APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006453-35.2022.4.03.6110
RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE
APELANTE: NUTRIEN SOLUCOES AGRICOLAS LTDA
Advogado do(a) APELANTE: LEO LOPES DE OLIVEIRA NETO - SP271413-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006453-35.2022.4.03.6110 RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE APELANTE: NUTRIEN SOLUCOES AGRICOLAS LTDA Advogado do(a) APELANTE: LEO LOPES DE OLIVEIRA NETO - SP271413-A APELADO: DELEGADO DA DELEGACIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM SOROCABA, DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM SOROCABA//SP, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Cuida-se de apelação interposta por NUTRIEN SOLUCOES AGRICOLAS LTDA visando a reforma da r. sentença que denegou a segurança no presente mandamus, objetivando ter assegurado o direito de aproveitar e escriturar o crédito de IPI relativo à aquisição de insumos, matérias primas, produtos intermediários e material de embalagem vinculados a saídas de produtos industrializados classificados como NT (não tributados), inclusive em relação àqueles créditos que venham a surgir em decorrência de qualquer procedimento fiscal em que a Receita Federal do Brasil venha a exigir o IPI relativo aos bens adquiridos. Em suas razões, aduz, em síntese, a procedência do pedido. Com contrarrazões. O representante do Ministério Público Federal manifestou-se pelo regular prosseguimento do feito. É o Relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006453-35.2022.4.03.6110 RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE APELANTE: NUTRIEN SOLUCOES AGRICOLAS LTDA Advogado do(a) APELANTE: LEO LOPES DE OLIVEIRA NETO - SP271413-A APELADO: DELEGADO DA DELEGACIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM SOROCABA, DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM SOROCABA//SP, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Pretende o impetrante ter reconhecido seu direito de aproveitar e escriturar o crédito de IPI relativo à aquisição de insumos, matérias primas, produtos intermediários e material de embalagem vinculados a saídas de produtos industrializados classificados como NT (não tributados), inclusive em relação àqueles créditos que venham a surgir em decorrência de qualquer procedimento fiscal em que a Receita Federal do Brasil venha a exigir o IPI relativo aos bens adquiridos. Sem preliminares, passo à análise do mérito. A matéria, ora discutida, foi objeto de embargos de divergência EREsp nº 1213143. No referido embargos de divergência, a Primeira Seção do STJ, por maioria, entendeu pela legalidade do aproveitamento do saldo de IPI decorrente da aquisição de insumo tributado e empregado na industrialização, com saída não-tributada, no período posterior à vigência do art. 11 da Lei 9.779/99, eis que constitui benefício fiscal autônomo. No caso, prevaleceu a divergência inaugurada pela Ministra Regina Helena Costa, no sentido de que a discussão travada é diversa do regramento da não-cumulatividade contemplado na Constituição, visto tratar-se de um creditamento autorizado por lei infraconstitucional (art. 11 da Lei 9.779/1999), em que se concede diretamente o creditamento de IPI quando o contribuinte não puder compensar o saldo credor do imposto na saída de outros produtos. E, segundo a Relatora, extrai-se de tal norma, a concessão de créditos na impossibilidade de compensá-los, sendo essa a premissa maior do dispositivo legal, que se ajusta ao delineamento de benefício fiscal autônomo – desvinculado da regra da não-cumulatividade Em seu voto, a Ministra Regina Helena Costa sustenta que o próprio art. 11 da lei, a título de reforço, consigna a expressão “inclusive de produto isento, ou tributado a alíquota zero”, chamando a atenção para o vocábulo “inclusive”, deixando claro que há outras possibilidades além daquelas expressamente citadas. A ementa do julgado, nos seguintes termos: PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS - IPI. OUTORGA DE CRÉDITO POR MEIO DO ART. 11 DA LEI N. 9.779/1999. CREDITAMENTO AUTÔNOMO. DESVINCULAÇÃO DA REGRA DA NÃO CUMULATIVIDADE - DISTINGUISHING. UTILIZAÇÃO DO SALDO CREDOR DE IPI NA INVIABILIDADE DA COMPENSAÇÃO COM O MENCIONADO TRIBUTO INCIDENTE NA SAÍDA. HIPÓTESE DE PRODUTO NÃO TRIBUTADO. POSSIBILIDADE. I - Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte, na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. Aplica-se, in casu, o Código de Processo Civil de 2015. II - A Constituição da República contempla o creditamento de Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI em três hipóteses distintas: (i) em decorrência da regra da não cumulatividade (art. 153, § 3º, II); (ii) como exceção constitucionalmente justificável à não cumulatividade, alcançada por meio de interpretação sistemática (arts. 43, § 1º, II, e § 2º, III; 153, § 3º, II; e 40 do ADCT); e (iii) mediante outorga diretamente concedida por lei específica (art. 150, § 6º). III - A Lei n. 9.779/1999 instituiu o aproveitamento de créditos de IPI como benefício fiscal autônomo, uma vez que não traduz mera explicitação da regra da não cumulatividade. IV - Por tratar-se do aproveitamento de créditos de IPI como benefício autônomo, diretamente outorgado por lei para a saída desonerada, a discussão devolvida pelos Embargos de Divergência distancia-se do núcleo da polêmica envolvendo a não cumulatividade desse tributo - necessidade de distinguishing -, cuidando-se, inclusive, de matéria eminentemente infraconstitucional. V - O art. 11 da Lei n. 9.779/1999 confere o crédito de IPI quando se revelar inviável ao contribuinte a compensação desse montante com o mencionado tributo incidente na saída de outros produtos. Na impossibilidade da utilização da soma decorrente da entrada onerada, o apontado artigo oportuniza a consolidada via dos arts. 73 e 74 da Lei n. 9.430/1996. Autorizado, portanto, o emprego do valor lançado na escrita fiscal, justamente com a saída "de outros produtos". Reitere-se que os produtos outros, nesse contexto, podem ser isentos, sujeitos à alíquota zero ou não tributados. VI - Inaceitável restringir, por ato infralegal, o benefício fiscal conferido ao setor produtivo, mormente quando as três situações - isento, sujeito à alíquota zero e não tributado -, são equivalentes quanto ao resultado prático delineado pela Lei do benefício. VII - Encontra, portanto, abrigo legal o aproveitamento do saldo de IPI decorrente das aquisições de matérias-primas, produtos intermediários e materiais de embalagem tributados, nas saídas de produtos não tributados no período posterior à vigência do art. 11 da Lei n. 9.779/1999. VIII - A manutenção do acórdão embargado representa: (i) a observância da disciplina legal específica; (ii) a escorreita interpretação sistemática do aproveitamento de saldo de IPI à luz dos múltiplos níveis normativos do creditamento admitidos pela Constituição da República; e (iii) uma prestação jurisdicional alinhada com os recentes pronunciamentos do Supremo Tribunal Federal quanto à temática (e.g. PLENO, RE n. 596.614/SP, Rel. p/ o acórdão Ministro EDSON FACHIN, julgado em 25.04.2019; PLENO, Projeto de Súmula Vinculante n. 26/DF, Rel. Ministro RICARDO LEWANDOWSKI, DJe 07.05.2020 - Ata n. 340/2020; e 2ª TURMA, AgR no AgR no RE n. 379.843/PR, Rel. Ministro EDSON FACHIN, julgado em 07.03.2017). IX - Embargos de Divergência improvidos. (EREsp n. 1.213.143/RS, relatora Ministra Assusete Magalhães, relatora para acórdão Ministra Regina Helena Costa, Primeira Seção, julgado em 2/12/2021, DJe de 1/2/2022.). No caso concreto, tem direito o impetrante a registrar extemporaneamente os créditos de IPI decorrentes da aquisição de insumos aplicados na industrialização de produtos com saída “não tributada” , observada a prescrição quinquenal. No tocante à recuperação do indébito, em relação à compensação, os valores indevidamente recolhidos a tal título, deverão ser atualizados pelos juros da taxa SELIC desde os pagamentos indevidos, nos termos do art. 39, §4º, da Lei 9.250/95, e poderão ser compensados, respeitada a prescrição quinquenal, nos termos em que disciplina a Lei 10.637/2002, bem como os eventualmente originados no curso desta demanda, observando-se, todavia, o art. 170-A do CTN. Quanto à atualização monetária, em relação ao pedido de ressarcimento, o STJ julgou o REsp 1767945, na sistemática dos recursos repetitivos, firmando a seguinte tese: O termo inicial da correção monetária de ressarcimento de crédito escritural excedente de tributo sujeito ao regime não cumulativo ocorre somente após escoado o prazo de 360 dias para a análise do pedido administrativo pelo Fisco (art. 24 da Lei n. 11.457/2007). Anoto, ainda, que o E. Supremo Tribunal Federal reconheceu que a restituição do pagamento indevido, decorrente de decisão em sede de mandado de segurança, se dê mediante a expedição de precatório ou de requisição de pequeno valor, conforme o caso. Assente o entendimento: Agravo regimental em recurso extraordinário com agravo. Constitucional e tributário. Reconhecimento de indébito tributário em sede de mandado de segurança. Restituição. Necessidade de expedição de precatório ou de requisição de pequeno valor. 1. O Tribunal de Origem, em sede de mandado de segurança, assentou ter a impetrante direito à restituição administrativa do indébito tributário reconhecido judicialmente na demanda, sem a observância do regime de precatórios. 2. Ao assim decidir, a Corte a Quo divergiu da orientação da Suprema Corte de que os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas em razão de decisão judicial devem se dar mediante a expedição de precatório ou de requisição de pequeno valor, conforme o valor da condenação, nos termos do art. 100 da Constituição Federal. Precedentes. 3. Agravo regimental e recurso extraordinário providos, assentando-se que a restituição do pagamento indevido, decorrente de decisão em sede de mandado de segurança, se dê mediante a expedição de precatório ou de requisição de pequeno valor, conforme o caso. ( ARE 1387512, Relator(a): Min. ALEXANDRE DE MORAES, Redator(a) do acórdão: Min. DIAS TOFFOLI, Julgamento: 10/10/2022, Publicação: 08/11/2022)- grifei. Em relação à restituição administrativa, o Supremo Tribunal Federal reconheceu, em 22/08/2023, a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada RE 1.420.691, e julgou o mérito do respectivo Tema 1.262, fixando a seguinte tese, em acórdão publicado em 28/08/2023: "Não se mostra admissível a restituição administrativa do indébito reconhecido na via judicial, sendo indispensável a observância do regime constitucional de precatórios, nos termos do art. 100 da Constituição Federal." No tocante à restituição judicial, o E. Supremo Tribunal Federal reconheceu que a restituição do pagamento indevido, decorrente de decisão em sede de mandado de segurança, se dê mediante a expedição de precatório ou de requisição de pequeno valor, conforme o caso. Assente o entendimento: Agravo regimental em recurso extraordinário com agravo. Constitucional e tributário. Reconhecimento de indébito tributário em sede de mandado de segurança. Restituição. Necessidade de expedição de precatório ou de requisição de pequeno valor. 1. O Tribunal de Origem, em sede de mandado de segurança, assentou ter a impetrante direito à restituição administrativa do indébito tributário reconhecido judicialmente na demanda, sem a observância do regime de precatórios. 2. Ao assim decidir, a Corte a Quo divergiu da orientação da Suprema Corte de que os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas em razão de decisão judicial devem se dar mediante a expedição de precatório ou de requisição de pequeno valor, conforme o valor da condenação, nos termos do art. 100 da Constituição Federal. Precedentes. 3. Agravo regimental e recurso extraordinário providos, assentando-se que a restituição do pagamento indevido, decorrente de decisão em sede de mandado de segurança, se dê mediante a expedição de precatório ou de requisição de pequeno valor, conforme o caso. ( ARE 1387512, Relator(a): Min. ALEXANDRE DE MORAES, Redator(a) do acórdão: Min. DIAS TOFFOLI, Julgamento: 10/10/2022, Publicação: 08/11/2022)- grifei. No entanto, cumpre ressaltar que o mandado de segurança não é a via adequada para obter efeitos patrimoniais pretéritos à impetração. Confira-se o julgado da nossa Corte Suprema: EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL. MANDADO DE SEGURANÇA. VALORES DEVIDOS ENTRE A DATA DA IMPETRAÇÃO E A IMPLEMENTAÇÃO DA ORDEM CONCESSIVA. SUBMISSÃO AO REGIME DE PRECATÓRIOS. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. Tema 831 - Obrigatoriedade de pagamento, mediante o regime de precatórios, dos valores devidos pela Fazenda Pública entre a data da impetração do mandado de segurança e a efetiva implementação da ordem concessiva. (RE 889173, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Julgamento: 07/08/2015, Publicação: 17/08/2015)- grifei. Nesse sentido é a Resolução 438/2021 do Conselho Nacional de Justiça que altera, renumera e acrescenta dispositivos à Resolução CNJ nº 303/2019, do Conselho Nacional de Justiça, que dispõe sobre a gestão de precatórios e respectivos procedimentos operacionais no âmbito do Poder Judiciário, in verbis: Art. 4o O pagamento de débito judicial superior àquele definido em lei como de pequeno valor será realizado mediante expedição de precatório. § 5o Submetem-se às formas de pagamento previstas neste Capítulo os valores devidos pela Fazenda Pública entre a data da impetração do mandado de segurança e a efetiva implementação da ordem concessiva. (incluído pela Resolução n. 438, de 28.10.2021) Portanto, possível a restituição mediante a expedição de precatório ou de requisição de pequeno valor, pela via do mandado de segurança, dos valores indevidamente recolhidos entre a data da impetração do mandado de segurança e a efetiva implementação da ordem concessiva. Na hipótese, há de ser reformada a r. sentença a quo, e reconhecido ao impetrante o direito da registrar extemporaneamente os créditos de IPI decorrentes da aquisição de insumos aplicados na industrialização de produtos com saída “não tributada”, bem como a compensação/ressarcimento de tais valores, ou restituição mediante a expedição de precatório ou de requisição de pequeno valor, entre a data da impetração do mandado de segurança e a efetiva implementação da ordem concessiva, nos termos em que explicitado. Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação, consoante fundamentação. É o meu voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. CREDITAMENTO IPI. INSUMO TRIBUTADO EMPREGADO NA INDUSTRIALIZAÇÃO. SAIDA NÃO TRIBUTADA. APELO PARCIALMENTE PROVIDO.
-Nos embargos de Divergência EREsp nº 1213143, a Primeira Seção do STJ, por maioria, entendeu pela legalidade do aproveitamento do saldo de IPI decorrente da aquisição de insumo tributado e empregado na industrialização, com saída não-tributada, no período posterior à vigência do art. 11 da Lei 9.779/99, eis que constitui benefício fiscal autônomo.-
-No caso concreto, tem direito o impetrante a registrar extemporaneamente os créditos de IPI decorrentes da aquisição de insumos aplicados na industrialização de produtos com saída “não tributada” , observada a prescrição quinquenal.
-No tocante à recuperação do indébito, em relação à compensação, os valores indevidamente recolhidos a tal título, deverão ser atualizados pelos juros da taxa SELIC desde os pagamentos indevidos, nos termos do art. 39, §4º, da Lei 9.250/95, e poderão ser compensados, respeitada a prescrição quinquenal, nos termos em que disciplina a Lei 10.637/2002, observando-se, todavia, o art. 170-A do CTN.
- Quanto à atualização monetária, em relação ao pedido de ressarcimento, o STJ julgou o REsp 1767945, na sistemática dos recursos repetitivos, firmando a seguinte tese: O termo inicial da correção monetária de ressarcimento de crédito escritural excedente de tributo sujeito ao regime não cumulativo ocorre somente após escoado o prazo de 360 dias para a análise do pedido administrativo pelo Fisco (art. 24 da Lei n. 11.457/2007).
- Anoto que E. STF reconheceu a possibilidade de restituição mediante a expedição de precatório ou de requisição de pequeno valor, entre a data da impetração do mandado de segurança e a efetiva implementação da ordem concessiva. Precedente.
-Apelação parcialmente provida.