Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0001526-23.2014.4.03.6133

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: EDP SAO PAULO DISTRIBUICAO DE ENERGIA S.A., INST. NAC. COLON. REFORMA AGRARIA - INCRA

Advogados do(a) APELANTE: ALEXANDRE ANTONIO CESCHINI FIGLIOLIA - SP297039-A, DUARTE ALBERTO LOJAS ANES - SP282803-A, GUSTAVO ANTONIO FERES PAIXAO - SP186458-S, LAIS SANTOS COELHO GOMES - SP304070-A

APELADO: INST. NAC. COLON. REFORMA AGRARIA - INCRA, ELIANA LOPES, EDUARDO LOPES, EDP SAO PAULO DISTRIBUICAO DE ENERGIA S.A.

Advogados do(a) APELADO: ALEXANDRE ANTONIO CESCHINI FIGLIOLIA - SP297039-A, DUARTE ALBERTO LOJAS ANES - SP282803-A, GUSTAVO ANTONIO FERES PAIXAO - SP186458-S, LAIS SANTOS COELHO GOMES - SP304070-A
Advogado do(a) APELADO: FERNANDO ALBERTO FELICIANO - SP60368-A

OUTROS PARTICIPANTES:

SUCEDIDO: JACOB CARDOSO LOPES, MYRIAM CHAVES LOPES
 

ADVOGADO do(a) SUCEDIDO: CLAUDIO GOMIERO - SP77317-A
ADVOGADO do(a) SUCEDIDO: CLAUDIO GOMIERO - SP77317-A

 


 

  

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2ª Turma
 

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0001526-23.2014.4.03.6133

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: EDP SAO PAULO DISTRIBUICAO DE ENERGIA S.A., INST. NAC. COLON. REFORMA AGRARIA - INCRA

Advogados do(a) APELANTE: ALEXANDRE ANTONIO CESCHINI FIGLIOLIA - SP297039-A, DUARTE ALBERTO LOJAS ANES - SP282803-A, GUSTAVO ANTONIO FERES PAIXAO - SP186458-S, LAIS SANTOS COELHO GOMES - SP304070-A

APELADO: INST. NAC. COLON. REFORMA AGRARIA - INCRA, ELIANA LOPES, EDUARDO LOPES, EDP SAO PAULO DISTRIBUICAO DE ENERGIA S.A.

Advogados do(a) APELADO: ALEXANDRE ANTONIO CESCHINI FIGLIOLIA - SP297039-A, DUARTE ALBERTO LOJAS ANES - SP282803-A, GUSTAVO ANTONIO FERES PAIXAO - SP186458-S, LAIS SANTOS COELHO GOMES - SP304070-A
Advogado do(a) APELADO: FERNANDO ALBERTO FELICIANO - SP60368-A

OUTROS PARTICIPANTES:

SUCEDIDO: JACOB CARDOSO LOPES, MYRIAM CHAVES LOPES
 

ADVOGADO do(a) SUCEDIDO: CLAUDIO GOMIERO - SP77317-A
ADVOGADO do(a) SUCEDIDO: CLAUDIO GOMIERO - SP77317-A

 

  

RELATÓRIO

 

O Exmo. Sr. Desembargador Federal CARLOS FRANCISCO (Relator): Trata-se de recursos de apelação interpostos por Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA, e por EDP São Paulo Distribuição de Energia S/A (nova denominação de Bandeirante Energia S/A), em face de sentença proferida nos autos da ação de constituição de servidão administrativa que julgou parcialmente procedente o pedido deduzido pela concessionária autora, fixando o valor de R$ 162.914,64, a título de indenização pelo uso de uma área de 12.148,57 m2 do imóvel matriculado junto ao 2º Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Mogi das Cruzes/SP sob nº. 31.075, para passagem da “Linha de Transmissão de Energia Elétrica LTA-Mogi-ECH Suzano”.

Em suas razões, o INCRA sustenta que o perito judicial deixou de valorar a indenização pela perda das benfeitorias, limitando-se a avaliar a terra nua, acrescida dos valores necessários à remoção dessas benfeitorias, razão pela qual requer a reforma da sentença para majoração do montante apurado.

Por sua vez, a EDP São Paulo Distribuição de Energia S/A alega cerceamento de defesa em razão da ausência de designação de audiência de instrução e julgamento para que seu assistente técnico pudesse confrontar o perito, nos termos do art. 24 do Decreto-lei nº 3.365/1941. Aduz que a indenização deve corresponder ao valor do imóvel apurado no início do processo, à época da imissão na posse, justamente para evitar que avaliação seja contaminada por eventual valorização imobiliária, decorrente muitas vezes do próprio ônus da servidão, ao valor da indenização. Questiona ainda o número de amostras utilizadas na elaboração do laudo oficial, bem como a ausência de aplicação do “fator favela”, que implicaria a redução de ao menos 50% do valor apurado. Pugna pela anulação da sentença para que o perito seja intimado a prestar esclarecimentos, ou mesmo para realização de nova perícia e, alternativamente, seja o recurso provido para reduzir a indenização para R$ 86.774,74, montante que considera correto.

Consta a apresentação de contrarrazões por parte do INCRA.

Parecer do Ministério Público Federal pelo parcial provimento do recurso de apelação interposto pela EDP SÃO PAULO DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA S.A., para que a r. sentença seja anulada por cerceamento de defesa, restando prejudicado o recurso de apelação interposto pelo INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA (INCRA).

É o breve relatório. Passo a decidir.

 

 


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2ª Turma
 

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0001526-23.2014.4.03.6133

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Advogados do(a) APELANTE: ALEXANDRE ANTONIO CESCHINI FIGLIOLIA - SP297039-A, DUARTE ALBERTO LOJAS ANES - SP282803-A, GUSTAVO ANTONIO FERES PAIXAO - SP186458-S, LAIS SANTOS COELHO GOMES - SP304070-A

APELADO: INST. NAC. COLON. REFORMA AGRARIA - INCRA, ELIANA LOPES, EDUARDO LOPES, EDP SAO PAULO DISTRIBUICAO DE ENERGIA S.A.

Advogados do(a) APELADO: ALEXANDRE ANTONIO CESCHINI FIGLIOLIA - SP297039-A, DUARTE ALBERTO LOJAS ANES - SP282803-A, GUSTAVO ANTONIO FERES PAIXAO - SP186458-S, LAIS SANTOS COELHO GOMES - SP304070-A
Advogado do(a) APELADO: FERNANDO ALBERTO FELICIANO - SP60368-A

OUTROS PARTICIPANTES:

SUCEDIDO: JACOB CARDOSO LOPES, MYRIAM CHAVES LOPES

ADVOGADO do(a) SUCEDIDO: CLAUDIO GOMIERO - SP77317-A
ADVOGADO do(a) SUCEDIDO: CLAUDIO GOMIERO - SP77317-A

 

V O T O

 

O Exmo. Sr. Desembargador Federal CARLOS FRANCISCO (Relator): Nos moldes do art. 5º, XXII, da ordem de 1988, é garantido o direito de propriedade privada, com os poderes a ele inerentes (usar, gozar e dispor da coisa), que deverá, contudo, atender à sua função social, conforme preceitua o inciso XXIII, do mesmo artigo. A propriedade, portanto, caracteriza-se por ser um direito fundamental, de exercício limitado por diretrizes estabelecidas no sistema jurídico, cabendo ao Estado estabelecer critérios específicos, bem como fiscalizar e intervir para atender aos propósitos superiores do Estado de Direito.

As intervenções estatais diretas no exercício do direito fundamental de propriedade privada podem se dar de duas formas básicas: a) restritivas, que sem retirar a propriedade de seu titular, impõem condições ao seu uso (servidão administrativa, requisição, ocupação temporária, limitações administrativas e tombamento); b) supressivas, que transferem compulsoriamente, para ente estatal, a propriedade até então pertencente a terceiro, por meio da modalidade única da desapropriação.

No que concerne à servidão administrativa, trata-se de um direito real de uso conferido à Administração Pública ou seus delegados (autorizados por dispositivo legal ou contratual), que permite a ela onerar a propriedade alheia (coisa serviente) com a redução ou supressão de um de seus atributos, para prestação de um serviço público ou afetação de um bem a fins de utilidade pública (coisa dominante).

Esse instituto encontra fundamento constitucional na já mencionada função social da propriedade (art. 170, III, CF/1988), e ainda nos artigos 40, do Decreto-Lei nº 3.365/1941 (Lei Geral das Desapropriações), e 29, IX, da Lei nº 8.987/1995 (Lei de Concessões e Permissões de Serviços Públicos), in verbis:

"Decreto-Lei nº 3.365/1941:

Art. 40.  O expropriante poderá constituir servidões, mediante indenização na forma desta lei."

 

"Lei nº 8.987/1995:

Art. 29. Incumbe ao poder concedente:

(...)

IX - declarar de necessidade ou utilidade pública, para fins de instituição de servidão administrativa, os bens necessários à execução de serviço ou obra pública, promovendo-a diretamente ou mediante outorga de poderes à concessionária, caso em que será desta a responsabilidade pelas indenizações cabíveis; (...)"

A servidão administrativa pode ser instituída por lei ou ato declaratório de utilidade pública editado previamente, consolidado mediante acordo ou por sentença judicial. Possui, em regra, caráter perpétuo, extinguindo-se, contudo, quando cessar a necessidade pública que motivou sua instituição, ou a utilidade do imóvel gravado, ou ainda pela desafetação da coisa dominante, ou pela incorporação ao patrimônio público do imóvel serviente.

É possível que a servidão administrativa seja imposta ao particular sem qualquer restrição ao direito de propriedade, hipótese que, em razão da ausência de danos, a indenização não será devida. De outro lado, se a limitação da propriedade resultar em desvalorização do imóvel serviente, o particular deverá ser indenizado em quantia correspondente aos prejuízos suportados. Excepcionalmente pode ocorrer de as restrições impostas pelo Poder Público serem da tal ordem que acabem por inviabilizar a utilização do bem, esvaziando por completo o direito de propriedade, caso no qual estará desnaturada a servidão administrativa, impondo-se ao Poder Público a efetiva desapropriação do imóvel, mediante justa e prévia indenização, na forma da lei.

Especificamente em relação à servidão constituída para a passagem de linha de transmissão de energia elétrica, o Decreto nº 24.643/1934 (Código de Águas, que possui forma normativa de lei ordinária por ter sido editada durante o Governo Provisório) estabelece, em seu art. 151, que para a execução dos trabalhos definidos no contrato de concessão, os concessionários terão o direito de estabelecer as servidões permanentes ou temporárias exigidas para o transporte e distribuição da energia elétrica. Esse dispositivo foi regulamentado pelo Decreto nº 35.851/1954 nos seguintes termos:

Art. 1º As concessões para o aproveitamento industrial das quedas d’água, ou, de modo geral, para produção, transmissão e distribuição de energia elétrica, conferem aos seus titulares o direito de constituir as servidões administrativas permanentes ou temporárias, exigidas para o estabelecimento das respectivas linhas de transmissão e de distribuição.

Art. 2º A constituição da servidão a que se refere o artigo anterior, depende da expedição, pelo Poder Executivo, de decreto em que, para êsse efeito, se reconheça a conveniência de estabelecê-la e se declarem de utilidade pública as áreas destinadas à passagem na linha.

§ 1º Para a fixação das áreas sujeitas ao ônus da servidão, a administração terá em vista, entre outros característicos, a tensão da linha, o número de circuitos e o tipo da construção.

§ 2º A servidão compreende o direito, atribuído ao concessionário, de praticar, na área por ela abrangida, todos os atos de construção, manutenção, conservação e inspeção das linhas de transmissão de energia elétricas e das linhas, sendo-lhe assegurado ainda o acesso à área da servidão, através do prédio serviente, desde que não haja outra via praticável.

Art. 3º Os proprietários das áreas atingidas pelo ônus limitarão o uso do gôzo das mesmas ao que fôr compatível com a existência a servidão, abstendo-se, em conseqüência, de praticar, dentro delas, quaisquer atos que a embacarem ou lhe causem dano, incluídos entre os de erguerem construções ou fazerem plantações de elevado porte.

§ 1º A administração, ao expedir o decreto de servidão, poderá vedar que tais construções ou plantações se façam em uma faixa paralela à área da servidão, estabelecendo-lhe os respectivos limites.

§ 2º Aos concessionários é assegurado o direito de mandar podar ou cortar quaisquer árvores, que, dentro da área da servidão ou na faixa paralela à mesma, ameacem as linhas de transmissão ou distribuição.

Art. 4º Uma vez expedido o decreto de que trata o art. 1º, a constituição da servidão se realizará mediante escritura pública, em que o concessionário e os proprietários interessados estipulem, nos têrmos do mesmo decreto, a extensão e limites do ônus, e os direitos e obrigações de ambas as partes.

Art. 5º Os proprietários das áreas sujeitas à servidão têm direito à indenização correspondente à justa reparação dos prejuízos a êles causados pelo uso público das mesmas e pelas restrições estabelecidas ao seu gôzo.

Art. 6º Os concessionários poderão promover, no caso de embaraço oposto pelos proprietários à constituição da servidão, ou ao respectivo exercício, as medidas judiciais necessárias ao seu reconhecimento, cabendo-lhes também a faculdade de utilizar-se do processo da desapropriação, nos têrmos do art. 40 do Decreto-lei nº 3.365, de 21 de junho de 1941.

Em resumo, o Poder Público deverá expedir um decreto reconhecendo a conveniência da servidão administrativa e declarando como sendo de utilidade pública as áreas destinadas à passagem da linha de transmissão e distribuição de energia, podendo impor, desde já vedações a construções ou plantações em faixa paralela à área da servidão, previamente estabelecida. A servidão será constituída mediante escritura pública, em que constará a extensão e limites do ônus, e os direitos e obrigações de ambas as partes, podendo ser adotadas medidas judiciais no caso de embaraço oposto pelos proprietários.

É assegurado ao concessionário o direito de praticar todos os atos necessários à construção, manutenção, conservação e inspeção das linhas de transmissão de energia elétricas, garantido ainda o acesso à área da servidão. Os proprietários das áreas atingidas, por sua vez, limitarão seu uso ao que for compatível com a finalidade da servidão, abstendo-se de praticar atos que a embaracem ou causem dano, como construções ou plantações de elevado porte.

Por fim, reforçou-se o direito dos proprietários a indenização correspondente aos prejuízos causados pelo uso público, bem como pelas restrições estabelecidas ao exercício dos atributos da propriedade.

No caso concreto, cuida-se de ação de constituição de servidão administrativa por meio da qual EDP São Paulo Distribuição de Energia S/A (atual denominação de Bandeirante Energia S/A) busca a formalização de servidão sobre uma área de 12.148,57 m2 do imóvel matriculado junto ao 2º Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Mogi das Cruzes/SP sob nº. 31.075, para passagem da “Linha de Transmissão de Energia Elétrica LTA-Mogi-ECH Suzano”. O pedido formulado na ação foi julgado parcialmente procedente, fixando, a título de indenização, o valor de R$ 162.914,64, apurado em perícia designada pelo juízo.

O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA, incluído no polo passivo da ação por ser autor de ação de desapropriação do imóvel em que está compreendida a área objeto da servidão administrativa, insurge-se contra o valor apurado, alegando que o perito judicial deixou de valorar a indenização pela perda das benfeitorias, limitando-se a avaliar a terra nua, acrescida dos valores necessários à remoção dessas benfeitorias.

A EDP São Paulo Distribuição de Energia S/A, por outro lado, alega cerceamento de defesa em razão da ausência de designação de audiência de instrução e julgamento para que seu assistente técnico pudesse confrontar o perito, nos termos do art. 24 do Decreto-lei nº 3.365/1941, aduzindo ainda que a indenização deve corresponder ao valor do imóvel apurado no início do processo para evitar que avaliação seja contaminada por eventual valorização imobiliária. Questiona ainda o número de amostras utilizadas na elaboração do laudo oficial, bem como a ausência de aplicação do “fator favela”, que implicaria a redução de ao menos 50% do valor apurado.

Deve ser afastada a pretensão de anulação da sentença recorrida em razão da não realização de audiência de instrução e julgamento. Observo que depois de apresentado o laudo elaborado pelo perito nomeado pelo juízo, em que foram respondidos os quesitos apresentados pelas partes, estas foram intimadas para se manifestarem sobre seu conteúdo (id 266453715), apresentando suas considerações conforme petições ids nºs 266453723 (Eduardo Lopes e Eliana Lopes), 266453725 e 266453726 (EDP São Paulo Distribuição de Energia S/A), e 266453728, 266453729 e 266453730 (INCRA).

O perito foi então intimado a esclarecer os questionamentos apresentados pelas partes e pelo Ministério Público, complementando o laudo inicial com as informações constantes do documento id 266453740. Sobreveio nova intimação das partes que se manifestaram por meio das petições ids 266453753 e 266453754 (EDP São Paulo Distribuição de Energia S/A), e 266453749 e 266453750 (INCRA).

Não há que se falar, portanto, em ofensa ao contraditório, na medida em que foi garantida às partes a oportunidade de apresentarem quesitos, manifestando-se ainda tanto em relação ao laudo pericial como aos esclarecimentos adicionais apresentados pelo perito. Cumpre destacar que a apresentação de parecer contrário às conclusões obtidas pelo perito nomeado pelo juízo tem por finalidade apresentar subsídios que permitam ao juiz uma apreciação crítica do laudo, ficando a critério do magistrado a avaliação acerca da necessidade de novos esclarecimentos ou, eventualmente, a realização de nova perícia. Nesse sentido, os artigos 479 e 480, do CPC:

Art. 479. O juiz apreciará a prova pericial de acordo com o disposto no art. 371 , indicando na sentença os motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do laudo, levando em conta o método utilizado pelo perito.

Art. 480. O juiz determinará, de ofício ou a requerimento da parte, a realização de nova perícia quando a matéria não estiver suficientemente esclarecida.

§ 1º A segunda perícia tem por objeto os mesmos fatos sobre os quais recaiu a primeira e destina-se a corrigir eventual omissão ou inexatidão dos resultados a que esta conduziu.

§ 2º A segunda perícia rege-se pelas disposições estabelecidas para a primeira.

§ 3º A segunda perícia não substitui a primeira, cabendo ao juiz apreciar o valor de uma e de outra.

Ademais, percebe-se que o juiz indicou, na sentença, as razões pelas quais formou seu convencimento, expondo de modo suficiente os fundamentos e provas que o embasaram, em especial as informações contidas no laudo pericial, aliadas às demais provas carreadas aos autos. Logo, não se vislumbra nulidade alguma na sentença, não sendo caso de devolução dos autos à Vara de origem para reabertura da instrução processual, nem de se converter o julgamento em diligência para obtenção de esclarecimentos do perito (art. 938, § 3º, do CPC), eis que as provas dos autos se mostram suficientes e a matéria já se encontra suficientemente esclarecida, de modo a permitir o julgamento da lide. Nessa linha, julgado do Superior Tribunal de Justiça:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ALIMENTOS. EXONERAÇÃO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. APLICAÇÃO DAS SÚMULAS 282/STF E 211/STJ. NECESSIDADE DE REEXAME DO ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. APRECIAÇÃO DAS PROVAS. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA LIVRE ADMISSIBILIDADE DA PROVA E DO LIVRE CONVENCIMENTO DO JUIZ. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

(...)

3. Na apreciação das provas, devem ser levados em consideração o princípio da livre admissibilidade da prova e do livre convencimento do juiz, que, nos termos do art. 130 do Código de Processo Civil, permitem ao julgador determinar as provas que entende necessárias à instrução do processo, bem como o indeferimento daquelas que considerar inúteis ou protelatórias.

(...)

(AgRg no AREsp n. 282.045/DF, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 18/6/2013, DJe de 25/6/2013.)

Além de tudo quanto acima exposto, é de se lembrar também que, por força do livre convencimento motivado (ou da persuasão racional), o juiz não está adstrito ao laudo pericial, podendo formar seu convencimento com base em outros elementos de prova constantes dos autos (art. 479 do CPC). Assim, nada impede que o julgador, de modo fundamentado, simplesmente desconsidere as conclusões do laudo pericial ou, tal como ocorre no presente caso, as leve em consideração combinadas com outras provas produzidas, sem que isso importe em qualquer tipo de vício.

Por fim, a designação da audiência de instrução e julgamento prevista no art. 24, do Decreto-lei nº 3.365/1941 não é obrigatória, como quer fazer crer a parte apelante, admitindo-se o julgamento quando suficientes os elementos presentes para a elucidação das questões controvertidas. Sobre o tema, trago à colação os seguintes julgados:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. DESAPROPRIAÇÃO. REFORMA AGRÁRIA. AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO. ARTIGO 11 DA LC 76/93. OBRIGATORIEDADE DE REALIZAÇÃO. INEXISTÊNCIA. TERRA NUA. JUSTA INDENIZAÇÃO. REVISÃO DE VALORES. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. INCIDÊNCIA. JUROS COMPENSATÓRIOS. IMÓVEL IMPRODUTIVO. IRRELEVÂNCIA. ALÍQUOTA. EFICÁCIA DA MP N.° 1.577/97. ADIN N.° 2.332/2001. PRINCÍPIO DO TEMPUS REGIT ACTUM. JUROS MORATÓRIOS. SUCUMBÊNCIA. INTERESSE RECURSAL. AUSÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. LIMITAÇÃO. ARTIGO 27, § 1º, DO DECRETO-LEI 3.365/1941. REDUÇÃO PARA 5%. 1. Do texto do artigo 11 da LC 76/93, não se pode extrair a obrigatoriedade da realização da audiência de instrução e julgamento, porquanto o fato de o referido dispositivo legal prever a realização da audiência, no prazo de quinze dias a contar da conclusão da perícia, não significa que essa deva, necessariamente, acontecer, podendo a lide receber julgamento conforme o estado do processo, desde que cumpridos os requisitos dispostos no artigo 330 do CPC. O Tribunal Regional entendeu que, havendo nos autos elementos suficientes para que se procedesse ao julgamento da causa, infundada a realização de audiência de instrução e julgamento, o que não pode ser alterado por meio de recurso especial. 2. A questão da justa indenização foi decidida com base na análise das provas constantes nos autos, de modo que não há como esta Corte Superior infirmar as conclusões a que chegou o Tribunal de origem, sob pena de violação da Súmula n. 7/STJ. As instâncias ordinárias, soberanas na análise das provas, entenderam que o valor alcançado pelo magistrado de piso era o que melhor se ajustava ao valor de mercado do imóvel, pois considerou inúmeras variáveis, inclusive a posição geográfica do imóvel e a existência de atividade agrícola na região. Concluir em sentido contrário demanda o revolvimento da matéria fático-probatória. 3. Quanto aos juros compensatórios, o STJ consolidou entendimento segundo o qual a improdutividade do imóvel não impede sua incidência, pois são devidos não como "lucros cessantes", mas sim pela perda antecipada da posse. Quanto ao percentual a incidir, nos casos em que a imissão ocorreu após o advento da MP 1.577/1997, a alíquota aplicável é de 6% (seis por cento) ao ano até a publicação da liminar concedida na ADIN 2.332/DF (13.09.2001). A partir daí, os juros compensatórios são calculados em 12% (doze por cento) ao ano, nos termos da Súmula 618/STF. No caso dos autos, a imissão na posse ocorreu em 31.8.1999, após a MP 1.577/1997 (publicada em 11.06.1997). Nessa situação, a alíquota dos juros compensatórios deve ser fixada em 6% ao ano, exclusivamente no período compreendido entre a imissão na posse até a publicação da liminar concedida na ADIN 2.332/DF (13.09.2001). 4. No pertinente aos juros moratórios, o recurso especial não deve ser conhecido tendo em vista que, pela simples leitura do aresto recorrido, a autarquia não foi sucumbente e recebeu a prestação jurisdicional nos exatos termos em que fora pleiteado. Assim, não há interesse recursal quanto ao ponto. 5. A Medida Provisória nº 1.997-37, de 11.04.00, reeditada por último sob o nº 2.183-56, de 24.08.01, estabeleceu no art. 27 que o percentual de verba de honorários de advogado não pode ultrapassar 5% da base de cálculo já consagrada. Restrição que se aplica à espécie, porque proferida a sentença em data posterior à edição do ato normativo (22.9.2003). 6. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, parcialmente provido. (RESP - RECURSO ESPECIAL - 902452 2006.02.47604-8, MAURO CAMPBELL MARQUES, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:10/09/2010)

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO E REMESSA OFICIAL. DESAPROPRIAÇÃO POR INTERESSE SOCIAL PARA REFORMA AGRÁRIA. CERCEAMENTO DE DEFESA. AFASTAMENTO. LIVRE CONVENCIMENTO DO JUIZ. LAUDO PERICIAL CONSISTENTE. JUSTA INDENIZAÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA, JUROS COMPENSATÓRIOS E JUROS MORATÓRIOS. CABIMENTO. IMPROVIMENTO 1. A prolação de uma decisão interlocutória, na fase saneadora, sobre "toda a matéria deduzida em juízo" representa o próprio julgamento do mérito da demanda, sendo a sentença a decisão judicial adequada à hipótese, nos termos do art. 162, parágrafo 1º, do CPC. 2. Da leitura do texto do artigo 11 da LC 76/93 não se pode extrair a obrigatoriedade da realização da audiência de instrução e julgamento, porquanto o fato de o referido dispositivo legal prever a realização da audiência, no prazo de quinze dias a contar da conclusão da perícia, não significa que essa deva, necessariamente, acontecer, podendo a lide receber julgamento conforme o estado do processo, desde que cumpridos os requisitos dispostos no artigo 330 do CPC, o que se observa no caso concreto. Precedente do STJ 3. Nos termos do art. 130 do CPC, não se constitui cerceamento de defesa o fato de o magistrado indeferir a produção de outras provas quando ele entender que as provas constantes nos autos são suficientes para formar o seu livre convencimento motivado, como se vê na hipótese dos autos. 4. O laudo oficial ocupa grande relevância no processo judicial de desapropriação, porquanto apresenta elaboração criteriosa da quantificação do valor indenizatório. 5. Hipótese em que o uso de GPS, nos trabalhos periciais, possibilitou a medição precisa da área imóvel desapropriado em detrimento daquela registrada, devendo aquela prevalecer sobre esta. Precedente do TRF1. 6. O perito judicial, ao calcular o valor da terra nua, não utilizou "métodos advinhatórios", mas adotou parâmetros estabelecidos na tabela adotada pelo Banco do Nordeste do Brasil - BNB para os municípios do sertão, não deixando de considerar, como bem ressaltado pelo o juízo a quo, todos os fatores que influenciariam o preço, tais como a localização, acesso, classe de solo, fator hídrico, energia e distância, como bem determina a NBR 14.653 7. Para a fixação do valor das benfeitorias, também verifica-se que o perito nomeado pelo juízo não chegou ao valor da indenização de forma arbitrária e sem seguir parâmetros oficialmente exigidos. No seu laudo, não só indicou as metodologias de avaliação por ele utilizadas para a terra nua, as benfeitorias reprodutivas e as não reprodutivas, como discriminou cada uma delas, demonstrando ter realizado um minucioso trabalho. 8. No tocante à benfeitoria da área do capim Buffel, verifica-se que foi correta a adoção pelo perito judicial de utilizar como referência a quantidade constatada anteriormente pelo INCRA e não a do momento da vistoria, uma vez que quando da realização da vistoria, não mais existia tal cobertura vegetal. 9. O abatimento do valor da terra nua pelo passivo ambiental é indevido por falta de previsão legal. Precedente do TRF1. 10. A Primeira Seção do STJ reafirmou o posicionamento daquela Corte, quando do julgamento do RESP 1.116.364/PI, sujeito ao regime dos "recursos repetitivos", nos termos do art. 543-C do CPC, no sentido de que os juros compensatórios são devidos, sendo irrelevante a questão de o imóvel ser produtivo ou não, pois visam compensar o que o desapropriado deixou de ganhar com a perda antecipada do imóvel, ressarcir o impedimento do uso e gozo econômico do bem ou o que deixou de lucrar. 11. No caso, a imissão na posse ocorreu em 06.09.2007, ou seja, após a decisão do STF na ADIN 2.332/DF, razão pela qual os juros devem incidir no percentual de 12% ao ano. 12. Nos moldes da jurisprudência firmada pelo e. STJ, tanto os juros compensatórios quanto os moratórios deverão incidir sobre a diferença entre os 80% do valor ofertado e o que foi fixado na sentença para a indenização, ou seja, aquele montante que ficou indisponível ao expropriado e que somente será liberado após o trânsito em julgado da decisão final. 13 No que tange à correção monetária, o valor da oferta deve ser atualizado monetariamente. Todavia, a atualização da parcela do preço depositada judicialmente em moeda corre por conta do agente financeiro depositário e a parcela do preço depositada em Títulos da Dívida Agrária está sujeita à valorização própria desses títulos até os respectivos vencimentos. 14. Apelações e remessa oficial improvidas. (APELREEX - Apelação / Reexame Necessário - 31884 0000381-08.2007.4.05.8303, Desembargador Federal Edílson Nobre, TRF5 - Quarta Turma, DJE - Data::03/09/2015 - Página::242.)

A propósito da alegação do INCRA no sentido de que o perito judicial deixou de valorar a indenização pela perda das benfeitorias, limitando-se a incluir o montante necessário à sua remoção, observo que no tópico do laudo relativo às benfeitorias (id 266453710, págs. 3 e seguintes), o perito informa que “não foi constatada (sic) benfeitorias sob a linha de transmissão”. Posteriormente, ao responder ao quesito 16, formulado pela EDP São Paulo Distribuição de Energia S/A, pertinente à existência de benfeitorias na área afetada pela servidão administrativa, o perito afirma que “conforme demonstrado no item benfeitorias, as benfeitorias já foram demolidas” (id 266453711, pág. 4).

Note-se que o laudo data de 11/08/2021, tendo o perito identificado em imagens aéreas de 2016 a projeção do que aparenta ter sido uma edificação existente na faixa de servidão que não aparecem mais nas imagens de 2020. Nas imagens mais atualizadas, o que se vê são restos de um piso de concreto e uma mureta baixa de alvenaria, sobras de uma construção de dimensões reduzidas. Assim, na ausência de evidências indicando a existência de edificações indenizáveis, entendo correto o destaque, pelo perito, de uma verba destinada apenas à demolição e retirada do material remanescente (“demolição mecanizada de concreto simples”, “demolição alvenaria em geral” e “remoção de entulho com caçamba metálica”), mas não à indenização do imóvel em si.

Acrescento que tanto na impugnação ao laudo pericial quanto nas razões recursais, o INCRA se limitou a questionar a existência de uma verba para demolição e remoção das “benfeitorias” sem que as mesmas fossem efetivamente avaliadas. Porém, além de não apontar quais seriam essas benfeitorias, não atentou para as circunstâncias fáticas descritas pelo perito, no sentido de que, ainda que aparentemente tenha existido ali uma edificação, sua demolição já havia sido realizada, o que afasta qualquer pretensão indenizatória a esse título, exceto em relação aos custos com a remoção do material ainda existente.

Não merece prosperar também a alegação da EDP São Paulo Distribuição de Energia S/A de que a indenização deve corresponder ao valor do imóvel apurado no início do processo para evitar que avaliação seja contaminada por eventual valorização imobiliária.

Nos termos do art. 26 do Decreto-Lei 3.365/1941, a indenização deverá corresponder, em regra, ao valor do imóvel apurado na data da realização da avaliação judicial, critério igualmente adotado pelo art. 12, §2º, da Lei Complementar 76/1993, e extensível à avaliação para fins de indenização das servidões administrativas:

"Decreto-Lei 3.365/1941:

(...)

Art. 26. No valor da indenização, que será contemporâneo da avaliação, não se incluirão os direitos de terceiros contra o expropriado.”

"Lei complementar 76/1993:

(..)

Art. 12. O juiz proferirá sentença na audiência de instrução e julgamento ou nos trinta dias subseqüentes, indicando os fatos que motivaram o seu convencimento. (...)

§ 2º O valor da indenização corresponderá ao valor apurado na data da perícia, ou ao consignado pelo juiz, corrigido monetariamente até a data de seu efetivo pagamento.”

Trata-se de entendimento pacificado, conforme se observa dos julgados a seguir transcritos:

PROCESSUAL CIVIL. DESAPROPRIAÇÃO PARA FINS DE REFORMA AGRÁRIA. JUSTA INDENIZAÇÃO. LAUDO PERICIAL. LIVRE CONVENCIMENTO DO MAGISTRADO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA.1. O TRF, após apreciação minuciosa dos fatos, concluiu que o laudo do perito oficial está conforme os ditames legais.2. No ordenamento jurídico pátrio, o magistrado é livre para apreciar motivadamente as provas produzidas no processo, dando-lhes o  valor que bem entender. No sistema de valoração de provas adotado pelo CPC, não há procedência de um tipo de prova sobre outro, como na idade média, período no qual as provas possuiam valores pré-estabelecidos.3. Por isso, não procede a irresignação do recorrente quanto ao pronunciamento do magistrado singular, porque ele apreciou adequadamente todas as provas colacionadas aos autos e concluiu fundamentadamente sua decisão.4. O valor da indenização deve ser contemporâneo à avaliação, tendo como base o  laudo adotado pelo juiz para a fixação do justo preço, pouco importando a data da imissão na posse ou mesmo a da avaliação administrativa. Resp 1.314.758/CE, Relator Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 24/10/2013) e  AgRg no Resp 1.395.872/CE, Relator Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 25/10/2013).5. É pacífica a jurisprudência que admite a incidência de juros compensatórios em matéria de desapropriação para fins de reforma agrária, mesmo com relação aos TDAs, operando-se sobre estes a correção monetária. 6. Agravo Regimental não provido. (AgRg no Resp 1.459.124/CE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe 10/10/2014)

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. DESAPROPRIAÇÃO. VALOR DA INDENIZAÇÃO. DATA DE AVALIAÇÃO DO IMÓVEL. PRECEDENTES STJ. REVISÃO DO VALOR. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ.1. A decisão da instância de origem quanto ao momento da avaliação do imóvel está consentânea com a orientação jurisprudencial desta Corte, que entende que o "valor da indenização será contemporâneo à  data da avaliação, não sendo relevante a  data em que ocorreu a  imissão na posse, tampouco a data em que se deu a vistoria do expropriante" (REsp 1.035.057/GO, Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 1º.9.2009, DJe 8.9.2009).2. Da leitura dos trechos do acórdão recorrido verifica-se que o  valor da indenização foi fixado com base na análise das provas constantes nos autos, de modo que não há como esta Corte Superior infirmar as conclusões a  que chegou o Tribunal de origem, sob pena de violação da Súmula 7/STJ.3. Não merece prosperar a  afirmação de que a jurisprudência colacionada na decisão agravada não seria aplicável ao caso vertente, porquanto a transcrição das ementas dos arestos não levou em consideração a discussão de mérito ali travada, mas o  fato de que os recursos não foram conhecidos nesta Corte por ser necessário o reexame do conjunto fático-probatório, o que atrai a incidência da Súmula 7/STJ.Agravo regimental improvido. (AgRg no Resp 1395872/CE, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJe 25/10/2013)

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. DESAPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. CONTEMPORANEIDADE DA AVALIAÇÃO. PERCENTUAL DOS JUROS COMPENSATÓRIOS. SÚMULA 408/STJ. BASE DE CÁLCULO.1. Não ocorre ofensa ao art. 535 do CPC, se o Tribunal de origem decide, fundamentadamente, as questões essenciais ao julgamento da lide.2. O art. 26 do Decreto-Lei n.º 3.365/41, ao determinar que o valor da indenização seja contemporâneo à avaliação, assim o faz em relação ao laudo adotado pelo juiz para a fixação do justo preço, seja ele qual for, pouco importando a data da imissão na posse ou mesmo a data da avaliação administrativa.3. "Nas ações de desapropriação, os juros compensatórios incidentes após a  Medida Provisória n. 1.577, de 11/06/1997, devem ser fixados em 6% ao ano até 13/09/2001 e,  a partir de então, em 12% ao ano, na forma da Súmula n. 618 do Supremo Tribunal Federal" (Súmula 408/STJ).4. Incidem os juros compensatórios sobre a diferença entre a  condenação e  oitenta por cento (80%) do valor da oferta.5. Recurso especial parcialmente provido.6. Agravo em recurso especial prejudicado. (Resp 1314758/CE, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, DJe 24/10/2013).

Reconheço que a expectativa de implantação de obras públicas em uma determinada região repercute no valor de mercado dos imóveis situados em seu entorno, considerado o impacto, positivo ou não, que as intervenções acarretem. Em regra, em se tratando de melhoramentos públicos que exijam desapropriações para sua implementação, os imóveis próximos não atingidos pela declaração de utilidade pública, costumam se valorizar em razão de processos especulativos que contaminam o setor. Essa variação de preços, no entanto, não é de fácil aferição, já que submetida à dinâmica da oferta e da procura. Trata-se de trabalho complexo, que deve ser feito de forma criteriosa, por profissional capacitado, a fim de que a indenização atinja, tanto quanto possível, a melhor expressão do que se considere uma indenização justa.

Não é o que ocorre nos casos de constituição de servidões administrativas, pois a restrição do exercício dos direitos inerentes à propriedade tende, em regra, a reduzir o valor do imóvel afetado. Assim, sem razão a parte apelante nesse ponto específico.

Sobre a alegação de que o perito teria se valido de número reduzido de elementos amostrais, a exposição técnica trazida aos autos pelos autores não guarda abrigo nas normas que regulamentam a matéria, notadamente a NBR 14653, norma técnica editada pela ABNT que consolida as metodologias e parametrizações utilizadas nos laudos e pareceres de avaliação mercadológica de bens.

É certo que a NBR 14653-1, que dispõe sobre os conceitos, métodos e procedimentos gerais para os serviços técnicos de avaliação de bens, recomenda que se busque “a maior quantidade possível de dados de mercado, com atributos comparáveis aos do bem avaliando”. Evidentemente, quanto maior o número de elementos amostrais, maiores serão as chances de que o valor apurado corresponda à realidade de preços praticados pelo mercado.

Com relação ao número mínimo de elementos amostrais, a NBR 14.653-2, direcionada à avaliação de imóveis urbanos, ao tratar do grau de fundamentação (item 9.2, tabela 1), apresenta, em função deste grau, a quantidade mínima de dados de mercado efetivamente utilizados, sendo o número de 6 para o grau de precisão III, de 4 elementos para o grau de fundamentação II e de 3 elementos para o grau I. Já a NBR 14.653-3, voltada à avaliação de imóveis rurais, estabelece em seu item 9.2.3.3, “d”, a obrigatoriedade de no mínimo três dados de mercado, qualquer que seja o grau de fundamentação do laudo.

No caso dos autos, o perito nomeado pelo juízo iniciou seus trabalhos com a seleção de 14 elementos amostrais que, após uma primeira etapa de homogeneização dos dados, foram reduzidos a 9, haja vista a exclusão dos elementos cujo valor do m2 estivesse acima ou abaixo da margem de 30% do valor médio obtido (id 266453709, pág. 6). Numa segunda etapa, foram ainda excluídas as amostras com valor superior ou inferior a 20% da média por m2, reduzindo para 7 o número de elementos amostrais utilizados na avaliação (id 266453709, pág. 7). Nesse ponto, oportuna a transcrição da justificativa apresentada pelo perito para o aludido procedimento (id 266453709, pág. 5).:

“O saneamento amostral tem a função de expurgar da amostra os eventos discrepantes, cuja parcela aleatória exceda ao tolerável, de modo a minimizar seus efeitos sobre o resultado da avaliação. Como produto, tem-se a média amostral saneada e o desvio padrão amostral.

Em um critério mais rigoroso, após a somatória dos valores homogeneizados, procedeu-se o saneamento das amostras, incialmente em 30% (trinta por cento), excluindo as amostras fora do intervalo de aceitação, excluídas as amostras discrepantes, novo saneamento foi elaborado, agora submetendo as amostras ao intervalo de 20% (vinte por cento), determinando assim o valor do metro quadrado para a região do avaliando.”

Nenhum reparo, portanto, ao trabalho do perito já que, para além do mero aspecto quantitativo - que ainda assim excedeu com folga o número mínimo de elementos amostrais recomendado, cuidou de realizar o enquadramento técnico necessário para que a seleção de amostras fosse a mais adequada, também do ponto de vista qualitativo, à obtenção do valor do m2 para o imóvel avaliado.

Quanto à alegação trazida pela EDP São Paulo Distribuição de Energia S/A no sentido de que a área avaliada estaria localizada em região “favelizada”, justificando assim a aplicação do denominado “fator favela”, com potencial para redução do valor da indenização em ao menos 50% do montante apurado, observo que o fator depreciativo invocado pela ora apelante está previsto nas “Normas Para Avaliação de Imóveis nas Varas da Fazenda Pública de São Paulo”, do CAJUFA (Centro de Apoio aos Juízes das Varas da Fazenda Pública da Capital) nos seguintes termos:

“5.6.1.1. No caso de terreno ocupado por favela, em que a ocupação se limita ao imóvel avaliado, estando o seu entorno livre e desimpedido desta ocupação irregular, o valor de mercado deste terreno, considerando-o sem a invasão (valor pleno) deverá ser depreciado em 50% (cinquenta por cento).

5.6.1.2. No caso de terreno ocupado por favela, em que a ocupação se estenda aos outros imóveis circunvizinhos, ou seja, o seu entorno também está ocupado, o valor de mercado deste terreno, considerando-o sem a invasão, deverá ser depreciado em no mínimo 80% (oitenta por cento).

(...)

5.6.1.4. No caso de terrenos circunvizinhos à favela, a faixa de circunvizinhança deverá ser igual a 200m (duzentos metros), contados a partir da divisa do terreno limítrofe. Para os imóveis inseridos nesta faixa, deverá ser aplicado um fator depreciativo linear, iniciando-se no índice indicado abaixo e finalizando-se com o fator igual a ‘1,0000’:

- inicialmente igual a ‘0,6667’, para circunvizinhança de favela caracterizada no item ‘5.6.1.1’.

- inicialmente igual a ‘0,3333’, para circunvizinhança de favela caracterizada no item ‘5.6.1.2’.”

Dito isso, verifico que não há menção à existência de favelas no laudo inicialmente apresentado pelo perito, que assim descreveu a área objeto da servidão (id 266453705, pág. 7):

“A área é ocupada por poceiros, é utilizada no plantio caracterizado pela exploração de hortaliças, ou seja, culturas folhosas, raízes, bulbos, tubérculos, frutos diversos e partes comestíveis de plantas. Sendo constatada depósitos com fins de comercialização, onde ocorre a preparação, armazenamento, e distribuição da produção. Estando devidamente detalhado no laudo ambiental.

Constata-se na área remanescente, lindeira as glebas a presença de escolas, mercado, bares, associações dos moradores.”

Esse o cenário que pode ser observado na foto aérea constante de fls. 42, do laudo pericial, (id 266453706, pág. 2), sendo que a imagem juntada às fls. 39/40 do referido documento, apresenta algumas edificações precárias localizadas próximas a uma adutora, ao norte da área sob discussão, que segundo informa o perito em seus esclarecimentos adicionais, estão situadas a uma distância superior aos 200,00 metros a que se refere à norma do CAJUFA), sem potencial para afetação pelo mencionado “fator favela”.

Não há, portanto, no presente caso, razões que justifiquem a reforma da sentença recorrida, haja vista a fixação de indenização segundo critérios técnicos, e em consonância com as disposições legais acerca da matéria.

Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO aos recursos.

É como voto.



E M E N T A

 

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE CONSTITUIÇÃO DE SERVIDÃO ADMINISTRATIVA. AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO (ART. 24, DO DECRETO-LEI Nº 3.365/1941). NÃO OBRIGATORIEDADE. VALOR DA INDENIZAÇÃO. DATA DE AVALIAÇÃO DO IMÓVEL. PRECEDENTES. BENFEITORIAS INEXISTENTES. PERÍCIA. ELEMENTOS AMOSTRAIS. QUANTIDADE MÍNIMA OBSERVADA. FATOR DEPRECIATIVO EM RAZÃO DA EXISTÊNCIA DE FAVELA. INAPLICABILIDADE AO CASO CONCRETO. RECURSOS NÃO PROVIDOS.

- Nos moldes do art. 5º, XXII, da ordem de 1988, é garantido o direito de propriedade privada, com os poderes a ele inerentes (usar, gozar e dispor da coisa), que deverá, contudo, atender à sua função social, conforme preceitua o inciso XXIII, do mesmo artigo. A propriedade, portanto, caracteriza-se por ser um direito fundamental, de exercício limitado por diretrizes estabelecidas no sistema jurídico, cabendo ao Estado estabelecer critérios específicos, bem como fiscalizar e intervir para atender aos propósitos superiores do Estado de Direito.

- No que concerne à servidão administrativa, trata-se de um direito real de uso conferido à Administração Pública ou seus delegados (autorizados por dispositivo legal ou contratual), que permite a ela onerar a propriedade alheia (coisa serviente) com a redução ou supressão de um de seus atributos, para prestação de um serviço público ou afetação de um bem a fins de utilidade pública (coisa dominante).

- Em relação à servidão constituída para a passagem de linha de transmissão de energia elétrica, o Decreto nº 24.643/1934 (Código de Águas, que possui forma normativa de lei ordinária por ter sido editada durante o Governo Provisório) estabelece, em seu art. 151, regulamentado pelo Decreto nº 35.851/1954, que para a execução dos trabalhos definidos no contrato de concessão, os concessionários terão o direito de estabelecer as servidões permanentes ou temporárias exigidas para o transporte e distribuição da energia elétrica.

- A ausência de designação da audiência de instrução e julgamento prevista no art. 24, do Decreto-lei nº 3.365/1941 não configura nulidade quando suficientes os elementos presentes para a elucidação das questões controvertidas.

- Não cabe indenização por benfeitorias já demolidas, admitindo-se, nessa hipótese, tão somente o destaque de verba destinada à retirada do material remanescente da área afetada pela servidão administrativa.

- Nos termos do art. 26 do Decreto-Lei 3.365/1941, a indenização deverá corresponder, em regra, ao valor do imóvel apurado na data da realização da avaliação judicial, critério igualmente adotado pelo art. 12, §2º, da Lei Complementar 76/1993, e extensível à avaliação para fins de indenização das servidões administrativas.

- A NBR 14.653-3, que detalha as diretrizes e padrões específicos de procedimentos para a avaliação de imóveis rurais, estabelece a obrigatoriedade de no mínimo três dados de mercado, qualquer que seja o grau de fundamentação do laudo, sendo suficientes, portanto, os sete elementos amostrais utilizados na avaliação ora sob análise.

- A pretendida aplicação de um fator de depreciação do valor do imóvel em razão da proximidade com áreas ocupadas por favelas não se justifica, já que segundo o perito não há imóveis com essas características a uma distância que justifique sua incidência.

- No caso concreto, cuida-se de ação de constituição de servidão administrativa para passagem da Linha de Transmissão de Energia Elétrica”, tendo sido realizada perícia segundo critérios técnicos preconizados pela legislação de regência, cujo laudo, ao final, restou acolhido pela sentença recorrida, não tendo sido apresentados, em sede recursal, elementos suficientes para a modificação do julgado.

- Recursos não providos.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma decidiu, por unanimidade, negar provimento aos recursos, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.