. Apelação improvida, com imposição de honorários recursais. (TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000646-23.2020.4.03.6104, Rel. Desembargador Federal LUIS ANTONIO JOHONSOM DI SALVO, julgado em 20/12/2021, Intimação via sistema DATA: 18/01/2022) TRIBUTÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. IMPORTAÇÃO DE MERCADORIAS. INDÍCIOS DE CONTRAFAÇÃO. INTERRUPÇÃO DO DESPACHO ADUANEIRO. PREVISÃO LEGAL E NORMATIVA PARA A RETENÇÃO DA MERCADORIA. RECURSO IMPROVIDO. 1. Trata-se de AGRAVO DE INSTRUMENTO, com pedido de tutela de urgência, interposto por L.F. DA SILVA FILHO INFORMATICA (contra a decisão proferida pelo Juízo da 2ª Vara Federal/CE, nos autos do processo nº 0802233-70.2021.4.05.8100, que indeferiu a tutela cautelar antecedente), no qual a agravante pretende a imediata retirada do bloqueio do CE MERCANTE nº 042005247657590, permitindo-se o registro da Declaração de Importação das mercadorias, salvo a existência de outro impedimento não discutido nos autos e ressalvado o direito da Fiscalização de suspender o desembaraço aduaneiro, caso a marca KINGSTON obtenha decisão judicial no prazo legal previsto no Regulamento Aduaneiro. 2. Em se tratando o presente agravo de instrumento de pleito de tutela recursal, o seu deferimento está condicionado à presença, de forma estreita e cumulativa, dos requisitos da probabilidade do direito e do perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. 3. No caso, não se vislumbra, nesta sede prefacial, a probabilidade do direito alegada, uma vez que restou devidamente demonstrada a regularidade da autuação fiscal, tendo sido devidamente motivado o termo de retenção parcial da carga originária da República Popular da CHINA, em razão da suspeita de que parte das mercadorias importadas era contrafeita, após vistoria física, não se verificando excesso nos prazos estabelecidos em lei para o procedimento de retenção e da adoção das outras providências administrativas pertinentes. Frise-se que em caso de contrafação, a nacionalização dos produtos é impedida, nos termos do art. 105, VIII, do Decreto-Lei nº 37/66; arts. 2º a 8º e 11 da IN RFB nº 1.986/2020; arts. 606 a 608 do Decreto 6.759/2009; e art. 237 da CF. 4. De acordo com os autos, a Autoridade Aduaneira acionou os representantes da empresa KINGSTON TECHNOLOGY CORPORATION ("KINGSTON") no país, os quais apresentaram a Receita Federal Laudo de Avaliação de Autenticidade, declarando que a parcela da carga era contrafeita, por constatar erros nos códigos de barras e etiquetas, além de parafusos não utilizados pela marca, o que confirmou a suspeita dos agentes alfandegários. Na ocasião, a empresa KINGSTON solicitou a destruição dos produtos contrafeitos apreendidos. 5. Como bem pontuado na decisão agravada, não procede a alegação de que a continuidade do despacho aduaneiro de importação somente poderia ser obstada se o titular da marca das mercadorias importadas, com indícios veementes de contrafação, requeresse e obtivesse decisão judicial, que determinasse sua apreensão, nos termos do art. 607 do Regulamento Aduaneiro. Na hipótese de indícios veementes de mercadoria importada objeto de contrafação, o art. 608 do Decreto 6.759/2009, estabelece que o titular da marca poderá requerer a sua retenção, cuja permanência não depende necessariamente de intervenção judicial: "Art. 608. O titular da marca, tendo elementos suficientes para suspeitar que a importação ou a exportação de mercadorias com marca contrafeita venha a ocorrer, poderá requerer sua retenção à autoridade aduaneira, apresentando os elementos que apontem para a suspeita", fundamento esse utilizado também na decisão agravada, para indeferir o pedido de tutela cautelar antecedente. 6. Independentemente da discussão acerca da necessidade ou não de o titular da marca adotar medidas para apreensão judicial das mercadorias, o fato é que a apreensão de mercadoria contrafeitas e sua consequente destruição/inutilização não só ocorrem por ordem judicial. Há previsão legal para a aplicação de pena de perdimento da mercadoria em caso de contrafação pela Autoridade aduaneira. O art. 105, VIII, do Decreto-Lei nº 37/66 prevê que "Aplica-se a pena de perda da mercadoria estrangeira que apresente característica essencial falsificada ou adulterada, que impeça ou dificulte sua identificação, ainda que a falsificação ou a adulteração não influa no seu tratamento tributário ou cambial". No mesmo sentido: art. 689, VIII, do Decreto nº 6.759/2009; arts. 2º a 8º e 11 da IN RFB nº 1.986/2020. 7. No caso, a Fiscalização aduaneira lavrou Auto de Infração e Termo de Apreensão e Guarda Fiscal nº 0317902-36174/2021, formalizado por meio do Processo Administrativo nº 10380.726749/2021-40, com a proposição de aplicação da pena de perdimento das mercadorias retidas, nos termos do art. 105, VIII, do Decreto-Lei nº 37/66; arts. 2º a 8º e 11 da IN RFB nº 1.986/2020; arts. 606 a 608 do Decreto 6.759/2009; e art. 237 da CF. Segundo consta dos autos, o representante legal da autuada foi cientificado pessoalmente em 14/04/2021, inaugurando o início da contagem de prazo de 20 (vinte) dias para apresentação de impugnação, previsto no art. 27, § 1º, do Decreto-Lei nº 1.455/76, assegurando-se assim o exercício do contraditório e do pleno do direito de defesa. 8. Portanto, havendo, no caso, probabilidade de uma futura pena de perdimento das mercadorias, consideradas contrafeitas pela Fiscalização aduaneira, não há, por enquanto, que se cogitar de sua liberação em sede liminar, tampouco em sede de agravo de instrumento, devendo-se aguardar o julgamento do mérito da demanda na ação principal. 9. Ademais, eventual concessão de liminar ensejaria, a princípio, periculum in mora inverso, uma vez que restaria autorizada, em decisão precária, a liberação de parte das mercadorias com indícios veementes de contrafação, que impedem o prosseguimento regular do despacho aduaneiro, sob pena de virem a ser causados danos a eventuais consumidores finais dos produtos importados. 10. Agravo de instrumento improvido. (TRF-5 - AI: 08050688120214050000, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO ROBERTO MACHADO, Data de Julgamento: 25/11/2021, 1ª TURMA) Rechaço, portanto, a alegação de vício no procedimento administrativo, não tendo sido identificada qualquer ofensa ao devido processo legal em âmbito administrativo ou cerceamento de defesa da Apelante. 3. Da apresentação de documentos falsos Consoante se depreende da decisão proferida no processo número 11128.006387/2010-78, a fiscalização, após concluir processo investigatório, entendeu que os documentos que amparavam as mercadorias chegadas no país não refletiam a realidade da operação de importação o que materializa hipótese de dano ao erário por falsificação de documento (falsidade ideológica). (Num. 151297882 - Pág. 3) Importante observar que a autoridade não nega que o critério preferencial de fixação do valor aduaneiro é o do valor da transação do produto internalizado no mercado nacional, tal como reclamado pela Apelante, mas justifica a paralisação do despacho aduaneiro, em razão dos valores declarados não serem compatíveis com aqueles que o próprio exportador anuncia serem os correntemente praticados no mercado, ou mesmo de outras operações semelhantes realizadas na mesma época, razão pela qual teve de se valer de outros métodos, para arbitrar o valor/preço correspondente ao valor real da mercadoria/bem adquirido no exterior. Para corroborar o afirmado, transcrevo o ato questionado: “[...] Analisaram-se os preços informados na fatura, utilizando: os valores usualmente praticados em importações de mercadorias idênticas ou similares, os valores indicados em cotações de preços internacionais, os valores de revenda no mercado interno, os custos de produção da mercadoria. Da análise, restou provado serem os valores inexequíveis, constituindo informação falsa com o objetivo de reduzir a base de cálculo dos tributos. A estratégia de montar Fatura Comercial agrupando vários tens de preços e características multo diferentes em um só, e descrevendo-os de forma genérica constituiu artificio para esconder produtos mais valiosos sob a alcunha de produtos menos valiosos, diminuindo a base de cálculo dos impostos devidos, conforme será demonstrado. Assim, um Termo de Guarda de mercadorias com valor de mercado avaliado em mais de R$ 1.700.000,00 tem uma Fatura Comercial correspondente informando valor comercial total de apenas USS 33.424,00. Pelas informações do Importador, um contêiner de 40 pés, lotado de mais de 18.700 kg de bolsas e eletrônicos, valeria pouco mais de US$1.70/kg. Para a pesquisa de alguns produtos- utilizou-se os sítios de internet: “alibaba.com - Global Trade Starts Here e aliexpress.com - como fonte de preços FOB-China e "www.buscape.com.br" - como fonte de preços do varejo brasileiro. Saliente-se que são os mais populares da especialidade, e, na era da Internet, não são meros painéis de anúncios, mas sim catálogos virtuais de fabricantes, distribuidores, e varejistas, no caso brasileiro, onde de fato acontecem as transações de compra e venda no mundo moderno, sendo, portanto, retratos fiéis da realidade. Tome-se o produto descrito nos itens 07, 27, 28, 42, 67, 73 e 75 do Termo de Guarda ("Mouse"- Fotos DOC. 05). Um total de 7952 "mouses", de sete modelos diferentes. A fatura informa apenas um item para estes quatro modelos diferentes de "mouse" 11000 unidades, ao preço unitário de US$ 0,18 (FOB-China). Pesquisas na internet demonstram que o preço mínimo de mercado para o produto está em torno de US$ 0,80 (Atacado, FOB-China- DOC. 05), uma diferença de 515%. Foram encontrados três modelos, similares aos quatro encontrados, variando de US$0,80 até US$3,00, ou seja, de 7 a 18 vezes mais que a fatura falsamente informa. Reforça a constatação da fraude o fato de que modelos sem fio são muito mais caros, entretanto, a fatura agrupa-os sob o mesmo tem e valor. Corroborando os anúncios de Empresas chinesas, os preços mínimos de varejo no brasil variam de R$4,80 a R$15,00. Em dólares americanos, de US$ 2,75 a US$ 8,50, ou em torno de 4 vezes o preço de atacado, dentro de uma margem esperada, muito diferente da margem de até 40 vezes o preço absurdamente baixo falsamente declarado pelo Importador, lucro que jamais poderia ser obtido havendo concorrência, como há no mercado brasileiro. Da mesma forma os produtos descritos como MINI RÁDIO declarados a US$0,73 na fatura, são na verdade NOVE modelos diferentes de “Mini-systems”: rádios AM/FM e tocadores MP3 com entrada USB e altofalantes, alguns inclusive com controle remoto, outros contendo bateria. Há também neste mesmo grupo caixas de som para computador e caixa de som/toca MP3 com função luminosa, nome comercial "Seven Colors Light Tube”. Os produtos citados têm preços de atacado, na China, variando de US$ 8,00 a US$25,00 (Atacado, FOB-China- DOO 06), ou até 30 vezes mais que o declarado. Aparelho similar foi encontrado à venda no mercado brasileiro a R$ 150,00. Os aparelhos têm inclusive, display de LCD e de um a quatro alto-falantes. Apenas os alto-falantes ou as baterias, ou mesmo os controles remotos, custam mais do que o valor declarado pelo aparelho de som rádio e MP3. Igualmente o produto "Carregador para laptop", declarado como “TOMADA ADAPTADOR" a US$0,80, foi encontrado em pesquisas de mercado custando pelo menos 10 vezes mais: US$8,00 (Atacado, FOB-Chirra- DOC. 07). O mesmo produto é vendido no sitio de internet Mercado Livre a R$ 70,00. Ressalte-se que só da simples observação dos produtos (DOCs. 05, 06, 07, 08) é possível se constatar que o preço declarado na fatura, da ordem de centavos de dólar, não é suficiente nem para custear as matérias-primas utilizadas quanto mais despesas de montagem, mão-de-obra e administrativas, que forem agregadas ao produto final. O caso das Bolsas e Carteiras de couro sintético (PU) e de tecido, ensejou uma análise mais aprofundada com respeito aos valores declarados face à: grande quantidade de produtos, fácil comparação com os preços da matérias-primas, possibilidade de consulta a DIs de produtos similares. Conforme será demonstrado as bolsas foram declaradas a preços muito abaixo do valor das matérias-primas. [...]” Constatado, portanto, que os valores aduaneiros lançados pela empresa importadora não se coadunam com aqueles praticados correntemente em outras operações semelhantes, revela-se legítima a atuação da autoridade administrativa, inclusive como forma de prestigiar os fundamentos apresentados na decisão que reconheceu a infração tributária e aplicou a pena de perdimento, forte no princípio da veracidade/legitimidade dos atos administrativos. Acerca da interposição fraudulenta e subfaturamento, assim restou consignado no auto de infração: “Acrescente-se ao acima exposto que, examinadas as Dia anteriores, constata-se a existência dos mesmos produtos já analisados aqui neste Auto. Ou seja, produtos subfaturados em até 20 vezes. Os valores constantes da planilha fornecida, são, portanto, insuficientes para arcar com ss despesas de importação. Nestas DIs foram movimentados previamente, pela empresa, 2 contêineres da 40 e um da 20 pés, totalizando mais de 50 ton de carga, no entanto a empresa não possui depósito próprio, nem mesmo apresentou despesas com depósito terceirizado, mesmo tendo sido intimada a fazê-lo. As despesas informadas pela empresa na planilha são insuficientes até para a simples movimentação, armazenagem e comercialização destes contêineres". (Num. 102951185 - Pág. 70) Nos termos do artigo 23, inciso V, do Decreto-Lei nº 1.455/1976, interposição fraudulenta de terceiros na importação, é definida como a conduta tipificada como a ocultação do sujeito passivo, real vendedor, comprador ou responsável pela operação, por meio de simulação ou fraude à lei, que será presumida no caso de não comprovação da origem, disponibilidade e transferência dos recursos empregados. Art. 23. Consideram-se dano ao Erário as infrações relativas às mercadorias: I – (...) V - estrangeiras ou nacionais, na importação ou na exportação, na hipótese de ocultação do sujeito passivo, do real vendedor, comprador ou de responsável pela operação, mediante fraude ou simulação, inclusive a interposição fraudulenta de terceiros.(Incluído pela Lei n. 10.637, de 30.12.2002) § 1º O dano ao erário decorrente das infrações previstas no caput deste artigo será punido com a pena de perdimento das mercadorias. (Incluído pela Lei n. 10.637, de 30.12.2002). § 2° Presume-se interposição fraudulenta na operação de comércio exterior a não -comprovação da origem, disponibilidade e transferência dos recursos empregados (Incluído pela Lei n. 10.637, de 30.12.2002). No caso, resta inequívoco que mesmo intimada a se manifestar, a Apelante deixou de apresentar à fiscalização documentos hábeis e idôneos, coincidentes em datas e valores, demonstrando a origem lícita, sua origem lícita, disponibilidade e efetiva transferência dos recursos aplicados na operação. Transcrevo, posto que oportuno, trecho do Parecer Conclusivo apresentado pela Divisão de Controle e acompanhamento tributário, “A interessada apresentou demonstrativo de origem de recursos e planilha com relação de clientes feita de próprio punho, sem citação das fontes, dados bancários, notas fiscais de entrada/saída ou qualquer outro documento contábil que comprovasse os valores apresentados à fiscalização. Também, não apresentou os lançamentos contábeis escriturados, referentes à importação em questão, ou seja, não logrou êxito em comprovar conforme determina a lei. Não o fez na fase de inquérito, tão pouco agora, em sua impugnação”. (Num. 151297882 - Pág. 5) A penalidade de perdimento de mercadoria estrangeira desacompanhada de documentação demonstrativa da sua regular importação é prevista o art. 105, VI, Decreto-Lei 37/1966. Nesse sentido o entendimento já firmado por essa Eg. Turma: TRIBUTÁRIO. AÇÃO ORDINÁRIA DECLARATÓRIA. DESEMBARAÇO ADUANEIRO. SUBFATURAMENTO. IMPORTADORA E EXPORTADORA VINCULADAS. INFORMAÇÃO OMITIDA. PENA DE PERDIMENTO. LEGALIDADE. MP Nº 2.158-35. ACORDO DE VALORAÇAO ADUANEIRA – AVA/GATT, ARTIGO 17. IN SRF 327/2003. As normas para definição e apuração do valor aduaneiro foram previstas no Acordo de Valoração Aduaneira - AVA/GATT, promulgado pelo Decreto 1.355/94, na IN/SRF nº 327/2003, estabelecendo os artigos 1 e 2º do Acordo Sobre a Implementação do artigo VII do Acordo sobre Tarifas e Comércio (promulgado pelo Decreto 1.355/94) o conceito de valor aduaneiro e a possibilidade de aceitação do valor, quando haja vinculação de empresas, apenas quando este se mostre ‘aceitável’ de acordo com critérios estabelecidos na norma. Neste caso, as circunstâncias que caracterizam a venda serão examinadas e o valor de transação será aceito, sempre que o importador demonstrar que a vinculação não influenciou o preço. Se a administração aduaneira, por força das informações prestadas pelo importador, ou obtidas por outros meios, tiver motivos para considerar que a vinculação influenciou o preço, deverá comunicar tal fato ao importador, a quem será dado um prazo razoável para se pronunciar a respeito. Por solicitação do importador, esta comunicação ser-lhe-á feita por escrito. O procedimento de fiscalização em questão teve início com a lavratura dos Termos de Retenção em razão da suspeita quanto à veracidade do valor aduaneiro declarado pela importadora (autora), bem como pela existência de vinculação entre esta e a empresa exportadora, na medida em que ambas possuem os mesmos sócios. No entanto, a autora não comprovou por prova idônea, que o valor da transação utilizado era aceitável, ante a evidente discrepância entre os valores informados na importação e os valores praticados no varejo do fabricante e revendedor. Não foi comprovado pela autora, portanto, equívoco no quanto foi apurado pela autoridade alfandegária. E diante da informação inverídica da autora perante a administração aduaneira (tanto em relação à existência de vinculação entre as empresas, quanto em relação ao valor aduaneiro das mercadorias), restou caracterizado o dano ao erário (fraude), restando que autorizada a aplicação da pena de perdimento prevista pela legislação. Com efeito, concluídas as apurações, em se verificando a ocorrência de fraude (tal como falsificação ou adulteração de documento ou de característica essencial, falsa declaração de conteúdo, ocultação do real vendedor ou adquirente etc.), a legislação prevê a aplicação da pena de perdimento, conforme artigo 105, VI do Decreto-Lei nº 37/66 e art. 618 do Decreto 4.543/2002 (vigente à época, atualmente artigo 689 do Decreto 6.759/09). Na hipótese de ocorrência de fraude/sonegação, a legislação excetua o procedimento de valoração aduaneira, aplicando-se ao caso o artigo 88 da MP nº 2.158-35/2001, inserido como artigo 84 do Regulamento Aduaneiro vigente à época dos fatos (Decreto 4.543/02), tal como decidiu o d. Juízo a quo. Tal exceção está conforme as determinações de direito internacional, uma vez que o artigo 17 do Acordo de Valoração Aduaneira – AVA/GATT prevê “que nenhuma disposição deste Acordo poderá ser interpretada como restrição ou questionamento aos direitos que têm as administrações aduaneiras de se assegurarem da veracidade ou exatidão de qualquer afirmação, documento ou declaração apresentados para fins de valoração aduaneira”. Também é o que estabelece o art. 38 da Instrução Normativa nº 327/03, restando respeitado o princípio da legalidade. Apelação a que se nega provimento. (TRF 3ª Região, 4ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0002934-43.2004.4.03.6119, Rel. Desembargador Federal MARLI MARQUES FERREIRA, julgado em 01/08/2022, DJEN DATA: 05/08/2022) ADMINISTRATIVO. AÇÃO ORDINÁRIA. ADUANEIRO. SUSPEITA DE INTERPOSIÇÃO FRAUDULENTA. IN N.º 206/2002. LEGALIDADE DA RETENÇÃO E PENA DE PERDIMENTO. APELAÇÃO DA AUTORA IMPROVIDA. - A existência de indícios de ocultação do real adquirente da mercadoria importada justificou a instauração de procedimento especial de controle na forma da IN SRF 206/2002 e Regulamento Aduaneiro. - É pacífica a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça e desta E. Corte no sentido da legitimidade da apreensão e retenção de mercadorias importadas para aplicação de eventual pena de perdimento no caso de interposição fraudulenta de terceiros, não havendo qualquer ilegalidade ou inconstitucionalidade. (...) - Apelação da autora improvida. (TRF 3ª Região, 4ª Turma, APELAÇÃO CÍVEL - 0018191-97.2006.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal MONICA AUTRAN MACHADO NOBRE, julgado em 17/02/2021, DJEN DATA: 25/02/2021). Com efeito, como ressaltado na decisão administrativa e na sentença recorrida, a Apelante não se desincumbiu do ônus de comprovar a real origem dos valores empregados na integralização do seu capital social, tampouco que o valor da transação utilizado na declaração de importação era aceitável, ante a constatação de discrepância entre os valores declarados e os praticados na aquisição da mercadoria junto ao exportador, bem como com o custo das respectivas matérias-primas, o fechamento de contrato de câmbio sob as escusas de a operação ser beneficiada por financiamento de 90 (noventa) dias e, por fim, a capacidade económica da empresa e de seus sócios. Portanto, correta a conclusão da autoridade administrativa de que a documentação apresentada era inidônea para legitimar a citada mercadoria, restando caracterizada a fraude (falsidade ideológica), o subfaturamento e a interposição fraudulenta, devendo, então, ser mantida a pena de perdimento decretada na esfera administrativa. Assim sendo, realmente se impunha a improcedência do pedido levada a efeito na origem, devendo a sentença, pois, subsistir, também por seus próprios e jurídicos fundamentos. Ante o exposto, voto por negar provimento ao recurso de apelação. É como voto.
E M E N T A
APELAÇÃO. ADMINISTRATIVO. ANULATÓRIA DE AUTO DE INFRAÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO OCORRÊNCIA. ADUANEIRO. CONTRAFAÇÃO DE MARCA. FALSIDADE IDEOLÓGICA DA DECLARAÇÃO DE IMPORTAÇÃO. INTERPOSIÇÃO FRAUDULENTA. MERCADORIA SUBFATURADA. LEGALIDADE DA RETENÇÃO. PENA DE PERDIMENTO.
1. Nos termos do artigo 370 do CPC/15 (correspondente ao artigo 130 do CPC/73), caberá ao juiz de ofício ou a requerimento das partes determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias.
2. Não se afigura a ocorrência de cerceamento de defesa, quando a robusta prova documental trazida aos autos, compreendida, inclusive por cópia integral do processo fiscalizatório, forneceu ao Magistrado os elementos suficientes ao deslinde da causa, nos termos do artigo 373 do CPC/15.
3. Na hipótese o procedimento administrativo fiscal observou inteiramente os princípios constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, bem como as normas procedimentais prescritas nos artigos 605 a 608 do Decreto n° 6.759/2009 - Regulamento Aduaneiro, que dentre outras providências, determinam a notificação dos titulares da propriedade intelectual das marcas supostamente falsificadas.
4. A promoção da queixa e a solicitação de apreensão judicial das mercadorias conforme determina e Regulamento Aduaneiro, constituem de um lado, uma faculdade do titular dos direitos de propriedade industrial e, de outro, um poder-dever da autoridade aduaneira, consoante entendimento já exarado por esta Eg. Corte. (TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5001386-78.2020.4.03.6104, Rel. Desembargador Federal LUIS ANTONIO JOHONSOM DI SALVO, julgado em 09/09/2022, DJEN DATA: 14/09/2022).
5. Comprovada a contrafação, a mercadoria importada está sujeita à decretação de apreensão e decretação de pena de perdimento pela Autoridade aduaneira, nos termos dos arts. 105, VIII do Decreto-lei 37/66 e art. 23, IV, do Decreto-Lei nº 1.455/76.
6. Conforme entendimento consolidado na jurisprudência pátria, a aplicação da pena de perdimento não atenta contra a Constituição Federal, quando observada a garantia do devido processo legal. Precedentes.
7. Rechaçada a alegação de vício no procedimento administrativo, não tendo sido identificada qualquer ofensa ao devido processo legal em âmbito administrativo ou cerceamento de defesa da Apelante.
8. A paralisação do despacho aduaneiro, com a consequente retenção das mercadorias importadas se justifica quando constatado que os valores declarados não são compatíveis com aqueles que o próprio exportador anuncia serem os correntemente praticados no mercado, ou mesmo de outras operações semelhantes realizadas na mesma época.
9. Constatado que os valores aduaneiros lançados pela empresa importadora não se coadunam com aqueles praticados correntemente em outras operações semelhantes, revela-se legítima a atuação da autoridade administrativa, inclusive como forma de prestigiar os fundamentos apresentados na decisão que reconheceu a infração tributária e aplicou a pena de perdimento, forte no princípio da veracidade/legitimidade dos atos administrativos.
10. Nos termos do artigo 23, inciso V, do Decreto-Lei nº 1.455/1976, interposição fraudulenta de terceiros na importação, é definida como a conduta tipificada como a ocultação do sujeito passivo, real vendedor, comprador ou responsável pela operação, por meio de simulação ou fraude à lei, que será presumida no caso de não comprovação da origem, disponibilidade e transferência dos recursos empregados.
11. Apelante que deixou de apresentar à fiscalização documentos hábeis e idôneos, coincidentes em datas e valores, demonstrando a origem lícita, sua origem lícita, disponibilidade e efetiva transferência dos recursos aplicados na operação.
12. A penalidade de perdimento de mercadoria estrangeira desacompanhada de documentação demonstrativa da sua regular importação é prevista o art. 105, VI, Decreto-Lei 37/1966.
13. Mantida a conclusão da autoridade administrativa de que a documentação apresentada era inidônea para legitimar a citada mercadoria, restando caracterizada a fraude (falsidade ideológica), o subfaturamento e a interposição fraudulenta, devendo, então, ser mantida a pena de perdimento decretada na esfera administrativa.
14. Recurso de apelação a que se nega provimento.