Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5003080-72.2017.4.03.6109

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

APELANTE: CONSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM DE SAO PAULO

Advogados do(a) APELANTE: FERNANDO HENRIQUE LEITE VIEIRA - SP218430-A, GIOVANNA COLOMBA CALIXTO DE CAMARGO - SP205514-A, JAMILLE DE JESUS MATTISEN - SP277783-A

APELADO: CASA DE SAUDE E MATERNIDADE SANTA FILOMENA SA

Advogados do(a) APELADO: DENISE VIANA NONAKA ALIENDE RIBEIRO - SP84482-A, EDGAR TROPPMAIR - SP104702-A, VICENTE JOSE CLARO - SP195617-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5003080-72.2017.4.03.6109

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

APELANTE: CONSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM DE SAO PAULO

Advogados do(a) APELANTE: FERNANDO HENRIQUE LEITE VIEIRA - SP218430-A, GIOVANNA COLOMBA CALIXTO DE CAMARGO - SP205514-A, JAMILLE DE JESUS MATTISEN - SP277783-A

APELADO: CASA DE SAUDE E MATERNIDADE SANTA FILOMENA SA

Advogados do(a) APELADO: DENISE VIANA NONAKA ALIENDE RIBEIRO - SP84482-A, EDGAR TROPPMAIR - SP104702-A, VICENTE JOSE CLARO - SP195617-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS CALIXTO (RELATOR): Trata-se de ação civil pública ajuizada pelo CONSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM DE SAO PAULO contra a CASA DE SAUDE E MATERNIDADE SANTA FILOMENA S/A.

Narra a petição inicial que durante fiscalização realizada no hospital em 14.06.2017 constatou “que não há Enfermeiro para supervisionar as atividades dos Técnicos de Enfermagem na Unidade de Terapia Intensiva, localizado no 2º andar, bem como no Pronto Atendimento”. Afirma que a obrigatoriedade de se manter profissional de enfermagem com nível de graduação decorre da Lei 7.498/86 e que a ausência deste profissional caracteriza afronta direta ao direito fundamental à saúde. Postula a concessão da tutela de urgência e, ao final, a procedência do pedido para que a Santa Casa mantenha um enfermeiro coordenador da equipe de enfermagem e seu substituto, além de um enfermeiro assistencial exclusivo para cada 10 leitos em cada turno da Unidade de Terapia Intensiva, bem como um enfermeiro assistencial em cada turno do Pronto Atendimento.

Atribuiu à causa o valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) em 09 de outubro de 2017 – id 257084285.

A análise do pedido de tutela de urgência foi diferida para após a realização de audiência – id 257084293.

Audiência realizada, não houve composição entre as partes – id 257084312.

Citada, a ré apresentou contestação – id 257084316.

Réplica do autor no id 257084440.

Audiência de instrução realizada em 28 de agosto de 2019 – id 257084477.

Alegações finais do autor no id 257084495 e do réu no id 257084497.

Por meio da sentença de id 257084501 o juízo, com fundamento no art. 487, I, do CPC, julgou improcedente o pedido e condenou a parte autora no pagamento de honorários advocatícios que fixou em 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa. Submeteu a sentença ao reexame necessário.

Apela o CONSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM DE SAO PAULO (id 257084505) alegando, em síntese, que o Supremo Tribunal Federal já assentou a orientação de que o COREN tem competência para fiscalizar as instituições de saúde que não apresentam profissionais habilitados para o exercício da enfermagem. Diz que os serviços de saúde possuem relevância pública e se sujeitam à regulamentação, fiscalização e controle pelo Poder Público e que lhe compete, pela Lei 5.905/73, fiscalizar e disciplinar o exercício profissional e, neste desiderato, lhe compete ajuizar ação para obrigar as casas de saúde a manter enfermeiros durante todo o período de funcionamento. Pondera que a Lei nº 7.498/86, regulamentada pelo Decreto nº 94.406/87, estabelece que as atividades de enfermagem, quando exercidas em instituições de saúde, públicas e privadas, e em programas de saúde, somente podem ser desempenhadas sob orientação e supervisão do enfermeiro, competindo-lhe privativamente a direção do órgão de enfermagem e a chefia de serviço e de unidade de enfermagem. Afirma que em sede de ação civil pública não são devidos honorários advocatícios, salvo comprovada má-fé, a qual não se evidenciou nestes autos. Pleiteia a antecipação da tutela recursal.

Contrarrazões de recurso apresentadas no id 257084509.

Processado o recurso, e por força do reexame necessário, subiram os autos a esta Corte.

O Ministério Público Federal manifestou-se como custos legis no id 258083844 pela confirmação da sentença.

Os autos vieram a mim redistribuídos por sorteio, em razão de criação da unidade judiciária, em 11.09.2023.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 


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3ª Turma
 

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APELANTE: CONSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM DE SAO PAULO

Advogados do(a) APELANTE: FERNANDO HENRIQUE LEITE VIEIRA - SP218430-A, GIOVANNA COLOMBA CALIXTO DE CAMARGO - SP205514-A, JAMILLE DE JESUS MATTISEN - SP277783-A

APELADO: CASA DE SAUDE E MATERNIDADE SANTA FILOMENA SA

Advogados do(a) APELADO: DENISE VIANA NONAKA ALIENDE RIBEIRO - SP84482-A, EDGAR TROPPMAIR - SP104702-A, VICENTE JOSE CLARO - SP195617-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

 

 

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS CALIXTO (RELATOR):

Trata-se de apelação e de remessa oficial interpostas contra sentença que julgou improcedente a ação civil pública ajuizada pelo CONSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM DE SAO PAULO contra a CASA DE SAUDE E MATERNIDADE SANTA FILOMENA S/A.

O autor da ação e ora apelante, CONSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM DE SAO PAULO, de acordo com o art. 1º da Lei nº 5.905/73, é autarquia vinculada ao Ministério do Trabalho e Previdência Social, constituindo-se, na forma do seu art. 2º, em órgão disciplinador do exercício da profissão de enfermeiro e das demais profissões compreendidas nos serviços de enfermagem.

Dentre as obrigações legais concedidas ao COREN, pela pertinência temática com o objeto desta lide, destacam-se:

Art 15. Compete aos Conselhos Regionais:

(...)

Il - disciplinar e fiscalizar o exercício profissional, observadas as diretrizes gerais do Conselho Federal;

III - fazer executar as instruções e provimentos do Conselho Federal;

A Lei nº 7.498/86, por sua vez, ao regulamentar o exercício da enfermagem, em seus artigos 11, 12 e 13 estabeleceu as atribuições relativas a cada um dos profissionais de enfermagem, a saber o enfermeiro, o técnico de enfermagem e o auxiliar de enfermagem. Consignou a lei, ainda, que as atividades dos técnicos e auxiliares, quando exercidas em instituições de saúde, públicas e privadas, e em programas de saúde, devem ser desempenhadas sob supervisão e fiscalização de um enfermeiro (art. 15).

Parece óbvio, portanto, que a presença de enfermeiro é imprescindível para que os demais profissionais da área de enfermagem possam desenvolver as suas funções.

E esta presença deve se verificar durante todo o período de funcionamento da instituição de saúde, tendo em vista que as atividades de orientação e supervisão não podem ser exercidas à distância, ainda mais quando se trata de assunto tão delicado como a saúde do paciente.

Tal exigência se deve à circunstância de possuir o enfermeiro, profissional diplomado, melhor capacitação técnica para assegurar o bom desempenho de tarefas próprias da enfermagem.

No entanto, nenhuma das leis anteriormente citadas mencionam a quantidade de enfermeiros que um hospital ou uma santa casa de misericórdia devem manter. Esta exigência somente foi instituída por meio de ato normativo da lavra do Conselho Federal de Enfermagem (COFEN).

Na época dos fatos, a Resolução COFEN nº 543/2017 estabelecia os parâmetros mínimos para a quantidade de profissionais da área de enfermagem que deveria haver nos hospitais. Todavia, é sabido, que no âmbito do direito administrativo a resolução é um ato normativo expedido por autoridades do Poder Executivo, do Poder Judiciário ou do Poder Legislativo, com o propósito de disciplinar matérias específicas. Apesar do conteúdo, não se trata de espécie normativa capaz de inovar o ordenamento jurídico criando direitos ou deveres para os administrados que não se encontrem previstos em uma lei.

A Constituição Federal reservou à lei, stricto sensu, a possibilidade de criar obrigações (art. 5º, II), donde se torna obrigatório concluir que a resolução do Conselho Federal de Enfermagem, por mais bem-intencionada que seja, não pode se sobrepor à cláusula pétrea contida no texto maior.

Nesse sentido, aliás, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça:

ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. EXERCÍCIO DE CARGO POR DESIGNAÇÃO. PAGAMENTO DE DIFERENÇA SALARIAL. PROVIMENTO APENAS POR PROMOÇÃO VERTICAL E MERECIMENTO. LEI ESTADUAL N. 13.467/2000 E RESOLUÇÃO N. 367/2001-TJ/MG. DIREITO LÍQUIDO E CERTO. INEXISTÊNCIA.

1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que "(...) às portarias, regulamentos, decretos e instruções normativas não é dado inovar a ordem jurídica, mas apenas conferir executoriedade às leis, nos estritos limites estabelecidos por elas" (REsp 872.169/RS, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, DJe 13/5/2009).

2. Inexistência de direito líquido e certo à percepção de vencimentos de acordo com o padrão PJ-64 (depois alterado para PJ-70), uma vez que o art. 2º, inc. I, da Lei Estadual n. 13.467/2000 estabelece o preenchimento dos cargos de Oficial de Apoio Judicial mediante a promoção vertical e merecimento, critério esse que foi respeitado pelo art. 51 da Resolução n. 367/2001-TJ/MG.

3. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg no RMS n. 17.920/MG, relator Ministro Og Fernandes, Sexta Turma, julgado em 16/5/2013, DJe de 28/5/2013.)

 

ADMINISTRATIVO - EXAME DE ORDEM - DEMONSTRAÇÃO DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO - MATÉRIA FÁTICA - SÚMULA 7 - DOMICÍLIO NA ÁREA DA SECCIONAL CUJA INSCRIÇÃO SE PRETENDE - REQUISITO NÃO EXIGIDO PELA LEI N. 8.906/94 - LIMITES DO PODER REGULAMENTAR - IMPOSSIBILIDADE DE INOVAÇÃO DA ORDEM JURÍDICA.

1. Aferir se o agravado, quando da interposição do mandado de segurança, obteve êxito em comprovar de plano o direito pleiteado, demandaria o reexame do contexto fático-probatório dos autos, o que é defeso a este Tribunal em vista do óbice da Súmula 7/STJ.

2. A competência privativa dos Conselhos Seccionais da OAB, para editar o regimento interno e suas resoluções, não é ilimitada nem deve ser interpretada literalmente, porquanto esses órgãos estão subordinados à lei e não possuem poderes legislativos, ou seja, não podem criar normatividade que inove a ordem jurídica.

3. A Lei n. 8.906/94 não exige a comprovação de domicílio na área da seccional para fins de inscrição como advogado. Ao impor esse requisito, a OAB inovou a ordem jurídica com a criação de vedações e obrigações não previstas em lei.

Agravo regimental improvido.

(AgRg no REsp n. 1.065.727/PR, relator Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 16/6/2009, DJe de 29/6/2009.)

Não é outro senão este também o entendimento consolidado no âmbito desta E. Corte Federal, inclusive em processos envolvendo a mesma questão aqui discutida. Confira-se:

APELAÇÃO EM AÇÃO ORDINÁRIA. ADMINISTRATIVO. IMPOSIÇÃO DE NÚMERO MÍNIMO DE ENFERMEIROS. RESOLUÇÃO COFEN 543/17. ILEGALIDADE. RECURSO DESPROVIDO, COM MAJORAÇÃO DA HONORÁRIA DEVIDA.

Não há, dentre as competências do conselho de enfermagem, a de estipular número mínimo de enfermeiros em estabelecimentos de saúde, conforme delimitado no art. 8º da Lei 5.905/73 e na Lei 7.498/96, assumindo o dimensionamento previsto em suas normas caráter orientador, e não impositivo. Precedentes (p. ex.: AI 5017350-22.2022.4.03.0000 / TRF3 – Sexta Turma / Des. Fed. LUIS ANTONIO JOHONSOM DI SALVO / 25.02.2023).

(TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5021450-87.2021.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal LUIS ANTONIO JOHONSOM DI SALVO, julgado em 16/06/2023, DJEN DATA: 22/06/2023)

 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONSELHO PROFISSIONAL. RESOLUÇÃO COFEN 543/2017. NÚMERO MÍNIMO DE ENFERMEIROS. ATENDIMENTO EM HOSPITAL. INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. PRESENÇA DE ENFERMEIRO NO TRANSPORTE DE PACIENTES POR AMBULÂNCIA. TESE 1.024/STJ: DISPENSA NOS CASOS SEM RISCO DE MORTE OU URGÊNCIA. SISTEMATIZAÇÃO DA ASSISTÊNCIA DE ENFERMAGEM. FALTA DE AMPARO LEGAL E DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA. 

1. Sustentou a apelante que a Resolução COFEN 543/2017, que revogou a Resolução 293/2004 anterior e que estabelece “parâmetros para dimensionamento do quadro de profissionais de enfermagem nas instituições de saúde”, tem respaldo na Lei 7.498/1986, sobretudo nos artigos 11 a 15, que tratam das atribuições do enfermeiro, técnico e auxiliar de enfermagem, e no artigo 20, que especificamente dispõe que: “Os órgãos de pessoal da administração pública direta e indireta, federal, estadual, municipal, do Distrito Federal e dos Territórios observarão, no provimento de cargos e funções e na contratação de pessoal de enfermagem, de todos os graus, os preceitos desta lei”. Ocorre que a Lei 7.498/1986 e o respectivo decreto regulamentador (Decreto 94.406/1987) não fixam quantidade mínima de profissionais de enfermagem a atuar em hospitais, nem mesmo os parâmetros para definição de tal número. A Lei 5.905/1973, que dispõe sobre a criação dos Conselhos Federal e Regionais de Enfermagem e respectivas competências (artigo 15), tampouco reserva atribuição a respeito da matéria a órgãos de fiscalização profissional para efeito de legitimar o disposto na Resolução COFEN 543/2017, e na revogada Resolução COFEN 293/2004, e  assim permitir que, com base em atos internos e infralegais, sejam instituídas exigências a terceiros que não integram seus quadros de fiscalização. As Resoluções COFEN 293/2004 e 543/ 2017, portanto, no ponto tratado, extrapolaram o poder regulamentar, infringindo o princípio da legalidade.

2. No que se refere à presença de enfermeiro no transporte de pacientes por ambulância, já decidiu a Corte Superior, sob rito de recursos repetitivos (Tese 1.024/STJ: “A composição da tripulação das Ambulâncias de Suporte Básico - Tipo B e das Unidades de Suporte Básico de Vida Terrestre (USB) do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência - SAMU sem a presença de enfermeiro não ofende, mas sim concretiza, o que dispõem os artigos 11, 12, 13 e 15 da Lei n.º 7.498/86, que regulamenta o exercício da enfermagem”, grifamos), pela desnecessidade de tal exigência nas hipóteses que não envolvem risco de vida ou urgência (REsp 1.828.993, Rel. Min. OG FERNANDES, DJe de 20/8/2020). Na espécie, como bem reconheceu a sentença, neste ponto, “as testemunhas foram uníssonas em afirmar que os pacientes transportados pela ambulância do hospital requerido não são pacientes de risco, posto que, nesses casos, o transporte é feito pelo SAMU ou por ambulância própria do convênio médico do paciente. Os transportes realizados pela ambulância do próprio hospital requerido são aqueles simples, para mera realização de exames ou em situações que não são urgentes. Caso haja risco, o transporte não é feito pelo próprio hospital, inclusive porque, como mencionou a testemunha Carlos Henrique Veronezi, a ambulância do requerido é simples, não é das mais modernas”.

3. Quanto à implantação da Sistematização da Assistência de Enfermagem - SAE e elaboração da documentação respectiva para conferência do COREN/MS tampouco merece reforma a sentença, pois inexistente base legal para impor adoção de qualquer sistema, pois a Lei 7.498/1986, a propósito, apenas dispôs, no artigo 4º, que "A programação de enfermagem inclui a prescrição da assistência à enfermagem". Apesar da fundamentada a rejeição do pedido pela sentença, a apelação não tratou do tema, aludindo apenas à Resolução COFEN 293/2004, revogada pela 543/2017, quando esta própria expõe que a disciplina da implantação do SAE foi objeto não daquela mas de outra normatização (Resolução COFEN 358/2009), acerca da qual, porém, nada foi alegado pela apelante, assim demonstrando a deficiência na impugnação recursal. Cabe, no entanto, em face da remessa necessária, registrar a ilegalidade da resolução e da exigência imposta, em conformidade com orientação firmada na Corte, no sentido de que ato interno de conselho profissional, ainda que resolução de conselho federal, não pode atentar e ampliar o alcance da base legal instituída na disciplina do exercício e controle da atividade profissional, sobretudo no que pretenda impor obrigação e dever a terceiros, como se evidencia na espécie. Note-se, ademais, que se trata, no caso, de unidade hospitalar ligada à entidade filantrópica, a respaldar a conclusão de que imposição de custos e encargos sem a devida base legal compromete a eficácia da própria atividade social desenvolvida. 

4. Apelação e remessa oficial, tida por submetida, desprovidas.

(TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0004461-76.2016.4.03.6000, Rel. Desembargador Federal LUIS CARLOS HIROKI MUTA, julgado em 02/12/2022, DJEN DATA: 09/12/2022)

 

ADMINISTRATIVO. REEXAME NECESSÁRIO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM. CONTRATAÇÃO DE ENFERMEIRO. RESOLUÇÃO COFEN Nº 293/04. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL.

1. A sentença que julgar improcedente o pedido formulado em Ação Civil Pública está submetida à remessa oficial, conforme aplicação analógica do art. 19 da Lei nº 4.717/1965.

2. Segundo o Relatório nº 2036/28-09-2020, a fiscal do COREN/SP foi categórica ao apontar que “a necessidade de Técnicos de Enfermagem foi suprida”. Nestes termos, resta configurada a superveniente perda do interesse de agir.

3. Analisando as competências previstas no art. 8º da Lei nº 5.905/73, em nenhuma delas se localiza a possibilidade de o CONFEN obrigar que as entidades de saúde contratem enfermeiros em quantidade por ele estabelecida. Daí porque a Resolução nº 293/2004, em seu § 1º, do art. 1º, consigna que os parâmetros ali previstos são “referências para orientar os gestores e gerentes das instituições de saúde no planejamento, programação e priorização das ações de saúde a serem desenvolvidas”. Possui, portanto, natureza meramente indicativa, e não compulsória.

4. E nem poderia ser diferente, já que o inciso II, do art. 5º, da CF, é expresso ao consignar que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.

5. Mostra-se equivocada a pretensão da autarquia, uma vez que Resolução nº 293/2004 não possui força normativa para fundamentar a imposição de contratação de enfermeiros.

5. Reexame necessário não provido.

(TRF 3ª Região, 4ª Turma, RemNecCiv - REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL - 0002187-86.2014.4.03.6105, Rel. Desembargador Federal MARCELO MESQUITA SARAIVA, julgado em 22/06/2022, Intimação via sistema DATA: 24/06/2022)

 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. COREN/SP. QUANTITATIVO MÍNIMO DE PROFISSIONAIS DE ENFERMAGEM. COMPLEXO HOSPITALAR DO MANDAQUI. RESOLUÇÃO COFEN 293/04. DIRETRIZ PARA OS GESTORES EM SAÚDE. APELAÇÃO E REMESSA NECESSÁRIA NÃO PROVIDAS.

1. A ação de improbidade administrativa, a ação civil pública e a ação popular compõem o microssistema de tutela dos direitos difusos e coletivos, de modo que se aplica à sentença de improcedência prolatada com fundamento na Lei 7.347/85 o disposto no artigo 19 da Lei 4.717/65 (Lei de Ação Popular), por analogia.

2. Ainda que questões orçamentárias e de planejamento estratégico não possam ser obstáculos à concretização do direito à saúde, a improcedência do pedido deve ser mantida, por outros fundamentos.

3. A Resolução COFEN 293/2004, posteriormente revogada pelas Resoluções COFEN 527/2016 e 543/2017, foi editada a fim de regulamentar a Lei 7.498/1986, que define as atribuições dos enfermeiros, dos técnicos e dos auxiliares de enfermagem, mas que não estabelece qual seria o número mínimo desses profissionais em um hospital ou quais seriam os parâmetros para definição de tal número.

4. Não se insere dentre o rol de competências do Conselho Regional de Enfermagem (previsto no art. 15 da Lei 5.905/73) a de fiscalizar se o número de profissionais de enfermagem em cada hospital é suficiente ou não para a prestação dos serviços de enfermagem.

5. A norma contida na Resolução COFEN 293/2004 é mera diretriz para os gestores em saúde, e não de norma que imponha um comando obrigatório, sob pena de afronta ao princípio da legalidade e aos limites do poder regulamentar. Precedentes deste Tribunal.

6. Apelação e remessa necessária não providas. 

(TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0022554-49.2014.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal NELTON AGNALDO MORAES DOS SANTOS, julgado em 07/06/2021, Intimação via sistema DATA: 09/06/2021)

                                       

Destaco, a fim de corroborar a falta de impositividade da resolução expedida pelo COFEN, tramitar no Poder Legislativo Federal o Projeto de Lei (PL) nº 2.242/21, de autoria do Deputado Célio Studart (PV/CE), que tem por objeto promover alteração na Lei nº 7.498/86 a fim de nela incluir a obrigatoriedade de garantir o adequado dimensionamento de pessoal de enfermagem. Assim, de forma explícita reconhece-se a ausência de lei a respeito da matéria, a qual não pode, como já dito, ser disciplinada por ato normativo infralegal.

Ademais, é importante destacar que existem profissionais de enfermagem contratados e mantidos em tempo integral pela recorrida. Em sua contestação a CASA DE SAUDE E MATERNIDADE SANTA FILOMENA S/A comprovou documentalmente possuir 17 (dezessete) enfermeiros em seu quadro de funcionários (id 257084322). Nenhum elemento informativo, indiciário ou probatório, a cargo do Conselho autor da ação demonstra que o número de profissionais seja insuficiente para o bom préstimo dos serviços fornecidos pelo hospital. E por se tratar de ônus que lhe competia, nos termos do art. 373, I, do CPC, a manutenção da sentença quanto a este aspecto é de rigor.

 

Honorários advocatícios em ação civil pública.

Em razão da sucumbência, a sentença condenou a parte autora no pagamento de honorários advocatícios, estabelecidos em 20% (vinte por cento) sobre o valor atribuído à causa, corrigido monetariamente.

Pugna o apelante pelo afastamento dessa condenação sob o fundamento de que não são cabíveis honorários nas ações civis públicas.

Saliento, de início, que como a condenação aqui imposta refere-se a Conselho profissional, autarquia com patrimônio e receita próprias, não se aplica a suspensão do feito determinada pelo STJ quando da afetação do tema repetitivo nº 1177, o qual trata exclusivamente da condenação da União em verba honorária.

Pois bem, a Lei nº 7.347/85, no intuito de incentivar a proteção a bens e interesses difusos ou coletivos, assegurou ao jurisdicionado a isenção de custas, de honorários periciais e de honorários advocatícios, salvo, neste último caso, se agir com comprovada má-fé. Neste sentido, estatui o art. 18 da lei:

Art. 18. Nas ações de que trata esta lei, não haverá adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas, nem condenação da associação autora, salvo comprovada má-fé, em honorários de advogado, custas e despesas processuais

Na espécie não foi cogitada a atuação de má-fé da autora sucumbente, de modo que descabe a sua condenação em honorários advocatícios.

A propósito, colhe-se da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO COLETIVA AJUIZADA POR SINDICATO COMO SUBSTITUTO PROCESSUAL. IMPOSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. INCIDÊNCIA DO ART. 18 DA LEI 7.347/1985. ACÓRDÃO RECORRIDO EM DISSONÂNCIA DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.

 1. No enfrentamento da matéria, o Tribunal de origem lançou os seguintes fundamentos (fl. 312, e-STJ): "Por outro viés, no que tange à condenação em verba advocatícia, não socorre melhor sorte ao Instituto, pois a ação foi ajuizada como procedimento comum, conforme peça vestibular e reconhecida na sentença, aliás no próprio relatório do presente julgado estabelece isso: 'Estas apelações atacam sentença proferida em ação ordinária proposta pelo Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica e Profissional - Seção de São Vicente do Sul/RS, na condição de substituto processual, contra o Instituto Federal Farroupilha', portanto não se trata de ação civil pública, o que faz incidir os efeitos da sucumbência nos termos da lei de regência (art. 85 do CPC)."

 2. Por outro lado, em relação à ação coletiva, ajuizada pelo Sindicato como substituto processual, a jurisprudência do STJ tem dispensado o mesmo tratamento à Ação Civil Pública.

 3. Assim sendo, nos termos da jurisprudência do STJ, em ações coletivas, não é cabível a condenação do autor em honorários advocatícios sucumbenciais na forma do art. 18 da Lei 7.347/1985. O referido entendimento deve ser aplicado tanto para o autor - Ministério Público, entes públicos e demais legitimados para a propositura da Ação Civil Pública -, quanto para o réu, em obediência ao princípio da simetria.

 4. Agravo Interno não provido.

(AgInt no REsp n. 2.010.444/RS, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 28/11/2022, DJe de 13/12/2022.)

Portanto, neste ponto, há de ser provido o recurso.

 

Dispositivo.

Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação e ao reexame necessário, apenas para afastar a condenação em honorários advocatícios decorrentes da sucumbência.

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. REEXAME NECESSÁRIO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM DE SÃO PAULO. NÚMERO MÍNIMO DE PROFISSIONAIS A SER MANTIDO EM ESTABELECIMENTO DE SAÚDE. PREVISÃO CONTIDA EM RESOLUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE LEI EM SENTIDO ESTRITO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DESCABIMENTO. ART. 18 DA LEI 7.347/85. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA NEGADA.

– Dentre as obrigações atribuídas por lei ao COREN e ao COFEN, conselhos fiscalizadores da enfermagem, não há a de quantificar o número de profissionais de enfermagem a ser mantido nos estabelecimentos de saúde (hospitais e santas casas). A quantidade prevista em resolução não pode inovar o ordenamento jurídico e criar direitos ou obrigações para os administrados, sob pena de afrontar o art. 5º, II, da Constituição Federal. Precedentes do STJ e do TRF3.  

– Não se demonstrou que os 17 (dezessete) profissionais graduados em enfermagem mantidos pelo nosocômio, mais os técnicos e auxiliares, sejam insuficientes para o cumprimento das obrigações legalmente previstas.

– Nas ações civis públicas não há condenação do sucumbente em honorários advocatícios, salvo comprovado comportamento de má-fé. Inteligência do art. 18 da Lei 7.347/85.

– Apelação e remessa oficial parcialmente providas, apenas para afastar a condenação nas verbas de sucumbência.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, deu parcial provimento à apelação e à remessa oficial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.