AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5030890-06.2023.4.03.0000
RELATOR: Gab. 05 - DES. FED. COTRIM GUIMARÃES
AGRAVANTE: RC COMERCIO DE BENS IMOVEIS LTDA
Advogado do(a) AGRAVANTE: MARCOS SERGIO FORTI BELL - SP108034-A
AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
INTERESSADO: LENA & CIA. LTDA
ADVOGADO do(a) INTERESSADO: ARLINDO CESAR ALBORGHETI MOREIRA - SP149138
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5030890-06.2023.4.03.0000 RELATOR: Gab. 05 - DES. FED. COTRIM GUIMARÃES AGRAVANTE: RC COMERCIO DE BENS IMOVEIS LTDA Advogado do(a) AGRAVANTE: MARCOS SERGIO FORTI BELL - SP108034-A AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: INTERESSADO: LENA & CIA. LTDA ADVOGADO do(a) INTERESSADO: RENAN LEMOS VILLELA - SP346100-A R E L A T Ó R I O O Exmo. Sr. Desembargador Federal COTRIM GUIMARÃES (Relator): Trata-se de agravo de instrumento interposto por RC COMÉRCIO DE BENS IMÓVEIS LTDA contra decisão que em sede de embargos de terceiro que opôs contra a execução fiscal de valores previdenciários movida pela União Federal em face de LENA & CIA. LTDA, objetivando livrar da constrição judicial os imóveis de matrículas nº 194.809 e 194.822 ambos do 3º CRI de Campinas/SP, alegando que os adquiriu, de boa-fé, da executada mediante escritura pública lavrada em 23/01/2020, indeferiu o pedido, em razão de fraude à execução nos termos do art. 185 do Código Tributário Nacional. Afirma, ainda, que a fraude à execução possui contornos próprios que dispensa o ajuizamento de ação Pauliana ou Revocatória para questioná-la. Por fim, corrigiu o valor da causa, de ofício, para constar o valor dos imóveis que pretende a liberação. Agravante: articula nesta sede os mesmos argumentos articulados na inicial de embargos, requerendo que o valor da causa atribuída inicialmente seja mantida, já que em se tratando de embargos de terceiros, tal atribuição pode ser feita exclusivamente da parte embargante. Com contraminuta. É o relatório.
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5030890-06.2023.4.03.0000 RELATOR: Gab. 05 - DES. FED. COTRIM GUIMARÃES AGRAVANTE: RC COMERCIO DE BENS IMOVEIS LTDA Advogado do(a) AGRAVANTE: MARCOS SERGIO FORTI BELL - SP108034-A AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: INTERESSADO: LENA & CIA. LTDA ADVOGADO do(a) INTERESSADO: RENAN LEMOS VILLELA - SP346100-A V O T O O Exmo. Sr. Desembargador Federal COTRIM GUIMARÃES (Relator): O artigo 185 e seu parágrafo único do Código Tributário Nacional prescrevem o seguinte, in verbis: Art. 185. Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública, por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa. Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica na hipótese de terem sido reservados, pelo devedor, bens ou rendas suficientes ao total pagamento da dívida inscrita. No caso, conforme documentação juntada aos autos, a alienação dos referidos imóveis foi firmada pela parte devedora fiscal em 07 de novembro de 2019, com escritura pública lavrada em janeiro/2020, na pendência de dívida tributária constituída em desfavor da parte alienadora regularmente inscrita em dívida ativa a partir de 20 de maio de 2019. Nesta situação, a fraude à execução resta caracterizada, pois referida alienação se deu após a inscrição em dívida ativa do crédito exequendo. A propósito: “EMEN: TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL. ALIENAÇÃO DE BEM APÓS A INSCRIÇÃO DO DÉBITO EM DÍVIDA ATIVA. FRAUDE À EXECUÇÃO CONFIGURADA. 1. O Superior Tribunal de Justiça consolidou entendimento de que, com a vigência da Lei Complementar n. 118/2005, se a alienação de bem se deu após a inscrição do débito em dívida ativa, é fraudulenta a operação. 2. No caso concreto, o ato ocorreu em 2007, pelo que o reconhecimento da fraude é medida que se impõe. 3. Recurso especial a que se dá provimento. ..EMEN:.” ( STJ, Resp. nº 1667914, 2ª Turma, rel. OG Fernandes, DJE 07-03-2018) Ademais, ao tempo da alienação/aquisição do imóvel a existência ou não de registro de gravame sobre o bem era irrelevante. O que deve ser considerado é que o vendedor era devedor fiscal de dívida previdenciária regularmente inscrita, portanto não poderia alienar seus bens a ponto de se tornar insolvente. O fato é que a parte adquirente não realizou as diligências que lhe cabiam, pois antes de efetivar a compra do bem, deveria obter certidão negativa de débito fiscal em nome da parte vendedora. Esta omissão descaracteriza a presunção de boa-fé da aquisição. Consigno que não está em discussão a boa-fé do embargante, mas sim a ineficácia da transação perante o credor exeqüente, ante a alienação realizada em fraude à execução. A propósito: “TRIBUTÁRIO - APELAÇÃO - EMBARGOS DE TERCEIROS - EXECUÇÃO FISCAL - PENHORA - COMPROVAÇÃO - ALIENAÇÃO APÓS CITAÇÃO - FRAUDE À EXECUÇÃO. 1. Havendo o descumprimento da obrigação legal de quitação dos tributos, podem as pessoas físicas responder pelo débito, jungi-se a isso, o fato de que todos os bens do devedor respondem pela execução. Logo, podendo recair qualquer tipo de restrição sobre o patrimônio do executado, cita-se, por exemplo, a penhora. 2. O embargante de terceiro adquiriu um veículo de um dos sócios-executados, em 24 de maio de 2002, conforme consta nos autos, destaca-se que o referido sócio foi incluído na execução, em 06/01/2001, sendo o automóvel penhorado, em 26/11/2001. 3. Conclui-se, que se o embargante tivesse diligenciado em analisar medianamente as condições do veículo, poderia ter notado perfunctoriamente pendências existentes, no caso, a penhora e que o alienante era réu em uma execução fiscal . 4. Há três elementos claros e robustos indicando pendências: uma penhora, a alienação após um ano de realizada a penhora, bem como, da inclusão do sócio e a simples consulta no cartório distribuidor, que por inércia do adquirente não foi consulta, mas este tem o dever de zelo, mas, especificamente, o dever de consultar minimante se aquele bem está livre de restrições. 5. A alienação se deu em fraude a execução, tornando-se ineficaz perante a credora, nos termos dos artigos 184 e 185 do CTN. 6. A boa-fé não deve ser discutida, mas, tão somente, a ineficácia da transação perante a credora, em razão da alienação realizada em fraude à execução. 7. Apelação improvida” ( TRF3, AC nº 1065186, Judiciário em Dia – Turma D, rel. Leonel Ferreira , eDJF3 Judicial 1 Data: 15-03-2011, pág. 548) Dessa forma, a alienação dos imóveis em relação às inscrições em dívida ativa anteriores a 07 de novembro de 2019 é nula. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA Havendo crédito tributário inscrito em dívida ativa, a alienação de bens do devedor pode implicar em fraude à execução fiscal mesmo antes da distribuição da cobrança, o que se extrai das disposições do art. 185 do Código Tributário Nacional. Como a fraude à execução é matéria de ordem pública, a mesma pode ser levantada ou conhecida de ofício a qualquer tempo ou grau de jurisdição por simples requerimento incidental da parte interessada, o que ocorreu nos autos. Sendo assim, não há falar em ajuizamento de ação autônoma para alegá-la. Até se poderia cogitar de ação Pauliana ou Revocatória para o caso, se inexistisse crédito fiscal inscrito em dívida ativa. VALOR DA CAUSA O entendimento jurisprudencial corrente é no sentido de que nos embargos de terceiro, o valor da causa deve corresponder ao valor do bem penhorado, no caso, do imóvel. Entretanto, entende que tal valor deve ser limitado ao valor do débito. A propósito: “EMEN: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO. VALOR DA CAUSA. VALOR DO BEM OBJETO DA CONSTRIÇÃO. LIMITE. VALOR DO DÉBITO. PRECEDENTES. 1. Esta Corte Superior possui entendimento firmado no sentido de que o valor da causa, nos embargos de terceiro, corresponderá ao valor do bem objeto da constrição limitado ao valor do débito. 2. Agravo regimental não provido. ..EMEN:” ( STJ, AGRESP nº 1220317, 3ª Turma, rel. Ricardo Villas Bôas Cueva, DJE 16/10/2012) Portanto, considerando o valor do crédito tributário cobrando na execução fiscal associada, a decisão agravada não merece reforma. Diante do exposto, nego provimento ao agravo de instrumento, nos termos da fundamentação supra. É o voto.
E M E N T A
PROCESSO CIVIL – AGRAVO DE INSTRUMENTO – EXECUÇÃO FISCAL – EMBARGOS DE TERCEIRO - ALIENAÇÃO DE BENS – FRAUDE À EXECUÇÃO – CARACTERIZADA - INEFICÁCIA
I – Se a alienação dos imóveis foi realizada em janeiro/2020, após a inscrição do crédito em dívida ativa em 20/05/2019, a teor da LC 118/2005, a aquisição do bem se deu em fraude à execução.
II – Em se tratando de embargos de terceiro, o valor da causa deve corresponder ao do bem penhorado.
III – A fraude à execução se constitui em matéria de ordem pública que pode ser apreciada, de oficio, e alegada por simples petição incidental, sendo desnecessária sua alegação em ação autônoma.
IV - Agravo de instrumento não provido.