Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000150-50.2018.4.03.6007

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

APELANTE: JESUS QUEIROZ BAIRD

Advogado do(a) APELANTE: OTON JOSE NASSER DE MELLO - MS5124-A

APELADO: INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000150-50.2018.4.03.6007

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

APELANTE: JESUS QUEIROZ BAIRD

Advogado do(a) APELANTE: OTON JOSE NASSER DE MELLO - MS5124-A

APELADO: INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

 

O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS CALIXTO (Relator): 

Trata-se de apelação interposta por JESUS QUEIROZ BAIRD contra r. sentença proferida em embargos opostos à execução fiscal ajuizada pelo INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS - IBAMA para a cobrança de créditos públicos decorrentes de sanções administrativas ambientais. 

A sentença (ID 259932153) julgou improcedentes os embargos à execução fiscal, nos termos do artigo 487, inciso I, do CPC, sem condenar o embargante ao pagamento de honorários advocatícios, por já estarem compreendidos no encargo de 20% incidente na execução fiscal, com base no Decreto-Lei 1.025/69. 

Sustenta o apelante, em síntese, que (ID 259932161): (i) o auto de infração nº 567847 refere-se a fatos já apurados em face do antigo proprietário do imóvel, inexistindo situação nova a ensejar uma segunda penalização; (ii) houve o transcurso do prazo prescricional quinquenal para a cobrança de sanção, tomando-se como termo inicial a data da lavratura do auto de infração contra o antigo proprietário, qual seja, 23/08/2000, e não aquele contra si dirigido, uma vez que possuem o mesmo objeto; (iv) não há provas do cometimento de infração ambiental, a gerar a nulidade do ato administrativo.

Requer o provimento do recurso, com o reconhecimento da prescrição, ou, caso ultrapassada a questão prejudicial de mérito, a declaração da nulidade do auto de infração e consequente extinção do feito. Subsidiariamente, pugna pela redução do valor da sanção de multa, de R$ 30.000,00 (trinta mil reais - ID 16765718 - pág. 5 - dos autos da execução fiscal nº 0000540-54.2017.4.03.6007) para R$ 10.000,00 (dez mil reais).

Com contrarrazões (ID 259932165), subiram os autos a esta E. Corte.

Em 11/09/2023, os autos foram redistribuídos para minha relatoria em razão da criação desta unidade judiciária.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000150-50.2018.4.03.6007

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

APELANTE: JESUS QUEIROZ BAIRD

Advogado do(a) APELANTE: OTON JOSE NASSER DE MELLO - MS5124-A

APELADO: INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

 

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V O T O

 

 

O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS CALIXTO (Relator): 

Cinge-se a controvérsia em definir se a sanção administrativa ambiental imposta ao recorrente é válida e exigível. 

O meio ambiente ecologicamente equilibrado é direito fundamental de terceira dimensão que ganhou tutela constitucional destacada com a promulgação da Constituição Federal de 1988. Com vistas à garantia deste direito às presentes e futuras gerações, incumbe ao Poder Público, dentre outros, o controle do emprego de técnicas que comportem riscos ambientais, bem como a proteção da fauna e da flora. Vejamos: 

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.

§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:

(...)

V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente;

(...)

VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.         

§ 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

Nesse contexto, o IBAMA - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis caracteriza-se como autarquia federal, instituída pela Lei nº 7.735/1989, que tem como uma de suas finalidades exercer o poder de polícia ambiental. Integra o Sistema Nacional do Meio Ambiente como um de seus órgãos executores, na forma do art. 6º, inc. IV, da Lei nº 6.938/1981, incumbindo-lhe executar e fazer executar a política e as diretrizes governamentais fixadas para o meio ambiente. 

O caso em tela envolve espaço especialmente protegido como Área de Preservação Permanente - APP, eis que se trata de faixa marginal de curso d’água - margem do Rio Sucuriú (conforme ID 259932146 - pág. 9), na forma do art. 4º, inc. I, da Lei 12.651/12 - Código Florestal, in verbis:

Art. 4º Considera-se Área de Preservação Permanente, em zonas rurais ou urbanas, para os efeitos desta Lei:

I - as faixas marginais de qualquer curso d’água natural perene e intermitente, excluídos os efêmeros, desde a borda da calha do leito regular, em largura mínima de:

a) 30 (trinta) metros, para os cursos d’água de menos de 10 (dez) metros de largura;

Tratando-se de área rural, como demonstra o Cadastro Ambiental Rural (ID 259931328 - pág. 23), também há de se observar a proteção destinada à área de reserva legal, como estabelece do art. 12 do mesmo diploma legal: 

Art. 12. Todo imóvel rural deve manter área com cobertura de vegetação nativa, a título de Reserva Legal, sem prejuízo da aplicação das normas sobre as Áreas de Preservação Permanente, observados os seguintes percentuais mínimos em relação à área do imóvel, excetuados os casos previstos no art. 68 desta Lei:

I - localizado na Amazônia Legal:

a) 80% (oitenta por cento), no imóvel situado em área de florestas;

b) 35% (trinta e cinco por cento), no imóvel situado em área de cerrado;

c) 20% (vinte por cento), no imóvel situado em área de campos gerais;

II - localizado nas demais regiões do País: 20% (vinte por cento).

Os documentos anexados ao feito dão conta de que, em 23/08/2000, o IBAMA empreendeu fiscalização junto ao imóvel Estância Novo Mundo, à época de propriedade de José Mauro Moreira, tendo verificado a ocorrência de diversas infrações administrativas ambientais (autos de infração no ID 259931327 - págs. 16/18). Tais irregularidades são anteriores às discutidas nesta apelação e possuem como sujeito ativo pessoa diversa do recorrente, motivo pelo qual não cabe, neste processo, a discussão acerca do desfecho dos autos de infração a elas relacionados. 

Após a aquisição do imóvel pelo apelante, o Sr. Jesus Queiroz Baird, o IBAMA realizou nova vistoria no imóvel, em 23/02/2010, da qual resultou o Laudo de Vistoria nº 002/2010 (ID 259932146 - págs. 12/18). Naquela ocasião, constatou-se a persistência das infrações administrativas de drenagem de nascente e de construção na APP do rio Sucuriú.

Em verdade, a autoridade administrativa atestou que (ID 259932146 - págs. 14/16)

“O abastecimento dos dois tanques cheios é realizado por cano proveniente de uma canaleta de drenagem, que apesar de aparentemente não ter sido limpa há algum tempo (verifica-se a presença de vegetação no canal) ainda drena a água da área brejosa localizada a montante dos tanques.

(...)

A estrutura de alvenaria construída na faixa de APP do rio Sucuriú, constituída por salão, cozinha e banheiros continua no local”.

Com base em tais informações, foi lavrado, em 18/04/2011, o auto de infração nº 567.874 em face do apelante (ID 259932146 - pág. 2), no qual foram descritas as condutas de edificar a menos de 30 (trinta) metros das margens do rio Sucuriú e implantar atividade de piscicultura e drenagem de nascente d’água, sem a competente licença legal.

O recorrente suscitou, como questão prejudicial de mérito, a ocorrência de prescrição, a ensejar a inexigibilidade do crédito público.

A prescrição da ação punitiva administrativa é regulada através do art. 1º da Lei nº 9.873/99, que estabelece:

Art. 1o  Prescreve em cinco anos a ação punitiva da Administração Pública Federal, direta e indireta, no exercício do poder de polícia, objetivando apurar infração à legislação em vigor, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado.

§ 1o  Incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho, cujos autos serão arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada, sem prejuízo da apuração da responsabilidade funcional decorrente da paralisação, se for o caso.

§ 2o  Quando o fato objeto da ação punitiva da Administração também constituir crime, a prescrição reger-se-á pelo prazo previsto na lei penal.

Sobre o tema, o C. Superior Tribunal de Justiça - STJ já definiu que: 

“ADMINISTRATIVO. EXECUÇÃO FISCAL. MULTA ADMINISTRATIVA. INFRAÇÃO À LEGISLAÇÃO DO MEIO AMBIENTE. PRESCRIÇÃO. SUCESSÃO LEGISLATIVA. LEI 9.873/99. PRAZO DECADENCIAL. OBSERVÂNCIA. RECURSO ESPECIAL SUBMETIDO AO RITO DO ART. 543-C DO CPC E À RESOLUÇÃO STJ N.º 08/2008. 

1. O Ibama lavrou auto de infração contra o recorrido, aplicando-lhe multa no valor de R$ 3.628,80 (três mil e seiscentos e vinte e oito reais e oitenta centavos), por contrariedade às regras de defesa do meio ambiente. O ato infracional foi cometido no ano de 2000 e, nesse mesmo ano, precisamente em 18.10.00, foi o crédito inscrito em Dívida Ativa, tendo sido a execução proposta em 21.5.07. 2. A questão debatida nos autos é, apenas em parte, coincidente com a veiculada no REsp 1.112.577/SP, também de minha relatoria e já julgado sob o regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ n.º 08/2008. Neste caso particular, a multa foi aplicada pelo Ibama, entidade federal de fiscalização e controle do meio ambiente, sendo possível discutir a incidência da Lei 9.873, de 23 de novembro de 1999, com os acréscimos da Lei 11.941, de 27 de maio de 2009. No outro processo anterior, a multa decorria do poder de polícia ambiental exercido por entidade vinculada ao Estado de São Paulo, em que não seria pertinente a discussão sobre essas duas leis federais. 3. A jurisprudência desta Corte preconiza que o prazo para a cobrança da multa aplicada em virtude de infração administrativa ao meio ambiente é de cinco anos, nos termos do Decreto n.º 20.910/32, aplicável por isonomia por falta de regra específica para regular esse prazo prescricional. 4. Embora esteja sedimentada a orientação de que o prazo prescricional do art. 1° do Decreto 20.910/32 – e não os do Código Civil – aplicam-se às relações regidas pelo Direito Público, o caso dos autos comporta exame à luz das disposições contidas na Lei 9.873, de 23 de novembro de 1999, com os acréscimos da Lei 11.941, de 27 de maio de 2009. 5. A Lei 9.873/99, no art. 1º, estabeleceu prazo de cinco anos para que a Administração Pública Federal, direta ou indireta, no exercício do Poder de Polícia, apure o cometimento de infração à legislação em vigor, prazo que deve ser contado da data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado a infração. 6. Esse dispositivo estabeleceu, em verdade, prazo para a constituição do crédito, e não para a cobrança judicial do crédito inadimplido. Com efeito, a Lei 11.941, de 27 de maio de 2009, acrescentou o art. 1º-A à Lei 9.873/99, prevendo, expressamente, prazo de cinco anos para a cobrança do crédito decorrente de infração à legislação em vigor, a par do prazo também quinquenal previsto no art. 1º desta Lei para a apuração da infração e constituição do respectivo crédito. 7. Antes da Medida Provisória 1.708, de 30 de junho de 1998, posteriormente convertida na Lei 9.873/99, não existia prazo decadencial para o exercício do poder de polícia por parte da Administração Pública Federal. Assim, a penalidade acaso aplicada sujeitava-se apenas ao prazo prescricional de cinco anos, segundo a jurisprudência desta Corte, em face da aplicação analógica do art. 1º do Decreto 20.910/32. 8. A infração em exame foi cometida no ano de 2000, quando já em vigor a Lei 9.873/99, devendo ser aplicado o art. 1º, o qual fixa prazo à Administração Pública Federal para, no exercício do poder de polícia, apurar a infração à legislação em vigor e constituir o crédito decorrente da multa aplicada, o que foi feito, já que o crédito foi inscrito em Dívida Ativa em 18 de outubro de 2000. 9. A partir da constituição definitiva do crédito, ocorrida no próprio ano de 2000, computam-se mais cinco anos para sua cobrança judicial. Esse prazo, portanto, venceu no ano de 2005, mas a execução foi proposta apenas em 21 de maio de 2007, quando já operada a prescrição. Deve, pois, ser mantido o acórdão impugnado, ainda que por fundamentos diversos. 10. Recurso especial não provido. Acórdão sujeito ao art. 543-C do CPC e à Resolução STJ n.º 08/2008.”

(STJ, REsp nº , Primeira Seção, Rel. Min. Castro Meira, j. em 24/03/2010, DJE em 06/04/2010) - grifos nossos. 

Nota-se, assim, que o termo inicial para contagem do lapso temporal para a constituição do crédito decorrente da sanção de multa (que a lei denomina prescrição) é a data da prática do ato ilícito ou, no caso de infração permanente, o dia em que tiver cessado sua ocorrência. Uma vez lavrado o auto de infração enquanto ainda persistia o ilícito, resta afastada a tese de prescrição da ação punitiva.

Cumpre registrar, ainda, que em vistoria realizada no local em 07/11/2012, após a lavratura do auto infracional, constatou-se a persistência das irregularidades (ID 259932146 - págs. 90/100), fato que corrobora a conclusão no sentido da não verificação da prescrição punitiva. 

Importa ressaltar, por oportuno que a multa por infração ambiental não tem caráter compensatório. Portanto,  não atua como sucedâneo da obrigação de reparar o dano. Sua natureza é punitiva, podendo reincidir em caso de persistência da ofensa ao meio ambiente e da omissão contumaz do responsável pela respectiva reparação, de modo que multa anterior não constitui empecilho a uma nova autuação.

Quanto ao prazo para o ajuizamento da ação executiva, fixa o art. 1º-A da Lei nº 9.873/99 que será de 05 (cinco) anos, contados da constituição definitiva do crédito, nos seguintes termos:

Art. 1o-A.  Constituído definitivamente o crédito não tributário, após o término regular do processo administrativo, prescreve em 5 (cinco) anos a ação de execução da administração pública federal relativa a crédito decorrente da aplicação de multa por infração à legislação em vigor. 

É também nesse sentido o teor da súmula 467 do STJ: Prescreve em cinco anos, contados do término do processo administrativo, a pretensão da Administração Pública de promover a execução da multa por infração ambiental.”

No presente caso, após regular processo administrativo, sobreveio decisão definitiva pela aplicação de multa em 16/03/2016 (ID 259932147 - pág. 103/105). O recorrente foi devidamente notificado da decisão pelo recolhimento da multa, com vencimento em 22/04/2016 (ID 259932147 - pág. 113). Considerando tal data como o início da contagem do lapso quinquenal para a propositura da ação judicial, bem como o ajuizamento da execução fiscal (processo nº 0000540-54.2017.4.03.6007) em 05/10/2017, com citação válida em 23/07/2018 (ID 16765718 - pág. 21 - execução fiscal nº 0000540-54.2017.4.03.6007), há de se concluir pela tempestividade da ação executiva, já que intentada dentro do prazo legal. 

Resta afastada, assim, a tese do recorrente no sentido de transcurso de lapso temporal superior ao limite legal entre o auto de infração e o ajuizamento da execução fiscal. Ademais, destaco que o auto de infração lavrado contra o antigo proprietário do imóvel em questão não deve ser considerado para fins de contagem de prazos neste processo, eis que se refere a sujeito distinto e tem como objeto infrações anteriores às ora apuradas.Ultrapassada a questão prejudicial de mérito, passo ao exame da tese acerca da ausência de provas para lavratura do auto de infração nº 567.874, arguida pela parte em suas razões de apelação, com vistas a invalidar o ato de fiscalização.

Conforme já enfrentado nesta fundamentação, o auto infracional embasou-se em diligências empreendidas pela autarquia federal junto ao local dos fatos. O conjunto probatório é farto, demonstrando de modo inequívoco a prática de ilícitos administrativos imputados ao recorrente. Os Laudos de Vistoria nº 002/2010 e nº 117/2012 são claros ao apontar para a existência de edificação em contrariedade com as normas ambientais, assim como para a presença de instalações de piscicultura e drenagem de nascente sem as respectivas licenças ambientais  (ID 259932146 - págs. 12/18 e 90/100).

Além disso, a responsabilidade pelas infrações ambientais sob análise foi apurada em processo administrativo, oportunidade em que o apelante exerceu o contraditório e apresentou as mesmas teses defensivas ora debatidas. Naquela ocasião, a autoridade pública entendeu por sua responsabilização, com base nos seguintes fundamentos (ID 259932147 - págs. 103/104): 

“Passo a analisar. 

a) Conforme Relatório de Vistoria Técnica nº 117/2012-DITEC/SUPES/IBAMA/MS (fls. 45/50), verifica-se que a atividade prevista no PRAD, de recuperação da área de Preservação Permanente, não foi executada. Igualmente, em que pese a atividade de piscicultura não tenha sido implantada, não foi apresentado o licenciamento da atividade de drenagem de nascente, que continua sendo realizada na propriedade sem a devida autorização ambiental, restando caracterizada a conduta tipificada pelo art. 66 do Decreto 6.514/2008.

b) A teor do art. 70 da Lei 9.605/98, bem como do art. 2º do Decreto 6.514/2008, não há restrição quanto à responsabilização pela infração administrativa ambiental, devendo ser imputada a qualquer um que provoque o dano ambiental ou deixe de impedi-lo, como deveria ter agido o proprietário da área. 

c) Ressalte-se que o próprio recorrente cita que a responsabilidade ambiental de reparar o dano se estende a quem se omitir ou permitir a continuidade da prática infracional, impedindo que a área se regenere. Assim, considerando que a drenagem de nascente continua funcionando sem o respectivo licenciamento, cabe a responsabilização do atual proprietário. 

d) Não foram trazidos aos autos provas da celebração do Termo de Compromisso e Ajustamento de Conduta com o Ministério Público mencionado pela defesa, tampouco prova da recuperação da área. E ainda que fosse feito, vale dizer que as esferas administrativa e cível são distintas, de modo que tais fatos não afastam a obrigação da autuada de funcionar portando a licença ambiental, igualmente, não possuem caráter substitutivo ao referido instrumento autorizativo. Portanto, cabível a manutenção da autuação.”

Nota-se, assim, a descrição minuciosa das condutas do recorrente, não havendo que se falar em nulidade por ausência de provas para a aplicação de penalidade. 

Nesse ponto, registro que a previsão de ilícitos administrativos ambientais e sua respectiva reprimenda constam do texto da Lei de Crimes Ambientais - Lei nº 9.605/98, in verbis

Art. 70. Considera-se infração administrativa ambiental toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente.

§ 1º São autoridades competentes para lavrar auto de infração ambiental e instaurar processo administrativo os funcionários de órgãos ambientais integrantes do Sistema Nacional de Meio Ambiente - SISNAMA, designados para as atividades de fiscalização, bem como os agentes das Capitanias dos Portos, do Ministério da Marinha.

§ 2º Qualquer pessoa, constatando infração ambiental, poderá dirigir representação às autoridades relacionadas no parágrafo anterior, para efeito do exercício do seu poder de polícia.

§ 3º A autoridade ambiental que tiver conhecimento de infração ambiental é obrigada a promover a sua apuração imediata, mediante processo administrativo próprio, sob pena de co-responsabilidade.

§ 4º As infrações ambientais são apuradas em processo administrativo próprio, assegurado o direito de ampla defesa e o contraditório, observadas as disposições desta Lei.

(...)

Art. 72. As infrações administrativas são punidas com as seguintes sanções, observado o disposto no art. 6º:

I - advertência;

II - multa simples;

III - multa diária;

(...)

§ 1º Se o infrator cometer, simultaneamente, duas ou mais infrações, ser-lhe-ão aplicadas, cumulativamente, as sanções a elas cominadas.

§ 2º A advertência será aplicada pela inobservância das disposições desta Lei e da legislação em vigor, ou de preceitos regulamentares, sem prejuízo das demais sanções previstas neste artigo.

§ 3º A multa simples será aplicada sempre que o agente, por negligência ou dolo:

I - advertido por irregularidades que tenham sido praticadas, deixar de saná-las, no prazo assinalado por órgão competente do SISNAMA ou pela Capitania dos Portos, do Ministério da Marinha;

II - opuser embaraço à fiscalização dos órgãos do SISNAMA ou da Capitania dos Portos, do Ministério da Marinha.

§ 4° A multa simples pode ser convertida em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente.

§ 5º A multa diária será aplicada sempre que o cometimento da infração se prolongar no tempo.

É no mesmo sentido a regra do art. 2º do Decreto nº 6.514/2008:

Art. 2o  Considera-se infração administrativa ambiental, toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente, conforme o disposto na Seção III deste Capítulo.

O mesmo diploma normativo especifica as infrações verificadas neste caso concreto. Vejamos:

Art. 66.  Construir, reformar, ampliar, instalar ou fazer funcionar estabelecimentos, atividades, obras ou serviços utilizadores de recursos ambientais, considerados efetiva ou potencialmente poluidores, sem licença ou autorização dos órgãos ambientais competentes, em desacordo com a licença obtida ou contrariando as normas legais e regulamentos pertinentes:

Multa de R$ 500,00 (quinhentos reais) a R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais).

As condutas descritas e apuradas no decorrer do processo administrado nº 02014.000346/2011-45 (ID 259932146) amoldam-se às previsões normativas acima transcritas. Desse modo, presente a comprovação da materialidade e da autoria de infrações legalmente previstas, entendo pela existência de elementos suficientes a embasar a aplicação de sanção pecuniária.

Por fim, é descabido o pedido de redução do montante fixado a título de multa. A quantia original de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) (ID 259932147 - pág. 119) encontra-se dentro dos parâmetros legais e é proporcional ao ilícito cometido de forma permanente pelo recorrente. Diante disso, não cabe ao Poder Judiciário adentrar o mérito administrativo para desconstituir ato válido, eficaz e exigível. 

É nesse sentido o entendimento desta Terceira Turma:

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR – ANS. PODER DE POLÍCIA. IMPOSIÇÃO DE PENALIDADE ADMINISTRATIVA. OBSERVÂNCIA DOS PARÂMETROS LEGAIS. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. DISCRICIONARIEDADE. JUROS MORATÓRIOS DESDE O VENCIMENTO ORIGINAL.

1. A questão posta nos autos diz respeito à exigibilidade de sanção administrativa imposta pela Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, no exercício de seu poder de polícia.

2. As agências reguladoras são autarquias especiais, dotadas de alto grau de especialização técnica e autonomia funcional, decisória, administrativa e financeira, concebidas com finalidade de regulação e fiscalização de setores econômicos explorados pela iniciativa privada, de modo a assegurar a prevalência do interesse público, nos termos do art. 174 da Constituição Federal. A Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS é amplamente disciplinada pela Lei 13.848/19 e, de modo específico, pela Lei 9.961/00 de cujo art. 4º se extraem suas atribuições.

3. O C. Superior Tribunal de Justiça já assentou o entendimento de que as agências reguladoras, no exercício de seu poder normativo-regulamentar, possuem aptidão para tipificar condutas passíveis de punição, relacionadas à sua especificidade técnica, sem que isso caracterize ofensa ao princípio da legalidade.

4. Quanto aos autos de infração observa-se o devido preenchimentos dos requisitos elencados pela Resolução ANS 48/2003. Sobre o tema, registra-se que a eventual impugnação dos elementos constitutivos do auto de infração não comporta alegações genéricas destituídas de substrato probatório idôneo capaz de formar, no julgador, a convicção da nulidade arguida. Quanto aos processos administrativos não se observa falta de fundamentação em suas decisões. Pelo contrário, de forma precisa e objetiva, foram enfrentados todos os questionamentos pertinentes e relevantes ao deslinde da controvérsia. Ainda, ausente qualquer violação aos princípios do contraditório e ampla defesa, uma vez que foi oportunizada à parte diversas manifestações.

5. Acerca da prescrição, a infração administrativa remete à data de 14/01/2010 (ID 279797566). O auto de infração nº 33564 foi lavrado em 01/04/2010, com notificação da autuada (12/04/2010 – ID 279797602), oportunizando-lhe apresentação de defesa no processo administrativo, e interrupção, desde logo, o prazo decadencial quinquenal, nos termos do supracitado art. 1º e 2º, I, da Lei 9.873/99. Ressalta-se que, apesar do art. 1º e 2º da Lei 9.873/99 se referir à prescrição da ação punitiva, é evidente o caso de atecnia legislativa, tratando-se, em verdade, de prazo decadencial, uma vez que relacionado a direito potestativo da Administração Pública de constituir o crédito público.

6. Uma vez apresentada defesa, foi proferida decisão administrativa de primeira instância em 28/12/2010 (ID 279797602 – fls. 25/27). Após houve interposição de recurso administrativo em 04/02/2011, manutenção da decisão recorrida em sede de juízo de retratação, em 03/11/2013 (ID 279797602 – fls. 82/84) e julgamento definitivo do feito em 03/02/2014 (ID 279797602 – fl. 94). Inocorrente, portanto, prescrição intercorrente em processo administrativo, por não ter este permanecido paralisado por mais de 3 anos, pendente de julgamento ou despacho, nos termos do art. 1º, §1º, da Lei 9.873/99.

7. Somente após constituição definitiva do crédito, coincidente com a data de vencimento da multa administrativa, fala-se em início do prazo prescricional, que no caso se deu a partir de 31/03/2014. Ainda, houve inscrição em dívida ativa (em 24/09/2015), com suspensão do fluxo prescricional por 180 dias, nos termos do art. 2º, §3º, da Lei 6.830/80. Após, a execução fiscal foi ajuizada em 06/10/2015, com prolação de despacho citatório e efeito retroativo interruptivo da prescrição. Portanto, não se vislumbra ocorrência de prescrição.

8. A respeito da imputação, segundo art. 12 da Lei 9.656/98 e art. 77 da Resolução ANS 124/06, a negativa de cobertura de atendimento, previsto legalmente como de cobertura mínima referencial, por parte de operadora de planos de saúde, é infração administrativa sancionada com multa de R$ 80.000,00. No caso dos autos, a autuação teve origem em denúncia de beneficiário que relatou a não disponibilização de consulta com médico ortopedista.

9. A fixação e quantificação de penalidade pela Administração Pública, com fundamento no exercício de poder de polícia, é atividade sujeita à discricionariedade, competindo ao Poder Judiciário, tão somente, verificar a observância de parâmetros legais, sob pena de imiscuir-se indevidamente no mérito administrativo. As balizas fixadas pela Resolução Normativa ANS 124/06 buscam concretizar o princípio da individualização das sanções e a diretriz que impõe que as penalidades sejam arbitradas de acordo com a gravidade das infrações e com porte econômico do agente envolvido, prevista nos art. 25 e 27 Lei 9.656/98.

10. Não obstante a discussão administrativa sobre a exigibilidade de multa aplicada pela autuação, os respectivos encargos moratórios são devidos desde o vencimento do prazo original de pagamento, notadamente porque a interposição de recurso administrativo não tem aptidão de alterar a data inicial de vencimento do crédito.

11. Apelação improvida.

(TRF3, ApCiv nº 5004865-39.2020.4.03.6182, 3ª Turma, Rel. Des. Federal CONSUELO YATSUDA MOROMIZATO YOSHIDA, j. em 18/12/2023, DJE em 20/12/2023) - grifos nossos. 

Considerando o arcabouço legal e jurisprudencial a permear o caso concreto, concluo pela exigibilidade da sanção imposta, devendo ser mantida a sentença em seus exatos termos. 

Ante o exposto, nego provimento ao recurso de apelação. 

É o voto. 

 

 

 



E M E N T A

 

APELAÇÃO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. INFRAÇÃO AMBIENTAL. MULTA. PRESCRIÇÃO. AUSÊNCIA. INFRAÇÃO PERMANENTE. EXECUÇÃO FISCAL INTENTADA NO PRAZO LEGAL. NULIDADE DO AUTO DE INFRAÇÃO. INOCORRÊNCIA. APURAÇÃO REGULAR EM PROCESSO ADMINISTRATIVO. RECURSO DESPROVIDO. 

- Trata-se de apelação que discute a ocorrência de prescrição da pretensão de cobrança de sanção administrativa de multa, bem como eventual nulidade de auto infração por ausência de provas e diminuição pela via judicial da penalidade imposta administrativamente.

- A prescrição da ação punitiva decorrente de infração administrativa ambiental é regulada através do art. 1º da Lei nº 9.873/99, que fixa o prazo de cinco anos para o exercício da pretensão, contados da prática do ato ou de sua cessação, quando permanente. Jurisprudência do STJ a corroborar o texto legal. 

- No caso, o ilícito caracteriza-se como permanente, fato que afasta a prescrição punitiva, eis que o auto de infração foi lavrado enquanto ainda persistia sua ocorrência. 

- A multa por infração ambiental não tem caráter compensatório. Portanto,  não atua como sucedâneo da obrigação de reparar o dano. Sua natureza é punitiva, podendo reincidir em caso de persistência da ofensa ao meio ambiente e da omissão contumaz do responsável pela respectiva reparação, de modo que multa anterior não constitui empecilho a uma nova autuação.

- O prazo quinquenal para ajuizamento da respectiva execução fiscal, na forma do art. 1º-A da Lei nº 9.873/99 também foi observado, eis que ausente o transcurso de mais de cinco anos entre o término do processo administrativo, com o notificação do recorrente para pagamento da multa, e o ajuizamento da ação. 

- O auto de infração encontra respaldo em vasto conjunto probatório anexado aos autos. A materialidade e a autoria dos ilícitos foram apuradas em processo administrativo, com a garantia do contraditório e da ampla defesa. Afastada, portanto, a alegação de nulidade do ato administrativo por ausência de elementos de prova da infração. 

- Não cabe ao Poder Judiciário adentrar o mérito administrativo para alterar a sanção imposta no exercício do poder de polícia ambiental. Entendimento desta Terceira Turma. 

- Multa que se encontra dentro dos parâmetros legais e é proporcional aos ilícitos apurados. 

- Recurso de apelação desprovido. 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.