APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5007285-39.2020.4.03.6110
RELATOR: Gab. 41 - DES. FED. HERBERT DE BRUYN
APELANTE: RESIDENCIAL PROVENCE EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS SPE LTDA, J C MORAIS ASSESSORIA E EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA, CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
Advogado do(a) APELANTE: MARCONI HOLANDA MENDES - SP111301-A
Advogado do(a) APELANTE: CASSIANO PIRES VILAS BOAS - MG154853-A
APELADO: SANDRO ANTONIO ROSA GIMENES, GISELE FERNANDES GIMENES
Advogado do(a) APELADO: CAMILA DE ANDRADE ALVES LIMA - SP310660-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5007285-39.2020.4.03.6110 RELATOR: Gab. 41 - DES. FED. HERBERT DE BRUYN APELANTE: RESIDENCIAL PROVENCE EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS SPE LTDA, J C MORAIS ASSESSORIA E EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA, CAIXA ECONÔMICA FEDERAL Advogado do(a) APELANTE: MARCONI HOLANDA MENDES - SP111301-A APELADO: SANDRO ANTONIO ROSA GIMENES, GISELE FERNANDES GIMENES Advogado do(a) APELADO: CAMILA DE ANDRADE ALVES LIMA - SP310660-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O Senhor Desembargador Federal Herbert de Bruyn (Relator): Trata-se de ação ajuizada por Sandro Antonio Rosa Gimenes e Gisele Fernandes Gimenes em face da Caixa Econômica Federal - CEF e das empresas JC Morais Assessoria e Empreendimentos Imobiliários Ltda. e Residencial Provence Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda. na qual, em razão de alegado inadimplemento, pleiteiam a resolução do contrato de compra e venda, de mútuo e de seguro habitacional, bem como a condenação das rés à restituição, em parcela única, do equivalente a 100% (cem por cento) dos valores pagos, a qualquer título, devidamente corrigidos; ao pagamento de 20% do valor total do contrato, a título de cláusula penal, e à indenização por danos morais. Os autores requereram, ainda, a concessão de “tutela de evidência, a fim de declarar rescindido o contrato de nº 155553328823 por culpa exclusiva das Requeridas, bem como dos contratos firmados com a Caixa Econômica Federal (de financiamento, de seguro e de taxa de construção), com a consequente condenação das Requeridas na devolução integral de todos os valores pagos, devidamente atualizados, em uma única vez, nos termos da súmula 2, do TJSP”. A tutela de urgência foi indeferida (ID 267506067). Por sentença prolatada em 29/07/2022, foram indeferidos os benefícios da justiça gratuita formulado pelas empresas JC Morais Assessoria e Empreendimentos Imobiliários Ltda. e Residencial Provence Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda. Foram, ainda, rejeitadas as preliminares e, no mérito, o pedido foi julgado parcialmente procedente, consoante dispositivo que segue: “Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE os pedidos deduzidos pelos autores, extinguindo o processo com resolução de mérito, com fulcro no disposto pelo artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para: I - DECLARAR a rescisão dos contratos: a) “Contrato de Compra e Venda de Terreno e Mútuo para Construção de Unidade Habitacional Vinculada a Empreendimento, com Fiança, Alienação Fiduciária em Garantia e Outras Obrigações – Recursos SBPE” firmado com a Caixa Econômica Federal – CEF; Residencial Provence Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda e J C Morais Assessoria e Empreendimentos Imobiliários Ltda (Id. 42601839); b) “Instrumento Particular de Compromisso de Venda e Compra de Unidade Autônoma do Condomínio Residencial Provence” firmado com a empresa “Residencial Provence Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda” (Id. 42602200); Por outro lado, CONDENAR a ré RESIDENCIAL PROVENCE EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS SPE LTDA a: Restituir aos autores todos os valores efetivamente pagos por conta do “Instrumento Particular de Compromisso de Venda e Compra de Unidade Autônoma do Condomínio Residencial Provence“ (Id. 42602200), devidamente corrigidos desde cada efetivo pagamento, com juros devidos desde a citação, sendo que para os pagamentos após a citação os juros e a correção incidirão a cada pagamento, nos termos do disposto pela Resolução CJF nº 658/2020; Da mesma forma, CONDENAR a Requerida CAIXA ECONÔMICA FEDERAL – CEF a: Restituir aos autores todos os valores despendidos em virtude do “Contrato de Compra e Venda de Terreno e Mútuo para Construção de Unidade Habitacional Vinculada a Empreendimento, com Fiança, Alienação Fiduciária em Garantia e Outras Obrigações – Recursos SBPE” (Id. 42601839), devidamente corrigido desde o pagamento, com juros devidos desde a citação, pela taxa SELIC, nos termos do disposto pela Resolução CJF nº 658/2020; II – CONDENAR as Requeridas CAIXA ECONÔMICA FEDERAL – CEF; RESIDENCIAL PROVENCE EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS SPE LTDA, e J C MORAIS ASSESSORIA E EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA, solidariamente, a pagar indenização a título de danos morais, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), sendo R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a cada autor, com juros moratórios incidentes mensalmente pela taxa SELIC (art. 406, CC, c/c o art. 5.º, § 3.º, e 61, § 3.º, da Lei 9.430/1996), incidentes desde a citação, com correção monetária a partir da fixação do valor definitivo para a indenização do dano moral, conforme Enunciado nº 362 da Súmula do STJ (Resp nº 1.139.612-PR- STJ 4ª Tuma Rel. Min. Maria Isabel Gallotti. Data do julgamento: 17.3.2011), pelo índice constante no Manual de Cálculos da Justiça Federal em vigor; III – CONDENAR a Requerida RESIDENCIAL PROVENCE EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS SPE LTDA ao pagamento da multa de 20% (vinte por cento) do valor recebido devidamente corrigido, nos termos dispostos pela Cláusula Décima Quinta, item “a”, do Instrumento Particular de Compromisso de Venda e Compra de Unidade Autônoma do Condomínio Residencial Provence” (Id. 42602200). JULGO IMPROCEDENTE o pedido deduzido pelos autores com relação a condenação das requeridas à devolução dos valores pagos a título de taxas de registro em Cartório e demais emolumentos, bem como a título de ITBI – Imposto de Transmissão de Bens Imóveis. Os valores decorrentes de repasses entre as Requeridas, caso haja dever de devolução por conta da rescisão dos contratos, bem como valores decorrentes de direito de regresso por conta da condenação em solidariedade, deverão ser devolvidos/compensados/ressarcidos em sede administrativa ou, se o caso, em lide própria. No tocante aos honorários advocatícios, haja vista que os autores sucumbiram em parte ínfima, condeno os réus a pagarem à parte autora honorários advocatícios no percentual de 10% sobre o valor da condenação, a serem proporcionalmente rateados entre os réus, devidamente atualizado nos termos da Resolução – CJF 658/2020 desde a presente data até a do efetivo pagamento. Custas ex lege.” A CEF apelou, arguindo preliminar de ilegitimidade passiva ad causam. No mérito, sustenta, em síntese, “que não há nos autos comprovação robusta no sentido de ter sofrido os apelados abalo de crédito ou de ordem moral a ser imputada como responsabilidade da Caixa”. Acresce não ter agido “com qualquer grau culpa para ser condenada ao pagamento de danos materiais e morais”. Insurge-se, outrossim, contra o quantum indenizatório fixado a título de danos morais. Debate a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao caso e o princípio do pacta sunt servanda. Pugna pela reforma da sentença e total improcedência do pedido. Recorreram, também, as corrés JC Morais Assessoria e Empreendimentos Imobiliários Ltda. e Residencial Provence Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda. postulando, preambularmente, o deferimento dos benefícios da justiça gratuita. Aduzem, outrossim, que “a Caixa Econômica Federal obteve desde março de 2018 (anterior à propositura da presente ação), liminar de reintegração de posse, tornando-se assim única responsável pelo empreendimento a partir de então, liminar essa tornada definitiva, por força de sentença transitada em julgado”. No mérito, defendem a inexistência de danos morais a serem reparados. Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte. A tutela recursal antecipada, requerida incidentalmente pelos autores, foi deferida para determinar à CEF que se abstenha de efetuar qualquer débito na conta corrente desses, relativo aos encargos do contrato de financiamento habitacional nº 155553328823 (ID 280115869 e 280488417). Foram opostos embargos de declaração pelas empresas JC Morais Assessoria e Empreendimentos Imobiliários Ltda. e Residencial Provence Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda., buscando o indeferimento do pedido liminar, “atribuindo-se ao recurso de apelação interposto, o efeito suspensivo”. Alegam que “não mais possui responsabilidades com o imóvel desde a data em que a CEF reintegrou-se na posse do bem, em 03/2018”. A CEF apresentou impugnação, pleiteando o improvimento dos aclaratórios. Preliminarmente ao julgamento da apelação, foram apreciados e indeferidos os benefícios da justiça gratuita requeridos pelas corrés JC Morais Assessoria e Empreendimentos Imobiliários Ltda. e Residencial Provence Empreendimentos Imobiliário SPE Ltda., determinando-se o recolhimento do preparo no prazo de cinco dias. Cumprida a determinação (ID 284.468.043), voltaram os autos conclusos. É o relatório.
Advogado do(a) APELANTE: CASSIANO PIRES VILAS BOAS - MG154853-A
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5007285-39.2020.4.03.6110 RELATOR: Gab. 41 - DES. FED. HERBERT DE BRUYN APELANTE: RESIDENCIAL PROVENCE EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS SPE LTDA, J C MORAIS ASSESSORIA E EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA, CAIXA ECONÔMICA FEDERAL Advogado do(a) APELANTE: MARCONI HOLANDA MENDES - SP111301-A APELADO: SANDRO ANTONIO ROSA GIMENES, GISELE FERNANDES GIMENES Advogado do(a) APELADO: CAMILA DE ANDRADE ALVES LIMA - SP310660-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O Senhor Desembargador Federal Herbert de Bruyn (Relator): Da legitimidade passiva ad causam. Verifico que a relação jurídica contratual em discussão sujeita-se aos ditames do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90), consoante entendimento pacífico do Supremo Tribunal Federal (ADI nº 2591, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Velloso, j. 7/6/06, DJ 29/9/06, Rel. para acórdão Min. Eros Grau) e do Superior Tribunal de Justiça (Súmula nº 297). Disciplina o artigo 6º, incisos VI e VII, do Código de Defesa do Consumidor: “Art. 6º São direitos básicos do consumidor: (...) VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos; VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados;” O artigo 14, do Código de Defesa do Consumidor preceitua, inclusive, que o fornecedor de serviços responde objetivamente pelos danos causados ao consumidor decorrentes de defeitos na prestação do serviço (teoria do risco do empreendimento). Sendo objetiva a responsabilidade, não se perquire a existência ou não de culpa na prestação do serviço, mas apenas do nexo de causalidade entre a conduta e o dano sofrido nas relações consumeristas. Sob outro prisma, nos termos do art. 7º, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, as rés devem solidariamente responder pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo. É pacífico o entendimento do Superior Tribunal de Justiça quanto à responsabilidade solidária entre os integrantes da cadeia de consumo, como ocorre na espécie: “AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL EM CONSTRUÇÃO. ATRASO NA ENTREGA. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS, LUCROS CESSANTES E REPETIÇÃO DO INDÉBITO. PROCEDÊNCIA PARCIAL. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA ENTRE OS INTEGRANTES DA CADEIA DE CONSUMO. INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULAS E REEXAME DE PROVAS. DESCABIMENTO. SÚMULAS 5 E 7/STJ. AGRAVO DESPROVIDO. 1. O entendimento desta Corte Superior é de que os integrantes da cadeia de consumo respondem solidariamente pelos danos causados ao consumidor. 2. No caso, a revisão da conclusão do acórdão recorrido, no sentido de que a corretora, ora recorrente, atuou como parceira comercial, não prescindiria da interpretação de cláusulas contratuais, bem como do reexame de provas, o que é vedado pelas Súmulas 5 e 7 deste Tribunal. 3. Agravo interno desprovido. (Terceira Turma, AgInt nos EDcl no AREsp n. 1.243.517/DF, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. em 26/6/2018, DJe de 29/6/2018) Com referência à responsabilidade da Caixa Econômica Federal - CEF para responder pelo descumprimento contratual relativo ao atraso na construção e entrega de imóvel vinculado a empreendimento financiado pelo Sistema Financeiro da Habitação, há que se distinguir duas situações, consoante jurisprudência sedimentada: 1ª) A CEF é parte legítima e pode responder, solidariamente, pelo descumprimento contratual, nas hipóteses em que tenha atuado na escolha da construtora, elaboração do projeto, execução ou fiscalização das obras do empreendimento ou opere como gestor de recursos e agente executor de políticas públicas federais para a promoção de moradia a pessoas de baixa renda; 2ª) não se reconhece a legitimidade passiva ad causam da CEF, caso esta instituição funcione como agente financeiro em sentido estrito, responsável, apenas, pelo financiamento da aquisição do imóvel já edificado e em nome de terceiro. Nesse sentido, destaco o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça: “AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS. AFRONTA AO ART. 535 DO CPC/73. VÍCIO NÃO INDICADO. SÚMULA Nº 284/STF. TESES REFERENTES À MULTA CONTRATUAL E JUROS, COMISSÃO DE CORRETAGEM, RESSARCIMENTO DOS ALUGUEIS E DANOS MORAIS. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS Nº 211/STJ E Nº 282/STF. PROGRAMA HABITACIONAL MINHA CASA MINHA VIDA. CEF. NATUREZA DAS ATIVIDADES. AGENTE FINANCEIRO. SEM LEGITIMIDADE PASSIVA. SÚMULA Nº 83/STJ. DECISÃO MANTIDA. 1. A alegação de afronta ao art. 535 do CPC/73 sem indicar em que consistiria o vício, consubstancia deficiência bastante a inviabilizar a abertura da instância especial, atraindo a incidência da Súmula nº 284 do Supremo Tribunal Federal. 2. A ausência de prequestionamento, mesmo implícito, impede a análise da matéria na via especial. Súmulas nº 211/STJ e nº 282/STF. 3. A Caixa Econômica Federal somente possui legitimidade passiva para responder por vícios, atraso ou outras questões relativas à construção de imóveis objeto do Programa Habitacional Minha Casa Minha Vida se, à luz da legislação, do contrato e da atividade por ela desenvolvida, atuar como agente executor de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa renda, sendo parte ilegítima se atuar somente como agente financeiro. Súmula nº 83/STJ. 4. Agravo interno não provido.” (STJ, Quarta Turma, AgInt no REsp 1.646.130/PE, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. em 30/08/2018, DJe de 04/09/2018) In casu, em 02/09/2014, os autores celebraram com a empresa Residencial Provence Empreendimentos Imobiliário SPE Ltda. contrato de “compromisso de venda e compra de unidade autônoma do condomínio Residencial Provence”, em Votorantim/SP (ID 267505961 a 267505963, p. 1/3). Em 29/01/2015, firmaram um segundo contrato, este, com a CEF, para “compra e venda de terreno e mútuo para construção de unidade habitacional e empreendimento, com fiança, alienação fiduciária em garantia e outras obrigações – Recursos SBPE” (ID 267505959 e 267505960). Do contrato de financiamento figura, como vendedora/incorporadora, a empresa Residencial Provence Empreendimentos Imobiliário SPE Ltda. e, como construtora responsável pela execução do empreendimento, a empresa JC Morais Assessoria e Empreendimentos Imobiliários Ltda. Há previsão expressa, na cláusula 1ª do aludido contrato, de pagamento pela compra do terreno, diretamente em conta corrente de titularidade do vendedor. A cláusula 26ª, item “b”, estipula que a destinação de recursos à construção, de acordo com o cronograma físico-financeiro da obra, será efetuada diretamente em conta corrente de titularidade da construtora. A empresa JC Morais Assessoria e Empreendimentos Imobiliários Ltda. integra o contrato, também, na condição de fiadora, conforme disposto na cláusula 24ª: “CLÁUSULA VIGÉSIMA QUARTA - GARANTIA FIDEJUSSÓRIA - Além da garantia fiduciária, a CONSTRUTORA, qualificada na Letra "A", comparece neste ato como FIADORA e principal pagadora de todas as obrigações assumidas pelo(s) DEVEDOR(ES), renunciando expressamente aos benefícios previstos nos artigos 827, 835, 838 e 839 Código Civil. Parágrafo Primeiro - A garantia fidejussória prevalecerá somente durante a fase de construção e legalização do empreendimento, previsto na Letra "C" deste instrumento e até que as unidades habitacionais sejam entregues e recebidas, momento em que deixará, a FIADORA, de responder pelas obrigações do(s) DEVEDOR(ES). Parágrafo Segundo - A fiança aqui prestada abrange as obrigações referidas neste instrumento, inclusive, na hipótese de atraso ou paralisação de obra, sendo facultado à CREDORA, em virtude da solidariedade e renuncia ao benefício de obra aqui estipulados, exigir o cabal adimplemento tão somente dos fiadores.” Das cláusulas do contrato em apreço, é nítida, ainda, a atuação da CEF tanto na fiscalização das obras do empreendimento, como na gestão dos recursos. É o que se depreende das suas cláusulas 26 e 27, que condicionam a liberação dos recursos, dentre outras exigências, “ao andamento da obra, no percentual atestado no Relatório de Acompanhamento do Empreendimento – RAE, conforme o cronograma físico-financeiro aprovado pela CAIXA”, ao acompanhamento da execução da obra, “pela Engenharia da CAIXA”, exclusivamente, para efeito de medição do andamento da obra e verificação da aplicação dos recursos”, e à “comprovação pela área de engenharia da CAIXA, da regularidade de execução dos serviços de infraestrutura externa, quando for o caso”. Além destas exigências, “a entrega da última parcela para construção do empreendimento, fica condicionada à verificação, pela CAIXA, da conclusão total da obra e de que nela foram investidas todas as parcelas anteriormente entregues”. Ressalto que a cláusula 28 prevê a substituição da construtora, “se for modificado o projeto pela inobservância das plantas, memoriais descritivos, cronogramas de obras, orçamentos e demais documentos aceitos pela CAIXA e integrantes do presente contrato, sem o prévio e expresso consentimento da CAIXA” ou “se não for concluída a obra, objeto deste financiamento, dentro do prazo contratual”, esta última hipótese, como de fato ocorreu, ao que se tem notícia nos autos. A CEF obteve a reintegração de posse do empreendimento, por sentença proferida em 11/03/2019, na ação de reintegração de posse nº 5003855-84.2017.4.03.6110, da 4ª Vara Federal de Sorocaba (ID 267506116, p. 3). Dessa forma, as rés são partes legítimas para figurar no polo passivo da presente demanda. Nesse sentido, a jurisprudência de ambas as Turmas da Primeira Seção desta Corte: “APELAÇÃO CÍVEL. PROCESSUAL CIVIL. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. ATRASO NA ENTREGA DA OBRA. LEGITIMIDADE. RESPONSABILIDADE. DANOS MATERIAIS. DANOS MORAIS. - Com relação à responsabilidade da CEF no que tange ao atraso na entrega da obra e/ou eventuais vícios de construção de imóveis financiados segundo as regras do Sistema Financeiro de Habitação, há que se distinguir entre duas situações: 1ª) nas hipóteses em opera como gestora de recursos e executora de políticas públicas federais para a promoção de moradia a pessoas de baixa renda (como é o caso do Programa Minha Casa Minha Vida), atuando na elaboração do projeto ou na fiscalização das obras, a CEF é parte legítima e pode responder por danos (materiais e/ou morais); 2ª) nos casos em que atua apenas como agente financeiro, financiando a aquisição de imóvel que já se encontra edificado e em nome de terceiro, essa instituição financeira não pode ser responsabilizada por vícios de construção e é parte ilegítima para compor lides a esse respeito. - Ainda que no âmbito do Programa Minha Casa, Minha Vida, para se configurar a responsabilidade da CEF (e, consequentemente, sua legitimidade), é necessário que a instituição financeira tenha atuado na construção do imóvel (seja no financiamento, elaboração e/ou fiscalização da obra), ou que o contrato esteja relacionado à Faixa 1 do mencionado Programa, quando a CEF atua como verdadeira gestora de políticas públicas, subsidiando a aquisição de moradias para a população de baixa renda, por meio de recursos do Fundo de Arrendamento Residencial (FAR). - No caso dos autos, a CEF atuou na elaboração do projeto e fiscalização da obra, uma vez que financia a construção de imóvel cujas parcelas são liberadas à medida em que as obras vão avançando, com supervisão do setor de engenharia da instituição financeira. Portanto, a CEF é parte legítima e poderá ser responsabilizada, não tendo atuado como mero agente financeiro no caso concreto. - Há previsão expressa de destinação de recursos oriundos da venda diretamente em conta de titularidade da alienante/apelante. Evidente, portanto, sua legitimidade para integrar o polo passivo, eis que um dos pedidos era de rescisão do contrato do qual era parte e beneficiária. - Não há como afastar a responsabilidade da alienante pela indenização por danos materiais, eis que tal indenização equivale aos valores despendidos pela autora para aquisição do imóvel. A alienante, como dito, foi beneficiada diretamente pelo contrato e pelos valores nesse tocante, sendo uma das destinatárias dos recursos por expressa previsão contratual. - A falha na prestação do serviço, pelas rés, ultrapassou o mero dissabor, impondo-se reparação, notadamente em razão do atraso na entrega da obra e inclusão da autora em cadastros de proteção ao crédito, causando apreensão e angústia. Assim, entendo devida a indenização por dano moral. Indenização fixada a título de danos morais no montante de R$ 10.000,00 (dez mil reais), eis que tal importância não proporcionará enriquecimento indevido e exagerado da parte autora e, ainda, é capaz de impor punição à parte ré, mormente na direção de evitar atuação reincidente. - Apelo da parte autora parcialmente provido. Apelos da CEF e da corré Hexágono desprovidos.” (Segunda Turma, ApCiv 5001606-27.2018.4.03.6143, Rel. Des. Federal Carlos Francisco, j. em 10/08/2023, DJEN de 16/08/2023, grifos nossos) “AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL NA PLANTA. ATRASO NA EDIFICAÇÃO DO IMÓVEL. LEGITIMIDADE PASSIVA “AD CAUSAM” DAS CONSTRUTORAS. MANUTENÇÃO DA CONSTRUTORA NO POLO PASSIVO. RECURSO PROVIDO. I - Discute-se nos autos o atraso na edificação de condomínio residencial e a responsabilidade das construtoras do Empreendimento, na sistemática do Programa Federal Habitacional, sob financiamento e parceria da Caixa Econômica Federal – CEF. II - Através do ID 154467893 se verifica terem as partes firmado, em 23/09/15, Compromisso Particular de Adesão com Promessa de Compra e Venda de Fração Ideal de Terreno e Promessa de Contratação de Financiamento para Construção de Imóvel na Planta, tendo como Promitente Vendedora/Incorporadora/Construtora/Fiadora a Casaalta Construções Ltda.. e Empreendimento o Condomínio Residencial Arboretto. Prazo de 24 (vinte e quatro) meses a partir da assinatura do pacto de financiamento com a CEF, com possibilidade de 180 (cento e oitenta) dias de prorrogação em caso fortuito ou força maior. III - O outro instrumento que consubstancia o negócio jurídico denomina-se Contrato de Compra e Venda de Terreno e Mútuo para Construção de Unidade Habitacional, Alienação Fiduciária em Garantia e outras Obrigações – Programa Minha Casa Minha Vida – Recursos do FGTS, emitido pela própria CAIXA ECONÔMICA FEDERAL – CEF (ID 154467894). Figura como Vendedora a HEXAGONO CONSTRUTORA COMERCIO E ENGENHARIA LTDA; Comprador(es) e devedor(es) Fiduciante(s) os recorrentes; Interveniente Construtora/Incorporadora/Fiadora, a Casaalta Construções Ltda e Credora Fiduciária, a CEF. A data é de 04/03/16, com assinaturas subscritas dos compradores em 09/03/16 (fls. 110/111 download crescente). Anexo recibo de pagamento em dinheiro para a Hexagono Ltda. emitido no dia 10/11/15 no importe de R$ 3.060,00 (três mil e sessenta reais), que, embora sem a especificidade de sua destinação (ID 154467922), a própria beneficiária assume em sua contestação ser o valor de entrada. IV - No Registro de Imóveis consta como Outorgante a Hexágono Construtora Comércio e Engenharia Limitada e Documento, o Instrumento Particular com o banco federal, protocolado o título na data de 23/03/16. V - Escriturada em matrícula a aquisição do terreno pela Hexágono Ltda., demolição do imóvel lá edificado e a especificação da finalidade de se promover a incorporação de condomínio residencial denominado Residencial Arboretto a ser erigido nos padrões do Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV) (– fl. 119/122). VI - Seguindo na averbação, à fl. 123 tem o aditamento para inclusão da incorporadora Casaalta Construções Ltda., requerimento de 19/08/15 (anteriormente à assinatura do contrato) em que se adiciona uma incorporadora ao empreendimento, não excluindo a Hexagono da propriedade do terreno e do próprio condomínio. Tanto que após foram celebrados os acordos com os recorrentes (e tantos outros compradores/mutuários) e pagamento do sinal à Hexágono Ltda.. VII - Consta na fl. 184 diversas anotações de indisponibilidade que foram efetuadas contra a Casaalta Ltda. advinda de processos de variadas naturezas e localidades. VIII - Foi deferida a tutela de urgência em 04/06/18 para ordenar a suspensão das cobranças das mensalidades relativas ao financiamento perante a instituição financeira, além desta ter de se abster de inscrever o nome dos requerentes em cadastros de inadimplência. IX - Por via de sua contestação, a co-requerida Hexágono Ltda. confessa ter recebido a quantia inicial do negócio, mas alega que não participou dele (fl. 238), o que a documentação carreada ao feito infirma, conforme supra narrado. X - In casu, não se cogita em absoluto da ilegitimidade passiva de qualquer das duas Construtoras arroladas no polo passivo, tampouco da CEF, uma vez que figuram nos acordos pactuados no âmbito do Programa Federal de Habitação para pessoas de baixa renda, sendo todas responsáveis pelo Empreendimento e, consequentemente, tudo que dele se origina. XI - Concedido o efeito suspensivo pleiteado a obstar a imediata exclusão da HEXAGONO CONSTRUTORA COMERCIO E ENGENHARIA LTDA. como corresponsável legal do Empreendimento Condomínio Residencial Arboretto. XII - Agravo de instrumento a que se dá provimento.” (Primeira Turma, AI 5005162-31.2021.4.03.0000, Rel. Des. Federal Valdeci dos Santos, j. em 24/06/2021, DJEN de 28/06/2021) No mérito, versa o caso sobre o pedido de rescisão dos contratos celebrados entre as partes, inclusive, de seguro habitacional, com a restituição do valor pago, tendo como fundamento, o atraso na entrega da obra. A sentença de primeiro grau reconheceu o atraso a partir de setembro de 2016, já incluso o período de tolerância de 180 (cento e oitenta) dias, sendo este fato incontroverso nesta sede recursal. Do direito à resolução do contrato e à restituição das parcelas pagas. No caso, configura-se a mora contratual das requeridas, a partir de setembro de 2016, incluso o prazo de tolerância. Tal não se deve à culpa do adquirente do imóvel, mas exclusivamente à mora da construtora, tecnicamente responsável pelo empreendimento, e à fiscalização deficitária da instituição financeira, aptas a amparar o dever de indenizar, ex vi do art. 389, do Código Civil: “Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado”. O parágrafo único do art. 395 do Código Civil dispõe que, caso a prestação, devido à mora, torne-se inútil ao credor, este poderá enjeitá-la e exigir perdas e danos. Ainda, o art. 475 do Código Civil, expressamente, faculta ao credor, diante do inadimplemento do devedor, escolher entre exigir o cumprimento da prestação ou rescindir o contrato, cabendo, em qualquer das hipóteses, a respectiva indenização: "Art. 475. A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos." “Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador - integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento” (Súmula 543 do Superior Tribunal de Justiça). Nesse sentido, o entendimento desta Primeira Turma: “APELAÇÃO. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. CEF. CONSTRUTORA. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL. LEGITIMIDADE PASSIVA DA CEF. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL. RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS. APELAÇÕES NÃO PROVIDAS. 1. Na origem, os autores ajuizaram a presente demanda em face da CEF e da construtora objetivando a rescisão do contrato de financiamento habitacional e do contrato de promessa de compra e venda, bem como a condenação das requeridas na devolução dos valores já pagos, corrigidos monetariamente. Alegou que, em razão do atraso na entrega do imóvel, manifestaram desinteresse na manutenção do contrato, sustentando, ainda, que a demora excessiva das obras constitui ilícito previsto na legislação consumerista e também na Lei nº 4.591/64. 2. No que se refere à responsabilidade da CEF em relação a eventuais vícios de construção de imóveis financiados segundo as regras do Sistema Financeiro de Habitação, há que se distinguir entre duas situações: 1ª) nas hipóteses em opera como gestora de recursos e executora de políticas públicas federais para a promoção de moradia a pessoas de baixa renda (como é o caso do Programa Minha Casa Minha Vida), atuando na elaboração do projeto ou na fiscalização das obras, a CEF é parte legítima e pode responder por danos (materiais e/ou morais); 2ª) nos casos em que atua apenas como agente financeiro, financiando a aquisição de imóvel que já se encontra edificado e em nome de terceiro, essa instituição financeira não pode ser responsabilizada por vícios de construção e é parte ilegítima para compor lides a esse respeito. Precedentes. 3. Conforme entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça e também deste Tribunal Regional, ainda que no âmbito do Programa Minha Casa, Minha Vida, para se configurar a responsabilidade/legitimidade da CEF, há necessidade de que além de financiar o imóvel, a instituição financeira tenha atuado na elaboração e/ou fiscalização da obra, ou ainda que o contrato esteja relacionado à Faixa 1 do mencionado Programa, quando a CEF atua como verdadeira gestora de políticas públicas, subsidiando a aquisição de moradias para a população de baixa renda, por meio de recursos do Fundo de Arrendamento Residencial (FAR). Precedentes do STJ e desta Corte. 4. No caso dos autos, a parte apelada celebrou, com a MRV Engenharia e Participações S/A, contrato particular de promessa de compra e venda de imóvel, em 05/01/2020, tendo por objeto a unidade imobiliária nº 1707, Bloco 1, do Residencial San Vicenzo, situado na Rua Domingos Ataíde, s/nº, Bairro Vila Andrade, na cidade de São Paulo/SP, com registro de incorporação imobiliária na matrícula nº 423.161, do 11º Registro de Imóveis de São Paulo/SP. Constou, do referido contrato, que a data limite para entrega das chaves seria 29/05/2021 (Id 262714268, p. 1-5). 5. Em seguida, os apelados celebraram com a CEF contrato de compra e venda de terreno e mútuo para construção de unidade habitacional, alienação fiduciária em garantia, fiança e outras obrigações – Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV) – Recursos do FGTS com utilização dos recursos da conta vinculada do FGTS do devedor, em 19/02/2020, no valor de R$ 167.326,59, a serem pagos em 360 prestações, atualizadas de acordo com a Tabela Price (Id 262714270, p. 2-28). 6. Na espécie, consta na cláusula 2.1 do contrato de financiamento com a CEF: “os valores remanescentes serão destinados à construção e creditados em parcelas mensais na proporção do andamento das obras em conta vinculada ao empreendimento, no percentual atestado no Relatório de Acompanhamento do Empreendimento – RAE e mediante o cumprimento das demais exigências estabelecidas neste contrato”, comprovando que a CEF financiou e atuou na fiscalização da obra, sendo parte legítima para atuar no processo. Assim, possui responsabilidade solidária no caso de atraso na entrega do imóvel em questão. 7. No que se refere ao prazo para conclusão da obra, constou, na cláusula 5,1, a previsão para a entrega das chaves em 30.11.2020, sendo a data limite para entrega das chaves 29.05.2021 (Id 262714268, p. 1-5). No item B.7 do contrato de financiamento com a CEF o prazo para a entrega das obras é 29.11.2021. 8. Entretanto, conforme bem consignou a sentença apelada, “ainda que houvesse a consideração do prazo estipulado no contrato de financiamento para a finalização das obras, vale destacar que apesar de a MRV aduzir em sua contestação que “as obras não foram entregues ANTES da data prevista no contrato de financiamento, ou seja, 29/11/2021, face a pandemia, que obrigou a paralisação das obras, mediante determinação do Executivo do Estado de São Paulo, através do Decreto n° 64.879, de 20 de março de 2020.”, o decreto apontado como embasador da paralisação das obras não tratou do tema.”, acrescentando também que “diante da inexecução contratual operada (ausência de entrega das obras nas condições aprazadas), não se pode obrigar os autores a manterem as avenças firmadas com as corrés, sobretudo em razão de inexistir o objeto da execução contratual, qual seja, a unidade habitacional construída, nos termos da Lei nº 9.514/97”. 9. Diante do atraso na entrega das obras, não se pode referendar a “vedação ao direito dos adquirentes de desfazer o negócio jurídico entabulado com a construtora”, sendo de rigor o retorno ao status quo anterior à realização do contrato, com a devolução de todos os valores recebidos pelas rés em razão do contrato, inclusive dos recursos do FGTS dos autores. Precedentes. 10. Apelações não providas. Honorários sucumbenciais majorados.” (ApCiv 5027905-68.2021.4.03.6100, Rel. Des. Federal Nelton dos Santos, j. em 03/08/2023, DJEN de 08/08/2023) "APELAÇÃO. CIVIL. COMPRA E VENDA. MÚTUO. EMPREITADA. FINANCIAMENTO PARA CONSTRUÇÃO. ATRASO NA OBRA. INADIMPLEMENTO. RESOLUÇÃO POR CULPA DA CONSTRUTORA. APELAÇÃO IMPROVIDA. I - Pretende a parte Autora a resolução dos contratos firmados com as corrés com a consequente restauração do status quo ante sob o fundamento de que obra não seria concluída no prazo avençado. O pleito exposto na inicial sugere a incidência do art. 395, parágrafo único do CC, segundo o qual se a prestação, devido à mora, se tornar inútil ao credor, este poderá enjeitá-la e exigir a satisfação das perdas e danos, bem como o teor do art. 475 do CC, que prevê que a parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos. II - Nestas condições, considerando que as obras não foram concluídas nem há notícia de justificativa para o atraso nos termos contratados, é patente o inadimplemento das corrés, não subsistindo controvérsia quanto à configuração do atraso. A construtora não logrou concluir a obra no prazo avençado, razão pela qual deve ser mantida a decisão que reconheceu a resolução do contrato sem qualquer retenção, considerando a sua culpa. A consagrar o entendimento anteriormente esposado, cumpre citar o teor da Súmula 543 do STJ. III - Como bem salientando na sentença impugnada, a atuação da CEF como promotora de políticas públicas está evidenciada nos autos por documentos remetidos à Prefeitura Municipal e por publicidade veiculada em seu nome. A intermediação das demais corrés não descaracteriza o fato de que a CEF foi a responsável pelo financiamento e destinatária final dos valores recolhidos a este título. Neste diapasão, na ausência de denunciação da lide, eventual divergência entre as corrés deverá ser objeto de ação própria. IV - No tocante aos danos morais, considerando a natureza do bem discutido nos autos e sua centralidade na vida dos adquirentes, é certo que o atraso na conclusão da obra gera impactos não apenas em seu patrimônio, mas também gera danos morais que não representam mero dissabor cotidiano. Considerando a frustração de seus planos pessoais e, em especial, a demora da CEF em oferecer resposta satisfatória para a conduta da construtora, o dano moral é presumido e foi fixado em montante que não representa valor irrisório ou exorbitante, R$ 10.000,00 (dez mil reais). V - Apelação improvida. Honorários majorados. (ApCiv 5000203-82.2020.4.03.6133, Rel. Des. Federal Valdeci dos Santos, j. em 27/10/2022, Intimação via sistema em 03/11/2022) Sendo assim, os autores fazem jus à resolução do contrato de compra e venda do imóvel objeto desta lide, que se estende ao financiamento e ao contrato de seguro contraídos perante a CEF, bem como à devolução de todos os valores pagos em razão destes, consoante discriminado na sentença: "Por outro lado, CONDENAR a ré RESIDENCIAL PROVENCE EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS SPE LTDA a: Restituir aos autores todos os valores efetivamente pagos por conta do “Instrumento Particular de Compromisso de Venda e Compra de Unidade Autônoma do Condomínio Residencial Provence“ (Id. 42602200), devidamente corrigidos desde cada efetivo pagamento, com juros devidos desde a citação, sendo que para os pagamentos após a citação os juros e a correção incidirão a cada pagamento, nos termos do disposto pela Resolução CJF nº 658/2020; Da mesma forma, CONDENAR a Requerida CAIXA ECONÔMICA FEDERAL – CEF a: Restituir aos autores todos os valores despendidos em virtude do “Contrato de Compra e Venda de Terreno e Mútuo para Construção de Unidade Habitacional Vinculada a Empreendimento, com Fiança, Alienação Fiduciária em Garantia e Outras Obrigações – Recursos SBPE” (Id. 42601839), devidamente corrigido desde o pagamento, com juros devidos desde a citação, pela taxa SELIC, nos termos do disposto pela Resolução CJF nº 658/2020; (...) III – CONDENAR a Requerida RESIDENCIAL PROVENCE EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS SPE LTDA ao pagamento da multa de 20% (vinte por cento) do valor recebido devidamente corrigido, nos termos dispostos pela Cláusula Décima Quinta, item “a”, do Instrumento Particular de Compromisso de Venda e Compra de Unidade Autônoma do Condomínio Residencial Provence” (Id. 42602200).". Da indenização por danos morais Segundo ensinamento de Yussef Said Cahali in Dano Moral, 2ª edição, Editora Revista dos Tribunais, p. 21, considera-se dano moral: "Tudo aquilo que molesta gravemente a alma humana, ferindo-lhe gravemente os valores fundamentais inerentes à sua personalidade ou reconhecidos pela sociedade em que está integrado, qualifica-se, em linha de princípio, como dano moral; não há como enumerá-los exaustivamente, evidenciando-se na dor, na angústia, no sofrimento, na tristeza pela ausência de um ente querido falecido; no desprestígio, na desconsideração social, no descrédito, à reputação, na humilhação pública, no devassamento da privacidade; no desequilíbrio da normalidade psíquica, nos traumatismos emocionais, na depressão ou no desgaste psicológico, nas situações de constrangimento moral." Em complemento, assevera Cleyton Reis em sua obra Avaliação do Dano Moral, 4ª edição, Editora Forense, p. 15: "É inquestionável que os padecimentos de natureza moral, como, por exemplo, a dor, a angústia, a aflição física ou espiritual, a humilhação, e de forma ampla, os padecimentos resultantes em situações análogas, constituem evento de natureza danosa, ou seja, danos extrapatrimoniais. Todavia, esse estado de espírito não autoriza a compensação dos danos morais, se não ficar demonstrado que os fatos foram conseqüência da privação de um bem jurídico, em que a vítima tinha um interesse juridicamente tutelado." A indenização por danos morais visa compensar os prejuízos ao interesse extrapatrimonial sofridos pelo ofendido, que não são, por sua natureza, ressarcíveis, e não se confundem com os danos patrimoniais, estes sim, suscetíveis de recomposição ou, se impossível, de indenização pecuniária. No que se refere à indenização por danos morais, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem entendido que “O simples inadimplemento contratual em razão do atraso na entrega do imóvel não é capaz, por si só, de gerar dano moral indenizável. Entretanto, sendo considerável o atraso, alcançando longo período de tempo, pode ensejar o reconhecimento de dano extrapatrimonial” (Segunda Seção, AgInt nos EAREsp n. 676.952/RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 03/10/2023, DJe de 5/10/2023; Terceira Turma, AgInt no AREsp 2.158.472/MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 12/12/2022, DJe de 14/12/2022, e Terceira Turma, AgInt no AREsp 2.059.944/MG, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 28/11/2022, DJe de 13/12/2022). No caso sob análise, verificados os documentos acostados aos autos, sobressaem presentes as premissas expostas pela parte autora e, consequentemente, o dano moral pretendido, a saber: "No presente caso, há um atraso injustificado de mais de 04 anos, por mera desídia das Requeridas, o que, evidentemente, ultrapassa os limites do razoável, supera o mero aborrecimento cotidiano e, por conseguinte, configura os danos morais. Diante do exposto, os danos morais eclodem dos próprios fatos, uma vez que o atraso injustificado tem trazido transtornos financeiros e psicológicos aos demandantes por mais de 04 anos, uma vez que eles investiram anos de trabalho em um negócio que não foi cumprido e que se destinaria à moradia de ambos. O descumprimento do contrato, de fato, ocasionou angústia, desgosto, sensação de impotência e frustração, notadamente, porque os Requerentes já pagaram o preço estipulado no contrato e confiavam que a obra seria entregue no prazo, tanto é que fizeram compras de móveis para o referido apartamento (doc. 7). Dessa forma, resta evidente que não podem as Requeridas repassarem aos Requerentes os riscos inerentes a suas atividades e esperar que eles convivam diariamente com a frustração e a insegurança sem gozar de uma reparação moral." (ID 267505955, p. 37) Com efeito, tem-se como prazo final para entrega do imóvel dos autores, o mês de setembro de 2016. A ação foi ajuizada em 30/11/2020 e, até então, não havia notícia de que a unidade habitacional tivesse sido entregue. O tempo decorrido nesse interregno foi relevante, sendo apto a determinar abalos morais acima de meros aborrecimentos, mormente porque relacionado ao direito social básico de moradia. Este caso, portanto, possui particularidades que tornam devida a indenização por danos morais. É indispensável, contudo, que exista uma mínima correlação entre o valor pedido a título de danos morais e os fatos trazidos a Juízo. Nesse sentido, esta Primeira Turma tem adotado o entendimento segundo o qual, na hipótese de cumulação de pedidos de proveito material e moral, o valor da indenização a título de danos morais deve ser fixado sem excesso, adequando-se aos parâmetros consolidados pela jurisprudência, que, em casos análogos à espécie, o vem estimando em R$ 10.000,00 (dez mil reais), com base nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade: "APELAÇÃO. PMCMV. FINANCIAMENTO HABITACIONAL. CONCESSÃO DOS BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA GRATUÍTA. ATRASO NA ENTREGA DA OBRA. LEGITIMIDADE PASSIVA DA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL NA QUALIDADE DE GESTORA DE POLÍTICAS PÚBLICA. RESILIÇÃO DO CONTRATO POR CULPA DAS CONTRATADAS. RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS PELO MUTUÁRIO. DANO MORAL CONFIGURADO. APELO NÃO PROVIDO. 1. A documentação consignada aos autos se mostra suficiente à comprovação da hipossuficiência necessária à concessão dos benefícios pretendidos. 2. O § 2º do art. 99, do CPC/15 é claro ao consignar que o magistrado poderá indeferir o pedido “se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade. 3. Ao enfrentar o tema, o C. STJ tem entendido que a presunção de pobreza é relativa, sendo possível o indeferimento do pedido de assistência judiciária caso verifique a existência de elementos que invalidem a hipossuficiência declarada. 4. Vale ressaltar, ainda, que o Apelado é efetivamente beneficiário do Programa Minha Casa Minha Vida, destinada à população de baixa renda, uma vez atendidas as exigências previstas tanto na Lei 11.977/2009, como no Decreto-Lei n.º 7.499/2011 que regulamentam o programa habitacional. 5. No que diz respeito à legitimidade da Embargante, a jurisprudência do próprio C. STJ firmou orientação assim sintetizada: a) Nas hipóteses em que a CAIXA atua na condição de agente financeiro em sentido estrito, isto é, não financia a construção do imóvel e nem participa dessa fase do empreendimento, não ostenta legitimidade para responder pelos vícios de construção na obra financiada, tendo em vista que a sua responsabilidade contratual diz respeito apenas ao cumprimento do contrato de financiamento, ou seja, à liberação do empréstimo, nas épocas acordadas, e à cobrança dos encargos estipulados no contrato; b) em se tratando de créditos imobiliários cedidos à CAIXA, essa empresa pública também não pode ser responsabilizada por eventuais vícios de construção nos imóveis, seja porque não financiou sua construção, seja porque não financiou originariamente a aquisição das unidades habitacionais. Precedentes do C. Superior Tribunal de Justiça e desta Corte. 6. No caso em análise, contudo, denota-se que a CEF, na qualidade de agente financeiro, também financiou a construção do imóvel, atuando com controle técnico, financeiro e operacional sobre o andamento da construção do empreendimento, como se depreende das cláusulas do contrato. 7. Constata-se, ainda, que a construção do empreendimento, recebeu subsídios do Governo Federal por intermédio do Programa "Minha Casa, Minha Vida", funcionando a Caixa Econômica Federal, na qualidade de gestora do FGTS, como agente operador do programa e, portanto, co-responsável pela conclusão das obras de construção da casa própria que financia, posto que fiscalizadas permanentemente pela Instituição Financeira, havendo inclusive acerto contratual que vincula a liberação do capital ao andamento do cronograma físico-financeiro. 8. Aplica-se ao caso, portanto, o entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que a Caixa Econômica Federal possui legitimidade passiva para responder nos casos em que não atua apenas como agente financeiro, "por vícios, atraso ou outras questões relativas à construção de imóveis objeto do Programa Habitacional Minha Casa Minha Vida se, à luz da legislação, do contrato e da atividade por ela desenvolvida, atuar como agente executor de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa renda (...)" (AgInt no REsp 1646130/PE, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 30/08/2018, DJe 04/09/2018). 9. O descumprimento injustificado do prazo estabelecido em compromisso de promessa de compra e venda para a entrega da unidade imobiliária negociada, caracteriza inadimplemento contratual culposo, fazendo emergir, para o comprador, o direito de pleitear a rescisão judicial do contrato. 10. A consequência da rescisão contratual em virtude do atraso excessivo e injustificado em que incidira na conclusão do empreendimento é o retorno ao statu quo ante, isto é, as partes devem retornar à posição jurídica em que se encontravam antes da celebração do contrato. Vale dizer: a restituição das parcelas pagas, na sua integralidade. 11. Precedentes. 12. A restituição das parcelas pagas pelos promitentes adquirentes e o pedido de indenização a título de danos morais, em decorrência da mora das requeridas e pelo interregno que foram privados do uso do imóvel, consistem em pretensões de natureza distintas, cuja legitimidade já foi pacificada pela jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça. 13. O caso dos autos, em que o autor adquiriu imóvel na planta para sua própria moradia, efetuou o pagamento das parcelas do financiamento e não pode fazer uso do mesmo, em razão do atraso na entrega de obra objeto de financiamento habitacional, revela situação que ultrapassa os limites de um mero aborrecimento, ensejando o dano moral passível de recomposição. 14. Demonstrada a ocorrência do dano, e presentes os requisitos ensejadores à configuração da responsabilidade da apelada, a fixação de indenização é medida que se impõe. 15. Considerando as circunstâncias específicas do caso concreto, em especial a elevada extensão do dano moral, uma vez que a aquisição de imóvel para moradia é fato de alta relevância no contexto socioeconômico do autor, bem como o considerável grau de culpa da CEF, que, além de atrasar a entrega completa e satisfatória do imóvel, pouco fez para solucionar o ocorrido, o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), se revela razoável e suficiente à reparação do dano moral no caso dos autos, sem importar no enriquecimento indevido da parte. 16. Desprovido o recurso interposto pela CEF, e havendo a condenação da parte vencida em primeira instância, restam presentes os requisitos necessários a ensejar a majoração dos honorários advocatícios de sucumbência, para o percentual de 17% (dezessete por cento), sobre o valor atualizado da causa, na forma do artigo 85, § 11, do CPC/15. 17. Recurso de apelação a que se nega provimento." (ApCiv 5007510-25.2021.4.03.6110, Rel. Des. Federal Wilson Zauhy Filho, j. em 17/02/2023, DJEN de 23/02/2023, grifos nossos) "CIVIL. APELAÇÃO. FINANCIAMENTO PARA CONSTRUÇÃO DE IMÓVEL. COMPRA E VENDA. MÚTUO. EMPREITADA. ATRASO NA OBRA. INADIMPLEMENTO. RESOLUÇÃO DO CONTRATO. RESTAURAÇÃO DO STATUS QUO ANTE. DANOS MATERIAIS PRESUMIDOS. DANOS MORAIS. APELAÇÃO A QUE SE NEGA PROVIIMENTO. 1. Com o ajuizamento da ação, pretende a parte Autora a rescisão dos contratos firmados com as corrés com a consequente restauração do status quo ante, além da condenação à indenização por danos materiais e danos morais, sob o fundamento de atraso na conclusão e entrega da obra para além do estabelecido em contrato. 2. O pleito exposto na inicial sugere a incidência do art. 395, parágrafo único do CC, segundo o qual se a prestação, devido à mora, se tornar inútil ao credor, este poderá enjeitá-la e exigir a satisfação das perdas e danos, bem como o teor do art. 475 do CC, que prevê que a parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos. 3. Vislumbra-se, ainda, a incidência do teor do art. 389 do CC ao prever que, não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado. E também o art. 624 do CC, ao determinar que, suspensa a execução da empreitada sem justa causa, responde o empreiteiro por perdas e danos. 4. No âmbito da legislação consumerista, o art. 3° do CDC trata como fornecedor a pessoa física ou jurídica que desenvolve atividade de construção. A CEF, enquanto pessoa jurídica pública nacional que presta serviços de natureza bancária, financeira e de crédito mediante remuneração no mercado de consumo, enquadra-se no conceito de fornecedora do art. 3º, caput e § 2º do CDC. A jurisprudência dos egrégios Supremo Tribunal Federal (ADI 2591) e do Superior Tribunal de Justiça (Súmula nº 297) é pacífica na conclusão de que o Código de Defesa do Consumidor aplica-se aos contratos de mútuo bancário. 5. Na hipótese de uma relação de consumo triangular em que o adquirente e mutuário compra o imóvel do vendedor ou construtor, mas sua obrigação principal tem como credora uma instituição financeira, ao se constatar a configuração de conduta lesiva da construtora que justifique a resolução do contrato, não há dúvidas de que os atos em questão podem repercutir no patrimônio da instituição financeira independentemente de culpa. 6. Com efeito, nestas condições, a instituição financeira não poderá exigir o cumprimento da obrigação do contrato de mútuo nos termos estritamente avençados, o que não impede que a instituição financeira possa exercer o correspondente regresso ou pleito de reparação civil junto ao construtor ou vendedor. A ausência de culpa, todavia, não serve de óbice à pretensão do consumidor. 7.No caso dos autos, em 17/05/2016 a parte Autora firmou com ALCANCE CONSTRUTORA LTDA "Instrumento Particular de Compromisso de Compra e Venda de Imóvel Urbano com Confissão de Dívida" com a previsão de entrega do imóvel em até 36 meses após a assinatura do contrato. 8. Em 14/12/2016, as partes firmaram "Contrato de Compra e Venda de Terreno e Mútuo Para Construção de Unidade Habitacional, Alienação Fiduciária em Garantia, Fiança e Outras Obrigações - Programa Minha Casa Minha Vida - PMCMV - Recursos do FGTS - Com Utilização do FGTS do(s) Comprador(es), com prazo de construção, consoante o item B.8.2, de 25 (vinte e cinco) meses, prorrogável uma única vem, em até 6 (seis) meses, uma vez restado comprovado caso fortuito, força maior ou outra situação excepcional superveniente à assinatura do contrato, conforme a Quinta Cláusula contratual. 9. O contrato contém, ainda, a previsão de substituição da construtora, entre outras hipóteses, quando ocorrer infração pela construtora de qualquer disposição do contrato e quando não concluída a obra dentro do prazo contratual (Cláusula Vigésima Nona). 10. Qualquer que seja o prazo considerado, as obras não foram concluídas tempestivamente, já que não haviam sido concluídas até a data do ajuizamento da presente ação, em julho de 2020. Não houve a comprovação de caso fortuito ou força maior a justificar qualquer prorrogação. 11. É patente o inadimplemento das fornecedoras. A construtora não logrou concluir a obra no prazo avençado. Quanto à CEF, resta inequívoca a sua obrigação contratual de fiscalizar a obra para fins de liberar os recursos necessários a construção. Considerando a natureza do empreendimento, a relação de consumo triangular configurada, bem como a evidente disparidade entre a capacidade técnica e econômica entre a CEF e parte Autora para exigir da construtora o cumprimento da obrigação, a responsabilidade da CEF resta configurada. 12. Não suficiente, era sua obrigação atestar eventual necessidade de prorrogar o prazo por força maior ou caso fortuito, além de mobilizar o seguro contratado em tempo hábil para não gerar danos ao adquirentes. Não há que se falar, portanto, que a responsabilidade solidária não se presume na hipótese em comento. 13. Ressalte-se, ainda, que o contrato é vinculado ao Programa Minha Casa, Minha Vida, sendo possível discutir se a atuação da CEF não poderia, inclusive, ser caracterizada como promotora de políticas públicas na área da habitação, o que só faria aumentar sua responsabilidade. 14. No âmbito do dos contratos de compra e venda de imóvel, o STJ editou a Súmula 543 que prevê o dever de imediata e integral restituição das parcelas pagas pelo comprador em caso de resolução do contrato por culpa exclusiva do vendedor ou construtor. 15. O Superior Tribunal de Justiça, ao julgar recurso especial pelo rito do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas enfatizou, entre outras teses, que na hipótese de atraso na conclusão da obra em financiamentos para construção de imóvel no âmbito do Programa Minha Casa Minha Vida, o dano material é presumido. 16. No que se refere aos danos morais, considerando a natureza do bem discutido nos autos e sua centralidade na vida dos adquirentes, é certo que o atraso na conclusão da obra gera impactos não apenas em seu patrimônio, mas também gera danos morais que não representam mero dissabor cotidiano. Considerando a frustração de seus planos pessoais e, em especial, a demora da CEF em oferecer resposta satisfatória para a conduta da construtora, o dano moral é presumido e foi fixado em montante que não representa valor irrisório ou exorbitante, R$ 10.000,00 (dez mil reais). 17. Apelação a que se nega provimento." (ApCiv 5001510-52.2020.4.03.6107, Rel. Des. Federal Valdeci dos Santos, j. em 04/02/2022, DJEN de 09/02/2022, grifos nossos) Dessa forma, para compensar a parte autora dos prejuízos emocionais sofridos, entendo adequado arbitrar a indenização por danos morais no montante de R$ 10.000,00 (dez mil reais), nos moldes fixados na sentença. Com fulcro no art. 300, do Código de Processo Civil, mantenho a tutela concedida aos autores, prejudicados os embargos de declaração interpostos pelas empresas JC Morais Assessoria e Empreendimentos Imobiliários Ltda. e Residencial Provence Empreendimentos Imobiliário SPE Ltda. Considerando que os recursos de apelação foram improvidos, majoro os honorários recursais em 1% do valor correspondente à sucumbência anteriormente fixada, nos termos do §11 do art. 85, do CPC. Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, nego provimento às apelações. Mantenho a tutela concedida aos autores, ficando prejudicados os embargos de declaração opostos pelas empresas JC Morais Assessoria e Empreendimentos Imobiliários Ltda. e Residencial Provence Empreendimentos Imobiliário SPE Ltda. É o meu voto. Herbert de Bruyn Desembargador Federal Relator
Advogado do(a) APELANTE: CASSIANO PIRES VILAS BOAS - MG154853-A
E M E N T A
SFH. COMPRA E VENDA DE TERRENO E MÚTUO PARA CONSTRUÇÃO DE UNIDADE HABITACIONAL E EMPREENDIMENTO, COM FIANÇA E ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. ATRASO NA CONCLUSÃO DA OBRA E ENTREGA DO IMÓVEL. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. APLICABILIDADE. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF. ATUAÇÃO NA FISCALIZAÇÃO DAS OBRAS E NA GESTÃO DOS RECURSOS. RESIDENCIAL PROVENCE EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS SPE LTDA. VENDEDORA/INCORPORADORA. JC MORAIS ASSESSORIA E EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA. CONSTRUTORA. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. MORA CONTRATUAL. RESOLUÇÃO DO CONTRATO. DEVER DE INDENIZAR. DANOS MATERIAIS. DANOS MORAIS. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. MATÉRIA PRELIMINAR REJEITADA. APELOS IMPROVIDOS.
1. A relação jurídica contratual em discussão sujeita-se aos ditames do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90), consoante entendimento pacífico do Supremo Tribunal Federal (ADI nº 2591, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Velloso, j. 7/6/06, DJ 29/9/06, Rel. para acórdão Min. Eros Grau) e do Superior Tribunal de Justiça (Súmula nº 297).
2. É pacífico o entendimento do Superior Tribunal de Justiça quanto à responsabilidade solidária entre os integrantes da cadeia de consumo, como ocorre na espécie.
3. Com referência à responsabilidade da Caixa Econômica Federal - CEF para responder pelo descumprimento contratual relativo ao atraso na construção e entrega de imóvel vinculado a empreendimento financiado pelo Sistema Financeiro da Habitação, há que se distinguir duas situações, consoante jurisprudência sedimentada: 1ª) A CEF é parte legítima e pode responder, solidariamente, pelo descumprimento contratual, nas hipóteses em que tenha atuado na escolha da construtora, elaboração do projeto, execução ou fiscalização das obras do empreendimento ou opere como gestor de recursos e agente executor de políticas públicas federais para a promoção de moradia a pessoas de baixa renda; 2ª) não se reconhece a legitimidade passiva ad causam da CEF, caso esta instituição funcione como agente financeiro em sentido estrito, responsável, apenas, pelo financiamento da aquisição do imóvel já edificado e em nome de terceiro.
4. Do contrato de financiamento figura, como vendedora/incorporadora, a empresa Residencial Provence Empreendimentos Imobiliários SPE Ltda. e, como construtora responsável pela execução do empreendimento, a empresa JC Morais Assessoria e Empreendimentos Imobiliários Ltda. Há previsão expressa no aludido contrato, de pagamento pela compra do terreno, diretamente em conta corrente de titularidade do vendedor, e de destinação de recursos à construção, de acordo com o cronograma físico-financeiro da obra, diretamente em conta corrente de titularidade da construtora. A empresa JC Morais Assessoria e Empreendimentos Imobiliários Ltda. integra o contrato, também, na condição de fiadora. Das cláusulas do contrato em apreço, é nítida, ainda, a atuação da CEF tanto na fiscalização das obras do empreendimento, como na gestão dos recursos.
5. As rés são partes legítimas para figurar no polo passivo da presente demanda.
6. Configura-se a mora contratual das requeridas, a partir de setembro de 2016, incluso o prazo de tolerância. Tal não se deve à culpa do adquirente do imóvel, mas exclusivamente à mora da construtora, tecnicamente responsável pelo empreendimento, e à fiscalização deficitária da instituição financeira, aptas a amparar o dever de indenizar, ex vi do art. 389 do Código Civil.
7. O parágrafo único do art. 395 do Código Civil dispõe que, caso a prestação, devido à mora, torne-se inútil ao credor, este poderá enjeitá-la, e exigir a satisfação das perdas e danos. Ainda, o art. 475 do Código Civil, expressamente, faculta ao credor, diante do inadimplemento do devedor, escolher entre exigir o cumprimento da prestação ou rescindir o contrato, cabendo, em qualquer das hipóteses, a respectiva indenização.
8. Os autores fazem jus à resolução do contrato de compra e venda do imóvel objeto desta lide, que se estende ao financiamento e ao contrato de seguro contraídos perante a CEF, bem como à devolução de todos os valores pagos em razão destes, consoante discriminado na sentença.
9. A indenização por danos morais visa compensar os prejuízos ao interesse extrapatrimonial sofridos pelo ofendido, que não são, por sua natureza, ressarcíveis, e não se confundem com os danos patrimoniais, estes sim, suscetíveis de recomposição ou, se impossível, de indenização pecuniária.
10. Quanto à indenização por danos morais em casos dessa ordem, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem entendido que “O simples inadimplemento contratual em razão do atraso na entrega do imóvel não é capaz, por si só, de gerar dano moral indenizável. Entretanto, sendo considerável o atraso, alcançando longo período de tempo, pode ensejar o reconhecimento de dano extrapatrimonial”(Segunda Seção, AgInt nos EAREsp n. 676.952/RJ, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, j. em 03/10/2023, DJe de 5/10/2023).
11. Verificados os documentos acostados aos autos, sobressaem presentes as premissas expostas pelos autores e, consequentemente, o dano moral pretendido. Com efeito, tem-se como prazo final para a entrega do imóvel dos autores, o mês de setembro de 2016. A ação foi ajuizada em 30/11/2020 e, até então, não havia notícia de que a unidade habitacional tivesse sido entregue. O tempo decorrido nesse interregno foi relevante, sendo apto a determinar abalos morais acima de meros aborrecimentos, mormente porque relacionado ao direito social básico de moradia.
12. É indispensável que exista uma mínima correlação entre o valor pedido a título de danos morais e os fatos trazidos a Juízo.
13. Esta Primeira Turma tem adotado o entendimento segundo o qual, na hipótese de cumulação de pedidos de proveito material e moral, o valor da indenização a título de danos morais deve ser fixado sem excesso, adequando-se aos parâmetros consolidados pela jurisprudência, que, em casos análogos à espécie, o vem estimando em R$ 10.000,00 (dez mil reais), com base nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.
14. Matéria preliminar rejeitada. Apelações improvidas. Tutela antecipada mantida. Embargos de declaração prejudicados.