APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000631-51.2019.4.03.6181
RELATOR: Gab. 44 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA
APELANTE: DOMENICO PICOLLI
Advogados do(a) APELANTE: APARECIDO JOSE DE LIRA - SP141174-A, SEBASTIAO MESSIAS DOS SANTOS - SP342543-A, THADEU GOPFERT WESELOWSKI - SP293196-A
APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000631-51.2019.4.03.6181 RELATOR: Gab. 44 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA APELANTE: DOMENICO PICOLLI Advogados do(a) APELANTE: APARECIDO JOSE DE LIRA - SP141174-A, SEBASTIAO MESSIAS DOS SANTOS - SP342543-A, THADEU GOPFERT WESELOWSKI - SP293196-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA (RELATOR): O Ministério Público Federal, em 11/07/2019, denunciou Domenico Picolli, nascido em 09/12/1965, qualificado nos autos, como incurso no artigo 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/1990, na forma do artigo 70 do Código Penal. Consta da denúncia (ID 159311658): (...) Restou apurado, por fiscalização realizada pela Secretaria da Receita Federal, que DOMENICO PICOLLI, na condição de sócio-administrador da empresa “PICOLLI TELECOM COMÉRCIO E PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS EM APARELHOS CELULARES LTDA.” (CNPJ nº 05.745.746/0001-48), (...), omitiu receita operacional no ano-calendário de 2008, do que resultou o lançamento de ofício de créditos tributários referentes ao Imposto de Renda da Pessoa Jurídica, Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, Contribuição para o Programa de Integração Social e Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (...). Tais fatos foram verificados no Procedimento Administrativo Fiscal nº 19515.723029/2013-14, que deu origem à Representação Fiscal para Fins Penais nº 19515.723030/2013-49 (...). Conforme consta dos autos, no curso da ação fiscal, foi constatado que a empresa “PICOLLI TELECOM” procedeu à entrega de demonstrativos contábeis fiscais “zerados”, ou seja, sem informação de receitas auferidas (...), além de não terem sido registrados débitos ou recolhimentos de IRPJ, CSLL, PIS e COFINS em Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais – DCTF (...), não obstante a comprovação da existência de receitas operacionais, com base em lançamentos contábeis informados pelo próprio contribuinte, ajustados por valores de vendas com cartões de crédito e recebimentos por serviços prestados à “TIM CELULAR S/A”, conforme minuciosamente descrito no Termo de Verificação Fiscal e de Responsabilidade Tributária Solidária (...). (...) O crédito tributário relativo ao processo administrativo fiscal nº 19515.723029/2013-14, lavrado em face da empresa “PICOLLI TELECOM COMÉRCIO E PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS EM APARELHOS CELULARES LTDA.” foi definitivamente constituído em 29/01/2014 (...) e inscrito em Dívida Ativa da União pela Procuradoria da Fazenda Nacional em 23/03/2018, não havendo registros de pagamento ou parcelamento do valor devido (...). (...) A materialidade da conduta delituosa restou plenamente demonstrada pela documentação referente ao procedimento administrativo discal, que comprova a supressão de tributos devidos à Fazenda Federal, relativos ao ano-calendário de 2008, assim como a omissão de informações às autoridades fiscais, conforme Demonstrativo Consolidado de Crédito Tributário (...), demonstrativos contábeis (...), Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais – DCTF (...) e Termo de Verificação Fiscal e de Responsabilidade Tributária Solidária (...). A autoria da conduta restou igualmente comprovada pela Ficha Cadastral da empresa “PICOLLI TELECOM COMÉRCIO E PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS EM APARELHOS CELULARES LTDA.”, enviada pela Junta Comercial do Estado de São Paulo – LUCESP (...), bem como pelas 19ª e 20ª Alterações Contratuais da Sociedade Empresária (...), as quais demonstraram que, na data dos fatos, eram responsáveis legais pela empresa fiscalizada o ora denunciado DOMENICO PICOLLI, seu pai GIOVANNI PICOLLI e seu irmão GIUSEPPE PICOLLI. (...) Assim, sendo pouco crível que a empresa de contabilidade espontaneamente decidisse apresentar demonstrativos contábeis “zerados” e ainda menos plausível que o responsável pelas questões tributárias não percebesse a total ausência de recolhimento de tributos federais, não resta dúvida de que foi o ora denunciado DOMENICO PICOLLI o responsável pela decisão de omitir rendimentos auferidos e prestar declarações falsas às autoridades fazendárias, de forma a suprimir tributos federais, praticando a conduta prevista no artigo 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/90. (...) A denúncia foi recebida em 30/07/2019 (ID 159311666). Processado o feito, sobreveio sentença (ID 159312198), publicada em 19/03/2021, que julgou procedente a denúncia, para condenar o réu como incurso no artigo 1º, inciso I, c.c. artigo 12, inciso I, da Lei nº 8.137/1990, à pena de 03 anos, 01 mês e 10 dias de reclusão no regime inicial aberto, bem como ao pagamento de 101 dias-multa no valor unitário de um salário-mínimo vigente. Determinada a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em: (a) prestação de serviços à comunidade ou a entidade pública a ser definida pelo Juízo da Execução na mesma duração da pena corporal substituída; e (b) prestação pecuniária correspondente a uma parcela única no valor de R$ 10.000,00, em favor da União. Apela o réu (ID 160900076). Em suas razões recursais, alega, preliminarmente, a inépcia da denúncia, porquanto a inicial acusatória seria genérica, não tendo precisado detalhadamente a conduta do réu. No mérito, sustenta o decurso da prescrição da pretensão punitiva, frente aos fatos datarem de 2008 e a denúncia somente ter sido recebida em 2019, considerando-se a inaplicabilidade ao caso das alterações promovidas pela Lei nº 12.234/2010. Sustenta, ainda, a não demonstração do dolo de fraudar o Fisco, o qual teria restado afastado pelas testemunhas ouvidas pelo Juízo. Aduz que o mero exercício do cargo de diretor de uma empresa não constituiria, por si só, fato ilícito. Nesse sentido, atribui aos escritórios de contabilidade contratados a responsabilidade pelo recolhimento dos tributos devidos pela sociedade. Alega, ainda, que a empresa não teria a obrigação de manter arquivada a documentação exigida pela fiscalização após cinco anos do encerramento da empresa. Subsidiariamente, pugna pelo reconhecimento de crime único e afastamento do concurso formal, bem como da aplicação do artigo 12, inciso I, da Lei nº 8.137/1990 ao caso concreto, cuja causa de aumento de pena nem ao menos teria sido postulada na denúncia. Requer, ainda, a adequação da pena de multa, para que seja arbitrada segundo os mesmos critérios da pena privativa de liberdade. Sem contrarrazões (ID 161293300), subiram os autos. O DD. Órgão do Ministério Público Federal manifestou-se pelo parcial provimento do recurso (ID 161893517). É o relatório. À revisão.
APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000631-51.2019.4.03.6181 RELATOR: Gab. 44 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA APELANTE: DOMENICO PICOLLI Advogados do(a) APELANTE: APARECIDO JOSE DE LIRA - SP141174-A, SEBASTIAO MESSIAS DOS SANTOS - SP342543-A, THADEU GOPFERT WESELOWSKI - SP293196-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA (RELATOR): Inicialmente, afasto a preliminar suscitada. Não se verifica nulidade decorrente de inépcia da denúncia por ausência de indicação precisa da conduta do réu. Em se tratando de delito de autoria coletiva, no caso, a supressão de tributos imputada aos representantes de pessoa jurídica, não é necessário que a denúncia apresente de maneira individualizada a conduta de cada um dos acusados, bastando que seja demonstrado o vínculo da conduta com o delito praticado. Nesse sentido: PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. 1. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. MATERIALIDADE DELITIVA. CRIME TRIBUTÁRIO. CRÉDITO GARANTIDO. IRRELEVÂNCIA. 2. CRÉDITO GARANTIDO POR MEIO DE SEGURO-GARANTIA. NÃO SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO. IMPOSSIBILIDADE DE SUSPENSÃO DA PERSECUÇÃO PENAL. 3. INÉPCIA DA DENÚNCIA. CONDUTAS NÃO DELIMITADAS. CRIME SOCIETÁRIO. ADMINISTRADORES DA PESSOA JURÍDICA. NEXO CAUSAL INDICADO. AMPLA DEFESA ASSEGURADA. 4. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Conquanto o débito tributário tenha sido garantido na origem, o certo é que a garantia não se equipara ao pagamento do tributo, razão pela qual não enseja, imediata e obrigatoriamente, o trancamento da ação penal, como almejado. 2. Embora não seja possível o trancamento da ação penal, a jurisprudência considera que "o depósito integral do valor como garantia enseja a suspensão da exigibilidade do crédito tributário, autorizando, portanto, a suspensão do inquérito policial ou da ação penal". (RHC n. 139.563/CE, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 21/9/2021, DJe de 27/9/2021.) - Na hipótese dos autos, a garantia do crédito tributário ocorreu por meio de seguro-garantia, o qual, segundo jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça "não se apresenta como meio apto a suspender a exigibilidade de crédito tributário, por ausência de previsão no art. 151 do CTN. Precedentes". (AgInt no REsp n. 1.965.194/DF, relatora Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, julgado em 7/12/2022, DJe de 14/12/2022.) - Não tendo havido a suspensão da exigibilidade do crédito tributário, não há se falar em suspensão da ação penal, porquanto "os embargos à execução constituem-se em hipótese de questão prejudicial facultativa, onde compete ao magistrado decidir se suspende ou não a persecução criminal até a solução do cível, de modo que a opção pela continuidade do feito criminal - de instância independente da cível - não constitui constrangimento ilegal". (HC n. 350.666/SP, Rel. Min. NEFI CORDEIRO, Sexta Turma, julgado em 21/6/2016, DJe de 29/6/2016.) 3. É pacífico na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça o entendimento no sentido de que, nos casos de crimes societários e de autoria coletiva, tem se admitido a denúncia geral, a qual, apesar de não detalhar minudentemente as ações imputadas aos denunciados, demonstra, ainda que de maneira sutil, a ligação entre sua conduta e o fato delitivo, conforme ocorre nos autos. - A conduta imputada aos pacientes foi descrita na denúncia com suficiência de detalhes, permitindo o contraditório e a ampla defesa no curso da ação penal. Acrescente-se que o detalhamento e a individualização de cada um dos atos de sonegação fiscal podem ser extraídos dos anexos integrantes das notificações fiscais que ensejaram o lançamento tributário e que integram a inicial acusatória bem como dos procedimentos de auditoria fiscal e dos registros de empresa. Assim, não há se falar em inépcia. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ, AgRg no HC n. 801.617/SC, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 25/9/2023, DJe de 27/9/2023) Além disso, o princípio da correlação determina que haja congruência indicativa entre os fatos narrados na denúncia e a situação concreta. No caso, a inicial acusatória explicita a relação concreta existente entre a conduta narrada e as funções comumente desempenhadas por administradores de empresas. Ademais, os documentos oriundos da fiscalização fazendária, que integram o inquérito, permitem a individualização dos atos de sonegação de tributos, não havendo que se falar em inépcia da denúncia. Firmado isso, passo à análise do mérito recursal. Da prescrição A defesa alega ter transcorrido o prazo da prescrição da pretensão punitiva, uma vez que os fatos datariam de 2008 e a denúncia somente teria sido recebida em 2019, considerando-se a inaplicabilidade ao caso das alterações promovidas pela Lei nº 12.234/2010. Sem razão, contudo. Nos termos da Súmula Vinculante 24, “Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/1990, antes do lançamento definitivo do tributo”. No caso, o Ofício DERAT/SPO/DICAT/ECOB nº 376/2018 informa que a constituição definitiva do crédito tributário vinculado ao PAF nº 19515.723029/2013-14 deu-se em 29/01/2014, sem notícia de pagamento ou parcelamento do débito (ID 159311662, p. 29), sendo essa a data a partir da qual deve ter início a contagem do prazo prescricional. A denúncia foi recebida em 30/07/2019 (ID 159311666) e a publicação da sentença deu-se em 19/03/2021 (ID 159312198), com a condenação do apelante à pena de 03 anos, 01 mês e 10 dias de reclusão, após a majoração em 1/6 pela continuidade delitiva. De acordo com a Súmula 497 do Supremo Tribunal Federal, “Quando se tratar de crime continuado, a prescrição regula-se pela pena imposta na sentença, não se computando o acréscimo decorrente da continuação”. Afastado o aumento pela continuidade delitiva, trabalha-se com a pena de 02 anos e 08 meses de reclusão. Tem-se, portanto, o prazo prescricional de oito anos para o delito considerado, tal como dispõe o artigo 109, inciso IV, do Código Penal. Vê-se, assim, que não houve o decurso do lapso de oito anos entre os marcos interruptivos da prescrição (recebimento da denúncia e publicação da sentença condenatória) e até o presente momento, devendo-se ainda afastar a alegação da defesa no sentido da inaplicabilidade ao caso concreto das disposições trazidas pela Lei nº 12.234/2010. Da materialidade A materialidade do crime previsto no artigo 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/1990 está demonstrada pelos documentos oriundos do Procedimento Administrativo Fiscal – PAF nº 19515.723029/2013-14 (ID 159311959 e ID 159312009), o qual compreende os Autos de Infração mediante os quais foi constituído de ofício o crédito tributário relativo a impostos e contribuições sociais devidos pela sociedade denominada Picolli Telecom Comércio e Prestação de Serviços em Aparelhos Celulares Ltda. – ME no ano-calendário de 2008. Corrobora a materialidade o documento emitido pela Receita Federal, informando que os créditos relativos ao processo administrativo nº 19515.723029/2013-14 foram constituídos definitivamente em 29/01/2014 (ID 159311662, p. 29). Da autoria e do dolo A autoria delitiva imputada a Domenico Picolli encontra amparo nas provas coligidas aos autos, destacando-se o Contrato Social e a Ficha Cadastral da JUCESP (ID 159311969), mediante os quais se atesta a qualidade de sócio administrador da empresa autuada – Picolli Telecom Comércio e Prestação de Serviços em Aparelhos Celulares Ltda. – ME. Além disso, por ocasião das declarações prestadas à autoridade policial, o réu reconheceu sua qualidade de administrador da empresa autuada (ID 159311664, 9). Deve-se considerar, ainda, que o acusado, em Juízo, admitiu assinar cheques e notas fiscais vindos do departamento financeiro (ID 159312138), bem como que assinou os Autos de Infração na qualidade de diretor da empresa autuada (ID 159312001). No que respeita ao dolo, infere-se da prova dos autos a caracterização da conduta livre e consciente do réu, na condição de administrador da pessoa jurídica fiscalizada, de fraudar a administração fiscal por meio da omissão de receitas. Para melhor compreensão dos fatos, veja-se o seguinte excerto do Termo de Verificação Fiscal e de Responsabilidade Tributária Solidária (ID 159312000): (...) 1) Para o Ano de 2008, o contribuinte acima qualificado optou pela tributação do IRPJ e CSLL com apuração do Lucro Real anual, conforme DIPJ 2009 – Ano Calendário 2008 – ND nº 1597591, entregue em 16/10/2009; (...) 21) Em 20/09/2013, ante o não cumprimento do solicitado reiteradamente, lavramos “Termo de Embaraço a Fiscalização”, objeto do Edital nº 235/2013, afixado nas dependências da Repartição em 08/10/2013 e desafixado em 24/10/2013, sendo que a ciência deu-se de forma pessoal em 18/10/2013 pelo comparecimento do representante legal retro qualificado; 22) Pela não entrega dos extratos de Cartão de Crédito da bandeira REDECARD, por parte do contribuinte, requisitamos os mesmos através da RMF (Requisição de Informações sobre Movimentação Financeira) nº 08.1.90-2013-00377-0 de 10/10/2013, nos termos da Lei Complementar 105, art. 6º, regulamentado pelo Decreto nº 3724/2001; (...) Ainda, tendo o contribuinte optado em 2008 pela forma de apuração de lucros através do Lucro Real anual, são obrigatórios o porte, utilização e apresentação à Fiscalização de livros comerciais e fiscais, sendo a falta na apresentação de um ou mais livros pode inviabilizar o levantamento e a correta apuração do Lucro Real, conforme previsto nos artigos 259 e 260 do Decreto 3.000/99. No caso presente foi o que ocorreu com a não apresentação do Livro de Registro de Inventário, Lalur, Livro Registro de Saídas de Prestação de Serviços, além de ter sido constatado a falta de registro da Junta Comercial do Livro Diário – fato este notificado ao contribuinte; Destarte, não restou a esta Fiscalização senão adotar a forma de tributação do Lucro Arbitrado, com o arbitramento da base tributável para apuração do IRPJ devido, pelo enquadramento do contribuinte em comento em uma das hipóteses de arbitramento previstos no Inciso III do Artigo 530 do Decreto nº 3.000/99 (RIR/99); (...) Quanto aos Cartões de Crédito, constatamos que a empresa operou em 2008 com vendas sob bandeira da CIELO e REDECARD. De posse dos extratos de repasses de Cartões de Crédito, obtidos diretamente das respectivas administradoras de cartões, conforme acima detalhado, procedemos a conferência, tabulação, análise dos dados, resultando em quadro consolidado mensalmente e trimestralmente. De outra parte, cotejamos os valores obtidos nos extratos com aqueles contabilizados pela empresa, em particular, na conta 1010201000 – Cartões de Débito e Crédito, constantes dos arquivos magnéticos entregues nos moldes da IN SRF 86/2001 e ADE Cofis nº 15/2001 já mencionados, resultando em saldos positivos ou negativos (...). Os valores positivos representam quantias à margem da contabilidade, não oferecidos a tributação, ou em outras palavras omissão de receita nos termos da legislação vigente – que neste caso resultou em R$ 395.051,70. (...) Quanto as Receitas recebidas pela empresa em 2008 originárias de serviços, comissões, propaganda (...) da TIM CELULAR S/A, cotejamos valores informados pela TIM e constantes dos sistemas informatizados da RFB com aqueles constantes nos registros contábeis da empresa, extraídos daqueles arquivos magnéticos já citados, envolvendo particularmente as contas 30010101002 – Receita de Prestação de Serviços e 10102044999 – Contas a Receber (...) os valores positivos (...) constituem montantes não oferecidos à tributação, caracterizando Omissão de Receitas, que resultou em R$ 1.082.356,54. (...) Constatado que o contribuinte entregou a DIPJ 2009 – AC 2008 e DACON “zeradas”, assim como não foram observados recolhimentos ou declarações de débitos para o IRPJ e CSLL, nos sistemas Sinal e DCTF, respectivamente, os valores apurados e descritos na planilha acima serão considerados como receitas omitidas, sendo o crédito tributário decorrente objeto de lançamento de ofício. (...) O acusado, por sua vez, nas declarações prestadas à autoridade policial, limitou-se a alegar que, à época dos fatos, a contabilidade da empresa teria estado a cargo de escritório terceirizado (ID 159311664, 9): (...) QUE era sócio administrador da PICOLLI TELECOM COM E PREST SERV AP CELULARES LTDA., sendo responsável inclusive pelas questões tributárias; QUE À época dos fatos, cuidava da contabilidade da empresa era o escritório de contabilidade ASPR CONTABILIDADE DE GESTÃO (...), sendo seu responsável de ARY SILVEIRA BUENO; QUE toda a documentação relativa a lançamentos contábeis e tributários era terceirizado para o escritório da ASPR; QUE, portanto, não tem conhecimento sobre eventual entrega de diversos demonstrativos contábeis fiscais “zerados” (...) Em sede de interrogatório judicial, afirmou que a parte fiscal da empresa teria sido integralmente entregue ao referido escritório de contabilidade, devido ao escasso conhecimento do acusado acerca de contabilidade e recolhimento de tributos (ID 159312134). A tese defensiva resume-se a atribuir aos contadores a responsabilidade pela supressão dos tributos devidos pela empresa. Há que se pontuar, contudo, que o administrador não atua como contador, mas deve fiscalizar a contabilidade da empresa, sendo seu dever tomar ciência de eventuais irregularidades praticadas nesse setor. Do quanto exposto pelo conjunto probatório, portanto, tem-se que a conduta praticada pela pessoa jurídica administrada pelo réu – seja apresentando declarações “zeradas”, seja apresentando escrituração contábil deficitária – implica a omissão de receitas operacionais e, consequentemente, a redução de IRPJ e reflexos. O crime do artigo 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/1990 prescinde de dolo específico, bastando, para sua caracterização, a simples ausência de prestação das informações exigidas do empresário, capaz de suprimir ou reduzir os tributos e respectivos acessórios devidos. Nesse sentido: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA (ART. 1º, INCISOS I e II, DA LEI N. 8.137/90 - REDUÇÃO E SONEGAÇÃO DE TRIBUTOS FEDERAIS). PLEITO DE ABSOLVIÇÃO. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO. PRESCINDIBILIDADE. JURISPRUDÊNCIA ASSENTE. REEXAME DE PROVAS. PRECEDENTES. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. O pleito de absolvição demanda revolvimento fático-probatório dos autos, providência de todo inviável nesta instância recursal, por óbice do enunciado n. 7 da Súmula/STJ. Precedentes. 2. É firme a jurisprudência esta Corte Superior no sentido de que "os crimes de sonegação fiscal e apropriação indébita previdenciária prescindem de dolo específico, sendo suficiente, para a sua caracterização, a presença do dolo genérico consistente na omissão voluntária do recolhimento, no prazo legal, dos valores devidos" (AgRgno AREsp469137 , Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, DJe 13/12/2017). 3. Agravo regimental desprovido. (STJ, AgRg no AREsp n. 1.123.098/GO, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 11/12/2018, DJe de 19/12/2018.) O fato de o dolo do tipo penal do artigo 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/1990 ser genérico implica que basta, para sua caracterização, a intenção de não pagar ou de reduzir o pagamento dos tributos, consubstanciando o elemento subjetivo em uma ação ou omissão voltada a esse propósito. No caso dos autos, o conjunto probatório aponta para a omissão de receitas propositalmente voltada à evasão fiscal. Desse modo, estando caracterizados a autoria delitiva e o dolo, resta mantido o decreto condenatório. Passo, assim, à dosimetria. Da dosimetria Inicialmente, deixo de conhecer do pedido pelo afastamento do concurso formal, uma vez que a questão nos autos diz respeito à continuidade delitiva. Na primeira fase, entendo que a culpabilidade do réu não extrapola a normalidade para o tipo penal. Não há elementos nos autos que permitam a valoração dos aspectos relativos à conduta social e à personalidade do acusado. Os motivos e as circunstâncias são normais à espécie e o comportamento da vítima é circunstância irrelevante no caso concreto. Ressalto ser incabível, no caso, a exasperação da pena-base com fundamento nas consequências negativas do crime valoradas de acordo com o montante de tributos sonegados, sob pena de indevido bis in idem, uma vez que o mesmo critério justifica, na terceira fase, a incidência da causa de aumento do artigo 12, inciso I, da Lei nº 8.137/1990. Nesse sentido: PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. PENA-BASE. DESPROPORCIONALIDADE. INOCORRÊNCIA. EXPRESSIVIDADE DO MONTANTE REDUZIDO OU SUPRIMIDO. GRAVE DANO À COLETIVIDADE. INCIDÊNCIA DA MAJORANTE PREVISTA NO ART. 12, INCISO I, DA LEI N. 8.137/90. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7 DO STJ. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Por se tratar de matéria afeta à certa discricionariedade do Magistrado, a revisão da dosimetria, na via do apelo extremo, tem caráter excepcional, sendo cabível apenas diante de manifesta ilegalidade, reconhecível de plano. Ademais, a fixação da pena não se submete a rígidos critérios matemáticos, mas sim a um juízo de discricionariedade vinculada. Precedentes. 2. Considerando o intervalo entre os limites mínimo e máximo da pena abstratamente prevista para o delito de sonegação fiscal e a existência de duas circunstâncias judiciais desfavoráveis, não se afigura desarrazoada ou desproporcional a exasperação da basilar em apenas 1 (um) ano acima do mínimo legal, porquanto, na compreensão das instâncias ordinárias, suficiente à prevenção e reprovação do crime. 3. Quanto ao grave dano à coletividade, importa consignar que este pode ser sopesado ou na primeira ou na terceira fase da dosimetria, ficando apenas vedado o bis in idem. 4. Nos termos da jurisprudência desta Corte, a expressividade do montante reduzido ou suprimido é fundamento idôneo a justificar a incidência da causa de aumento prevista no art. 12, inciso I, da Lei n. 8.137/90. De todo modo, perquirir se o importe sonegado ensejou grave dano à coletividade implica o necessário revolvimento do conteúdo probatório dos autos, providência que, como cediço, encontra óbice na Súmula n. 7 do STJ. Precedentes. 5. Agravo regimental desprovido. (STJ, AgRg no AREsp n. 1.194.509/MG, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 8/2/2018, DJe de 21/2/2018) PENAL E PROCESSO PENAL. RECURSO ESPECIAL. DELITO CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. ART. 1º, I, DA LEI Nº 8.137/90. SONEGAÇÃO FISCAL. CAUSA DE AUMENTO PREVISTA NO ART. 12, I, DA LEI Nº 8.137/90. VALOR SONEGADO NO IMPORTE DE R$ 839.701,35 (OITOCENTOS E TRINTA E NOVE MIL, SETECENTOS E UM REAIS E TRINTA E CINCO CENTAVOS). GRAVE DANO À COLETIVIDADE CONFIGURADO. IMPOSSIBILIDADE DA APLICAÇÃO NO CASO CONCRETO, SOB PENA DE BIS IN IDEM. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME VALORADA NEGATIVAMENTE PELO MESMO MOTIVO. RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. No caso dos autos, não resta dúvidas de que, à luz da jurisprudência deste STJ, a quantia não recolhida pelo recorrido - R$ 839.701,35 (oitocentos e trinta e nove mil, setecentos e um reais e trinta e cinco centavos), sem os consectários da multa e dos juros moratórios - justifica a aplicação da causa de aumento prevista no artigo 12, inciso I, da Lei nº 8.137/90, porquanto implica em grave dano à coletividade. 2. "Em sede de individualização de pena criminal, por força do princípio non bis in idem, é vedada a dupla consideração da mesma circunstância, como ocorre quando se lhe atribui as funções de circunstância judicial e de causa especial de aumento, no processo trifásico da imposição da sanção penal". (REsp 208.952/RS, Rel. Min.LUIZ VICENTE CERNICCHIARO, Rel. p/ Acórdão Min. HAMILTON CARVALHIDO, SEXTA TURMA, DJ 15/05/2000) 3. Recurso especial a que se nega provimento. (STJ, REsp n. 1.325.685/RS, relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, julgado em 7/8/2014, DJe de 21/8/2014) A propósito da alegação defensiva no sentido de que a causa especial de aumento de pena do artigo 12, inciso I, da Lei nº 8.137/1990 não teria sido postulada na denúncia, destaco que a jurisprudência admite sua incidência se a denúncia descreve satisfatoriamente a elevada quantia sonegada, permitindo ao julgador valorar a existência de grave dano à coletividade. Nesse sentido: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. ART. 12, INCISO I, DA LEI N.º 8.137/90. ELEVADO PREJUÍZO À COLETIVIDADE NARRADO NA DENÚNCIA. DEFINIÇÃO JURÍDICA. COMPETÊNCIA DO JUÍZO SENTENCIANTE. CONTINUIDADE DELITIVA NARRADA NA INICIAL ACUSATÓRIA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. O agravo regimental em matéria penal deve ser trazido para julgamento em mesa, independentemente da sua inclusão em pauta ou de prévia intimação das partes, nos termos dos arts. 159, inciso IV, e 258 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça. 2. Não há ofensa ao art. 619 do Código de Processo Penal quando a Corte de origem analisa e refuta, de forma precisa e fundamentada, as pretensões do Embargante. 3. A denúncia narrou expressamente que a conduta criminosa foi praticada ao longo de 4 (quatro) exercícios financeiros - anos-calendário de 2000 a 2003 -, o que ocasionou um prejuízo milionário aos cofres públicos - valor consolidado de R$ 5.491.169, 19 (cinco milhões, quatrocentos e noventa e um mil, cento e sessenta e nove reais e dezenove centavos). Portanto, não há qualquer ilegalidade na valoração jurídica destes fatos para fazer incidir a causa de aumento de pena prevista no art. 12, inciso I, da Lei n.º 8.137/90 e a majoração decorrente da continuidade delitiva. 4. Ao contrário do que sustenta o Agravante, há um perfeita correlação entre os fatos narrados na denúncia e aqueles considerados pelo Juízo sentenciante e pelo Tribunal de origem. Com efeito, o Acusado se defende dos fatos que lhe são imputados, e não da qualificação jurídica eventualmente conferida a eles pelo Ministério Público. 5. O não recolhimento de expressiva quantia de tributo atrai a incidência da causa de aumento prevista no art. 12, inciso I, da Lei n.º 8.137/90, pois configura grave dano à coletividade. Precedentes. 6. Não compete ao Superior Tribunal de Justiça, nem mesmo para fins de prequestionamento, a análise de supostas ofensas a princípios e dispositivos da Constituição Federal. 7. Agravo regimental desprovido. (STJ, AgRg no AREsp n. 1.437.412/ES, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 28/5/2019, DJe de 5/6/2019) PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. ART. 1º, II, DA LEI N. 8.137/1990. ACÓRDÃO RECORRIDO. OMISSÃO. AUSÊNCIA. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO FISCAL (PAF). ILEGALIDADE. VIA INADEQUADA PARA DISCUSSÃO. PRECEDENTE. DENÚNCIA. DESCRIÇÃO SUFICIENTE DO VÍNCULO ENTRE A POSIÇÃO DO AGENTE NA SOCIEDADE EMPRESÁRIA E O CRIME IMPUTADO. ADOÇÃO DOS FUNDAMENTOS DA SENTENÇA PELO ACÓRDÃO RECORRIDO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTE. GRAVE DANO À COLETIVIDADE. ART. 12, I, DA LEI N. 8.137/1990. CAUSA DE AUMENTO. VALOR DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO SONEGADO DESCRITO NA DENÚNCIA. PRECEDENTE. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. AUSÊNCIA. NECESSIDADE DE PRÉVIO EXAME DA APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL (ART. 23, § 1º, DO DECRETO N. 70.235/1972). AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. Não há omissão relevante no acórdão recorrido que justifique a sua anulação. A Corte de origem explicitou os elementos de prova que embasaram a conclusão sobre a autoria delitiva. 2. A jurisdição criminal não é a via adequada para a verificação de nulidades ocorridas no Procedimento Administrativo Fiscal. Precedente. 3. Não é inepta pela generalidade a denúncia que, em crimes tributários praticados em coautoria, descreve o vínculo existente entre a posição do agente na sociedade empresária e o crime imputado. Precedente. 4. Esta Corte Superior admite que o julgador adote, como razão de decidir, integralmente ou em parte, a motivação da sentença de primeiro grau. Precedente. 5. Na hipótese, não houve nenhuma ilegalidade na adoção dos fundamentos explicitados na sentença, inclusive houve acréscimo de motivação, para fins de constatação da autoria e da materialidade dos delitos. 6. A descrição, na denúncia, do valor do crédito tributário sonegado é suficiente para que o juízo delibere sobre o grave dano à coletividade e, consequentemente, sobre a incidência da causa de aumento do art. 12, I, da Lei n. 8.137/1990. Precedente. 7. O recurso extraordinário inadmitido na origem não preenche o requisito da repercussão geral, porquanto necessita, previamente, do exame da correta aplicação da legislação infraconstitucional, qual seja, o art. 23, § 1º, do Decreto n. 70.235/1972. 8. Agravo regimental não provido. (STJ, AgRg no AREsp n. 1.058.190/RJ, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 21/11/2017, DJe de 28/11/2017) Consequentemente, a pena-base há de ser fixada no mínimo legal, em 02 anos de reclusão e 10 dias-multa. Na segunda fase da dosimetria, não há circunstâncias agravantes nem atenuantes a serem sopesadas, permanecendo a pena intermediária em 02 anos de reclusão e 10 dias-multa. Na terceira fase, como visto, o valor dos tributos sonegados justifica a causa de aumento prevista no artigo 12, inciso I, da Lei nº 8.137/1990. Nesse sentido: PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. ART. 1º, INCISOS I E II, DA LEI N. 8.137/1990. CAUSA DE AUMENTO DE PENA. ART. 12, INCISO I, DA LEI N. 8.137/1990. GRAVE DANO À COLETIVIDADE. 1. De acordo com a mais recente jurisprudência desta Corte, "a majorante do grave dano à coletividade, prevista pelo art. 12, I, da Lei 8.137/90, restringe-se a situações de especialmente relevante dano, valendo, analogamente, adotar-se para tributos federais o critério já administrativamente aceito na definição de créditos prioritários, fixado em R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), do art. 14, caput, da Portaria 320/PGFN" (REsp n. 1.849.120/SC, relator Ministro NEFI CORDEIRO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 11/3/2020, DJe 25/3/2020). Precedente. 2. Na hipótese, o montante do tributo suprimido foi de R$ 1.660.903, 64, de acordo com o acórdão recorrido, valor que, portanto, autoriza a incidência da referida majorante. 3. Agravo regimental desprovido. (STJ, AgRg no REsp n. 1.871.684/SC, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 15/12/2020, DJe de 18/12/2020) Ressalto que o valor do crédito tributário a ser examinado tanto para aferição da aplicação do princípio da insignificância quanto para fins de fixação da dosimetria da pena não deve contemplar multa e juros, pois estes são consectários civis do não recolhimento do tributo, consoante jurisprudência firmada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ, REsp n. 1.378.555/DF, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 25/3/2014, DJe de 15/4/2014). Desse modo, é o valor principal do crédito em questão, apurado na data dos fatos, que deve servir de parâmetro para a fixação da reprimenda. No caso, os Autos de Infração apontam o total de R$ 1.214.432,14 relativamente ao principal sonegado de IRPJ, CSLL, PIS e COFINS, individualizados da seguinte maneira (ID 159311965): Assim, tratando-se de tributos suprimidos em valor superior a R$ 1.000.000,00, de acordo com a jurisprudência desta Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da Terceira Região, a pena deveria ser aumentada de metade (1/2), com base no artigo 12, inciso I, da Lei nº 8.137/1990. Todavia, considerando-se que a r. sentença aplicou a causa especial de aumento de pena no patamar mais benéfico de 1/3, deve ser assim mantida, na ausência de recurso da acusação. A sentença, ainda, fez incidir a causa genérica de aumento de pena da continuidade delitiva. Contudo, na espécie, a conduta diz respeito a um único ano-calendário (2008) e, como a exação ocorre anualmente, há que ser considerada uma única conduta, afastando-se a continuidade aplicada. Desse modo, resta fixada a pena definitiva em 02 anos e 08 meses de reclusão. Quanto à pena de multa, com razão o apelo defensivo, uma vez que não foi observado o mesmo critério utilizado para a pena privativa de liberdade. Assim, deve ser reduzida a pena pecuniária para 13 dias-multa, no valor unitário de 1/30 do salário-mínimo vigente à época dos fatos, devidamente atualizado. O regime inicial do cumprimento da pena deve ser o aberto, nos termos do artigo 33, § 2º, "c", do Código Penal. Mantida a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, na forma como determinado pela r. sentença, porquanto observado o critério estabelecido pelo § 2º do artigo 44 do Código Penal. Ante o exposto, voto por afastar a preliminar suscitada e, no mérito, dar parcial provimento à apelação, para reduzir a pena pecuniária; e, de ofício, afastar a causa de aumento de pena pela continuidade delitiva, fixando a pena definitiva em 02 anos e 08 meses de reclusão no regime inicial aberto e 13 dias-multa no valor unitário de 1/30 do salário-mínimo vigente à época dos fatos, devidamente atualizado. Mantida a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, tal como determinado pela r. sentença. É o voto.
E M E N T A
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO. CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA (ART. 1º, I, LEI 8.137/1990). INÉPCIA DA DENÚNCIA: AFASTADA. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA: NÃO CARACTERIZADA. REDUÇÃO OU SUPRESSÃO DE IRPJ E REFLEXOS MEDIANTE OMISSÃO DE RECEITAS OPERACIONAIS E ESCRITURAÇÃO CONTÁBIL INEXISTENTE. MATERIALIDADE DEMONSTRADA. AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. INCIDÊNCIA DA CAUSA ESPECIAL DE AUMENTO DE PENA DO ART. 12, I LEI 8.137/1990: POSSIBILIDADE. CONTINUIDADE DELITIVA AFASTADA DE OFÍCIO. REDUÇÃO DA PENA PECUNIÁRIA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Não se verifica nulidade decorrente de inépcia da denúncia por ausência de indicação precisa da conduta do réu. Em se tratando de delito de autoria coletiva, no caso, a supressão de tributos imputada aos representantes de pessoa jurídica, não é necessário que a denúncia apresente de maneira individualizada a conduta de cada um dos acusados, bastando que seja demonstrado o vínculo da conduta com o delito praticado. Precedente.
2. No caso, a inicial acusatória explicita a relação concreta existente entre a conduta narrada e as funções comumente desempenhadas por administradores de empresas. Ademais, os documentos oriundos da fiscalização fazendária, que integram o inquérito, permitem a individualização dos atos de sonegação de tributos, não havendo que se falar em inépcia da denúncia.
3. Nos termos da Súmula Vinculante 24, “Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/1990, antes do lançamento definitivo do tributo”.
4. No caso, o Ofício DERAT/SPO/DICAT/ECOB nº 376/2018 informa que a constituição definitiva do crédito tributário vinculado ao PAF nº 19515.723029/2013-14 deu-se em 29/01/2014, sem notícia de pagamento ou parcelamento do débito, sendo essa a data a partir da qual deve ter início a contagem do prazo prescricional. A denúncia foi recebida em 30/07/2019 e a publicação da sentença deu-se em 19/03/2021, com a condenação do apelante à pena de 03 anos, 01 mês e 10 dias de reclusão, após a majoração em 1/6 pela continuidade delitiva.
5. De acordo com a Súmula 497 do Supremo Tribunal Federal, “Quando se tratar de crime continuado, a prescrição regula-se pela pena imposta na sentença, não se computando o acréscimo decorrente da continuação”. Afastado o aumento pela continuidade delitiva, trabalha-se com a pena de 02 anos e 08 meses de reclusão. Tem-se, portanto, o prazo prescricional de oito anos para o delito considerado, tal como dispõe o artigo 109, inciso IV, do Código Penal.
6. Não houve o decurso do lapso de oito anos entre os marcos interruptivos da prescrição (recebimento da denúncia e publicação da sentença condenatória) e até o presente momento, devendo-se ainda afastar a alegação da defesa no sentido da inaplicabilidade ao caso concreto das disposições trazidas pela Lei nº 12.234/2010.
7. A materialidade do crime previsto no artigo 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/1990 está demonstrada pelos documentos oriundos do Procedimento Administrativo Fiscal – PAF nº 19515.723029/2013-14, o qual compreende os Autos de Infração mediante os quais foi constituído de ofício o crédito tributário relativo a impostos e contribuições sociais devidos pela sociedade denominada Picolli Telecom Comércio e Prestação de Serviços em Aparelhos Celulares Ltda. – ME no ano-calendário de 2008. Corrobora a materialidade o documento emitido pela Receita Federal, informando que os créditos relativos ao processo administrativo nº 19515.723029/2013-14 foram constituídos definitivamente em 29/01/2014.
8. A autoria delitiva imputada ao acusado encontra amparo nas provas coligidas aos autos, destacando-se o Contrato Social e a Ficha Cadastral da JUCESP, mediante os quais se atesta a qualidade de sócio administrador da empresa autuada. Além disso, por ocasião das declarações prestadas à autoridade policial, o réu reconheceu sua qualidade de administrador da empresa autuada. Deve-se considerar, ainda, que o acusado, em Juízo, admitiu assinar cheques e notas fiscais vindos do departamento financeiro, bem como que assinou os Autos de Infração na qualidade de diretor da empresa autuada.
9. No que respeita ao dolo, infere-se da prova dos autos a caracterização da conduta livre e consciente do réu, na condição de administrador da pessoa jurídica fiscalizada, de fraudar a administração fiscal por meio da omissão de receitas.
10. A tese defensiva resume-se a atribuir aos contadores a responsabilidade pela supressão dos tributos devidos pela empresa. Há que se pontuar, contudo, que o administrador não atua como contador, mas deve fiscalizar a contabilidade da empresa, sendo seu dever tomar ciência de eventuais irregularidades praticadas nesse setor.
11. Do quanto exposto pelo conjunto probatório, tem-se que a conduta praticada pela pessoa jurídica administrada pelo réu – seja apresentando declarações “zeradas”, seja apresentando escrituração contábil deficitária – implica a omissão de receitas operacionais e, consequentemente, a redução de IRPJ e reflexos.
12. O crime do artigo 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/1990 prescinde de dolo específico, bastando, para sua caracterização, a simples ausência de prestação das informações exigidas do empresário, capaz de suprimir ou reduzir os tributos e respectivos acessórios devidos. Precedente.
13. O fato de o dolo do tipo penal do artigo 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/1990 ser genérico implica que basta, para sua caracterização, a intenção de não pagar ou de reduzir o pagamento dos tributos, consubstanciando o elemento subjetivo em uma ação ou omissão voltada a esse propósito. No caso dos autos, o conjunto probatório aponta para a omissão de receitas propositalmente voltada à evasão fiscal. Desse modo, estando caracterizados a autoria delitiva e o dolo, resta mantido o decreto condenatório.
DOSIMETRIA
14. Na primeira fase, a culpabilidade do réu não extrapola a normalidade para o tipo penal. Não há elementos nos autos que permitam a valoração dos aspectos relativos à conduta social e à personalidade do acusado. Os motivos e as circunstâncias são normais à espécie e o comportamento da vítima é circunstância irrelevante no caso concreto.
15. É incabível, no caso, a exasperação da pena-base com fundamento nas consequências negativas do crime valoradas de acordo com o montante de tributos sonegados, sob pena de indevido bis in idem, uma vez que o mesmo critério justifica, na terceira fase, a incidência da causa de aumento do artigo 12, inciso I, da Lei nº 8.137/1990. Precedentes.
16. É admissível a incidência da causa especial de aumento de pena do artigo 12, inciso I, da Lei nº 8.137/1990, ainda que não postulada na denúncia, se a inicial acusatória descreve satisfatoriamente a elevada quantia sonegada, permitindo ao julgador valorar a existência de grave dano à coletividade. Precedentes.
17. Pena-base há de ser fixada no mínimo legal, em 02 anos de reclusão e 10 dias-multa.
18. Na segunda fase da dosimetria, não há circunstâncias agravantes nem atenuantes a serem sopesadas, permanecendo a pena intermediária em 02 anos de reclusão e 10 dias-multa.
19. Na terceira fase, o valor dos tributos sonegados justifica a causa de aumento prevista no artigo 12, inciso I, da Lei nº 8.137/1990. Precedente.
20. O valor do crédito tributário a ser examinado tanto para aferição da aplicação do princípio da insignificância quanto para fins de fixação da dosimetria da pena não deve contemplar multa e juros, pois estes são consectários civis do não recolhimento do tributo. Precedente.
21. No caso, tratando-se de tributos suprimidos em valor superior a R$ 1.000.000,00, de acordo com a jurisprudência desta Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da Terceira Região, a pena deveria ser aumentada de metade (1/2), com base no artigo 12, inciso I, da Lei nº 8.137/1990. Todavia, considerando-se que a r. sentença aplicou a causa especial de aumento de pena no patamar mais benéfico de 1/3, deve ser assim mantida, na ausência de recurso da acusação.
22. A sentença, ainda, fez incidir a causa genérica de aumento de pena da continuidade delitiva. Contudo, na espécie, a conduta diz respeito a um único ano-calendário (2008) e, como a exação ocorre anualmente, há que ser considerada uma única conduta, afastando-se a continuidade aplicada. Desse modo, resta fixada a pena definitiva em 02 anos e 08 meses de reclusão no regime inicial aberto.
23. Quanto à pena de multa, com razão o apelo defensivo, uma vez que não foi observado o mesmo critério utilizado para a pena privativa de liberdade. Assim, deve ser reduzida a pena pecuniária para 13 dias-multa, no valor unitário de 1/30 do salário-mínimo vigente à época dos fatos, devidamente atualizado.
24. Mantida a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, na forma como determinado pela r. sentença, porquanto observado o critério estabelecido pelo § 2º do artigo 44 do Código Penal.
25. Preliminar afastada. Apelação parcialmente provida.