Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
11ª Turma

APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0002775-88.2017.4.03.6105

RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS, EDUARDO DINIZ, ELSON DINIZ, JOSE REGINALDO RONCON MOURA DOS ANJOS, MARCELO LIGIERO

Advogados do(a) APELANTE: DANIEL LEON BIALSKI - SP125000-A, GUSTAVO ALVARES CRUZ - SP386305-A
Advogado do(a) APELANTE: MARCO ANTONIO MACHADO - SP106429-A
Advogado do(a) APELANTE: ANA PAULA LOPES - SP176443-A

APELADO: CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS, EDUARDO DINIZ, ELSON DINIZ, JOSE REGINALDO RONCON MOURA DOS ANJOS, MARCELO LIGIERO, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

Advogado do(a) APELADO: MARCO ANTONIO MACHADO - SP106429-A
Advogados do(a) APELADO: DANIEL LEON BIALSKI - SP125000-A, GUSTAVO ALVARES CRUZ - SP386305-A
Advogado do(a) APELADO: ANA PAULA LOPES - SP176443-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
11ª Turma
 

APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0002775-88.2017.4.03.6105

RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS, EDUARDO DINIZ, ELSON DINIZ, JOSE REGINALDO RONCON MOURA DOS ANJOS, MARCELO LIGIERO

Advogados do(a) APELANTE: DANIEL LEON BIALSKI - SP125000-A, GUSTAVO ALVARES CRUZ - SP386305-A
Advogado do(a) APELANTE: MARCO ANTONIO MACHADO - SP106429-A
Advogado do(a) APELANTE: ANA PAULA LOPES - SP176443-A

APELADO: CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS, EDUARDO DINIZ, ELSON DINIZ, JOSE REGINALDO RONCON MOURA DOS ANJOS, MARCELO LIGIERO, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

Advogado do(a) APELADO: MARCO ANTONIO MACHADO - SP106429-A
Advogados do(a) APELADO: DANIEL LEON BIALSKI - SP125000-A, GUSTAVO ALVARES CRUZ - SP386305-A
Advogado do(a) APELADO: ANA PAULA LOPES - SP176443-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

O DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS: 

 

Trata-se de Apelações interpostas pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e pelas Defesas de CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS, nascido em 10.05.1974, EDUARDO DINIZ, nascido em 23.05.1974, MARCELO LIGIERO, nascido em 15.01.1973, ELSON DINIZ, nascido em 17.05.1947, JOSÉ REGINALDO RONCON MOURA DOS ANJOS, nascido em 21.01.1959, em face da r. sentença proferida pela Exma. Juíza Federal Márcia Souza e Silva de Oliveira Fernandes (1ª Vara Criminal Federal de Campinas/SP – ID 205780571), publicada em 28.07.2020, que julgou PROCEDENTE o pedido formulado pela r. denúncia e CONDENOU os réus, pela prática do crime previsto no artigo 299 do Código Penal, às seguintes penas: 

 

i - CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS: à pena corporal de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de reclusão, em regime inicial ABERTO, e ao pagamento de 11 (onze) dias-multa, cada qual fixado em 01/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos. Restou substituída a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade, vedada a possibilidade de conversão em prestação pecuniária. 

 

ii - EDUARDO DINIZ: à pena corporal de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de reclusão, em regime inicial ABERTO, e ao pagamento de 11 (onze) dias-multa, cada qual fixado em 01/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos. Restou substituída a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor de 02 (dois) salários mínimos.  

 

iii – JOSÉ REGINALDO RONCONI MOURA DOS ANJOS: à pena corporal de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de reclusão, em regime inicial ABERTO, e ao pagamento de 11 (onze) dias-multa, cada qual fixado em 01/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos. Restou substituída a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor de 02 (dois) salários mínimos.  

 

iv – MARCELO LIGIERO: à pena corporal de 1 (um) ano de reclusão, em regime inicial ABERTO, e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa, cada qual fixado em 01/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos. Restou substituída a pena privativa de liberdade por uma de prestação de serviços à comunidade, vedada a conversão em prestação pecuniária.  

 

v - ELSON DINIZ: 1 (um) ano de reclusão, em regime inicial ABERTO, e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa, cada qual fixado em 01/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos. Restou substituída a pena privativa de liberdade por uma pena de prestação de serviços à comunidade, vedada a conversão em prestação pecuniária. 

 

Consta da r. denúncia, em síntese, que (ID 205720201 p. 03/07): 

 

“(...)  

Consta da documentação anexa que a empresa CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS, na qualidade de sócio administrador, registrou-se no SISCOMEX na modalidade simplificada de pequena monta. 

Nos termos da IN SRF nº 650/2006, tal modalidade permitia ao seu usuário maiores facilidades, uma vez que as exigências da Administração Aduaneira seriam menores do que aquelas referentes à habilitação na modalidade ordinária. Em contrapartida, ao se habilitar nessa modalidade, sujeitava-se a certas restrições, dentre as quais o limite, no período de seis meses consecutivos, de US$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil dólares americanos) em importações, com cobertura cambial, do tipo CIF (Cost, Insurance and Freight). 

(...) 

Cientes dessa situação, CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS, como administrador da empresa CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS IMPORTAÇÃO E E
XPORTAÇÃO e os DEMAIS DENUNCIADOS, na qualidade de despachantes aduaneiros, alteraram, em diversas oportunidades, o campo referente à cobertura cambial, em variadas DIs [Declarações de Importação], com o escopo de burlar as restrições do SISCOMX para a modalidade em que a empresa estava habilitara, importando, em período de seis meses, valores acima do teto estabelecido para a modalidade simplificada de pequena monta. 

(...)” 

 

A r. denúncia foi recebida em 28.03.2017 (ID 205720201 p. 09/10). 

 

Apela o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (ID. 205780568), requerendo, em síntese: i) seja adequadamente apenado o “empresário que dirigia a atuação dos demais atores, nos moldes do art. 61, I, do CP, e considerando que os despachantes aduaneiros cometeram crimes violando as próprias atribuições funcionais, o que encerra particular carga de reprovabilidade”; ii) aplicação de concurso material nas condutas praticadas em intervalo superior e 30 dias; iii) aplicação da continuidade delitiva adequada ao número de infrações perpetradas. 

   

A Defesa de JOSE REGINALDO RONCON MOURA DOS ANJOS apresentou razões de Apelação (ID 205780956), pleiteando, em síntese: i) a reforma da sentença com o reconhecimento da Declaração de Importação como documento particular e consequente absolvição diante da atipicidade da conduta. 

 

Igualmente inconformada, apela a Defesa de ELSON DINIZ (ID. 221935132), aduzindo, em síntese: i) que seja a Declaração de Importação considerada como documento particular e não público; ii) o reconhecimento da prescrição, nos termos dos artigos, 109, IV e 115, ambos do Código Penal; iii) absolvição diante da ausência de provas ou existência de dúvidas da autoria; iv) ausência de materialidade e autoria delitiva em relação DI n.º 11/2043477-9; v) ausência de dolo do acusado; vi) seja a conduta considerada penalmente irrelevante, ante a ausência de dano ao erário ou potencialidade lesiva ao Estado; vii) absolvição diante da aplicação do princípio da intervenção mínima. 

 

Apela a Defesa e EDUARDO DINIZ (ID. 227603230), aduzindo, em síntese, que: i) ausência de materialidade delitiva; ii) ausência de dolo; iii) irrelevância penal da falsidade, diante da ausência de potencialidade lesiva e dano ao erário; iv) aplicação do princípio da intervenção mínima e consequente absolvição; v) ausência de autoria delitiva; vi) absolvição nos termos do artigo 396, incisos I e III, do Código de Processo Penal. 

 

A Defesa de MARCELO LIGIERO, em suas razões de Apelação (ID. 238147517), requer, em síntese: i) absolvição por ausência de autoria; ii) ausência de dolo em sua conduta; iii) irrelevância penal da conduta, diante da ausência de potencialidade lesiva ou dano ao erário; iv) absolvição nos termos do artigo 386, incisos I e III, do Código de Processo Penal. 

 

Apela a Defesa de CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS (ID. 245738460), requerendo, em síntese: i) preliminarmente, conversão do julgamento em diligência, com devolução dos autos ao juízo de origem, para oferta, pelo Ministério Público Federal, de acordo de não persecução penal, nos termos do artigo 28-A do Código de Processo Penal; ii) no mérito, absolvição nos termos do artigo 386, incisos III, IV, V ou VII, do Código de Processo Penal. 

 

Contrarrazões pelas partes (ID. 205780942, 205780951, 205780955, 205780957, 205780962, 254900855). 

 

A Procuradoria Regional da República ofertou parecer (ID 257560972) manifestando-se pelo desprovimento dos recursos das Defesas e pelo provimento do recurso da Acusação. 

 

É o relatório. 

 

À revisão. 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


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APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0002775-88.2017.4.03.6105

RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS, EDUARDO DINIZ, ELSON DINIZ, JOSE REGINALDO RONCON MOURA DOS ANJOS, MARCELO LIGIERO

Advogados do(a) APELANTE: DANIEL LEON BIALSKI - SP125000-A, GUSTAVO ALVARES CRUZ - SP386305-A
Advogado do(a) APELANTE: MARCO ANTONIO MACHADO - SP106429-A
Advogado do(a) APELANTE: ANA PAULA LOPES - SP176443-A

APELADO: CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS, EDUARDO DINIZ, ELSON DINIZ, JOSE REGINALDO RONCON MOURA DOS ANJOS, MARCELO LIGIERO, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

Advogado do(a) APELADO: MARCO ANTONIO MACHADO - SP106429-A
Advogados do(a) APELADO: DANIEL LEON BIALSKI - SP125000-A, GUSTAVO ALVARES CRUZ - SP386305-A
Advogado do(a) APELADO: ANA PAULA LOPES - SP176443-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

O DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS:

 

Segundo constou na exordial acusatória (ID 205720201 p. 03/07) os denunciados teriam inserido, ou feito inserir, em documentos públicos, constantes de Declarações de Importação, apresentados perante a Receita Federal do Brasil, informações diversas das que deveriam constar, assim alterando a verdade sobre fatos juridicamente relevantes. Segue a inicial acusatória narrando que, no período compreendido entre janeiro de 2011 e fevereiro de 2012, CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS, na qualidade de administrador da pessoa jurídica Carlos Pioltini dos Santos Importação, juntamente com os acusados EDUARDO DINIZ, JOSÉ REGINALDO RONCON MOURA DOS ANJOS, MARCELO LIGIERO e ELSON DINIZ, estes na qualidade de despachantes aduaneiros, alteraram, em diversas DI’s, os campos referentes à cobertura cambial, com a finalidade de fraudar as restrições impostas pelo SISCOMEX.

 

DA NATUREZA DA DOCUMENTO PÚBLICO DA DECLARAÇÃO DE IMPORTAÇÃO

 

As Defesas dos acusados JOSÉ REGINALDO RONCON MOURA DOS ANJOS e ELSON DINIZ requerem que as Declarações de Importação sejam reconhecidas como documento particular, de forma que recairia sobre os acusados a pena abstrata de 01 (um) a 03 (três) anos de reclusão, conforme segunda parte do preceito secundário do artigo 299 do Código Penal. In verbis:

 

Art. 299 - Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante:

Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de um a três anos, e multa, de quinhentos mil réis a cinco contos de réis, se o documento é particular.

Parágrafo único - Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, ou se a falsificação ou alteração é de assentamento de registro civil, aumenta-se a pena de sexta parte.

 

 

Contudo, a despeito do sustentado, a Declaração de Importação tem natureza de documento público.

 

Conforme já destacado pela r. sentença (ID. 205780571):

 

“(...) A Declaração de Importação é documento público, consoante já decidido pelos Tribunais:

APELAÇÃO CRIMINAL número 0013759-22.2010.4.02.5001 00137592220104025001 Classe ACR - APELAÇÃO CRIMINAL, Relator(a) PAULO ESPÍRITO SANTO Relator para Acórdão PAULO ESOPIRITO SANTO Origem TRIBUNAL – SEGUNDA REGIÃO Data 09/12/2013 Data da publicação 07/01/2014

Ementa

PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO. OS FATOS NARRADOS NA DENÚNCIA NÃO CONDIZEM COM A CAPITULAÇÃO JURÍDICA FEITA PELO REPRESENTANTE MINISTERIAL. EQUÍVOCO NA DEFINIÇÃO JURÍDICA. ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA QUE NÃO PROSPERA. INOCORRÊNCIA DE PRESCRIÇÃO. PROVIMENTO DO RECURSO. (...) II – Considerando que a Declaração de Importação é documento público, a conduta do acusado não se amolda à falsidade ideológica, feita em documento particular, como capitulado na inicial, sendo nítido o equívoco cometido pelo órgão ministerial. III – Tendo em vista que para documento público a pena máxima em abstrato do art. 299, do CP é de 05 anos de reclusão, não está prescrita a pretensão punitiva estatal, porque entre a data do fato e o recebimento da denúncia não transcorreu o prazo de 12 (doze) anos, previsto no art. 109, III, do Código Penal (...)”

 

 

Diversamente do que pretendem as Defesas requerentes, a definição da natureza da Declaração de Importação (se documento público ou privado) não pode ser limitada ao sujeito emissor.

 

Não obstante emitida pelo particular, recai interesse público sobre a Declaração de Importação, visto que regulariza as informações contidas no processo de importação de mercadorias e serve de base para o despacho aduaneiro. A DI é documento exigido pela Administração Federal para o desembaraço aduaneiro.

 

“A Declaração de Importação - DI será formulada pelo importador no Siscomex e consistirá na prestação das informações constantes do Anexo I da IN SRF nº 680/2006, de acordo com o tipo de declaração e a modalidade de despacho aduaneiro” (conforme: https://www.gov.br/receitafederal/pt-br/assuntos/aduana-e-comercio-exterior/manuais/despacho-de-importacao/topicos-1/conceitos-e definicoes/tipos-de-declaracao-de-importacao/declaracao-de-importacao-di; consulta de 30.04.2024).

 

O Sistema Integrado de Comércio Exterior-Siscomex é responsável pelo registro, controle e monitoramento das atividades de comércio exterior.

 

Ademais, conforme destacado pela própria Receita Federal no Auto de Infração e Termo de Constatação: “(...) O sistema integrado de comércio exterior – SISCOMEX – é a plataforma informatizada sistemática do comércio exterior brasileiro que integra as atividades afins da Secretaria de Comércio Exterior – SECEX, da Secretaria da Receita Federal do Brasil – RFB e do Banco Central do Brasil – BACEN, no registro, acompanhamento e controle das etapas das operações de importação e exportação. (...) É através do SISCOMEX, via declaração de importação, que o importador registra e informa os dados relativos a cada uma de suas operações no comércio exterior. A inserção de informações falsas na declaração de importação afeta diretamente os controles dos órgãos públicos intervenientes.” (ID. 205720228, p. 06/07).

 

Dessa feita, indubitável a natureza de documento público da Declaração de Importação. Nesse sentido:

 

PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 299 DO CP. INSERÇÃO DE INFORMAÇÃO FALSA EM DECLARAÇÃO DE IMPORTAÇÃO. INTERPOSIÇÃO FRAUDULENTA PARA A OCULTAÇÃO DE REAL ADQUIRENTE DE MERCADORIAS IMPORTADAS. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. PENA DE MULTA. PENA RESTRITIVA DE DIREITOS. APELAÇÃO DA DEFESA PROVIDA EM PARTE. (...) 3. A denúncia imputou ao acusado a conduta de inserir em documentos públicos - Declarações de Importação - informação diversa da que deveria constar, a fim de alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante, ocultando o real adquirente de mercadorias importadas. Consoante precedente do STJ, a interposição fraudulenta de terceiro na documentação referente à importação de mercadoria, configura crime de falsidade ideológica, tipificado no art. 299 do Código Penal. (...) (TRF, ApeCrim 0010711-67.2017.403.6105, Rel. Desembargador Federal Hélio Nogueira, 11ª Turma, publicação: 29.02.2024) - grifei

 

 

Assim, afastadas as teses Defensivas dirigidas ao reconhecimento das DIs como documentos particulares.

 

DO REQUERIMENTO DE RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA ESTATAL PELA DEFESA DE ELSON DINIZ

 

A Defesa de ELSON DINIZ requer o reconhecimento da prescrição e consequente declaração de extinção da punibilidade. Aduz, em síntese, que: “Inicialmente insta destacar que na possibilidade de ser mantida como irretocável a sentença proferida às págs. 973/980; e, tendo em vista a dosimetria de pena ter sido apontada como de 01 ano de reclusão ao réu Elson Diniz, prescrita se encontra a pretensão punitiva, a rigor do que dispõe o art. 110, § 1º, do Código Penal. (...) Assim, à guisa da possível hipótese de não provimento do apelo interposto pelo parquet federal, roga o réu seja aplicada a prescrição de sua punição no presente caso, porquanto, os moldes aqui esmiuçados. (...) Uma vez decidido que a declaração de importação é um documento particular, seja a presente ação tida como prescrita nos termos do art. 109, inciso IV, c.c. com art. 115, do CP, extinguindo-se a punibilidade em relação a Elson, nos termos do art. 397, inciso IV, do CPP” (ID. 221935132 p. 05/06).

 

Contudo, conforme já fundamentado acima, a Declaração de Importação é documento público.

 

Nos termos do art. 110, parágrafo 1º, do Código Penal, em já tendo havido o trânsito em julgado para a acusação (mesmo que ainda pendente o julgamento de recurso da defesa), o prazo prescricional a ser considerado regula-se pela pena concretamente aplicada. Contudo, esse não é o caso dos autos, já que o recurso de Apelação do Ministério Público Federal, requerendo a majoração das penas dos acusados, encontra-se pendente de apreciação (ID. 205780568).

 

Desta forma, não tendo havido trânsito em julgado da r. sentença para a acusação, a prescrição da pretensão punitiva regula-se pela pena máxima em abstrato do delito, qual seja, 05 (cinco) anos de reclusão (inteligência da primeira parte do preceito secundário do artigo 299 do Código Penal), cujo lapso prescricional é de 12 (doze) anos, a teor do artigo 109, inciso III, do Código Penal.

 

Entre a data do recebimento da denúncia (28.03.2017 - ID 205720201 p. 09/10) e a da publicação da r. sentença (28.07.2020 - ID 205780571), ou da publicação da sentença até o presente momento, também não transcorreu lapso temporal ensejador do reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva estatal, ainda que considerada a redução pela metade do prazo prescricional a teor do artigo 115 do Código Penal, tendo em vista a idade do réu na data da prolação da sentença, eis que nascido em 17.05.1947.

 

Assim, fica afastado o requerimento Defensivo.

 

DO REQUERIMENTO DE APLICAÇÃO DO ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL – ANPP

 

Requer a Defesa do acusado CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS a conversão do julgamento em diligência, com a devolução dos autos ao r. juízo de origem, para oferta, pelo Ministério Público Federal, de Acordo de Não Persecução Penal, nos termos do artigo 28-A do Código de Processo Penal (ID. 245738460).

 

Na atual fase processual, defeso fazer incidir nesta relação processual penal o instituto trazido a lume pelo artigo 28-A do Código de Processo Penal (incluído por força da edição da Lei nº 13.964, de 24 de dezembro de 2019).

 

A Lei nº 13.964/2019, comumente denominada de “Pacote Anticrime”, introduziu o art. 28-A no Código de Processo Penal com a finalidade de prever o instituto do Acordo de Não Persecução Penal – ANPP, in verbis:

 

Art. 28-A. Não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, mediante as seguintes condições ajustadas cumulativa e alternativamente: I - reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo; II - renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público como instrumentos, produto ou proveito do crime; III - prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à pena mínima cominada ao delito diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo juízo da execução, na forma do art. 46 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal); IV - pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), a entidade pública ou de interesse social, a ser indicada pelo juízo da execução, que tenha, preferencialmente, como função proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito; ou V - cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que proporcional e compatível com a infração penal imputada. § 1º Para aferição da pena mínima cominada ao delito a que se refere o caput deste artigo, serão consideradas as causas de aumento e diminuição aplicáveis ao caso concreto. § 2º O disposto no caput deste artigo não se aplica nas seguintes hipóteses: I - se for cabível transação penal de competência dos Juizados Especiais Criminais, nos termos da lei; II - se o investigado for reincidente ou se houver elementos probatórios que indiquem conduta criminal habitual, reiterada ou profissional, exceto se insignificantes as infrações penais pretéritas; III - ter sido o agente beneficiado nos 5 (cinco) anos anteriores ao cometimento da infração, em acordo de não persecução penal, transação penal ou suspensão condicional do processo; e IV - nos crimes praticados no âmbito de violência doméstica ou familiar, ou praticados contra a mulher por razões da condição de sexo feminino, em favor do agressor. § 3º O acordo de não persecução penal será formalizado por escrito e será firmado pelo membro do Ministério Público, pelo investigado e por seu defensor. § 4º Para a homologação do acordo de não persecução penal, será realizada audiência na qual o juiz deverá verificar a sua voluntariedade, por meio da oitiva do investigado na presença do seu defensor, e sua legalidade. § 5º Se o juiz considerar inadequadas, insuficientes ou abusivas as condições dispostas no acordo de não persecução penal, devolverá os autos ao Ministério Público para que seja reformulada a proposta de acordo, com concordância do investigado e seu defensor. § 6º Homologado judicialmente o acordo de não persecução penal, o juiz devolverá os autos ao Ministério Público para que inicie sua execução perante o juízo de execução penal. § 7º O juiz poderá recusar homologação à proposta que não atender aos requisitos legais ou quando não for realizada a adequação a que se refere o § 5º deste artigo. § 8º Recusada a homologação, o juiz devolverá os autos ao Ministério Público para a análise da necessidade de complementação das investigações ou o oferecimento da denúncia. § 9º A vítima será intimada da homologação do acordo de não persecução penal e de seu descumprimento. § 10. Descumpridas quaisquer das condições estipuladas no acordo de não persecução penal, o Ministério Público deverá comunicar ao juízo, para fins de sua rescisão e posterior oferecimento de denúncia. § 11. O descumprimento do acordo de não persecução penal pelo investigado também poderá ser utilizado pelo Ministério Público como justificativa para o eventual não oferecimento de suspensão condicional do processo. § 12. A celebração e o cumprimento do acordo de não persecução penal não constarão de certidão de antecedentes criminais, exceto para os fins previstos no inciso III do § 2º deste artigo. § 13. Cumprido integralmente o acordo de não persecução penal, o juízo competente decretará a extinção de punibilidade. § 14. No caso de recusa, por parte do Ministério Público, em propor o acordo de não persecução penal, o investigado poderá requerer a remessa dos autos a órgão superior, na forma do art. 28 deste Código - destaques nossos.

 

Tendo como base a dicção legal, verifica-se que o instituto do Acordo de Não Persecução Penal – ANPP tem pertinência em ser invocado antes do oferecimento da denúncia ou da queixa, tendo em vista o art. 28-A, caput, do Código de Processo Penal, afirmar que o expediente somente será apresentado acaso não seja hipótese de arquivamento do Inquérito Policial, demonstrando claramente a intenção do legislador de sua incidência antes de iniciada a persecução penal. Nesse diapasão, o § 8º do mesmo comando legal dispõe que, recusada a homologação do Acordo, o magistrado devolverá os autos ao Ministério Público para que este analise a viabilidade de complementação das investigações ou ofereça denúncia. Desta feita, é notória a premissa de que o Acordo de Não Persecução Penal - ANPP foi criado para situações em que não tenham sido ainda recebidas as iniciais acusatórias.

 

Corroborando o posicionamento ora sustentado, mostra-se possível verificar que o Projeto de Lei nº 882/2019, que deu origem ao Acordo de Não Persecução Penal – ANPP, apresentado pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública, regulava uma modalidade de acordo aos investigados para fins de não persecução penal, qual seja, o ANPP, e outra aos acusados para fins de impedir a continuidade da persecução penal. A propósito, essa última modalidade (art. 395-A) retratava a importação do denominado plea bargain à justiça pátria, porém, não restou aprovada pelo legislador. A propósito, em documento datado de 31 de janeiro de 2019, da lavra do então Senhor Ministro da Justiça, extrai-se a justificativa da proposta de inserção do art. 395-A: aumenta as hipóteses e disciplina a prática de acordos que poderão ser requeridos pelo Ministério Público ou pelo querelante e o acusado, assistido por seu defensor. A situação aqui é diferente da justificada para o art. 28-A, porque pressupõe a existência de denúncia já recebida. No mérito, valem os argumentos lá mencionados, ressaltando-se que, homologada a concordância, a pena será aplicada de pronto (in http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Projetos/ExpMotiv/MJ/2019/14.htm) – destaque nosso.

 

Além disso, observe-se que a redação da regra do Acordo de Não Persecução Penal – ANPP encontra uma similitude incrível com a da transação penal, sabidamente ofertada antes do início da ação penal (art. 76 da Lei nº 9.099/95): Havendo representação ou tratando-se de crime de ação penal pública incondicionada, não sendo caso de arquivamento, o Ministério Público poderá propor a aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multas, a ser especificada na proposta – destaque nosso. Outrossim, não pode passar desapercebido que o Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais do Ministério Público editou o Enunciado nº 20, estabelecendo que cabe acordo de não persecução penal para fatos ocorridos antes da vigência da Lei nº 13.964/2019, desde que não recebida a denúncia (destaque nosso).

 

Desta feita, não há pertinência em se requerer a aplicação de instituto que foi concebido para evitar-se a instauração de persecução penal, qual seja, o Acordo de Não Persecução Penal – ANPP, em relação processual penal em que, inclusive, já foi confirmado o édito penal condenatório exarado por magistrado singular. Confira-se, a propósito, r. decisão monocrática da lavra do Eminente Ministro Reynaldo Soares da Fonseca e, portanto, oriunda do C. Superior Tribunal de Justiça, por meio da qual se afirmou que, embora não seja propriamente uma novidade, porquanto já prevista como política criminal na Resolução n. 181/2017 do Conselho Nacional do Ministério Público (alterada pela Resolução n. 183/2018 do CNMP), o acordo de não persecução penal inaugura nova realidade no âmbito da persecução criminal. Em síntese, consiste em um negócio jurídico pré-processual entre o Ministério Público e o investigado, juntamente com seu defensor, como alternativa à propositura de ação penal para certos tipos de crimes, principalmente no momento presente, em que se faz necessária a otimização dos recursos públicos (STJ: Habeas Corpus nº 584843 - SP, j. 24.06.2020 - destaque nosso).

 

Como se não bastasse a transcrição realizada anteriormente, calha destacar que tanto o C. Supremo Tribunal Federal como o E. Superior Tribunal de Justiça pacificaram posicionamento segundo o qual o Acordo de Não Persecução Penal – ANPP somente é cabível na fase de investigação criminal ou até o recebimento da denúncia – nesse sentido:

 

Direito penal e processual penal. Agravo regimental em habeas corpus. Acordo de não persecução penal (art. 28-A do CPP). Retroatividade até o recebimento da denúncia. 1. A Lei nº 13.964/2019, no ponto em que institui o acordo de não persecução penal (ANPP), é considerada lei penal de natureza híbrida, admitindo conformação entre a retroatividade penal benéfica e o tempus regit actum. 2. O ANPP se esgota na etapa pré-processual, sobretudo porque a consequência da sua recusa, sua não homologação ou seu descumprimento é inaugurar a fase de oferecimento e de recebimento da denúncia. 3. O recebimento da denúncia encerra a etapa pré-processual, devendo ser considerados válidos os atos praticados em conformidade com a lei então vigente. Dessa forma, a retroatividade penal benéfica incide para permitir que o ANPP seja viabilizado a fatos anteriores à Lei nº 13.964/2019, desde que não recebida a denúncia. 4. Na hipótese concreta, ao tempo da entrada em vigor da Lei nº 13.964/2019, havia sentença penal condenatória e sua confirmação em sede recursal, o que inviabiliza restaurar fase da persecução penal já encerrada para admitir-se o ANPP. 5. Agravo regimental a que se nega provimento com a fixação da seguinte tese: ‘o acordo de não persecução penal (ANPP) aplica-se a fatos ocorridos antes da Lei nº 13.964/2019, desde que não recebida a denúncia’ (STF, HC 191464 AgR, Rel. Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 11/11/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-280  DIVULG 25-11-2020  PUBLIC 26-11-2020) – destaque nosso.

 

PROCESSO PENAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE DROGAS. APLICAÇÃO DO ART. 28-A DO CPP. IMPOSSIBILIDADE. PECULIARIDADE DO CASO. RECONHECIMENTO DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS. 1. Segundo o § 1º do art. 28-A do Código de Processo Penal, para aferição da pena mínima cominada ao delito a que se refere o caput deste artigo, serão consideradas as causas de aumento e diminuição aplicáveis ao caso concreto. 2. Para serem consideradas as causas de aumento e diminuição, para aplicação do Acordo de Não Persecução Penal (ANPP), essas devem estar descritas na denúncia, que, no presente caso, inocorreu, não sendo possível considerar, no cálculo da pena mínima cominada ao crime imputado ao acusado, a causa de diminuição reconhecida apenas quando do julgamento do recurso especial. No caso do delito de tráfico, far-se-á necessário o curso da ação penal, em regra, para aferir os requisitos previstos no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06, o que obsta a aplicação do benefício, que decorre, inclusive do tratamento constitucional e da lei que são rigorosos na repressão contra o tráfico de drogas, crime grave, que assola o país, merecendo um maior rigor estatal. 3. Mostra-se incompatível com o propósito do instituto do Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) quando já recebida a denúncia e já encerrada a prestação jurisdicional na instância ordinária, com a condenação do acusado, cuja causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei de drogas fora reconhecida somente neste STJ, com a manutenção da condenação. 4. Embargos de declaração rejeitados (STJ, EDcl no AgRg no AgRg no AREsp 1635787/SP, Rel. Min. REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 04/08/2020, DJe 13/08/2020) – destaque nosso.

 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ESTELIONATO TENTADO. CONVERSÃO DO JULGAMENTO EM DILIGÊNCIA. INOVAÇÃO RECURSAL. IMPOSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE OMISSÃO. I - Os embargos declaratórios não constituem recurso de revisão, sendo inadmissíveis se a decisão embargada não padecer dos vícios que autorizariam a sua oposição (obscuridade, contradição e omissão). Na espécie, à conta de omissão no v. acórdão, pretende o embargante a rediscussão, sob nova roupagem, da matéria já apreciada. II - Ademais, da simples leitura do art. 28-A do CPP, se verifica a ausência dos requisitos para a sua aplicação, porquanto o embargante, em momento algum, confessou formal e circunstancialmente a prática de infração penal, pressuposto básico para a possibilidade de oferecimento de acordo de não persecução penal, instituto criado para ser proposto, caso o Ministério Público assim o entender, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, na fase de investigação criminal ou até o recebimento da denúncia e não, como no presente, em que há condenação confirmada por Tribunal de segundo grau. Embargos de declaração rejeitados (STJ, Embargos de Declaração no Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial nº 1.668.298/SP, Rel. Min. Félix Fisher, 5ª Turma, j. 26.05.2020) – destaque nosso.

 

Portanto, não faz jus o acusado ao ANPP, tendo em vista que o feito já se encontra sentenciado.

 

DO CRIME DO ARTIGO 299 DO CÓDIGO PENAL (FALSIDADE IDEOLÓGICA)

 

A despeito da tese de ausência de lesividade invocada pelas Defesas, esta não pode prosperar, uma vez que, para a consumação do delito de falsidade ideológica, não se exige a efetiva produção de um resultado naturalístico. Por se tratar de delito cuja natureza é formal, estará consumado o crime independentemente de ter havido concretização do dano ou efetiva obtenção da vantagem indevida (circunstâncias que representam mero exaurimento). A consumação se dá com a prática de quaisquer das condutas descritas no tipo penal, independentemente da ocorrência de qualquer resultado material.

 

Da materialidade e autoria delitivas.

 

A materialidade delitiva restou amplamente demonstrada nos autos através da Representação Fiscal para Fins Penais 11829.000013/2014-75, formalizada pela Autoridade Alfandegária do Aeroporto Internacional de Viracopos (ID. 205720195, p. 04/ID. 205720197, p. 24). No termo de Verificação Fiscal e Descrição dos Fatos (n.º 0817700.2014.00010-2 – ID. 205780541, p. 07/37) a Receita Federal esclarece:

 

“(...)

O sistema integrado de comércio exterior – SISCOMEX - é a plataforma informatizada sistemática do comércio exterior brasileiro que integra as atividades afins da Secretaria de Comércio Exterior – SECEX, da Secretaria da Receita Federal do Brasil – RFB e do Banco Central do Brasil – BACEN, no registro, acompanhamento e controle das etapas das operações de importação e exportação.

(...)

Todos os usuários do Sistema devem habilitar-se para acessar as informações necessárias ao desempenho de suas atividades, mediante identificação, fornecimento de senha e especificação de nível de acesso de dados. O acesso ao SISCOMEX é permitido apenas a detentores de senha, de caráter pessoal e intransferível, observada a legislação do órgão concedente e os limites das funções por ele administradas.

É através do SISCOMEX, via declaração de importação, que o importador registra e informa os dados relativos a cada uma de suas operações no comércio exterior.

A inserção de informações falsas na declaração de importação afeta diretamente os controles dos órgãos públicos intervenientes.

(...)

DAS DECLARAÇÕES DE IMPORTAÇÃO DA AUTUADA

(...)

A Fiscalização detectou que a empresa, por meio do despachante aduaneiro, para que pudesse importar acima do limite imposto pela IN SRF 650/2006, registrou declarações de importação com a informação “sem cobertura cambial”, quando na realidade houve cobertura, ou retificou adições de DI’s anteriormente informadas “com cobertura cambial” para “sem cobertura cambial”, para liberar limite para registro de nova DI com cobertura. Em alguns casos, após aproveitar-se da fraude, a empresa restabeleceu a informação da DI para “com cobertura cambial”, tentando maquiar a fraude efetuada.

A informação “sem cobertura cambial” prestada no registro das DI’s permitiu que CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS IMPORTAÇÃO registrasse, sem limites, declarações de importação no sistema, uma vez que somente entram para cálculo do limite de US$ 150.000,00 os valores das declarações de importação que possuem cobertura cambial, conforme previsto na IN SRF 650/2006.

Obviamente, tanto o registro de declaração de importação “sem cobertura cambial” quanto a retificação de “com” para “sem cobertura cambial” são permitidos, desde que tais operações reflitam a realidade dos fatos, o que não foi o caso de CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS IMPORTAÇÃO, como será demonstrado mais à frente.

O que determina se a declaração de importação é com ou sem cobertura cambial é a negociação entre importador e exportador. Se este realiza negócio pelo qual não vai receber pagamento daquele, ele deixa registrado tal fato na fatura comercial, como também registra se o pagamento for previsto.

Havendo previsão de pagamento ao exportador na fatura comercial, o importador deve informar no Siscomex “com cobertura cambial”; não havendo, “sem cobertura cambial”.

(...)

Como afirmado no início deste capítulo, CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS IMPORTAÇÃO registrou diversas declarações de importação “sem cobertura cambial” (pois não havia limite disponível”, sendo que algumas foram retificadas posteriormente para “com cobertura cambial” (quando já havia limite disponível). Outras foram registradas “com cobertura”, mas depois retificadas para “sem cobertura” (para abrir limite para outras declarações) e mais tarde novamente retificadas para “com cobertura” (para maquiar a fraude).

(...)

6.2 Das Declarações de Importação nº 11/0123480-8 e 11/0123524-3

(...)

Fica assim demonstrado que o importador inseriu falsa informação (“sem cobertura cambial”) em documento necessário ao desembaraço (declaração de importação), com intuito de burlar o limite da pequena monta.

6.3 Da Declaração de importação nº 11/0999661-8

(...)

Fica assim demonstrado que o importador inseriu falsa informação (“sem cobertura cambial”) em documento necessário ao desembaraço (declaração de importação), com intuito de burlar o limite da pequena monta.

6.4 Das Declarações de Importação nº 11/1313446-3, 11/1409565-8 e 11/1493567-2

(...)

Conclui-se que o importador inseriu falsa informação (“sem cobertura cambial”) em documento necessário ao desembaraço (declaração de importação), com único intuito de burlar o limite da pequena monta.

6.5 Da Declaração de Importação nº 11/1731427-0

(...)

Fica assim demonstrado que o importador inseriu falsa informação (“sem cobertura cambial”) em documento necessário ao desembaraço (declaração de importação), com intuito de burlar o limite da pequena monta.

6.6 Da Declaração de Importação nº 11/2043477-9

(...)

Fica assim demonstrado que o importador inseriu falsa informação (“sem cobertura cambial”) em documento necessário ao desembaraço (declaração de importação), com intuito de burlar o limite da pequena monta.

6.7 Dos contratos de câmbio

(...)

Se o importador pagou (pagamento antecipado), ou pagaria (pagamento postecipado) pelas mercadorias, e não é razoável que uma das partes da negociação seja surpreendida com tal obrigação, deveria ter informado “com cobertura cambial” no registro das declarações de importação e não poderia em nenhum caso das DI’s aqui relatadas ter retificado para “sem cobertura cambial”.

6.8 Das faturas comerciais

As faturas comerciais que instruíram os despachos de importação demonstram de forma inequívoca que as importações realizadas por meio das DI’s mencionadas nos itens 5.2 a 5.6 tiveram cobertura cambial, pois tratam-se de venda de mercadorias à CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS IMPORTAÇÃO, cuja contraprestação é o pagamento em moeda, sendo que algumas faturas mencionam até mesmo se o pagamento é antecipado ou Postecipado.

As faturas e os contratos de câmbio estão juntados no processo e fazem parte da resposta da autuada ao termo nº 1 de início de ação fiscal e intimação.

(...)”

 

Também verificam-se sobejamente comprovados autoria e dolo presentes nas condutas dos acusados.

 

O acusado CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS era o representante legal da empresa Carlos Pioltini dos Santos Importação, CNPJ n.º 05.514.9191/0001-1, e, nessa condição, por meio dos despachantes aduaneiros (corréus EDUARDO DINIZ, JOSÉ REGINALDO RONCON MOURA DOS ANJOS, MARCELO LIGIERO e ELSON DINIZ) falseou por diversas vezes as Declarações de Importação, no período compreendido entre janeiro de 2011 e fevereiro de 2012, mediante o registro das operações “com cobertura” quando tinha margem cambial, e “sem cobertura” na falta de margem, assim manipulando os limites legalmente estabelecidos, e no intuito de dar seguimento às operações comerciais de importação da empresa, ainda que ilegalmente.

 

Conforme descrição da Autoridade Aduaneira, nas condições de importador e despachantes aduaneiros, o estratagema dos acusados para que a empresa importadora ficasse abaixo do teto limite do SISCOMEX era registrar as DI’s como “sem cobertura cambial”. Ao passo que, posteriormente, quando dispunha de limite disponível para a operação, retificava as DI’s para “com cobertura cambial”, na tentativa de trazer aparência de regularidade à situação.

 

A Autoridade Alfandegária, através do Termo de Verificação Fiscal e Descrição dos Fatos n.º 0817700.2014.00010-2, revela as condutas dos corréus despachantes aduaneiros, mediante a verificação das senhas de acesso (diga-se, pessoais e intransferíveis) e sua utilização no sistema Siscomex. Também traz os extratos que comprovam as autorizações de cada despachante a operar no Siscomex em nome da empresa do corréu CARLOS PIOLTINI.  Confira-se:

 

“(...)

DA IDENTIFICAÇÃO DO DESPACHANTE

O fisco identificou 4 (quatro) despachantes aduaneiros que registraram ou retificaram indevidamente as declarações de importação de CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS IMPORTAÇÃO com informação ‘sem cobertura cambial’.

O Siscomex identifica o usuário do sistema responsável pela operação nele realizada (registro de DI ou sua retificação, por exemplo) pelo número de inscrição no CPF (cadastro nacional de pessoa física) de quem o acessou.

Esta informação - quem registrou a DI e quem retificou - está na planilha elaborada a partir dos dados extraídos do Siscomex.

A tabela abaixo foi construída a partir da Tabela 4, selecionando-se apenas as DI’s objetos deste auto de infração, com inclusão do CPF responsável pelo registro ou retificação:

(...) - vide Tabela em ID. 205720195, p. 54

Da tabela acima, vê-se que o responsável pelas retificações na cobertura cambial das DI’s nº 11/0123480-8 e 11/0123524-3 é o CPF 186.264.751-87, pertencente ao Sr. José Reginaldo Roncon Moura dos Anjos, que era à época dos fatos devidamente autorizado pelo responsável a operar no Siscomex em nome da empresa, como se vê no extrato de Siscomex abaixo:

(...) - vide extrato Siscomex em ID. 205720195, p. 55

O despachante de CPF 186.264.751-87 colaborou para que CARLOS POLTINI DOS SANTOS IMPORTAÇÃO importasse mais do que o permitido para o período. Ele responde solidariamente com CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS IMPORTAÇÃO no auto de infração presente”. (ID. 205720195, p. 54/55).

 

“(...)

DA IDENTIFICAÇÃO DO DESPACHANTE

O fisco identificou 4 (quatro) despachantes aduaneiros que registraram ou retificaram indevidamente as declarações de importação de CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS IMPORTAÇÃO com informação ‘sem cobertura cambial’.

O Siscomex identifica o usuário do sistema responsável pela operação nele realizada (registro de DI ou sua retificação, por exemplo) pelo número de inscrição no CPF (cadastro nacional de pessoa física) de quem o acessou.

Esta informação - quem registrou a DI e quem retificou - está na planilha elaborada a partir dos dados extraídos do Siscomex.

A tabela abaixo foi construída a partir da Tabela 4, selecionando-se apenas as DI’s objetos deste auto de infração, com inclusão do CPF responsável pelo registro ou retificação:

(...) - vide Tabela em ID. 205720195, p. 94

Da tabela acima, vê-se que o responsável pelo registro da cobertura cambial da DI nº 11/0999661-8 é o CPF 170.833.938-85, pertencente ao Sr. Marcelo Ligiero, que era à época dos fatos devidamente autorizado pelo responsável a operar no Siscomex em nome da empresa, como se vê no extrato de Siscomex abaixo:

(...) - vide extrato Siscomex em ID. 205720195, p. 95

O despachante de CPF 170.833.938-85 colaborou para que CARLOS POLTINI DOS SANTOS IMPORTAÇÃO importasse mais do que o permitido para o período. Ele responde solidariamente com CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS IMPORTAÇÃO no auto de infração presente”. (ID. 205720195, p. 94/95).

 

“(...)

DA IDENTIFICAÇÃO DO DESPACHANTE

O fisco identificou 4 (quatro) despachantes aduaneiros que registraram ou retificaram indevidamente as declarações de importação de CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS IMPORTAÇÃO com informação ‘sem cobertura cambial’.

O Siscomex identifica o usuário do sistema responsável pela operação nele realizada (registro de DI ou sua retificação, por exemplo) pelo número de inscrição no CPF (cadastro nacional de pessoa física) de quem o acessou.

Esta informação - quem registrou a DI e quem retificou - está na planilha elaborada a partir dos dados extraídos do Siscomex.

A tabela abaixo foi construída a partir da Tabela 4, selecionando-se apenas as DI’s objetos deste auto de infração, com inclusão do CPF responsável pelo registro ou retificação:

(...) - vide Tabela em ID. 205720196, p. 29

Da tabela acima, vê-se que o responsável pelas retificações na cobertura cambial das DI’s nº 11/1313446-3, 11/1409565-8, 11/1493567-2 e 11/1731427-0 é o CPF 246.195.958-70, pertencente ao Sr. Eduardo Diniz, que era à época dos fatos devidamente autorizado pelo responsável a operar no Siscomex em nome da empresa, como se vê no extrato de Siscomex abaixo:

(...) - vide extrato Siscomex em ID. 205720196, p. 30

O despachante de CPF 246.195.958-70 colaborou para que CARLOS POLTINI DOS SANTOS IMPORTAÇÃO importasse mais do que o permitido para o período. Ele responde solidariamente com CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS IMPORTAÇÃO no auto de infração presente”. (ID. 205720196, p. 29/30).

 

“(...)

DA IDENTIFICAÇÃO DO DESPACHANTE

O fisco identificou 4 (quatro) despachantes aduaneiros que registraram ou retificaram indevidamente as declarações de importação de CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS IMPORTAÇÃO com informação ‘sem cobertura cambial’.

O Siscomex identifica o usuário do sistema responsável pela operação nele realizada (registro de DI ou sua retificação, por exemplo) pelo número de inscrição no CPF (cadastro nacional de pessoa física) de quem o acessou.

Esta informação - que registrou a DI e quem retificou - está na planilha elaborada a partir dos dados extraídos do Siscomex.

A tabela abaixo foi construída a partir da Tabela 4, selecionando-se apenas as DI’s objetos deste auto de infração, com inclusão do CPF responsável pelo registro ou retificação:

(...) - vide Tabela em ID. 205720196, p. 70

Da tabela acima, vê-se que o responsável pelo registro de cobertura cambial da DI nº 11/2043477-9 é o CPF 253.643.598-91, pertencente ao Sr. Elson Diniz, que era à época dos fatos devidamente autorizado pelo responsável a operar no Siscomex em nome da empresa, como se vê no extrato de Siscomex abaixo:

(...) - vide extrato Siscomex em ID. 205720196, p. 71

O despachante de CPF 253.643.598-91 colaborou para que CARLOS POLTINI DOS SANTOS IMPORTAÇÃO importasse mais do que o permitido para o período. Ele responde solidariamente com CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS IMPORTAÇÃO no auto de infração presente”. (ID. 205720196, p. 70/71).

 

 

Ademais, a análise da Autoridade Aduaneira não apenas aclara a atuação dos despachantes, como identifica cada conduta, mediante a individualização das senhas de acesso e utilização do Sistema Integrado de Comércio Exterior-Siscomex, voltada aos registros e retificações das Declarações, dirigida à manipulação do limite de importação no interesse comercial da empresa Carlos Poltini dos Santos Importação, de propriedade e administrada pelo corréu CARLOS POIOLTINI DOS SANTOS. A Receita Federal aponta que:

 

i) JOSÉ REGINALDO RONCON MOURA DOS ANJOS (CPF n.º 186.264.751-87) operou as DI’s 11/0123480-8 e 11/0123524-3, registradas em 20.01.2011 e retificadas em 09.02.2011;

 

ii) MARCELO LIGIERO (CPF n.º 170.833.938-85) operou a DI 11/0999661-8, registrada em 31.05.2011;

 

iii) EDUARDO DINIZ (CPF n.º 246.195.958-70) operou as DI’s 11/1313446-3, 11/1409565-8 e 11/1493567-2, registradas, respectivamente, nas datas de 15.07.2011, 29.07.2011 e 10.08.2011, e retificadas em 13.09.2011; EDUARDO DINIZ, em 21.09.2011, também retificou a DI n.º 11/1731427-0;

 

iv) ELSON DINIZ (CPF n.º 253.643.598-91) registrou a DI n.º 11/2043477-9, em 27.10.2011.

 

Particularmente, quanto à DI n.º 11/2043477-9, objeto de questionamento em sede de Apelação da Defesa de ELSON DINIZ, aponta a Receita Federal no Termo de Verificação Fiscal e Descrição dos Fatos MPF-F Nº 0817700.2014.00010-2:

 

“(...)

6.6 Da Declaração de Importação nº 11/2043477-9.

A DI nº 11/2043477-9 foi registrada em 27/10/2011 “sem cobertura cambial” com valor CIF de US$ 37.779,38.

Pela tabela 3, verifica-se que, até 26/10/2011, o importador já havia utilizado US$ 136.228,62 de sua cota de importação nos últimos seis meses (valor esse já manipulado pela fraude com as DI’s dos itens 5.3, 5.4 e 5.5, senão o correto seria US$ 216.439,00).

Desta forma, a alternativa que restou ao importador para registrar sua DI sem ultrapassar o limite de US$ 150.000,00 foi informá-la como ‘sem cobertura cambial’, ignorando a realidade dos fatos, já que houvera cobertura cambial para esta importação, como o próprio autuado informa em resposta à intimação feita por esta Fiscalização:

[vide quadro ID. 205780543, p. 28]

Para tentar maquiar a fraude efetuada, o importador, em 01/02/2012, quando já dispunha de limite disponível, retificou a DI para ‘com cobertura cambial’, restabelecendo a ‘normalidade’ dos fatos.

O extrato do contrato de câmbio nº 103013790, bem como a fatura comercial nº K201108031 foram apresentados, fazem parte deste auto de infração e confirmam as informações acima.

Fica assim demonstrado que o importador inseriu falsa informação (‘sem cobertura cambial’) em documento necessário ao desembaraço (declaração de importação), com intuito de burlar o limite da pequena monta.

(...)” - ID. 205780543, p. 28/29

 

Conforme acertadamente fundamentado r. pelo juízo sentenciante: “(...) Os despachantes aduaneiros são representantes do importador/exportador sua atividade também está regulada pela Receita Federal. No didático Termo de Verificação Fiscal e Descrição dos Fatos 0817700.2013.00010-2, a autoridade fiscal explica no artigo 18 da Instrução Normativa 650/2006, o responsável legal da importadora elege seus representantes que podem ser os despachantes aduaneiros. De todo o exposto, conclui-se que para o registro da DI há a necessidade de apresentação da fatura comercial, dentre outros documentos. O despachante aduaneiro, representante legal do importador é quem registra os documentos. Nos termos do artigo 28 de Decreto-lei 1937/1946 as relações entre despachantes e comitentes são reguladas pelas leis que regem os mandatos, ou seja, nos termos do artigo 653 e seguintes do Código Civil. ‘Art. 653. Opera-se o mandato quando alguém recebe de outrem poderes, para em seu nome praticar atos ou administrar interesses. A procuração é o instrumento do mandato.’ De fato, os despachantes devem registrar a Declaração de Importação, a modalidade de pagamento, inclusive, e este encontra-se na fatura comercial. Se há alteração na forma de pagamento, essa deve ser registrada mediante comprovação do acordo entre o exportador e importador.” (ID 205780571).

 

Os acusados foram interrogados, bem como foram ouvidas pelo juízo de origem as testemunhas Gabriel Cardoso Schweitzer, Antonio Fernando Pereira, Marcelo Martins da Silva, Adilson Chaves, Mario Silva Júnior, Marcia Cristina Yanaka Melucci, José Roberto Dias, Ana Lígia Moreira Teixeira, Patrícia Elaine Pioltini, Katia Helena Pioltini, Marly Gomes Caldas e Paulo Rogério Pioltini (IDs. 205780554, 205780555, 205780556, 205780557, 205780558, 205780559, 205780546, 205780547, 205780548, 205780549, 205780550, 205780551, 205780552, 205780533, 205780534, 205780535, 205780536, 205780537, 205780538, 205780539, 205780540, 205780541, 205780542, 205780543, 205780544).

 

A prova oral produzida nos autos confirma a autoria e dolo por parte dos acusados. Nesse sentido, cumpre trazer a síntese de pontos de importante destaque.

 

Em juízo o corréu CARLOS PIOLTINI negou as acusações. Afirmou que apenas comprava produtos na China para revenda no Brasil, porque não tinha conhecimento de comércio exterior, e que os procedimentos de importação eram terceirizados aos escritórios dos despachantes contratados. O controle de quotas do radar era feito pelos despachantes contratados. Não soube responder qual seria a vantagem dos despachantes em ultrapassarem os limites do radar. Afirmou que não preenchia as declarações de importação.

 

Por seu turno, o acusado EDUARDO DINIZ, em juízo, disse quem inseria as informações no sistema eram os colaboradores. Não tratava diretamente com CARLOS. As retificações quanto ao pagamento eram a pedido do importador. Compartilhava as senhas de acesso ao Siscomex com seus colaboradores. O despachante não visualizava o limite do importador. O importador deveria ter o controle do limite do radar. Quando CARLOS pediu a retificação da DI ao seu empregado, justificou que não pagaria as mercadorias porque recebera o material fora das especificações acordadas. A colaboradora que tratava com CARLOS dizia que ele era desorganizado.

 

O réu ELSON DINIZ disse que não registrava as DIs, e quem fazia esse trabalho eram seus funcionários. Também não tratava diretamente com CARLOS. CARLOS cuidava dos pagamentos cambiais. Não tinha controle dos limites porque CARLOS trabalhava com outros despachantes. O empresário que faz as compras deveria saber seu saldo para importar.

 

Quanto ao acusado JOSÉ REGINALDO, em seu interrogatório judicial declinou que não chegou a conhecer CARLOS, pois seu ex-sócio foi quem fez o contato comercial. Não sabe qual funcionário registrou a DI. Por volta de quinze colaboradores utilizavam sua senha. O pagamento do câmbio é feito pelo cliente (importador). Não tinha como controlar os limites do radar. O importador deve fazer os controles do limite. Apenas a partir de agora há funcionalidade no sistema da Receita para o despachante controlar o radar do importador. Não tratava com CARLOS. Casos de registro de DIs são inúmeros e retificações são raros.

 

Perante o juízo o corréu MARCELO LIGIERO disse que não conhecia CARLOS pessoalmente. Fez os desembaraços para sua esposa em apenas dois casos. Não registrou retificações de DIs. Apenas fez os desembaraços, enquanto o pagamento é pelo importador. No caso de sua DI registrada, foi o importador (CARLOS) quem disse para fazer o registro sem cobertura cambial. Não tem acesso aos valores de importação no sistema. Quem digitava as DIs era seu colaborador.

 

A testemunha de Acusação Gabriel Cardoso Schweitzer, Auditor Fiscal que elaborou o relatório de fiscalização (ID. 205780545), afirmou em juízo que a Alfândega realizou várias fiscalizações durante o ano de 2014 envolvendo alterações dos limites do Siscomex. Quando a DI é registrada sem cobertura o valor não conta para o limite de importação. Várias empresas usaram desse expediente, inclusive com coincidências de despachantes que faziam isso para as empresas. Pelo relatório percebeu nitidamente a intenção de fraudar o limite. Entende que o despachante deve estar ciente do que está fazendo. A Receita Federal espera que tudo o que o despachante faça seja comprovado pelo cliente. Nunca viu um caso legítimo em que o despachante tenha tido necessidade de alterar os registros das DIs como nessa forma do caso dos autos. A retificação das DIs não é vedada. Improvável que tenha havido engano pelo acusado CARLOS PIOLTINI. A primeira beneficiada seria sua empresa. Porém, a Receita Federal apurou que certos despachantes estariam vendendo essas facilidades para as empresas, então de forma indireta pode ter havido vantagem para os despachantes. O despachante teria como saber se o limite estava sendo ultrapassado, pois quando ele tentasse registrar uma DI com cobertura o sistema recusaria.

 

A testemunha de Defesa Marly Gomes Caldas (ID. 205780547), foi contadora da empresa de CARLOS PIOLTINI, aproximadamente de 2011 a 2014. Não tinha funcionários. Era somente ele com um sócio. Afirmou que nunca recebeu para contabilização documentação de importação sem o pagamento de câmbio.

 

A testemunha de Defesa Patrícia Elaine Pioltini (ID. 205780548), esposa de CARLOS PIOLTINI, ouvida como informante, disse que não tinham expertise para os desembaraços aduaneiros, razão pela qual contrataram escritórios para esse trabalho.

 

A testemunha de Defesa Antônio Fernando Pereira (ID. 205780549), trabalha com despacho aduaneiro na empresa “Trakers”. Conhece JOSÉ REGINALDO porque ele trazia clientes. Em 2011 trabalhavam por volta de 13 funcionários. REGINALDO não registrava as DIs diretamente em razão do volume de operações. Não sabe quem registrou a DI dos autos. Não cobravam pelas retificações, era cobrado o desembaraço como um todo. As senhas pessoais de despachante em geral normalmente são utilizadas dentro do escritório. Quem negocia a operação é o importador.

 

A testemunha de Defesa Adilson Chaves é despachante aduaneiro aposentado. Disse que as senhas do acesso são normalmente compartilhadas, principalmente quando o despachante sai para visitas a clientes. O registro das DIs é feito com as informações do importador. Trabalhou no Sindicato dos Despachantes. Segunda a legislação, a senha é pessoal.

 

A testemunha de Defesa Márcia Cristina Júnior disse que as importações de CARLOS PIOLTINI eram regulares e tratava diretamente com ele. O réu CARLOS conhecia as operações de importação. Executava as orientações de CARLOS e quando a documentação era incompleta tiravam dúvidas com ele. Algumas importações não tinham informação de pagamento. Sabe que CARLOS trabalhava com outros despachantes. Pela forma que ele coordenava os embarques CARLOS já era um importador experiente. Tinha conhecimento dos procedimentos fiscais e aduaneiros. Nas retificações recebeu contato de CARLOS solicitando alteração das formas de pagamento de “com cobertura” para “sem cobertura cambial”. Era comum ele fazer esses pedidos porque ele fazia muitos financiamentos em banco. CARLOS pediu as alterações diretamente à testemunha e não falou com EDUARDO.

 

A testemunha de Defesa José Roberto Dias afirmou que trabalha com ELSON e EDUARDO DINIZ há mais de 08 anos. Cuidou de operações de importação de CARLOS PIOLTINI. O relacionamento com CARLOS não era bom. A testemunha não aceitava alguns pedidos de CARLOS e resolveu passar o cliente “para frente”, não cuidou mais dele. Ele não precisava de despachante aduaneiro porque tinha conhecimentos específicos.

 

A testemunha de Defesa Ana Lígia Moreira Teixeira afirmou que CARLOS PIOLTINI era o único sócio e administrador da empresa. Toda importação era feita pelo escritório Diniz (EDUARDO e ELSON DINIZ). Os pagamentos de fechamento de câmbio eram feitos pela testemunha para o escritório DINIZ. Não ficou sabendo de problemas de mercadorias com defeito ou quebradas que CARLOS não iria pagar.

 

O conjunto probatório amealhado aos autos, principalmente através do Procedimento Administrativo da Aduana de Viracopos, descortina o esquema arquitetado e dirigido à manipulação dos limites do Siscomex, mediante os registros de Declarações de Importação “sem cobertura cambial” e, posteriormente, quando os limites da empresa de propriedade do corréu CARLOS poderiam abrigar novas importações, era feita a retificação para “com cobertura”. Também a fraude era operacionalizada de forma inversa, com registro de Declarações de Importação “com cobertura cambial” e, com a constatação de que referido limite de importações seria alcançado, aludido registro era retificado para “sem cobertura cambial”.

 

Os despachantes aduaneiros (EDUARDO DINIZ, JOSÉ REGINALDO RONCON MOURA DOS ANJOS, MARCELO LIGIERO e ELSON DINIZ), inseriram, em documentos públicos, declarações falsas, assim alterando a verdade sobre fatos juridicamente relevantes. Eram os mandatários responsáveis pelos registros ou alterações das Declarações de Importação e suas especificações quanto às formas de pagamento (com ou sem cobertura cambial).

 

A versão trazida pelas Defesas dos acusados despachantes aduaneiros, acerca do compartilhamento de senhas, não pode ser aceita e está em desacordo com as demais provas dos autos.

 

Não é crível que, como profissionais experientes, compartilhassem indiscriminadamente as senhas de acesso ao sistema pelos seus colaboradores, sem controle das atividades, e para o preenchimento de documentos públicos (há relatos de senhas sendo compartilhadas por até 15 pessoas). Também não é crível que, como profissionais experientes do ramo, os despachantes não tinham ciência das atividades praticadas no exercício de suas funções, além de não exigirem comprovação dos registros e retificações realizados a pedido do importador.

 

Ainda, de acordo com a testemunha de Acusação (Auditor Fiscal que elaborou o procedimento fiscalizatório), houve nítida intenção de fraudar o limite do Siscomex. E rememore-se que, conforme destacado pela testemunha, os procedimentos de fiscalização foram iniciados com as constatações de que alguns profissionais vendiam essas facilidades (DIs fora do radar) às empresas.

 

O Auditor Fiscal também destacou que o despachante tomaria conhecimento dos limites do Siscomex quando o sistema recusasse os registros das DIs que ultrapassassem o valor legalmente estabelecido.

 

Acrescente-se que a alegação de que os despachantes compartilhariam suas senhas durante o desempenho de suas atividades é prescindível para a configuração da autoria delitiva dos acusados. Em tal contexto, o compartilhamento de senhas não se mostra, no presente julgamento, como um fundamento-chave para a condenação dos acusados, bastando para a manutenção de suas condenações a comprovação de que as informações, inseridas ou por eles consentidas, eram conhecidamente falsas.

 

De outro turno, também suficientemente comprovadas autoria e dolo quanto ao acusado CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS. O corréu era o proprietário e administrador da sociedade comercial Carlos Pioltini dos Santos Importação e, assim, o responsável pelo fechamento dos contratos de importação e detentor das decisões quanto às formas de pagamento.

 

Apesar de sua negativa de autoria, quando cotejada com as demais provas dos autos, não pode ser aceita a versão de CARLOS de que teria total desconhecimento e ausência de controles próprios sobre os limites e procedimentos afetos às importações.

 

Verifica-se que os corréus despachantes aduaneiros são unânimes ao afirmar que cabia  a CARLOS PIOLTINI, na condição de importador, ter ciência dos limites do radar, porque realizava os respectivos pagamentos, bem ainda, que os registros das DIs eram feitos conforme informações por ele fornecidas.

 

Ademais, conforme bem destacado pela testemunha de acusação, Auditor Fiscal, a empresa do acusado CARLOS era a primeira beneficiária das falsidades das DIs.

 

Ainda, cumpre destacar a afirmação da testemunha Márcia Cristina Júnior, no sentido de que CARLOS era importador experiente e conhecia as operações de importação. E as alegações da testemunha José Roberto, de que não aceitava alguns pedidos de CARLOS, e que esse acusado não precisava de despachantes, porque tinha conhecimentos de importação. 

 

Da tese de irrelevância penal da conduta, diante de ausência de potencialidade lesiva e dano ao erário.

 

As Defesas constituídas dos acusados ELSON DINIZ, EDUARDO DINIZ e MARCELO LIGIERO requerem suas absolvições, entendendo que a conduta dos acusados possuiria irrelevância penal diante de ausência de potencialidade lesiva e de dano ao erário.

 

A despeito das alegações de ausência de lesão ou potencialidade lesiva a bem jurídico, a conduta descrita no artigo 299 do Código Penal trata-se de delito formal, cuja caracterização independe da obtenção dos efeitos pretendidos pelo agente, consumando-se com a simples contrafação ideológica.

 

Confira-se jurisprudência desta E. 11ª Turma Julgadora, bem como do C. STJ:

 

PENAL E PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. INSERÇÃO DE DECLARAÇÃO FALSA EM DOCUMENTO PARTICULAR. ART. 125, XIII, DA LEI N.º 6.815/1980 (ESTATUTO DO ESTRANGEIRO) C.C. ARTIGOS 299 E 304 DO CP. REVOGAÇÃO DO ESTATUTO DO ESTRANGEIRO PELA LEI N.º 13.445/2017 (NOVA LEI DE MIGRAÇÃO). PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE NORMATIVO-TÍPICA. MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS. INOCORRÊNCIA DE CRIME IMPOSSÍVEL. ERRO DE PROIBIÇÃO AFASTADO. DOSIMETRIA. REDUÇÃO DA PENA APLICADA A UM DOS RÉUS. IMPOSSIBILIDADE DE IMPOSIÇÃO DE MULTA, SOB PENA DE REFORMATIO IN PEJUS. POSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS PARA AMBOS OS RÉUS. FIXAÇÃO DE REGIME ABERTO PARA AMBOS OS RÉUS. REFORMA PARCIAL DA SENTENÇA.

(...)

6. Não merece guarida a tese da defesa no sentido de que o modus operandi de outros estrangeiros teria despertado a atenção da Polícia Federal e, por tal razão, o crime em testilha seria impossível, uma vez que o bem jurídico não teria sofrido risco algum. Somente é possível cogitar-se de crime impossível quando a ineficácia do meio empregado for absolutamente irretorquível e, no caso concreto, não se pode dizer que o meio utilizado para a prática do crime era ineficaz. O objetivo pretendido com a emissão e utilização da duplicata falsa somente não foi atingido por circunstâncias externas, alheias à vontade dos agentes, o que não afeta o fato de que o meio empregado para tal consecução era perfeitamente apto à produção do resultado pretendido. Ademais, a falsidade ideológica (artigo 299, caput, do Código Penal) é crime de natureza formal, cuja consumação se opera com a mera inserção de declaração falsa no documento, sendo desnecessária, para a caracterização do delito em questão, a comprovação de que a Administração Pública tenha sido ludibriada ou sofrido efetivo prejuízo.

(...)

(ACR 0000188-69.2011.403.6181, DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS, TRF3 - DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/08/2018)

 

PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ART. 299 DO CP. FALSIDADE IDEOLÓGICA. CRIME FORMAL. ARREPENDIMENTO EFICAZ. INAPLICABILIDADE DO INSTITUTO. SÚMULA 7/STJ. ART. 143 DA LEI 8.112/90. CONDESCENDÊNCIA CRIMINOSA. PRODUÇÃO DE PROVA CONTRA A SI MESMO. NÃO OCORRÊNCIA. OFENSA AO ART. 155 DO CPM. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 282/STF. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. "Segundo a classificação doutrinária, o delito de falsidade ideológica é crime formal, que se consuma com a prática de uma das figuras típicas previstas, independente da ocorrência de qualquer resultado ou de efetivo prejuízo para terceiro" (RHC 78.502/BA, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 20/02/2018, DJe 02/03/2018).

(...)

(AGARESP 1548430, MIN. RIBEIRO DANTAS, STJ - QUINTA TURMA, DJF DATA:19/12/2019)

 

Afastadas as teses Defensivas nesse ponto.

 

Dos requerimentos de aplicação do princípio da intervenção mínima e consequente absolvição dos acusados.

 

Requerem os acusados EDUARDO DINIZ e ELSON DINIZ suas absolvições diante da aplicação do princípio da intervenção mínima.

 

A propósito, destaque-se que o Estado de Direito necessariamente exige a presença de um Direito Penal fragmentário, ou seja, mínimo no sentido de que não incrimine qualquer conduta no plano dos fatos e dos acontecimentos da vida (princípio da intervenção mínima), sob o pálio do conceito de que a tipificação de ações / omissões deve ocorrer quando os demais ramos da Ciência Jurídica não foram o bastante para restabelecer a harmonia social (postulado da ultima ratio), conforme já restou consignado pelo C. Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do HC 107638 (Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, julgado em 13/09/2011, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-187 DIVULG 28-09-2011 PUBLIC 29-09-2011): A existência de um Estado Democrático de Direito passa, necessariamente, por uma busca constante de um direito penal mínimo, fragmentário, subsidiário, capaz de intervir apenas e tão-somente naquelas situações em que outros ramos do direito não foram aptos a propiciar a pacificação social. Sem prejuízo do exposto, ainda de acordo com o C. Supremo Tribunal Federal, o Direito Penal constitui a ultima ratio legis quanto às condutas humanas, por isso que deve incidir somente quando indispensável para a manutenção da ordem jurídica, posto inexistir norma jurídica para controlar e sancionar ações que violem expectativas normativas de maior intensidade (INQ 3674, Rel. Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 07/03/2017, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-209 DIVULG 14-09-2017 PUBLIC 15-09-2017).

 

Importante salientar que o E. Superior Tribunal de Justiça faz coro ao entendimento de que o Direito Penal não deve ser chamado a regular toda e qualquer situação da vida real (sob pena, inclusive, de haver a banalização de condutas incriminadas sem a presença de efetivo potencial lesivo a bem jurídico relevante, culminando, assim, no descrédito do Direito Penal), conforme pode ser inferido do excerto que segue: de acordo com o princípio da intervenção mínima, o direito penal não deve interferir em demasia na vida em sociedade, devendo ser utilizado somente quando os demais ramos do direito não forem suficientes para proteger os bens de maior importância (HC 215.522/RS, Rel. Min. GURGEL DE FARIA, QUINTA TURMA, julgado em 20/10/2015, DJe 10/11/2015).

 

Em que pesem tais premissas, entendo que o tipo penal colacionado no art. 299 do Código Penal não padece de qualquer vício que o torne contrário ao Texto Constitucional de 1988. Isso porque tal preceito tem como escopo tutelar bem jurídico consistente na fé pública.

 

Desta feita, mostra-se extremamente relevante e necessária a intervenção do Direito Penal a incriminar condutas que tenham como alvedrio a obtenção de vantagem ilícita, em prejuízo alheio, por meio da perpetração de ardil, não apenas quando há um desfalque patrimonial, mas, principalmente, a fim de manter a higidez do sistema que cerca a entidade de direito público ou instituto de economia popular, de assistência social ou de beneficência.

 

Portanto, correta a incidência do Direito Penal para proteger as máculas ao bem jurídico tutelado pelo crime de falsidade ideológica, principalmente quando levado a efeito em prejuízo da fiscalização federal, não bastando a possibilidade de o ordenamento jurídico prever a necessidade de reparação do erário nas esferas cível e administrativa, sem que possa ser alegada violação aos postulados da mínima intervenção do Direito Penal e da incidência de tal ramo do Direito como ultima ratio. Consigne-se, por oportuno, não haver qualquer possibilidade da pretensão vindicada ser acolhida sob o aspecto do reconhecimento da existência de inconstitucionalidade formal por desrespeito ao devido processo legislativo (como, por exemplo, vício de iniciativa da lei ou desrespeito ao rito constitucional de elaboração da espécie normativa) quando da edição da norma em comento.

 

Portanto, por todo o exposto, impossível reconhecer a atipicidade material do delito em questão sob o prisma da intervenção mínima do direito penal, motivo pelo qual subsiste válida a condenação dos acusados.

 

Dessa forma, demonstradas materialidade e autoria delitivas, bem como o elemento subjetivo pelos réus, ficam mantidas as condenações de CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS,  EDUARDO DINIZ, JOSÉ REGINALDO RONCON MOURA DOS ANJOS, MARCELO LIGIERO e  ELSON DINIZ pela prática do delito previsto no artigo 299 do Código Penal.

 

DA DOSIMETRIA DA PENA NO CASO CONCRETO

 

O r. juízo a quo efetuou a dosimetria da pena nos seguintes termos (ID 205780571):

 

“(...)

Passo à dosimetria das penas.

CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS

Na fase do artigo 59 do Estatuto Repressivo, à míngua de elementos quanto à conduta social e à personalidade do acusado, deixo de valorá-las. Não ostenta antecedentes criminais. Por fim, as consequências do crime são as esperadas. Assim, fixo a pena-base no mínimo legal, ou seja, em 01 (um) ano de reclusão e 10 (dez) dias-multa. Não avultam agravantes ou atenuantes. Não há causas de diminuição. NOS TERMOS DO ARTIGO 71 DO CÓDIGO PENAL, AUMENTO A PENA EM 1/3 (UM TERÇO). A PENA DEFINITIVA É DE 1 (UM) ANO E 4 (QUATRO) MESES DE RECLUSÃO, E 11 (ONZE) DIAS MULTA.

O REGIME DE CUMPRIMENTO É O ABERTO NOS TERMOS DO ARTIGO 33 DO CÓDIGO PENAL.

Arbitro a pena de multa em um trigésimo do valor do salário mínimo vigente a data dos fatos por ausência de informações nestes autos sobre a situação econômica do acusado.

Em razão também da quantidade de pena corporal aplicada, cabível a substituição prevista no artigo 44 do Código Penal por duas penas restritivas de direito, a saber a prestação de serviços à Comunidade, sem a possibilidade de conversão para pagamento de pena pecuniária.

EDUARDO DINIZ

Na fase do artigo 59 do Estatuto Repressivo, à míngua de elementos quanto à conduta social e à personalidade do acusado, deixo de valorá-las. Não ostenta antecedentes criminais. Por fim, as consequências do crime são as esperadas. Assim, fixo a pena-base no mínimo legal, ou seja, em 01 (um) ano de reclusão e 10 (dez) dias-multa. Não avultam agravantes ou atenuantes. Não há causas de diminuição. NOS TERMOS DO ARTIGO 71 DO CÓDIGO PENAL, AUMENTO A PENA EM 1/3 (UM TERÇO). A PENA DEFINITIVA É DE 1 (UM) ANO E 4 (QUATRO) MESES DE RECLUSÃO, E 11 (ONZE) DIAS MULTA.

O REGIME DE CUMPRIMENTO É O ABERTO NOS TERMOS DO ARTIGO 33 DO CÓDIGO PENAL.

Arbitro a pena de multa em um trigésimo do valor do salário mínimo vigente à data dos fatos por ausência de informações nestes autos sobre a situação econômica do acusado.

Em razão também da quantidade de pena corporal aplicada, cabível a substituição prevista no artigo 44 do Código Penal por duas penas restritivas de direito, saber, a prestação de serviços à Comunidade, e a pena pecuniária no valor de 2 (dois) salários mínimos.

JOSE REGINALDO RONCONI MOURA DOS SANTOS

Na fase do artigo 59 do Estatuto Repressivo, à míngua de elementos quanto à conduta social e à personalidade do acusado, deixo de valorá-las. Não ostenta antecedentes criminais. Por fim, as consequências do crime são as esperadas. Assim, fixo a pena-base no mínimo legal, ou seja, em 01 (um) ano de reclusão e 10 (dez) dias-multa. Não avultam agravantes ou atenuantes. Não há causas de diminuição. NOS TERMOS DO ARTIGO 71 DO CÓDIGO PENAL, AUMENTO A PENA EM 1/3 (UM TERÇO). A PENA DEFINITIVA É DE 1 (UM) ANO E 4 (QUATRO) MESES DE RECLUSÃO, E 11 (ONZE) DIAS MULTA.

O REGIME DE CUMPRIMENTO É O ABERTO NOS TERMOS DO ARTIGO 33 DO CÓDIGO PENAL.

Arbitro a pena de multa em um trigésimo do valor do salário mínimo vigente à data dos fatos por ausência de informações nestes autos sobre a situação econômica do acusado.

Em razão também da quantidade de pena corporal aplicada, cabível a substituição prevista no artigo 44 do Código Penal por duas penas restritivas de direito, saber, a prestação de serviços à Comunidade, e a pena pecuniária no valor de 2 (dois) salários mínimos.

MARCELO LIGIERO

Na fase do artigo 59 do Estatuto Repressivo, à míngua de elementos quanto à conduta social e à personalidade do acusado, deixo de valorá-las. Não ostenta antecedentes criminais. Por fim, as consequências do crime são as esperadas. Assim, fixo a pena-base no mínimo legal, ou seja, em 01 (um) ano de reclusão e 10 (dez) dias-multa. Não avultam agravantes ou atenuantes. Não há causas de aumento ou diminuição. A PENA DEFINITIVA É DE 1 (UM) ANO DE RECLUSÃO, e 10 (DEZ) DIAS MULTA.

O REGIME DE CUMPRIMENTO É O ABERTO nos termos do artigo 33 do Código Penal.

Arbitro a pena de multa em um trigésimo do valor do salário mínimo vigente à data dos fatos por ausência de informações nestes autos sobre a situação econômica do acusado.

Em razão também da quantidade de pena corporal aplicada, cabível a substituição prevista no artigo 44 do Código Penal por uma pena restritiva de direito, a saber, a prestação de serviços à Comunidade, sem a possibilidade de conversão para pagamento de pena pecuniária.

ELSON DINIZ

Na fase do artigo 59 do Estatuto Repressivo, à míngua de elementos quanto à conduta social e à personalidade do acusado, deixo de valorá-las. Não ostenta antecedentes criminais. Por fim, as consequências do crime são as esperadas. Assim, fixo a pena-base no mínimo legal, ou seja, em 01 (um) ano de reclusão e 10 (dez) dias-multa. Não avultam agravantes ou atenuantes. Não há causas de aumento ou diminuição. A PENA DEFINITIVA É DE 1 (UM) ANO DE RECLUSÃO, e 10 (DEZ) DIAS MULTA.

O REGIME DE CUMPRIMENTO É O ABERTO nos termos do artigo 33 do Código Penal.

Arbitro a pena de multa em um trigésimo do valor do salário mínimo vigente à data dos fatos por ausência de informações nestes autos sobre a situação econômica do acusado.

Em razão também da quantidade de pena corporal aplicada, cabível a substituição prevista no artigo 44 do Código Penal por uma pena restritiva de direito, a saber, a prestação de serviços à Comunidade, sem a possibilidade de conversão para pagamento de pena pecuniária.

(...)”

 

Em suas razões de apelação, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (ID. 205780568), requer, em síntese: i) seja adequadamente apenado o “empresário que dirigia a atuação dos demais atores, nos moldes do art. 62, I, do CP, e considerando que os despachantes aduaneiros cometeram crimes violando as próprias atribuições funcionais, o que encerra particular carga de reprovabilidade”; ii) aplicação de concurso material nas condutas praticadas em intervalo superior e 30 dias; iii) aplicação da continuidade delitiva adequada ao número de infrações perpetradas.

 

Inicialmente, quanto ao acusado CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS, requer o Ministério Público Federal a elevação da pena, em aplicação ao artigo 62, inciso I, do Código Penal (A pena será ainda agravada em relação ao agente que: I - promove, ou organiza a cooperação no crime ou dirige a atividade dos demais agentes).

 

Contudo, não merece provimento o Apelo nesse ponto.

 

Apesar de demonstrado que CARLOS PIOLTINI, na condição de administrador, certamente atuava em conjunto e com unidade de desígnios com os demais corréus despachantes aduaneiros, não restou comprovado que promovia, organizava ou dirigia as atividades delituosas. A incidência da agravante exige que haja hierarquia entre os acusados e autoria intelectual por parte do empresário, o que não é o caso dos autos.

 

Quanto aos demais coacusados (EDUARDO DINIZ, JOSÉ REGINALDO RONCON MOURA DOS ANJOS, MARCELO LIGIERO e ELSON DINIZ), o Ministério Público Federal requer a elevação do vetor  culpabilidade, aduzindo ter havido descumprimento das obrigações afetas às atividades de despachantes aduaneiros. Aduz haver “expressiva reprovabilidade que é o cometimento de crimes mediante descumprimento das próprias atribuições funcionais, que não pode ter como grau de culpabilidade o normal para o tipo penal em comento” (ID. 205780568, p. 08).

 

Constata-se que a culpabilidade, para fins do art. 59 do CP, deve ser compreendida como juízo de reprovabilidade sobre a conduta, apontando maior ou menor censurabilidade do comportamento do réu.

 

Com efeito, a culpabilidade merece elevação em relação aos acusados despachantes aduaneiros, posto que as falsidades praticadas no exercício das funções às quais são especialmente habilitados, representam maior reprovabilidade em suas condutas.

 

Desta feita, merecem elevação as penas-base de EDUARDO DINIZ, JOSÉ REGINALDO RONCON MOURA DOS ANJOS, MARCELO LIGIERO e ELSON DINIZ em 1/6, resultando na reprimenda de 01 (um) ano e 02 (dois) meses de reclusão, acrescidos do pagamento de 11 (onze) dias-multa.

 

Ausentes demais agravantes ou atenuantes da pena, e não havendo causas de aumento ou diminuição, na terceira fase dosimétrica resulta a reprimenda de 01 (um) ano de reclusão e 10 (dez) dias multa para o acusado CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS e 01 (um) ano e 02 (dois) meses de reclusão, acrescidos do pagamento de 11 (onze) dias-multa para os acusados EDUARDO DINIZ, JOSÉ REGINALDO RONCON MOURA DOS ANJOS, MARCELO LIGIERO e ELSON DINIZ.

 

Do concurso de crimes.

 

Por fim, requer o Ministério Público Federal aplicação do concurso material nas condutas praticadas em intervalo superior a 30 (trinta) dias e aplicação da continuidade delitiva adequada ao número de infrações perpetradas por cada acusado.

 

Contudo, as condutas descritas na exordial acusatória, ainda que em intervalos superiores a 30 (trinta) dias, são havidas como consequentes umas das outras, porquanto praticadas no intuito de manter as importações abaixo do limite do Siscomex e, dessa forma, enquadrando-se todas elas no contexto do crime continuado. 

 

Para a caracterização do crime continuado, o agente deve, mediante mais de uma ação ou omissão, praticar dois ou mais crimes, os quais devem, necessariamente, ser da mesma espécie, bem como deve o primeiro delito determinar o(s) subsequente(s), ou seja, ser a causa dos outros crimes, observadas as condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes.

 

O artigo 71, caput, do Código Penal assim dispõem:

 

Art. 71 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subseqüentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços.

 

Quanto à fração de pena a ser aumentada, é sabido que o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula n.º 659 ("A fração de aumento em razão da prática de crime continuado deve ser fixada de acordo com o número de delitos cometidos, aplicando-se 1/6 pela prática de duas infrações, 1/5 para três, 1/4 para quatro, 1/3 para cinco, 1/2 para seis e 2/3 para sete ou mais infrações").

 

Considerando que cada falsidade configurou um delito, e tendo em vista que a fixação do aumento da pena em razão da continuidade delitiva deve ser proporcional à quantidade de ações perpetradas, conclui-se que devem ser exasperadas as penas, da seguinte forma:

 

CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS atuou em unidade de desígnios com os despachantes na falsificação de todas as DI’s (n.ºs 11/0123480-8, 11/0123524-3, 11/0999661-8, 11/1313446-3, 11/1409565-8, 11/1493567-2 e 11/1731427-0, 11/2043477-9), razão pela qual sua pena deve ser exasperada em 2/3, resultando sua reprimenda em 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão, acrescidos do pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa.

 

 EDUARDO DINIZ, em ¼ (DI’s n.ºs 11/1313446-3, 11/1409565-8, 11/1493567-2 e 11/1731427-0), resultando na reprimenda de 01 (um) ano, 05 (cinco) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, acrescido do pagamento de 13 (treze) dias-multa.

 

JOSÉ REGINALDO RONCON MOURA DOS ANJOS, em 1/6 (DI’s n.ºs 11/0123480-8 e 11/0123524-3), resultando na reprimenda de 01 (um) ano, 04 (quatro) meses e 10 (dez) dias de reclusão, acrescido do pagamento de 12 (doze) dias-multa.

 

MARCELO LIGIERO, tendo apenas registrado uma DI (n.º 11/0999661-8), sem acréscimo decorrente da continuidade delitiva, mantida a reprimenda de 01 (um) ano e dois (dois) meses de reclusão, acrescida do pagamento de 11 (onze) dias-multa.

 

ELSON DINIZ, tendo apenas registrado uma DI (n.º 11/2043477-9), sem acréscimo decorrente da continuidade delitiva, mantida a reprimenda de 01 (um) ano e dois (dois) meses de reclusão, acrescida do pagamento de 11 (onze) dias-multa.

 

Mantido o regime ABERTO para início de cumprimento das penas.

 

Fica mantido o valor individual do dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data do fato, nos termos da r. sentença

 

Das substituições das penas privativas de liberdade por restritivas de direitos.

 

As elevações das penas dos acusados MARCELO LIGIERO e ELSON DINIZ, reclamam, nos termos do artigo 44, § 2º, do Código Penal, a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, de forma que restam as reprimendas substituídas por prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor de 02 (dois) salários mínimos. 

 

As substituições das penas dos demais acusados (CARLOS PIOLTINI, EDUARDO DINIZ e JOSÉ REGINALDO RONCON) ficam mantidas nos termos da r. sentença.

 

PENAS DEFINITIVAS

 

A pena definitiva do acusado CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS restou em 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão, em regime ABERTO, acrescidos do pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa, arbitrados no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data do fato. Mantida, na forma da r. sentença, a substituição da pena privativa de liberdade por prestação de serviços à comunidade, vedada a possibilidade de conversão em prestação pecuniária.

 

A pena definitiva do acusado EDUARDO DINIZ restou em 01 (um) ano, 05 (cinco) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, em regime ABERTO, acrescidos do pagamento de 13 (treze) dias-multa, arbitrados no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data do fato. Mantida, na forma da r. sentença, a substituição da pena privativa de liberdade por prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor de 02 (dois) salários mínimos.  

 

A pena definitiva do acusado JOSÉ REGINALDO RONCON MOURA DOS ANJOS restou em 01 (um) ano, 04 (quatro) meses e 10 (dez) dias de reclusão, em regime ABERTO, acrescidos do pagamento de 12 (doze) dias-multa, arbitrados no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data do fato. Mantida, na forma da r. sentença, a substituição da pena privativa de liberdade por prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor de 02 (dois) salários mínimos. 

 

A pena definitiva do acusado MARCELO LIGIERO restou em 01 (um) ano e 02 (dois) meses de reclusão,  em regime ABERTO, acrescidos do pagamento de 11 (onze) dias-multa, arbitrados no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data do fato. Substituída a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor de 02 (dois) salários mínimos. 

 

A pena definitiva do acusado ELSON DINIZ restou em 01 (um) ano e 02 (dois) meses de reclusão, em regime ABERTO, acrescidos do pagamento de 11 (onze) dias-multa, arbitrados no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data do fato. Substituída a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor de 02 (dois) salários mínimos.

 

DISPOSITIVO

 

Diante do exposto, voto por NEGAR PROVIMENTO às Apelações da Defesas e DAR PARCIAL PROVIMENTO à Apelação do Ministério Público Federal, nos termos do relatório e voto, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

 

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 



 

 

 

DIREITO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. FALSIDADE IDEOLÓGICA. ART. 299 DO CÓDIGO PENAL. INTERPOSIÇÃO FRAUDULENTA DE REAL IMPORTADOR. DECLARAÇÕES DE IMPORTAÇÃO. DOCUMENTO PÚBLICO. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL. INAPLICABILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DOLO CONFIGURADO. DOSIMETRIA DA PENA. CULPABILIDADE. ART. 62, INCISO I, DO CÓDIGO PENAL. CONCURSO MATERIAL. INOCORRÊNCIA. CONCURSO FORMAL. APELAÇÕES DAS DEFESAS NÃO PROVIDAS. APELAÇÃO DA ACUSAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.  

- Diversamente do que pretendem as Defesas requerentes, a definição da natureza da Declaração de Importação (se documento público ou privado) não pode ser limitada ao sujeito emissor. Não obstante emitida pelo particular, recai interesse público sobre a Declaração de Importação, visto que regulariza as informações contidas no processo de importação de mercadorias e serve de base para o despacho aduaneiro. A DI é documento exigido pela Administração Federal para o desembaraço aduaneiro. Indubitável a natureza de documento público da Declaração de Importação.

- Nos termos do art. 110, parágrafo 1º, do Código Penal, em já tendo havido o trânsito em julgado para a acusação (mesmo que ainda pendente o julgamento de recurso da defesa), o prazo prescricional a ser considerado regula-se pela pena concretamente aplicada. Contudo, esse não é o caso dos autos, já que o recurso de Apelação do Ministério Público Federal, requerendo a majoração das penas dos acusados, encontra-se pendente de apreciação. Desta forma, não tendo havido trânsito em julgado da r. sentença para a acusação, a prescrição da pretensão punitiva regula-se pela pena máxima em abstrato do delito, qual seja, 05 (cinco) anos de reclusão (inteligência da primeira parte do preceito secundário do artigo 299 do Código Penal), cujo lapso prescricional é de 12 (doze) anos, a teor do artigo 109, inciso III, do Código Penal.

- Tendo como base a dicção legal, verifica-se que o instituto do Acordo de Não Persecução Penal – ANPP tem pertinência em ser invocado antes do oferecimento da denúncia ou da queixa, tendo em vista o art. 28-A, caput, do Código de Processo Penal, afirmar que o expediente somente será apresentado acaso não seja hipótese de arquivamento do Inquérito Policial, demonstrando claramente a intenção do legislador de sua incidência antes de iniciada a persecução penal. Nesse diapasão, o § 8º do mesmo comando legal dispõe que, recusada a homologação do Acordo, o magistrado devolverá os autos ao Ministério Público para que este analise a viabilidade de complementação das investigações ou ofereça denúncia. Notória a premissa de que o Acordo de Não Persecução Penal - ANPP foi criado para situações em que não tenham sido ainda recebidas as iniciais acusatórias. Tanto o C. Supremo Tribunal Federal como o E. Superior Tribunal de Justiça pacificaram posicionamento segundo o qual o Acordo de Não Persecução Penal – ANPP somente é cabível na fase de investigação criminal ou até o recebimento da denúncia.

- Sobejamente comprovadas materialidade e autoria delitivas, bem como o elemento subjetivo do tipo penal. Restou comprovado que os acusados inseriram, e fizeram inserir, em documentos públicos, constantes de Declarações de Importação, apresentados perante a Receita Federal do Brasil, informações diversas das que deveriam constar, assim alterando a verdade sobre fatos juridicamente relevantes. Carlos Pioltini dos Santos, na qualidade de administrador da pessoa jurídica Carlos Pioltini dos Santos Importação, juntamente com os acusados Eduardo Diniz, José Reginaldo Roncon Moura dos Anjos, Marcelo Ligiero e Elson Diniz, estes na qualidade de despachantes aduaneiros, alteraram, em diversas DI’s, os campos referentes à cobertura cambial, com a finalidade de fraudar as restrições impostas pelo SISCOMEX.

- A despeito das alegações de ausência de lesão ou potencialidade lesiva a bem jurídico, a conduta descrita no artigo 299 do Código Penal trata-se de delito formal, cuja caracterização independe da obtenção dos efeitos pretendidos pelo agente, consumando-se com a simples contrafação ideológica.

- Dosimetria da Pena. A culpabilidade merece elevação em relação aos acusados despachantes aduaneiros, posto que as falsidades praticadas no exercício das funções às quais são especialmente habilitados, representam maior reprovabilidade em suas condutas.

- Segunda fase dosimétrica. Agravante do artigo 62, inciso I, do Código Penal. Inocorrência. Apesar de demonstrado que Carlos Pioltini, na condição de administrador, certamente atuava em conjunto e com unidade de desígnios com os demais corréus despachantes aduaneiros, não restou comprovado que promovia, organizava ou dirigia as atividades delituosas. A incidência da agravante exige que haja hierarquia entre os acusados e autoria intelectual por parte do empresário, o que não é o caso dos autos.

- Concurso de Crimes. As condutas descritas na exordial acusatória, ainda que em intervalos superiores a 30 (trinta) dias, são havidas como consequentes umas das outras, porquanto praticadas no intuito de manter as importações abaixo do limite do Siscomex e, dessa forma, enquadrando-se todas elas no contexto do crime continuado. Considerando que cada falsidade configurou um delito, e tendo em vista que a fixação do aumento da pena em razão da continuidade delitiva deve ser proporcional à quantidade de ações perpetradas, conclui-se que devem ser exasperadas as penas nos termos da Súmula n.º 659 do STJ ("A fração de aumento em razão da prática de crime continuado deve ser fixada de acordo com o número de delitos cometidos, aplicando-se 1/6 pela prática de duas infrações, 1/5 para três, 1/4 para quatro, 1/3 para cinco, 1/2 para seis e 2/3 para sete ou mais infrações”).

 - A pena definitiva do acusado CARLOS PIOLTINI DOS SANTOS restou em 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão, em regime ABERTO, acrescidos do pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa, arbitrados no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data do fato. Mantida, na forma da r. sentença, a substituição da pena privativa de liberdade por prestação de serviços à comunidade, vedada a possibilidade de conversão em prestação pecuniária.

- A pena definitiva do acusado EDUARDO DINIZ restou em 01 (um) ano, 05 (cinco) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, em regime ABERTO, acrescidos do pagamento de 13 (treze) dias-multa, arbitrados no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data do fato. Mantida, na forma da r. sentença, a substituição da pena privativa de liberdade por prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor de 02 (dois) salários mínimos.  

- A pena definitiva do acusado JOSÉ REGINALDO RONCON MOURA DOS ANJOS restou em 01 (um) ano, 04 (quatro) meses e 10 (dez) dias de reclusão, em regime ABERTO, acrescidos do pagamento de 12 (doze) dias-multa, arbitrados no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data do fato. Mantida, na forma da r. sentença, a substituição da pena privativa de liberdade por prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor de 02 (dois) salários mínimos. 

- A pena definitiva do acusado MARCELO LIGIERO restou em 01 (um) ano e 02 (dois) meses de reclusão, em regime ABERTO, acrescidos do pagamento de 11 (onze) dias-multa, arbitrados no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data do fato. Substituída a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor de 02 (dois) salários mínimos. 

- A pena definitiva do acusado ELSON DINIZ restou em 01 (um) ano e 02 (dois) meses de reclusão, em regime ABERTO, acrescidos do pagamento de 11 (onze) dias-multa, arbitrados no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data do fato. Substituída a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor de 02 (dois) salários mínimos.

- Apelações das Defesas não providas.

- Apelação da Acusação parcialmente provida. 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Primeira Turma, por unanimidade, decidiu NEGAR PROVIMENTO às Apelações da Defesas e DAR PARCIAL PROVIMENTO à Apelação do Ministério Público Federal, nos termos do relatório e voto, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado, tendo o Des. Fed. Nino Toldo acompanhado o voto do Relator com a ressalva de seu entendimento, no sentido de que o crime continuado (CP, art. 71) integra o sistema trifásico da dosimetria da pena (CP, art. 68), pois constitui causa de aumento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.