Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0022074-47.2009.4.03.6100

RELATOR: Gab. 47 - DES. FED. WILSON ZAUHY

APELANTE: ITAUTEC S.A. - GRUPO ITAUTEC

Advogado do(a) APELANTE: JULIANO DI PIETRO - SP183410-A

APELADO: BANCO CENTRAL DO BRASIL, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0022074-47.2009.4.03.6100

RELATOR: Gab. 47 - DES. FED. WILSON ZAUHY

APELANTE: ITAUTEC S.A. - GRUPO ITAUTEC

Advogado do(a) APELANTE: JULIANO DI PIETRO - SP183410-A

APELADO: BANCO CENTRAL DO BRASIL, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

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R E L A T Ó R I O

 

 

 

 

Cuida-se de apelação interposta pela parte impetrante, ITAUTEC S.A. - GRUPO ITAUTEC, contra sentença que julgou improcedente o seu pedido de cancelamento da multa imposta no processo administrativo nº 0601331872.

 

Inconformada, sustenta a apelante que (ID 104179882 - Pág. 35/62):

a) “não há na legislação determinação expressa de que as retificações devem ocorrer dentro do prazo estipulado de 180 dias”;

b) as “retificações não comprometeram a data dos pagamentos efetuados para cada uma das DIs. A contratação da instituição financeira e o pagamento do montante integral da importação foram efetuados antes de expirado o prazo legal, conforme se depreende dos swifts já juntados (DOC. 04 da Inicial), os quais atestam a quitação total e tempestiva das DI's pelas respectivas instituições financeiras contratadas. Somente a formalização da retificação desta opção de pagamento é que se verificou posteriormente ao vencimento”;

c) “o fato da retificação das Declarações de Importações ter ocorrido após o prazo de 180 dias não causou qualquer prejuízo ao erário”;

d) “o único swift que não fora localizado pela autoridade administrativa é aquele relativo à DI 01/0090648-0 (vide relatório do acórdão do CRFSN - Doc. O6-B da inicial), sendo que este fato evidentemente não influenciou na conclusão de que os pagamentos foram todos efetuados no prazo regulamentar de 180 dias”;

e) “Os pagamentos [...] foram, também devidamente comprovados nos autos do competente processo administrativo, sendo certo que o Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional, vinculado ao Ministério da Fazenda, expressamente os reconheceu, concluindo pela inexistência de ofensa ao inciso II do artigo 1° da Lei n° 10755/2003”;

f) “a despeito da demonstração do efetivo pagamento tempestivo das DI's, o Conselho de Recursos do Sistema Financeiro entendeu pela manutenção da multa, sustentando seu decisum, entretanto, com base em nova fundamentação, diversa da própria hipótese legal da sanção inicialmente aplicada. Vale dizer, em vez da aplicação do inciso II, do art. 1° da Lei 10.755/03, dispositivo em que capitulada a imputação da multa inicial, o Conselho Administrativo passou a sustentar a aplicação da multa com base no inciso I deste mesmo artigo”;

g) “o inciso l se refere apenas às situações nas quais os pagamentos são efetuados diretamente pela empresa importadora. Já o inciso II se refere pontualmente aos casos em que a empresa importadora trava um contrato de financiamento com uma instituição financeira, para que esta promova o pagamento integral e antecipado à empresa estrangeira no nome da contratante. E é apenas nesta segunda hipótese que se enquadra o vertente caso. [...] cada um dos incisos se refere a uma determinada exigência legal, não sendo possível ‘mesclá-los' com o fito de criar nova penalidade”;

h) “os prazos e condições definidos pelo Banco Central do Brasil e que deverão ser observados para fins do inciso I (ou seja, para contratação do câmbio e pagamento da importação em reais diretamente pelo importador) são aqueles estabelecidos no Regulamento do Mercado de Câmbio e Capitais Internacionais (RMCCI), preconizados no Título 1. Capítulo 12, Seção 5, mais especificamente em seu item 2 ‘a’ c/c itens 5 e 7 (DOC. 15 da exordial), cujos dispositivos estabelecem prazos que nada se relacionam ao de cento e oitenta dias do inciso II”;

i) “a Lei n° 11.371, de 28.11.2006 (‘Lei 11.371/06’), determinou que a multa prevista na Lei 10.755/03, objeto desta demanda, não fosse mais aplicada às importações cujo vencimento tivesse ocorrido a partir 04.08.2006 ou cujo termo final para a liquidação do contrato de câmbio de importação, na forma do inciso II do art. 1° da Lei 10.755/03 não tivesse transcorrido até 04.08.2006”;

j) “embora as importações objeto desta ação tratem de operações cujos vencimentos se deram em 2001, os efeitos da citada Lei 11.371/06 deverão retroagir aos fatos anteriores a 01.08.2006, a fim de conferir tratamento isonômico a todos os administrados e consagrar o princípio da igualdade”;

k) “a jurisprudência reconhece a possibilidade de utilização do mandado de segurança preventivo para evitar a inscrição em dívida ativa, como ocorre no presente caso, não havendo que se falar em ilegitimidade passiva do Procurador Chefe da Fazenda Nacional”.

 

Com contrarrazões (ID 104179882 - Pág. 70/78), subiram os autos.

O Ministério Público Federal opina pelo “desprovimento do recurso interposto” (ID 104179882 - Pág. 82).

É o relatório.

 

 

 


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V O T O

 

 

 

 

Transcrevo excerto da sentença para melhor compreensão da controvérsia (ID 104179882 - Pág. 17/27):

 

“(...) a legitimidade da Procuradoria Nacional exsurge mediante a inscrição do crédito em dívida ativa.

Destarte, se não há débito inscrito deve-se proclamar a ilegitimidade passiva "ad causam" [...] do Procurador-chefe da Dívida Ativa da União da Procuradoria da Fazenda Nacional em São Paulo.

[...] a matéria de fundo tratada na presente ação é eminentemente de direito, não impondo a necessidade de instrução probatória, na qual se pleiteia o afastamento de incidência de norma legal que impõe a aplicação de multa administrativa.

[...] passo ao exame do mérito.

Sustenta a impetrante que foi notificada acerca da imposição de multa no valor de R$23.426,97, sob o fundamento de violação artigo 1º do inciso IV, da Lei nº 9.817/99. Disciplina citada legislação:

‘Art. 1º Fica o importador sujeito ao pagamento de multa diária, sob a modalidade de encargo financeiro, a ser recolhida ao Banco Central do Brasil, quando:

I - contratar operação de câmbio fora dos prazos estabelecidos pelo Banco Central do Brasil;

II - efetuar o pagamento, em reais, de importação em virtude da qual seja devido o pagamento em moeda estrangeira;

III - efetuar pagamento, com atraso, das importações licenciadas para pagamento em reais;

IV - não efetuar o pagamento de importação até cento e oitenta dias após o primeiro dia do mês subsequente ao previsto para pagamento na Declaração de Importação.’

Outrossim, disciplina o artigo 1º da Lei nº 10.755/03: aplicável ao presente caso:

‘Art. 1º Fica o importador sujeito ao pagamento de multa a ser recolhida ao Banco Central do Brasil nas importações com Declaração de Importação - DI, registrada no Sistema Integrado de Comércio Exterior - Siscomex, quando:

I - contratar operação de câmbio ou efetuar pagamento em reais sem observância dos prazos e das demais condições estabelecidas pelo Banco Central do Brasil;

II - não efetuar o pagamento de importação até cento e oitenta dias a partir do primeiro dia do mês subsequente ao previsto para pagamento da importação, conforme consignado na DI ou no Registro de Operações Financeiras - ROF, quando financiadas.

§1º O disposto neste artigo aplica-se também às irregularidades previstas na legislação anterior, desde que pendentes de julgamento definitivo nas instâncias administrativas. (Redação dada pela Lei nº 11.196, de 2005).’

Por fim, estabelece o artigo 4º da Instrução Normativa nº 680/06 da Secretaria da Receita Federal e os artigos 1º e 2º da Circular nº 2731 do Bacen:

‘Art. 4º A Declaração de Importação (DI) será formulada pelo importador no Siscomex e consistirá na prestação das informações constantes do Anexo Único, de acordo com o tipo de declaração e a modalidade de despacho aduaneiro.’

‘Art. 1º Instituir, a partir de 02.01.97, e regulamentar, na forma do Regulamento anexo a esta Circular, o registro declaratório eletrônico, módulo Registro de Operação Financeira - ROF, das seguintes operações:

I - Importação financiada, mediante financiamento direto ao importador pelo fornecedor do bem e/ou serviço ou por outro financiador, ou concessão de linhas de crédito a bancos autorizados a operar em câmbio sediados no País, para financiamento a importadores, com prazos de pagamento superiores a 360 dias;

(...)

Art. 2. - O registro de cada operação no modulo registro de operação financeira (ROF) deve ser providenciado com anterioridade a declaração de importação (DI), mediante declaração do importador ou arrendatário, por meio das seguintes transações do sistema de informações banco central - SISBACEN:’

Portanto, de acordo com a legislação supra transcrita, as importações realizadas por meio de Declaração de Importação devem ser saldadas no prazo de 180 dias a contar da data de previsão de pagamento inscrita na respectiva DI.

Ocorre que o impetrante alega em sua inicial que: ‘A única providência tomada pela Impetrante após o prazo de 180 dias, foi com relação à retificação desta condição de pagamento, na medida em que a Impetrante, em vez de despender o montante integral de uma única vez, optou por financiar o valor junto às instituições financeiras credenciadas ao Banco Central do Brasil’ (fl. 04).

Assim, de acordo com a legislação supra transcrita, as importações realizadas por meio de Declaração de Importação devem ser saldadas no prazo de 180 dias a contar da data de previsão de pagamento inscrita na respectiva DI.

[...]

Insta observar o conteúdo da decisão administrativa de fls. 96/97:

‘5. Em consulta ao Sistema de Informações Banco Central - Sisbacen (fls. 84-114) constata-se que, efetivamente, todas as DIs em questão foram retificadas após 180 dias do vencimento do prazo de pagamento para a modalidade acima de 360 dias e pagas por meio de contratos de câmbio, que foram vinculados a operações de registro eletrônico declaratório de operação financiada - ROF.

6. Com relação à alegação de que as DIs foram pagas dentro do prazo estabelecido, constata-se pela análise da transação PCEX630 do Sisbacen que todas as DIs foram retificadas quanto à forma de pagamento após os prazos de vencimentos constantes nas versões originais das mesmas e só então atreladas a operações de ROF. Portanto, em tais casos, caracteriza-se a irregularidade, cabendo aplicação de multa.’ (grifos nossos)

Destarte, observa-se que a Impetrante, não tendo informado a tempo as condições em que efetuaria o pagamento das Declarações de Importação, incorreu em violação ao previsto na legislação de regência.

E não há de se falar em ‘mesclagem de normas para criar nova penalidade’ como alega a impetrante, mas sim estrita observância ao determinado no §1º do artigo 1º da Lei nº 10.755/03, que expressamente determina a sua incidência ‘às irregularidades previstas na legislação anterior desde que pendentes de julgamento definitivo nas instâncias administrativas’.

Ademais, a Impetrante não apenas deixou de observar o regramento expedido pelo BACEN, como também, intimada para oferecer defesa administrativa acerca da imputação de penalidade pela não quitação das importações, não apresentou os comprovantes de pagamento, conforme se depreende do relatório da decisão do recurso administrativo interposto pela demandante:

‘Solicitado, pela PGFN, o retorno dos autos ao Banco Central para melhor especificação das pendências, retornaram com a confirmação de que as regularizações foram realizadas após o prazo regulamentar de 180 dias. E quanto à DI 01/0090648-0, cuja multa foi considerada em R$2.554,70 (dois mil, quinhentos e cinqüenta e quatro reais e setenta centavos), o Banco Central considerou que a prova de pagamento da importação não era suficiente, pois não fora juntada aos autos cópia do SWIFT que comprovaria a transferência ao exportador." (fls. 101/102) (grifos nossos)

Assim, não tendo apresentado os comprovantes de que havia efetuado os pagamentos no prazo estipulado, e tampouco observado as condições estabelecidas pelo Banco Central do Brasil, no tocante à retificação da forma de pagamento, tem-se por legal a aplicação da penalidade imposta à impetrante.

Por fim, alega a impetrante que, ainda que devida a multa imposta pelo BACEN, há de se observar o princípio da retroatividade da lei mais benéfica, em virtude do disposto no artigo 6º da Lei nº 11.371/06:

‘Art. 6º A multa de que trata a Lei nº 10.755, de 3 de novembro de 2003, não se aplica às importações:

I - cujo vencimento ocorra a partir de 4 de agosto de 2006; ou

II - cujo termo final para a liquidação do contrato de câmbio de importação, na forma do inciso II do art. 1o da Lei no 10.755, de 2003, não tenha transcorrido até 4 de agosto de 2006’ (grifos nossos)

Ocorre que não há como prosperar tal assertiva. A natureza jurídica da multa aplicada pelo BACEN é administrativa, e não tributária, não sendo aplicável o disposto no artigo 106 do Código Tributário Nacional.

[...]

Portanto, diante de toda a fundamentação supra, não há direito líquido e certo a ser protegido por meio do presente mandado de segurança.

Cumpre registrar, por fim, que, tendo o juiz encontrado motivo suficiente a fundamentar a decisão, torna-se despicienda a análise dos demais pontos ventilados pela autora, pois ‘o juiz não está obrigado a responder todas as alegações das partes, quando já lenha encontrado motivo suficiente para fundar a decisão, nem se obriga a ater-se aos fundamentos indicados por elas, e tampouco a responder um a um todos os seus argumentos’ (RJTJESP 115/207).

“Diante do exposto e de tudo mais que dos autos consta, JULGO EXTINTO o processo sem julgamento do mérito, com fundamento no artigo 267, VI, do Código de Processo Civil, em relação ao Procurador Chefe da Procuradoria da Fazenda Nacional em São Paulo e, quanto ao pleito vinculado ao Chefe do Departamento de Combate a Ilícitos Financeiros e Supervisão de Câmbio e Capitais Internacionais do Banco Central do Brasil julgo improcedente o pedido e denego a segurança, na forma como pleiteada, com julgamento de mérito; extinguindo o processo com fundamento no artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil.

Custas pela impetrante.

É incabível a condenação em honorários advocatícios em mandado de segurança, nos termos do artigo 25 da Lei nº 12.016/09.

Após o trânsito em julgado, convertam-se em renda do Banco Central do Brasil os valores depositados na conta judicial indicada à fl. 240.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se e Oficie-se.”

(grifos no original)

 

Deveras, o Procurador-Chefe da Fazenda Nacional não é parte legítima para figurar no polo passivo do mandado de segurança, uma vez que o valor relativo à multa não foi inscrito em dívida ativa. Tampouco havia espaço para fazê-lo pois, conforme destacado na sentença: “Realizado o depósito integral do valor sob discussão (fls. 238/240), foi deferida parcialmente a liminar, determinando a suspensão da exigibilidade da multa, bem como a inscrição no CADIN (fl. 242)”.

Além disso, o c. Superior Tribunal de Justiça decidiu que “o mandado de segurança preventivo exige efetiva ameaça decorrente de atos concretos ou preparatórios por parte da autoridade indigitada coatora, não bastando o risco de lesão a direito líquido e certo, baseado em conjecturas por parte do impetrante, que, subjetivamente, se entende encontrar na iminência de sofrer o dano”. Confira-se:

 

“PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO. MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO. ICMS-DIFAL. MERO RECEIO DE LESÃO A DIREITO. AUSÊNCIA DE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA. NÃO CABIMENTO. PRECEDENTES. AFERIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7 DO STJ.

1. Cuida-se, na origem, de mandado de segurança preventivo visando evitar a cobrança do DIFAL-ICMS em observância à garantia constitucional da anterioridade do exercício financeiro e da anterioridade nonagesimal, em relação à Lei Complementar n. 190/2022, publicada no DOU de 5 de janeiro de 2022, que prevê a incidência desse diferencial de alíquota de ICMS, respeitando-se a modulação dos efeitos da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 1.287.019, com repercussão geral - Tema n. 1.093.

2. A sentença extinguiu o feito sem resolução de mérito em razão da ausência de demonstração, pela impetrante, de inobservância aos princípios da anterioridade de exercício e anterioridade nonagesinal, ou da prática de algum ato efetivo tendente a tal cobrança futura do DIFAL-ICMS, seja em relação à LC n. 190/2022, seja em relação à Lei Estadual n. 1.608/2021. O acórdão recorrido negou provimento ao apelo sob os seguintes fundamentos: "[...] -O mandado de segurança é cabível na modalidade preventiva, quando existir a iminência de uma ameaça real, plausível, concreta e objetiva, de a autoridade pública praticar algum ato ou de se omitir deliberadamente, quando esteja obrigada a agir. Não basta um mero receio de lesão a direito. -O Tema de Repercussão Geral nº. 1092 não impôs o cabimento demandado de segurança em toda e qualquer situação para afastar a cobrança do diferencial de alíquota do ICMS. "

3. O acórdão recorrido não destoa da jurisprudência desta Corte, a qual já se manifestou no sentido de que o mandado de segurança preventivo exige efetiva ameaça decorrente de atos concretos ou preparatórios por parte da autoridade indigitada coatora, não bastando o risco de lesão a direito líquido e certo, baseado em conjecturas por parte do impetrante, que, subjetivamente, se entende encontrar na iminência de sofrer o dano. A propósito: AgInt nos EDcl no REsp 2.042.577/MS, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe 19/05/2023; AgInt no REsp 1945760/MT, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 09/08/2022.

4. Por outro lado, não é possível a esta Corte, em sede de recurso especial, infirmar as conclusões do acórdão recorrido quanto à ausência de prova pré-constituída em relação à natureza preventiva do mandado de segurança, tendo em vista que tal procedimento demandaria incursão no substrato fático-probatório do mandado do segurança, providência que esbarra no óbice da Súmula nº 7 desta Corte.

5. Agravo interno não provido.”

(AgInt no AREsp n. 2.386.450/RR, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 13/11/2023, DJe de 17/11/2023.)

(grifos nossos)

 

No que tange ao mérito, tem-se por incontroverso que as Declarações de Importação foram retificadas (para modalidade acima de 360 dias) após decorridos os 180 dias do vencimento do prazo de pagamento original e, somente a partir de então, atreladas ao Registro de Operação Financeira - ROF.

Ora, ao optar por não efetuar o pagamento em até cento e oitenta dias após o primeiro dia do mês subsequente ao previsto na Declaração de Importação, a impetrante/apelante deu causa à aplicação da multa por violação ao disposto nos artigos 1º, inciso IV, da Lei nº 9.817/99 e 1º, inciso II, da Lei nº 10.755/03, e por inobservância ao procedimento previsto no artigo 2º da Circular nº 2731 do Bacen.

Assim, uma vez decorrido o prazo original de pagamento (180 dias), carece de plausibilidade a argumentação de que as “retificações não comprometeram a data dos pagamentos efetuados para cada uma das DIs.” ainda que, consoante igualmente aduz a impetrante: “todas as operações se encontram liquidadas e sem saldo a aplicar no sistema do Banco Central do Brasil Sisbacen/Siscomex” (ID 104179890 - Pág. 15).

Acerca deste último argumento, colhe-se das decisões proferidas no processo administrativo que também remanesce dúvida acerca do alegado pagamento.

Nesse passo, ante a ausência de prova robusta, o mandado de segurança não se mostra a via adequada para apurar a integralidade do pagamento, pois a controvérsia sobre os fatos alegados somente poderá ser solucionada por meio de produção de outras provas não presentes nos autos.

Por derradeiro, diante da natureza administrativa da multa cominada em razão do exercício do poder de polícia, se apresenta inviável a pretensão de aplicar norma afeta exclusivamente ao direito tributário para obter a retroatividade de lei mais benéfica com o objetivo de afastar a penalidade.

Note-se. O caso não trata de questionamento de pagamento de crédito tributário, mas de exigência de multa de natureza administrativa.

A jurisprudência do c. Superior Tribunal de Justiça é uníssona quanto ao tema, “verbis”:

 

“ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. SANÇÃO ADMINISTRATIVA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL NÃO VERIFICADA. EXAME DE FUNDAMENTO EMINENTEMENTE CONSTITUCIONAL. INVIABILIDADE. PRINCÍPIO DA RETROATIVIDADE DA NORMA MAIS BENÉFICA. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 106 DO CTN. IMPOSSIBILIDADE.

1. Afasta-se a alegada ofensa aos arts. 489, § 1º, IV e 1.022, II, do CPC, porquanto a instância ordinária solucionou, de forma clara e fundamentada, as questões que lhe foram submetidas, apreciando integralmente a controvérsia posta nos autos, não havendo que se confundir julgamento desfavorável ao interesse da parte com negativa ou ausência de prestação jurisdicional.

2. Apresenta-se inviável a este Superior Tribunal realizar juízo de valor a respeito da adequação, ou não, do fundamento constitucional adotado no acórdão recorrido, por se tratar de matéria reservada ao Supremo Tribunal Federal, nos termos do art. 102, III, da Constituição da República.

3. Depreende-se da leitura do acórdão recorrido que o Tribunal de origem adotou fundamento de natureza eminentemente constitucional para solucionar a controvérsia, de forma que a análise do tema extrapola a estreita via do recurso especial.

4. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que as disposições do art. 106 do Código Tributário Nacional não são aplicáveis às hipóteses de multa administrativa, as quais possuem natureza jurídica não tributária.

5. Agravo interno não provido.”

(AgInt no AREsp n. 2.213.337/PR, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 22/5/2023, DJe de 25/5/2023.)

 

“PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. INOVAÇÃO RECURSAL. PRECLUSÃO CONSUMATIVA. MULTA. LEI MAIS BENÉFICA. RETROATIVIDADE. IMPOSSIBILIDADE.

1. As alegações que não foram deduzidas no momento oportuno, mas, apenas, no presente agravo interno, configuram inovação recursal insuscetível de análise em face da preclusão consumativa.

2. O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento consolidado no sentido de que não é aplicável às infrações de natureza administrativa (hipótese dos autos) a previsão da retroatividade da lei mais benéfica prevista no Código Tribunal Nacional (art. 106 do CTN).

3. Agravo interno desprovido.”

(AgInt no AREsp n. 1.547.574/SP, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 16/11/2021, DJe de 9/12/2021.)

(grifos nossos)

 

Ainda que assim não fosse, verifica-se que o próprio legislador da Lei nº 11.371/06 entendeu por ressalvar expressamente, no artigo 6º, as multas vencidas até 04 de agosto de 2006 ou cujo termo final de liquidação do contrato de câmbio de importação não tenha transcorrido até a aludida data.

Destarte, diante dos fundamentos alhures delineados, a sentença merece ser mantida para o fim de denegar a segurança.

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.

É como voto.
 



E M E N T A

 

DIREITO CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO. MERO RECEIO DE LESÃO A DIREITO. PAGAMENTO EXTEMPORÂNEO DE DECLARAÇÃO DE IMPORTAÇÃO. MULTA ADMINISTRATIVA COMINADA POR VIOLAÇÃO AO DISPOSTO NOS ARTIGOS 1º, INCISO IV, DA LEI Nº 9.817/99 E 1º, INCISO II, DA LEI Nº 10.755/03. RETROATIVIDADE DA LEI MAIS BENÉFICA. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ARTIGO 106 DO CTN. IMPOSSIBILIDADE.

1. O Procurador-Chefe da Fazenda Nacional não é parte legítima para figurar no polo passivo do mandado de segurança, uma vez que o valor relativo à multa não foi inscrito em dívida ativa.

2. O “mandado de segurança preventivo exige efetiva ameaça decorrente de atos concretos ou preparatórios por parte da autoridade indigitada coatora, não bastando o risco de lesão a direito líquido e certo, baseado em conjecturas por parte do impetrante, que, subjetivamente, se entende encontrar na iminência de sofrer o dano” (AgInt no AREsp n. 2.386.450/RR, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 13/11/2023, DJe de 17/11/2023.)

3. Ao optar por não efetuar o pagamento em até cento e oitenta dias após o primeiro dia do mês subsequente ao previsto na Declaração de Importação, a impetrante/apelante deu causa à aplicação da multa por violação ao disposto nos artigos 1º, inciso IV, da Lei nº 9.817/99 e 1º, inciso II, da Lei nº 10.755/03, e por inobservância ao procedimento previsto no artigo 2º da Circular nº 2731 do Bacen.

4. Uma vez decorrido o prazo original de pagamento (180 dias), carece de plausibilidade a argumentação de que as “retificações não comprometeram a data dos pagamentos efetuados para cada uma das DIs.” ainda que, consoante igualmente aduz a impetrante: “todas as operações se encontram liquidadas e sem saldo a aplicar no sistema do Banco Central do Brasil Sisbacen/Siscomex”

5. Colhe-se das decisões proferidas no processo administrativo que também remanesce dúvida acerca do alegado pagamento. Nesse passo, ante a ausência de prova robusta, o mandado de segurança não se mostra a via adequada para apurar a integralidade do pagamento, pois a controvérsia sobre os fatos alegados somente poderá ser solucionada por meio de produção de outras provas não presentes nos autos.

6. Diante da natureza administrativa da multa cominada em razão do exercício do poder de polícia, se apresenta inviável a pretensão de aplicar norma afeta exclusivamente ao direito tributário para obter a retroatividade de lei mais benéfica com o objetivo de afastar a penalidade.

7. “A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que as disposições do art. 106 do Código Tributário Nacional não são aplicáveis às hipóteses de multa administrativa, as quais possuem natureza jurídica não tributária” (AgInt no AREsp n. 2.213.337/PR, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 22/5/2023, DJe de 25/5/2023.)

8. Ainda que assim não fosse, verifica-se que o próprio legislador da Lei nº 11.371/06 entendeu por ressalvar expressamente, no artigo 6º, as multas vencidas até 04 de agosto de 2006 ou cujo termo final de liquidação do contrato de câmbio de importação não tenha transcorrido até a aludida data.

9. Apelação desprovida.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, à unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do voto do Des. Fed. WILSON ZAUHY (Relator), com quem votaram o Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE e a Des. Fed. MÔNICA NOBRE, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.