Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003934-20.2022.4.03.6100

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

APELADO: ALLIANZ SEGUROS S/A

Advogados do(a) APELADO: CRISTIANA GESTEIRA COSTA PINTO DE CAMPOS - SP205396-A, FERNANDA DORNBUSCH FARIAS LOBO - SP218594-A, TATIANA PALMIERI KEHDI - SP188636-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003934-20.2022.4.03.6100

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

APELADO: ALLIANZ SEGUROS S/A

Advogados do(a) APELADO: CRISTIANA GESTEIRA COSTA PINTO DE CAMPOS - SP205396-A, FERNANDA DORNBUSCH FARIAS LOBO - SP218594-A, TATIANA PALMIERI KEHDI - SP188636-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

R E L A T Ó R I O

 

O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL DOUTOR CARLOS DELGADO (RELATOR):

 

Trata-se de apelação interposta pela UNIÃO FEDERAL, em ação declaratória proposta pela ALLIANZ SEGUROS S.A., objetivando o reconhecimento da inexigibilidade do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI, para incorporar ao seu patrimônio os salvados de veículo de segurada.

 

Em decisão interlocutória de 22/02/2022 (ID 258752051), foi deferida a antecipação da tutela jurisdicional, para não só autorizar a transferência do veículo da segurada à demandante, independentemente do recolhimento do IPI, como também para suspender a exigibilidade da exação até o julgamento definitivo desta demanda.

 

A r. sentença (ID 258752077), prolatada em 18/04/2022, julgou procedente a ação, para afastar o condicionamento da emissão de autorização de transferência dos salvados do veículo, para o nome da demandante, ao recolhimento do IPI cujo pagamento a segurada já havia sido dispensada por ocasião da aquisição do bem, nos termos da Lei n. 8.989/95. A União Federal ainda foi condenada a arcar com  os honorários advocatícios, arbitrados em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), e com as custas processuais.

 

Em suas razões recursais (ID 258752080), a UNIÃO FEDERAL pugna pela reforma do r. decisum, ao fundamento de que a isenção prevista na Lei n. 8.989/95 se restringe à aquisição de veículos por pessoas portadoras de deficiência e, portanto, não pode beneficiar a demandante. No mais, sustenta que a transferência do bem para a seguradora não observou a carência mínima fixada pelo artigo 2º da Lei n. 8.989/95, o que torna exigível a obrigação prevista no artigo 6º do mesmo diploma legal. Por fim, afirma que não houve baixa do veículo no DETRAN, em razão da sua absoluta inutilidade, de modo que a seguradora deve quitar o débito fiscal para se apropriar dos salvados do automóvel, nos termos do artigo 12, §1º, inciso II, da IN RFB n. 1769/2017.

 

Devidamente processado o recurso, com contrarrazões, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.

 

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003934-20.2022.4.03.6100

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

APELADO: ALLIANZ SEGUROS S/A

Advogados do(a) APELADO: CRISTIANA GESTEIRA COSTA PINTO DE CAMPOS - SP205396-A, FERNANDA DORNBUSCH FARIAS LOBO - SP218594-A, TATIANA PALMIERI KEHDI - SP188636-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

V O T O

 

O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL DOUTOR CARLOS DELGADO (RELATOR):

 

A controvérsia diz respeito à exigibilidade do imposto sobre produtos industrializados - IPI para autorizar a transferência dos salvados de veículo de pessoa portadora de deficiência, que é isenta do referido tributo, para a seguradora.

 

A isenção do IPI incidente na aquisição de automóveis, concedida às pessoas portadoras de deficiência, está prevista no artigo 1º da Lei n. 8.989/95, in verbis

 

"Art. 1º  Ficam isentos do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) os automóveis de passageiros de fabricação nacional, equipados com motor de cilindrada não superior a 2.000 cm³ (dois mil centímetros cúbicos), de, no mínimo, 4 (quatro) portas, inclusive a de acesso ao bagageiro, movidos a combustível de origem renovável, sistema reversível de combustão ou híbrido e elétricos, quando adquiridos por:                 (Redação dada pela Lei nº 13.755, de 2018

(…)

IV – pessoas portadoras de deficiência física, visual, mental severa ou profunda, ou autistas, diretamente ou por intermédio de seu representante legal;        (Redação dada pela Lei nº 10.690, de 16.6.2003)  (Vide ADI nº 30)" (g.n.)

 

Trata-se de benesse que objetiva facilitar a compra de veículos e, consequentemente, maximizar o direito à mobilidade de parcela vulnerável da população.

 

De início, limitou-se a fruição deste benefício fiscal por uma única vez, consoante o artigo 2º da Lei n. 8.989/95, em sua redação original. Entretanto, considerando que o automóvel é um bem cujo uso recorrente gera desgaste com o decurso do tempo, a partir de 30/12/1996, passou-se a estabelecer um prazo mínimo a ser observado pelo beneficiário, para gozar novamente da mesma isenção tributária quando da troca deste meio de transporte.

 

Esse prazo sofreu inúmeras alterações ao longo dos anos. 1) entre 30/12/1996 e 21/11/2005, ele foi fixado em 3 (três) anos, por força das Leis n. 9.317/96 e 10.690/2003; 2) entre 22/11/2005 e 28/02/2021, a Lei n. 11.196/2005 o reduziu para 2 (dois) anos; e 3) de 01/03/2021 a 14/07/2021, a Medida Provisória n. 1.034/21 o ampliou para 4 (quatro) anos. Em 15/07/2021, com a conversão da referida MP na Lei n. 14.183/21, o parágrafo único do artigo 2º da Lei n. 8.989/95 passou a estabelecer o prazo mínimo de 3 (três) anos, a fim de que a pessoa portadora de deficiência possa novamente adquirir um automóvel com isenção do IPI.

 

A fim de assegurar que a finalidade da liberalidade fiscal não seria subvertida, o legislador ainda estabeleceu que, em caso de revenda do veículo durante o biênio que sucedeu a aquisição do bem, a pessoa portadora de deficiência seria obrigada a recolher o valor do IPI dispensado quando da compra do bem, acrescido de multa e juros de mora, nos termos do artigo 6º da Lei n. 8.989/95, in verbis:  

 

"Art. 6º A alienação do veículo adquirido nos termos desta Lei que ocorrer no período de 2 (dois) anos, contado da data de sua aquisição, a pessoas que não satisfaçam as condições e os requisitos estabelecidos para a fruição da isenção acarretará o pagamento pelo alienante do tributo dispensado, atualizado na forma prevista na legislação tributária.     (Redação dada pela Lei nº 14.183, de 2021)   

Parágrafo único. A inobservância do disposto neste artigo sujeita ainda o alienante ao pagamento de multa e juros moratórios previstos na legislação em vigor para a hipótese de fraude ou falta de pagamento do imposto devido." (g.n.)

 

Cuida-se, portanto, de preceito legal que visa inibir o beneficiário de se utilizar da isenção para seu enriquecimento pessoal - mediante a alienação lucrativa do automóvel,

 

Do caso concreto.

 

Segundo a narrativa desenvolvida na inicial, a demandante firmou contrato de seguro automotivo com pessoa portadora de deficiência que usufruiu do benefício fiscal previsto na Lei n. 8.989/95 por ocasião da aquisição, em 05/02/2021, do veículo Volkswagen Fox Connect 1.6, quatro portas, automático, ano/modelo 2021, placa EKJ 4I98, RENAVAM 01256374587 e Chassi 9BWAB45Z1M4014734.

 

Em tal contrato, restou estabelecido o pagamento integral de indenização em caso de colisão, equivalente a 100% (cem por cento) da Tabela Fipe - a qual registra o preço de mercado praticado na comercialização do veículo -, desde que o custo dos reparos do automóvel supere 75% (setenta e cinco por cento) do valor da indenização.

 

Assim, em 17/12/2021, durante a vigência da relação contratual supramencionada, foi noticiada a ocorrência de colisão de veículos com perda total, que ensejou o pagamento integral da indenização à segurada e, consequentemente, deu à demandante o direito de se sub-rogar nos direitos sobre o salvado, inclusive com a incorporação da sucata do automóvel ao seu patrimônio, por força de cláusula do contrato de seguro.

 

A fim de corroborar essas alegações, foram anexados aos autos, entre outros, os seguintes documentos:

 

1 - apólice de seguro n. 5177202126310401192, emitida em 02/03/2021, em nome de Cristiane de Moura Freitas, referente ao veículo Volkswagen Fox Connect 1.6, quatro portas, automático, ano/modelo 2021, placa EKJ 4I98, RENAVAM 01256374587 e Chassi 9BWAB45Z1M4014734, na qual consta como limite máximo de indenização, em caso de colisão do automóvel, o valor equivalente a 100% (cem por cento) da Tabela Fipe (ID 258752019);

 

2 - nota fiscal de compra do veículo supramencionado, emitida em 05/02/2021, na qual está expressamente consignado que houve a fruição da isenção do IPI, nos termos da Lei n. 8.989/95 (ID 258752020);

 

3 - comunicação da segurada à demandante da ocorrência do sinistro em 17/12/2021 (ID 258752021);

 

4 - boletim de ocorrência relativo à colisão de veículos (ID 258752022);

 

5 - comprovante de pagamento da indenização feito pela demandante à segurada (ID 258752024).

 

O Fisco, contudo, se recusa a deferir a autorização para transferir o bem para o nome da demandante, sob a justificativa de que não houve o recolhimento do IPI cujo pagamento foi dispensado na época da aquisição do automóvel, com esteio nos artigos 2º e 6º da Lei n. 8.989/95 e na Instrução Normativa RFB n. 1.769/2017.

 

A tese, contudo, não comporta acolhimento.

 

A Instrução Normativa n. 1.769, editada pela Receita Federal em 19 de Dezembro de 2017, regulamentou a vedação à revenda do automóvel pelo beneficiário da isenção fiscal em seu artigo 12, in verbis:

 

"Art. 12. Não será exigido o IPI sobre as seguintes operações, por não configurarem alienação do veículo adquirido com isenção:

I - alienação fiduciária em garantia do pagamento de empréstimo contraído para aquisição do veículo;

II - retomada do veículo pelo credor fiduciário nas hipóteses previstas no parágrafo único do art. 1.368-B da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil; e

III - transferência de propriedade do veículo para a companhia seguradora quando, ocorrido o pagamento de indenização em decorrência de perda total por sinistro, furto ou roubo, o veículo for posteriormente recuperado." (g.n.)

 

Entretanto, no parágrafo 1º, inciso II, do mesmo artigo 12 da IN RFB 1.769/2017, a Administração Fazendária esclareceu que, caso a seguradora pretendesse incorporar o salvado do veículo ao seu patrimônio ou vendê-lo a terceiro, não poderia ser favorecida pela inexigibilidade do tributo. Eis a dicção do referido dispositivo regulamentar:

 

"Art. 12. Não será exigido o IPI sobre as seguintes operações, por não configurarem alienação do veículo adquirido com isenção:

(…)

§ 1º O disposto no caput não será aplicado se:

I - verificada a hipótese prevista no inciso II do caput, o proprietário fiduciário vender o veículo a terceiro que não cumpra os requisitos previstos nos arts. 2º e 3º; e

II - verificada a hipótese prevista no inciso III do caput, a companhia seguradora incorporar o veículo ao seu patrimônio ou ao de outra seguradora ou vendê-lo a terceiro que não cumpra os requisitos previstos nos arts. 2º e 3º.

§ 2º Nas hipóteses previstas nos incisos I e II do § 1º será considerada como data da venda ou da incorporação, para fins de cálculo do IPI, a data da nota fiscal de venda ou do documento que formalizar a incorporação do veículo ao patrimônio da companhia seguradora.

§ 3º Na hipótese prevista no inciso II do § 1º, ocorrendo a incorporação do veículo ao patrimônio da seguradora ou a sua transferência a pessoa que não satisfaça as condições para se beneficiar da isenção ou a outra empresa seguradora, antes de 2 (dois) anos da aquisição do veículo com isenção, será devido o IPI dispensado na aquisição, com incidência dos acréscimos legais devidos" (g.n.).

 

Percebe-se que o artigo 12, §3º, da IN RFB 1.769/2017, ao exigir o recolhimento do tributo na transferência do salvado (sucata) do automóvel para o nome da seguradora, inovou na ordem jurídica, já que tal hipótese de revogação do benefício fiscal não possui lastro no disposto na norma isentiva (Lei n. 8.989/95).

 

Ora, não se pode equiparar a alienação voluntária do bem, com a finalidade de obter lucro - que é o propósito da vedação consignada no artigo 6º da Lei n. 8.989/95 -, com a transferência do salvado do veículo feito pela pessoa portadora de deficiência à seguradora, por força de cláusula contratual, para o recebimento da indenização devida pelo sinistro.

 

Em tal transação, o titular da liberalidade fiscal apenas recompõe o prejuízo decorrente do imprevisto que lhe sobreveio.

 

Ademais, não seria razoável exigir do beneficiário da isenção que aguardasse o término do prazo de 2 (dois) anos, previsto no artigo 12, §3º, da IN RFB 1.769/2017, para acionar a seguradora e obter a cobertura do sinistro, sob pena de frustrar a proteção a evento futuro e incerto que se busca com a celebração do contrato de seguro.

 

Em decorrência, ante a ilegalidade de condicionar o recolhimento do IPI à concessão de autorização para transferir os salvados do veículo do beneficiário da isenção tributária para a seguradora, a manutenção da sentença de 1º grau é de rigor.

 

Este, aliás, foi o posicionamento adotado pelo C. Superior Tribunal de Justiça em caso análogo:

 

"PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA 284/STF. IPI. VEÍCULO UTILIZADO POR PROFISSIONAL TAXISTA. ISENÇÃO. ALIENAÇÃO EM PERÍODO INFERIOR AO ESTABELECIDO NA LEGISLAÇÃO. INCIDÊNCIA, RESSALVADA A HIPÓTESE EM QUE A TRANSFERÊNCIA DA PROPRIEDADE SE DÁ PARA O FIM DE INDENIZAÇÃO, PELA SEGURADORA, EM CASO DE SINISTRO QUE IMPLICA PERDA TOTAL DO BEM.

1. Não se conhece de Recurso Especial em relação a ofensa ao art. 535 do CPC quando a parte não aponta, de forma clara, o vício em que teria incorrido o acórdão impugnado. Aplicação, por analogia, da Súmula 284/STF.

2. Define o art. 6º da Lei 8.989/1995, em sua redação original, que perde o benefício da isenção do IPI o profissional motorista de táxi que o alienar, antes de três anos, a pessoas que não satisfaçam às condições e requisitos estabelecidos em legislação própria.

3. A suspensão do IPI, no ponto, tem finalidade extrafiscal, qual seja a de estimular os meios de transporte público - no caso, nas condições especificadas em lei, facilita-se a aquisição de veículo que é instrumento de trabalho do profissional taxista.

4. Cessa o benefício, contudo, se houver alienação antes do prazo definido na legislação tributária (originalmente, 3 anos;

atualmente, 2 anos). O objetivo é coibir a celebração de negócio jurídico que, em caráter comercial ou meramente civil, atraia escopo lucrativo.

5. Na hipótese dos autos, contudo, a situação é diversa. A transferência da propriedade (no caso, sucata) decorreu do cumprimento de cláusula contratual, requisito para o recorrido receber a indenização devida pela companhia de seguro, após acidente em evento que implicou perda total do automóvel.

6. Nesse contexto, ausente a intenção de utilizar a legislação tributária para fins de enriquecimento indevido, deve ser rejeitada a pretensão recursal.

7. Recurso Especial não provido."

(REsp n. 1.310.565/PB, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 21/8/2012, DJe de 3/9/2012.)

 

Tal entendimento possui forte ressonância nesta Corte Regional, conforme se infere dos seguintes precedentes recentíssimos que trago à colação:

 

"APELAÇÃO. DIREITO TRIBUTÁRIO. IPI. VEÍCULO SINISTRADO. AQUISIÇÃO COM ISENÇÃO PREVISTA NA LEI Nº 8.989/95. TRANSFERÊNCIA DA PROPRIEDADE À SEGURADORA. REQUISITO PARA RECEBIMENTO DA INDENIZAÇÃO. IPI INEXIGÍVEL. RECURSO DESPROVIDO.

1. É entendimento consolidado em nossa jurisprudência a inexigibilidade do IPI na transferência à seguradora dos salvados de veículo adquirido anteriormente com a isenção prevista na Lei nº 8.989/1995.

2. Na hipótese dos autos a situação é diversa daquela protegida pelo art. 6º da Lei nº 8.989/95, pois não houve alienação do veículo antes do prazo, e sim transferência do veículo sinistrado à seguradora, decorrente de cumprimento de cláusula contratual sem a qual o proprietário não receberia a indenização do seguro. Assim, o tributo não é exigível por ocasião da transferência à seguradora.

3. Recurso desprovido."

(TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5022193-97.2021.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal LUIS ANTONIO JOHONSOM DI SALVO, julgado em 25/02/2023, DJEN DATA: 02/03/2023)

 

"DIREITO TRIBUTÁRIO. ISENÇÃO DE IPI. LEI Nº 8.989/1995. SINISTRO. INDENIZAÇÃO INTEGRAL. AUSÊNCIA DE ALIENAÇÃO VOLUNTÁRIA.

1. A Lei nº 8.989/1995, posteriormente alterada, estabelece a isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI na aquisição de veículos automotores às pessoas portadoras de deficiência física, visual, auditiva e mental severa ou profunda e pessoas com transtorno de espectro autista, com o escopo de criar facilidades de locomoção para os indivíduos com necessidades especiais, em atendimento aos princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade.

2. A vedação contida na Lei nº 8.989/1995, que regulamenta a isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI, refere-se à alienação voluntária e à conduta de utilizar-se da legislação tributária para fins de enriquecimento indevido, situação esta que não se coaduna com a deparada nestes autos.

3. A transferência do veículo para o patrimônio da seguradora deu-se por força de contrato, a fim de poder efetivar o pagamento da indenização integral à segurada.

4. Ausente a intenção de utilizar a legislação tributária com o propósito de enriquecimento indevido, deve prevalecer a sentença que afastou a obrigatoriedade do recolhimento do Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI por parte da seguradora.

5. Remessa necessária e apelação da União Federal (Fazenda Nacional) improvidas. Pedido de majoração da verba honorária formulado pela parte autora em sede de contrarrazões não conhecido, por inadequação da via eleita."

(TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5002736-45.2022.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal CONSUELO YATSUDA MOROMIZATO YOSHIDA, julgado em 14/11/2023, DJEN DATA: 21/11/2023)

 

"PROCESSO CIVIL - TRIBUTÁRIO - IPI - LEI FEDERAL Nº. 8.989/95 - ISENÇÃO NA AQUISIÇÃO DE VEÍCULOS POR PESSOAS COM DEFICIÊNCIA - SINISTRO GRAVE - TRANSFERÊNCIA À SEGURADORA - DESCABIMENTO DA EXIGÊNCIA TRIBUTÁRIA.

1- A Lei Federal nº. 8.989/95 estabelece isenção de IPI na aquisição de veículo de transporte de passageiros por pessoa com deficiência, impedindo a revenda do bem por dois anos após a compra.

2- O intuito do legislador é garantir que a isenção seja aplicada no transporte de pessoas com deficiência, evitando a alienação voluntária com o intuito de utilizar a norma isentiva para enriquecimento pessoal indevido. A hipótese de transferência para seguradora, em decorrência de sinistro grave, não se insere na limitação legislativa da isenção.

3- Não pode, o administrador, a pretexto de regulamentar a norma isentiva, desbordar de seu fundamento legal, tratando-se de hipóteses diversas daquelas ponderadas pelo legislador. Entendimento desta Corte Regional.

4- Apelação desprovida."

(TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5006981-70.2020.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal GISELLE DE AMARO E FRANCA, julgado em 28/02/2024, DJEN DATA: 06/03/2024)                                        

 

TRIBUTÁRIO. IPI. ISENÇÃO. LEI N. 8.989/1995. VEÍCULO SINISTRADO. RECUPERAÇÃO DE SALVADOS. TRANSFERÊNCIA DA PROPRIEDADE À SEGURADORA. INEXIGIBILIDADE DO TRIBUTO.

1. O artigo 6º da Lei nº 8.989/1995 estabelece que "a alienação do veículo adquirido nos termos desta Lei que ocorrer no período de 2 (dois) anos, contado da data de sua aquisição, a pessoas que não satisfaçam as condições e os requisitos estabelecidos para a fruição da isenção acarretará o pagamento pelo alienante do tributo dispensado, atualizado na forma prevista na legislação tributária. (Redação dada pela Lei nº 14.183, de 2021)”.

2. O artigo 12, inciso III, da Instrução Normativa RFB nº 1.769/2017 assegura que não será exigido o IPI sobre a transferência de propriedade do veículo para a companhia seguradora quando ocorrido o pagamento de indenização em decorrência de perda total por sinistro, por não configurar alienação do veículo adquirido com isenção.

3. A transferência da propriedade do veículo sinistrado (enchente) à seguradora, mediante pagamento de indenização integral, não enseja a exigência do IPI, não recolhido originalmente em face de isenção (pessoa com deficiência).

4. Honorários recursais no percentual de 1% sobre o valor da causa, a serem acrescidos aos fixados pelo Juízo de primeiro grau, a teor do disposto no artigo 85, § 1º, fine, combinado com o § 11, do Código de Processo Civil.

5. Apelação não provida. 

(TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5004813-61.2021.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal MAIRAN GONCALVES MAIA JUNIOR, julgado em 27/02/2024, DJEN DATA: 07/03/2024)

 

Ante o exposto, nego provimento à apelação da União Federal e, em atenção ao disposto no artigo 85, §11, do CPC, majoro os honorários advocatícios em 1% (um por cento), respeitando-se os limites previstos nos §§ 2º e 3º do mesmo artigo.

 

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

PROCESSO CIVIL. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS - IPI. PESSOAS PORTADORAS DE DEFICIÊNCIA. ISENÇÃO. TRANSFERÊNCIA DOS SALVADOS DO AUTOMÓVEL À SEGURADORA. CONDIÇÃO PARA RECEBIMENTO DA INDENIZAÇÃO. EXIGIBILIDADE DO TRIBUTO AFASTADA. APELAÇÃO DA UNIÃO FEDERAL DESPROVIDA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS MAJORADOS EM SEDE RECURSAL.

1 - A isenção do IPI incidente na aquisição de automóveis, concedida às pessoas portadoras de deficiência, está prevista no artigo 1º da Lei n. 8.989/95. Trata-se de benesse que objetiva facilitar a compra de veículos e, consequentemente, maximizar o direito à mobilidade de parcela vulnerável da população.

2 - A fim de assegurar que a finalidade da liberalidade fiscal não seria subvertida, o legislador estabeleceu que, em caso de revenda do veículo durante o biênio que sucedeu a aquisição do bem, a pessoa portadora de deficiência seria obrigada a recolher o valor do IPI dispensado quando da compra do bem, acrescido de multa e juros de mora, nos termos do artigo 6º da Lei n. 8.989/95.

3 - Cuida-se, portanto, de preceito legal que visa inibir o beneficiário de se utilizar da isenção para seu enriquecimento pessoal - mediante a alienação lucrativa do automóvel,

4 - A Instrução Normativa n. 1.769, editada pela Receita Federal em 19 de Dezembro de 2017, regulamentou a vedação à revenda do automóvel pelo beneficiário da isenção fiscal em seu artigo 12.

5 - Entretanto, no parágrafo 1º, inciso II, do mesmo artigo 12 da IN RFB 1.769/2017, a Administração Fazendária esclareceu que, caso a seguradora pretendesse incorporar o salvado do veículo ao seu patrimônio ou vendê-lo a terceiro, não poderia ser favorecida pela inexigibilidade do tributo,

6 - Percebe-se que o referido preceito infralegal, ao exigir o recolhimento do tributo na transferência do salvado (sucata) do automóvel para o nome da seguradora, inovou na ordem jurídica, já que tal hipótese de revogação do benefício fiscal não possui lastro no disposto na norma isentiva (Lei n. 8.989/95).

7 - Ora, não se pode equiparar a alienação voluntária do bem, com a finalidade de obter lucro - que é o propósito da vedação consignada no artigo 6º da Lei n. 8.989/95 -, com a transferência do salvado do veículo feito pela pessoa portadora de deficiência à seguradora, por força de cláusula contratual, para o recebimento da indenização devida pelo sinistro.

8 - Em tal transação, o titular da liberalidade fiscal apenas recompõe o prejuízo decorrente do imprevisto que lhe sobreveio.

9 - Ademais, não seria razoável exigir do beneficiário da isenção que aguardasse o término do prazo de 2 (dois) anos, previsto no artigo 12, §3º, da IN RFB 1.769/2017, para acionar a seguradora e obter a cobertura do sinistro, sob pena de frustrar a proteção a evento futuro e incerto que se busca com a celebração do contrato de seguro.

10 - Em decorrência, ante a ilegalidade de condicionar o recolhimento do IPI à concessão de autorização para transferir os salvados do veículo do beneficiário da isenção tributária para a seguradora, a manutenção da sentença de 1º grau é de rigor.

11 - Majoração dos honorários advocatícios nos termos do artigo 85, §11, CPC, respeitados os limites dos §§2º e 3º do mesmo artigo.

12 - Apelação da União Federal desprovida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação da União Federal e, em atenção ao disposto no artigo 85, §11, do CPC, majorou os honorários advocatícios em 1% (um por cento), respeitando-se os limites previstos nos §§ 2º e 3º do mesmo artigo, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.