Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000941-95.2022.4.03.6005

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

APELADO: LOCAMERICA RENT A CAR S.A.

Advogado do(a) APELADO: LUIZ HENRIQUE NERY MASSARA - MG128362-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000941-95.2022.4.03.6005

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

APELADO: LOCAMERICA RENT A CAR S.A.

Advogado do(a) APELADO: LUIZ HENRIQUE NERY MASSARA - MG128362-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):

 

Trata-se de apelação interposta pela UNIÃO, em ação de procedimento comum ajuizada por UNIDAS S.A., atualmente denominada LOCAMÉRICA RENT A CAR S.A., contra a UNIÃO, em que se postulou:

 

“(...) c) ao final, confirme a tutela provisória de urgência e julgue integralmente PROCEDENTES os pedidos deduzidos na presente ação pela Autora, a fim de que sejam anulados o Autos de Infração e Apreensão de Veículo nº. 0147800-14497/2021, bem como do Despacho Decisório nº 04/2022, exarados pelo Alfândega da Receita Federal do Brasil em Ponta Porá – MS nos autos do Processo Administrativo Fiscal nº 10109.724424/2020-61, respectivamente, determinando-se, por via de consequência, a liberação definitiva do veículo de marca Volkswagen, modelo GOL 1.0L MC4, placa RFI-3F49, cor cinza, fabricação / modelo 2020 / 2021, chassi 9BWAG45U2MT044031, de propriedade de Autora, sem qualquer ônus, bem como afastando-se a aplicação da pena de perdimento;

d) subsidiariamente ao pedido de item “c”, caso o veículo de propriedade da Autora mencionado no item anterior seja leiloado pela Receita Federal do Brasil e arrematado, condene-se o Réu a pagar indenização à Autora por perdas e danos correspondente ao valor constante do procedimento fiscal (R$ 47.343,00 – Doc.4), devidamente acrescido de taxa de juros prevista no § 4º do artigo 39 da Lei nº. 9.250, de 26 de dezembro de 199514 (Taxa Selic), tendo como marco inicial a data da apreensão, tudo nos termos do artigo 30, §1º, inciso I, c/c §2º, do Decreto-Lei nº. 1.455, de 7 de abril de 1976 (...)” (g.n.)

 

O pedido de antecipação da tutela de urgência foi parcialmente deferido (ID 277959772), in verbis:

 

“(...) Por todo o exposto, concedo a tutela provisória de urgência, em caráter liminar, nos termos do art. 300, § 2º, do CPC, determinando à Receita Federal que libere o veículo da marca Volkswagen, modelo GOL 1.0L MC4, placa RFI-3F49, cor cinza, fabricação / modelo 2020 / 2021, chassi 9BWAG45U2MT044031, em favor da parte autora, e respectivo(s) representante(s) legal(is) ou contratuais, mediante compromisso de fiel depósito do bem, juntada de comprovante de depósito do valor do veículo como forma de garantia do juiz ou caução na modalidade seguro-fiança. (...)”

 

A r. sentença ID 277959840, integrada pelo julgamento dos aclaratórios (ID 277959850), dispôs:

 

“(...) Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido, extinguindo o processo no mérito na forma do art. 487, I do CPC, para:

A) anular o ato administrativo que determinou o perdimento do veículo de marca Volkswagen, modelo GOL 1.0L MC4, placa RFI-3F49, cor cinza, fabricação/modelo 2020/2021, chassi 9BWAG45U2MT044031, por conseguinte, determinar sua restituição à parte autora, sem imposição de qualquer ônus ou gravame;

B) havendo informação de que o veículo em questão tenha sido destinado administrativamente, a restituição do veículo será dada pelo equivalente em dinheiro na quantia correspondente adotando-se o valor da avaliação constante do Auto de Apreensão, que será corrigido da data da apreensão do veículo até a data do pagamento administrativo, tudo nos termos do artigo 30 e §§ do Decreto-lei 1455/76 e art. 803-A do Decreto 6.759/2009;

C) Deverá a Receita Federal, antes de efetuar a indenização, verificar se à época da apreensão o veículo era objeto de arrendamento mercantil ou alienação fiduciária e, neste caso, o pagamento do valor correspondente à indenização deverá ser pago nos termos do contrato firmado com a instituição financeira, repassando à instituição os valores devidos a esta pelo devedor fiduciário, devendo o saldo, se houver, ser repassado diretamente à outra parte que conste como contratante, nos termos do contrato firmado. Eventual discussão acerca dos valores do contrato não envolve as partes que figuram nos polos desta relação processual nem pode ser imposta à União, devendo, se for o caso, ser dirimida na instância apropriada, não sendo objeto de discussão nestes autos".

 A Receita Federal deverá comprovar nestes autos o pagamento da indenização nos termos delineados nos parágrafos acima, no prazo de 15 (quinze) dias contados da intimação do trânsito em julgado da decisão que julgou procedente a restituição.

Tendo em vista a sucumbência mínima da parte autora, condeno somente a parte ré ao reembolso das custas processuais e pagamento de honorários advocatícios, que fixo no percentual mínimo previsto no §3º do art. 85 do CPC, de acordo com o inciso correspondente ao proveito econômico obtido. (...)”

 

 

Em suas razões recursais (ID 277959848), a UNIÃO sustentou:

 

“(...) Que todos os atos praticados pela Receita Federal do Brasil estão de acordo com a legislação vigente, não podendo ser considerados como atos abusivos ou ilegais.

Que a apreensão do veículo ocorreu com total obediência aos dispositivos legais, não possuindo o procedimento fiscal administrativo nenhuma irregularidade ou vício.

Que a locadora pode ser responsabilizada pela infração, levando-se em conta a não adoção de cautelas adequadas na locação do bem, assim como o disposto no art. 95, inciso II, do Decreto-Lei 37/1966, e na Súmula 492, do Supremo Tribunal Federal;

Que os contratos privados não são oponíveis a terceiros e, portanto, deve a demandante buscar a reparação dos prejuízos advindos da apreensão do veículo utilizando-se dos meios ordinários disponibilizados pela legislação civil.

Diante de tudo o que foi exposto, quedam patentes a legalidade e a

regularidade de toda a atuação levada a cabo pela Receita Federal do Brasil, motivo pelo qual se impõe o julgamento de total improcedência da pretensão deduzida na inicial. (...)”

 

“(...) Em caráter sucessivo, vem dizer a Vossa Excelência que, na hipótese de eventual manutenção da r. sentença e acolhimento do pedido quanto à anulação da pena de perdimento e restituição do citado veículo, a Autora deverá suportar as despesas decorrentes de sua regular apreensão, transporte (guincho), guarda e conservação pela RFB.

(...) que a liberação do comentado veículo, ou mesmo ressarcimento de seu valor, acaso já alienado, fique condicionada ao pagamento/abatimento das respectivas despesas com a apreensão, transporte e guarda, a ser apurada pela Autoridade Fiscal no momento de sua devolução ou ressarcimento, sem a limitação de tempo imposta pelo juízo “a quo” (10 dias). (...)”

 

Com contrarrazões da parte autora (ID 277959855).

 

Devidamente processado o feito, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.

 

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


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APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000941-95.2022.4.03.6005

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V O T O

 

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):

 

Cinge-se a controvérsia dos autos no cabimento da pena de perdimento de veículo automotor, de propriedade de locadora de veículos, utilizado para o cometimento de ilícito aduaneiro.   

 

Da aplicação ao caso concreto do Tema 1.041/STJ  

 

A questão submetida a julgamento no Tema nº 1.041/STJ está delimitada em: 

 

Definirse o transportador (proprietário ou possuidor) está sujeito à pena de perdimento de veículo de transporte de passageiros ou de carga em razão de ilícitos praticados por cidadãos que transportam mercadorias sujeitas à pena de perdimento, nos termos dos Decretos-leis 37/66 e 1.455/76. 

Definirse o transportador, de passageiros ou de carga, em viagem doméstica ou internacional que transportar mercadoria sujeita a pena de perdimento sem identificação do proprietário ou possuidor; ou ainda que identificado o proprietário ou possuidor, as características ou a quantidade dos volumes transportados evidenciarem tratar-se de mercadoria sujeita à referida pena, está sujeito à multa de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) prevista no art. 75 da Lei 10.833/03, ou à retenção do veículo até o recolhimento da multa, nos termos do parágrafo 1º do mesmo artigo.” 

 

Na Sessão realizada em 09.06.2021, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade de votos, acolheu a questão de ordem proposta pelo Exmo. Relator nos autos do REsp nº 1.818.587/DF– um dos processos afetados como representativos da controvérsia –para, diante da aplicação analógica do art. 256-F do RISTJ, solicitar que a Comissão Gestora de Precedentes indique, em substituição, outros recursos especiais que cumpram as exigências para ao rito dos arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015. Confira-se: 

 

“O SENHOR MINISTRO MANOEL ERHARDT (DESEMBARGADORCONVOCADO DO TRF-5ª REGIÃO): 

1. A Primeira Seção do STJ, em sessão virtual de 20.11.2019 a26.11.2019, submeteu o julgamento dos Recursos Especiais 1.823.800/DF e1.818.587/DF ao rito dos recursos repetitivos, assim restringindo acontrovérsia: 
(i) Definir se o transportador (proprietário ou possuidor) estásujeito à pena de perdimento de veículo de transporte de passageiros oude carga em razão de ilícitos praticados por cidadãos que transportammercadorias sujeitas à pena de perdimento, nos termos dosDecretos-leis 37/1966 e 1.455/1976. 
(ii) Definir se o transportador, de passageiros ou de carga, emviagem doméstica ou internacional que transportar mercadoria sujeita apena de perdimento sem identificação do proprietário ou possuidor; ouainda que identificado o proprietário ou possuidor, as características oua quantidade dos volumes transportados evidenciarem tratar-se demercadoria sujeita à referida pena, está sujeito à multa de R$ 15.000,00(quinze mil reais) prevista no art. 75 da Lei 10.833/03, ou à retenção doveículo até o recolhimento da multa, nos termos do parágrafo 1o. domesmo artigo. 

2. Naquele julgamento, esse colegiado, por maioria de votos,vencidos os eminentes Ministros MAURO CAMPBELL MARQUES EASSUSETE MAGALHÃES, deliberou pela viabilidade de se afetar ambos osrecursos selecionados pela Comissão Gestora de Precedentes, considerandoque tais recursos preenchiam os requisitos necessários à submissão ao ritodos recursos repetitivos, que, segundo os arts. 1.036, caput e § 6º, doCPC/2015 e 257-A, § 1º, do RISTJ, podem ser assim estabelecidos: (i) veiculação de matéria de competência do STJ; (ii) multiplicidade de recursosespeciais com fundamento em idêntica questão de direito; (iii) preenchimentodos pressupostos recursais genéricos e específicos; (iv) ausência de obstáculoao conhecimento do recurso especial; e (v) abrangente argumentação ediscussão a respeito da questão a ser decidida. 

3. Não tenho dúvidas de que as questões jurídicas discutidas emambos os recursos afetados têm natureza infraconstitucional, cujaapreciação compete a esta Corte Superior, pois decorrem da interpretação dediversos dispositivos legais que legitimam a aplicação da pena de perdimentode veículo apreendido por dar ingresso no país a mercadorias de origemestrangeira, de forma irregular ou fraudulenta. 

4. Também se encontra satisfeito o requisito do quantitativo derecursos em curso com fundamento em idêntica matéria de direito, hajavista que foram identificados mais de quatrocentos e vinte processos emtramitação perante o TRF-1a. Região, conforme destacado na proposta deafetação apresentada pelo eminente Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, então relator. 

5. Todavia, não obstante a relevância das questões jurídicasabordadas nosRecursos Especiais 1.823.800/DF e 1.818.587/DF, não meparece cumprido, de forma adequada, todos os requisitos do art. 1.036, § 6º, do NCPC, poisos recursos em referência não estão subsidiados emargumentação e discussão suficientemente abrangentes a respeito do tema selecionado. Tampouco se verifica a homogeneidade necessária para que a tese firmada seja aplicada nos demais processos cuja discussão jurídica seja análoga. 

6. Isso porquea controvérsia discutida no Recurso1.818.587/DF restringe-se à responsabilidade do proprietário/locador doveículo utilizado pelo locatário para cometimento de infração aduaneira atinente ao transporte de mercadorias provenientes do exterior eirregularmente introduzidas no território nacional. Embora também aqui a Fazenda Pública recorrente defenda aplicação da pena de perdimento doveículo com amparo nos arts. 95, 96 e 104, V, do Decreto-Lei 37/1966 e 23 eseguintes do Decreto-Lei 1455/1976,tal questionamento não trazsimilaridade com aquela primeira questão que emerge do Tema 1.041,atinente aplicação da sanção à empresa prestadora de serviços de transporte de pessoas ou de carga pelos ilícitos fiscais praticados por seus passageiros. 

7. Ressalte-se, inclusive, que a controvérsia atinente à aplicaçãode pena de multa de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) prevista no art. 75 daLei 10.833/2003, ou à retenção do veículo até o recolhimento da multa, nostermos do parágrafo 1o. do mesmo artigo, sequer foi objeto de apreciaçãopelo Tribunal Regional, e tampouco o ente fazendário se debruçou sobre otema nas razões apresentadas em ambos os recursos especiais afetados, oque impede que esta Corte Superior emita posicionamento fundamentadopara o desate dessa relevante questão. 

8. Nesse panorama, não há como se superar a exigência previstano art. 104-A do RISTJ, de que o recurso especial repetitivo apresente osfundamentos relevantes da questão jurídica discutida, favoráveis oucontrários, entendidos esses como a conclusão dos argumentos deduzidos noprocesso capazes de, em tese, respectivamente, confirmar ou infirmar aconclusão adotada pelo órgão julgador. 

9. Sob outro vértice, convém assinalar que, em relação àadmissibilidade dos dois recursos afetados como representativos dacontrovérsia, apenas o Recurso Especial 1.187.587/DF atende aospressupostos recursais genéricos e específicos, não existindo óbices ao seuconhecimento. Já a cognoscibilidade do Recurso Especial 1.823.800/DFesbarra na vedação contida nas Súmulas 283 e 284, do STF, conforme bemdestacado no voto-vista do eminente Ministro MAURO CAMBPELLMARQUES, motivo pelo qual peço vênia para transcrever, integrando-os às razões ora apresentadas, os judiciosos fundamentos nele lançados:Quanto ao REsp. n. 1.823.800/DF, onde está em jogo apreensãode mercadorias feita em ônibus de empresa de transporte rodoviário depassageiros, o acórdão proferido pela Corte de Origem está assentadoem dois fundamentos suficientes: 1º) “para a aplicação da pena deperdimento de veículo utilizado em contrabando ou descaminho, épreciso comprovar, mediante regular processo administrativo, aparticipação do proprietário do bem na prática do delito, não basta queseja presumida a sua responsabilidade”; e 2º) “em casos como opresente, deve ser respeitado o princípio da proporcionalidade entre osvalores das mercadorias sujeitas à pena de perdimento e o valor doveículo apreendido” (ambos nas e-STJ fls. 479). 
Já o recurso especial da FAZENDA NACIONAL (e-STJ fls.522/538) invoca de forma genérica a violação ao art. 535, doCPC/1973, o que chama no ponto a aplicação da Súmula n. 284/STF ("Éinadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na suafundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia"), e,ao invocar violação aos arts. 94, 95, 96, 104 e 105, do Decreto-lei n°37/66; arts. 23 e 24, do Decreto-lei n° 1.455/76; art. 75, §§1º e 2º, daLei n° 10.833/03; e o art. 136 do Código Tributário Nacional, apenasataca o primeiro fundamento, pugnando pela responsabilidade objetiva,sem discutir a aplicação do “princípio da proporcionalidade” que é osegundo fundamento autônomo do acórdão recorrido. Desta forma, emanálise preliminar, a situação é de aplicação sucessiva da Súmula n.284/STF e da Súmula n. 283/STF ("É inadmissível o recursoextraordinário, quando a decisão recorrida assenta em mais de umfundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles") (fls.621/622). 

10. Percebe-se, portanto, quea controvérsia abordada no Resp1.818.587/DF não equivale, com exatidão, à delimitação do Tema 1.041.Ademais, é notória a inviabilidade de conhecimento do REsp 1.823.800/DF,porquanto caracterizada a deficiência na fundamentação recursal nopertinente à preliminar de violação do art. 535 do CPC/1973 (Súmula284/STF), além da ausência de impugnação de um dos fundamentosadotados pelo acórdão recorrido quanto à matéria de mérito ( Súmula 283/STF), o que impossibilita a análise da questão jurídica indicada comocontrovertida. 

11. Em virtude desse cenário, proponho a resolução da presentequestão de ordem, para, diante da aplicação analógica do art. 256-F doRISTJ, solicitar que a Comissão Gestora de Precedentes indique, emsubstituição, outros recursos especiais que cumpram as exigências para aorito dos arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015.” [e-STJ Fl. 447 a 451 do Recurso Especial nº 1.818.587 – DF (2019/0165747-1)] (grifos nossos) 

 

Considerando que a presente ação objetiva a anulação de ato administrativo de perdimento de veículo e fora ajuizada por empresa com atividade preponderante voltada à locação desse tipo de bem móvel,tenho que o Tema nº 1.041/STJ não se aplica ao caso em análise.

 

Do mérito

 

A pena de perdimento de veículo, prevista na legislação aduaneira e aplicada pela Receita Federal do Brasil, constitui uma sanção decorrente de condenação em processo administrativo-fiscal, pela prática de ilícitos graves, como contrabando e descaminho, dentre outros, que geram danos ao erário.

 

A aplicação da pena de perdimento de veículo está disciplinada no inciso V do artigo 104 do Decreto-Lei nº 37/66, nos artigos 23, 24 e 27 do Decreto-Lei nº 1.455/1976 e no inciso V do artigo 688 do Decreto-Lei nº 6.759/2009. Por sua vez, os agentes do crime e sua responsabilização estão especificados nos artigos 94 e 95 do Decreto-Lei nº 37/66 e no artigo 674 do Decreto-Lei nº 6.759/2009.

 

Decreto-Lei nº 37/1966

 

“Art. 94 - Constitui infração toda ação ou omissão, voluntária ou involuntária, que importe inobservância, por parte da pessoa natural ou jurídica, de norma estabelecida neste Decreto-Lei, no seu regulamento ou em ato administrativo de caráter normativo destinado a completá-los.

 

(...)

 

§ 2º - Salvo disposição expressa em contrário, a responsabilidade por infração independe da intenção do agente ou do responsável e da efetividade, natureza e extensão dos efeitos do ato.”

 

“Art. 95 - Respondem pela infração: 

I - conjunta ou isoladamente, quem quer que, de qualquer forma, concorra para sua prática, ou dela se beneficie; 

II - conjunta ou isoladamente, o proprietário e o consignatário do veículo, quanto à que decorrer do exercício de atividade própria do veículo, ou de ação ou omissão de seus tripulantes;

(...)” 

 

“Art.104 - Aplica-se a pena de perda do veículo nos seguintes casos:

(...)

V - quando o veículo conduzir mercadoria sujeita à pena de perda, se pertencente ao responsável por infração punível com aquela sanção;

(...)”

 

Decreto-Lei nº 1.455/1976

 

“Art 23. Consideram-se dano ao Erário as infrações relativas às mercadorias:

I - importadas, ao desamparo de guia de importação ou documento de efeito equivalente, quando a sua emissão estiver vedada ou suspensa na forma da legislação específica em vigor;

II - importadas e que forem consideradas abandonadas pelo decurso do prazo de permanência em recintos alfandegados nas seguintes condições:

a) 90 (noventa) dias após a descarga, sem que tenh sido iniciado o seu despacho; ou

b) 60 (sessenta) dias da data da interrupção do despacho por ação ou omissão do importador ou seu representante; ou

c) 60 (sessenta) dias da data da notificação a que se refere o artigo 56 do Decreto-Iei número 37, de 18 de novembro de 1966, nos casos previstos no artigo 55 do mesmo Decreto-lei; ou

d) 45 (quarenta e cinco) dias após esgotar-se o prazo fixado para permanência em entreposto aduaneiro ou recinto alfandegado situado na zona secundária.

III - trazidas do exterior como bagagem, acompanhada ou desacompanhada e que permanecerem nos recintos alfandegados por prazo superior a 45 (quarenta e cinco) dias, sem que o passageiro inicie a promoção, do seu desembaraço;

IV - enquadradas nas hipóteses previstas nas alíneas " a " e " b " do parágrafo único do artigo 104 e nos incisos I a XIX do artigo 105, do Decreto-lei número 37, de 18 de novembro de 1966.

V - estrangeiras ou nacionais, na importação ou na exportação, na hipótese de ocultação do sujeito passivo, do real vendedor, comprador ou de responsável pela operação, mediante fraude ou simulação, inclusive a interposição fraudulenta de terceiros.(Incluído pela Lei nº 10.637, de 30.12.2002)

VI - (Vide Medida Provisória nº 320, 2006)

§ 1o O dano ao erário decorrente das infrações previstas no caput deste artigo será punido com a pena de perdimento das mercadorias. (Incluído pela Lei nº 10.637, de 30.12.2002)

§ 2o Presume-se interposição fraudulenta na operação de comércio exterior a não-comprovação da origem, disponibilidade e transferência dos recursos empregados.(Incluído pela Lei nº 10.637, de 30.12.2002)

§ 3o  As infrações previstas no caput serão punidas com multa equivalente ao valor aduaneiro da mercadoria, na importação, ou ao preço constante da respectiva nota fiscal ou documento equivalente, na exportação, quando a mercadoria não for localizada, ou tiver sido consumida ou revendida, observados o rito e as competências estabelecidos no Decreto no 70.235, de 6 de março de 1972. (Redação dada pela Lei nº 12.350, de 2010)

§ 4o O disposto no § 3o não impede a apreensão da mercadoria nos casos previstos no inciso I ou quando for proibida sua importação, consumo ou circulação no território nacional.(Incluído pela Lei nº 10.637, de 30.12.2002)

Parágrafo único. (Suprimido com a nova Redação da Lei nº 10.637,2002)

 

Art 24. Consideram-se igualmente dano ao Erário, punido com a pena prevista no parágrafo único do artigo 23, as infrações definidas nos incisos I a VI do artigo 104 do Decreto-lei número 37, de 18 de novembro de 1966.

(...)       

Art. 27. As penalidades decorrentes das infrações de que tratam os arts. 23, 24 e 26 deste Decreto-Lei serão aplicadas por Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil e formalizadas por meio de auto de infração acompanhado de termo de apreensão e, se for o caso, de termo de guarda, o qual deverá estar instruído com os termos, os depoimentos, os laudos e os demais elementos de prova indispensáveis à comprovação do ilícito.   (Redação dada pela Lei nº 14.651, de 2023)

 

Decreto-Lei nº 6.759/2009

 

“Art. 674.  Respondem pela infração (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 95):

I - conjunta ou isoladamente, quem quer que, de qualquer forma, concorra para sua prática ou dela se beneficie;

II - conjunta ou isoladamente, o proprietário e o consignatário do veículo, quanto à que decorra do exercício de atividade própria do veículo, ou de ação ou omissão de seus tripulantes;

(...)” 

 

“Art. 688.  Aplica-se a pena de perdimento do veículo nas seguintes hipóteses, por configurarem dano ao Erário (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 104; Decreto-Lei nº 1.455, de 1976, art. 24; e Lei nº 10.833, de 2003, art. 75, § 4º):

(...)

V - quando o veículo conduzir mercadoria sujeita a perdimento, se pertencente ao responsável por infração punível com essa penalidade;

(...)

§ 2o Para efeitos de aplicação do perdimento do veículo, na hipótese do inciso V, deverá ser demonstrada, em procedimento regular, a responsabilidade do proprietário do veículo na prática do ilícito.

(...)”

 

E, ainda, no que tange à responsabilidade do proprietário do veículo automotor utilizado na prática do ato ilícito aduaneiro foi editada a súmula nº 138 do extinto Tribunal Federal de Recursos: “A pena de perdimento de veículo, utilizado em contrabando ou descaminho, somente se justifica se demonstrada, em procedimento regular, a responsabilidade do seu proprietário na prática do ilícito".

 

No caso concreto, depreende-se da exordial que no dia 20 de setembro de 2020, a parte autora, pessoa jurídica, proprietária do veículo de marca Volkswagen, modelo GOL 1.0L MC4, placa RFI-3F49, cor cinza, fabricação / modelo 2020 / 2021, chassi 9BWAG45U2MT044031 (ID 277959761), celebrou um contrato de locação deste veículo com a pessoa física, Sra. Paula Fernanda Calixto, que indicou como motorista adicional a Sra. Emanuelli Calixto de Freitas, com data prevista de término, em 22 de setembro de 2020 (ID 277959761).

 

Relata a parte autora, na inicial, que na data do término do contrato de locação, referido veículo, de sua propriedade, não foi devolvido à sua posse direta, na data e local definidos nos termos do contrato, e que foi surpreendida com a notícia da apreensão deste.

 

Do auto de infração juntado ao presente feito nº 147800-14497/2021, lavrado em 11 de fevereiro de 2021 (ID 277959763), verifica-se que, no dia 22 de setembro de 2020, foi feita a apreensão do veículo em questão, na posse da motorista indicada como adicional, Sra. Emanuelli Calixto de Freitas, que o utilizou para a prática do ilícito fiscal de transporte mercadorias de origem estrangeira, desacompanhadas de documentação comprobatória de sua importação regular no país. Consequentemente, foi aplicada pela Receita Federal do Brasil a pena de perdimento do veículo apreendido, de propriedade da parte autora.

 

Cumpre analisar, no presente feito, a responsabilidade da parte autora, locadora de veículos, no cometimento da citada infração aduaneira.

 

Insta consignar que, de acordo com o §2º do artigo 688 do Decreto nº 6.759/2009: “Para efeitos de aplicação do perdimento do veículo, na hipótese do inciso V, deverá ser demonstrada, em procedimento regular, a responsabilidade do proprietário do veículo na prática do ilícito”. (g.n.)

 

Trata-se a parte autora de empresa que tem como atividade preponderante a locação de veículos automotores, atuando, de forma regular e com fins lucrativos, em diversas cidades brasileiras.

 

Relevante, por certo, que a parte autora já esteve envolvida em outros ilícitos semelhantes, em razão de sua atividade desenvolvida, sendo notória a grande quantidade de registros de infrações fiscais dessa natureza, com esse modus operandi. Ou seja, um agente criminoso usufruindo de um bem alheio para o cometimento de delito.

 

Nessa circunstância, não se pode afastar, desde logo, a boa-fé da parte autora no negócio jurídico celebrado, de modo que o fato desta não ter realizado prévia consulta ao sistema de Comunicação e Protocolo - COMPROT, para averiguar o histórico de antecedentes criminais dos seus consumidores, antes de efetivar o negócio jurídico, não permite que lhe seja estendida a responsabilidade pelo ilícito fiscal, por ausência de previsão legal. Ademais, a recusa do aluguel do veículo ao consumidor, em caso de localização de antecedente criminal, configuraria prática abusiva, vedada pelo Código de Defesa do Consumidor:  

 

“Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:  

(...) 

 II - recusar atendimento às demandas dos consumidores, na exata medida de suas disponibilidades de estoque, e, ainda, de conformidade com os usos e costumes; 

(...) 

 IX - recusar a venda de bens ou a prestação de serviços, diretamente a quem se disponha a adquiri-los mediante pronto pagamento, ressalvados os casos de intermediação regulados em leis especiais;

(...)” 

 

Portanto, do conjunto probatório carreado aos autos, depreende-se que a parte autora, em que pese ser proprietária do veículo apreendido, estava exercendo suas atividades de forma regular, não restando comprovada a sua atuação no ilícito aduaneiro de internalização de mercadorias estrangeiras desprovidas de documentação fiscal, nem mesmo restou demonstrado o seu conhecimento sobre a possibilidade de uso ilegal do veículo pelo condutor-locatário, que foi flagrado na posse das mercadorias apreendidas.

 

Nesse sentido tem sido o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

 

ADMINISTRATIVO. MERCADORIAS ESTRANGEIRAS. INTERNAÇÃO IRREGULAR. DESCAMINHO OU CONTRABANDO. VEÍCULO TRANSPORTADOR. LOCADORA DE VEÍCULOS. PROPRIEDADE. PARTICIPAÇÃO NO ILÍCITO. INEXISTÊNCIA. PENA DE PERDIMENTO. ILEGALIDADE.

1. Só a lei pode prever a responsabilidade pela prática de atos ilícitos e estipular a competente penalidade para as hipóteses que determinar, ao mesmo tempo em que ninguém pode ser privado de seus bens sem a observância do devido processo legal.

2. À luz dos arts. 95 e 104 do DL n. 37/1966 e do art. 668 do Decreto n. 6.759/2009, a pena de perdimento do veículo só pode ser aplicada ao proprietário do bem quando, com dolo, proceder à internalização irregular de sua própria mercadoria.

3. A pessoa jurídica, proprietária do veículo, que exerce a regular atividade de locação, com fim lucrativo, não pode sofrer a pena de perdimento em razão de ilícito praticado pelo condutor-locatário, salvo se tiver participação no ato ilícito para internalização de mercadoria própria, exceção que, à míngua de previsão legal, não pode ser equiparada à não investigação dos "antecedentes" do cliente.

4. Hipótese em que o delineamento fático-probatório contido no acórdão recorrido não induz à conclusão de exercício irregular da atividade de locação, de participação da pessoa jurídica no ato ilícito, nem de algum potencial proveito econômico da locadora com as mercadorias internalizadas.

5. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.

(REsp n. 1.817.179/RS, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 17/9/2019, DJe de 2/10/2019.) (g.n.)

 

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. OFENSA AO ART. 1.022 DO CPC. RAZÕES GENÉRICAS. SÚMULA 284/STF. ADUANEIRO. EMPRESA LOCADORA. PERDIMENTO. APREENSÃO DE VEÍCULO QUE TRANSPORTAVA MERCADORIAS INTERNADAS IRREGULARMENTE. RESPONSABILIDADE DO PROPRIETÁRIO DEMONSTRADA NOS AUTOS. AUSÊNCIA DE BOA-FÉ. REVISÃO DAS CONCLUSÕES ADOTADAS NA ORIGEM. SÚMULA 7/STJ.

1. A parte recorrente sustenta que o art. 1.022 do CPC foi violado, mas deixa de apontar, de forma clara, o vício em que teria incorrido o acórdão impugnado. Assim, é inviável o conhecimento do Recurso Especial nesse ponto, ante o óbice da Súmula 284/STF.

2. Consoante o entendimento do STJ, "somente é cabível a aplicação de pena de perdimento de veículo quando houver clara demonstração da responsabilidade do proprietário na prática do ilícito" (AgRg no REsp 1.313.331/PR, Rel. Ministro Catro Meira, Segunda Turma, DJe 18.6.2013).

3. Verifica-se que o acórdão recorrido fundamentou-se em matéria fático-probatória, ao concluir pela responsabilidade do proprietário do veículo na prática do ilícito, a ensejar a incidência da referida penalidade, "especialmente em razão da sua culpa in vigilando, pois deixou de adotar as cautelas típicas do negócio" (fl. 328, e-STJ).

Com efeito, a modificação da conclusão a que chegou a Corte de origem demanda o reexame de provas, o que é inadmissível na via estreita do Recurso Especial, ante o óbice da Súmula 7/STJ.

4. Recurso Especial não conhecido.

(REsp n. 1.811.138/PR, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 11/6/2019, DJe de 1/8/2019.) (g.n.)

 

E, ainda, nesse sentido já se manifestou esta E. 3ª Turma:

 

DIREITO ADUANEIRO E TRIBUTÁRIO. INTRODUÇÃO IRREGULAR DE MERCADORIA ESTRANGEIRA. PENA DE PERDIMENTO DO VEÍCULO TRANSPORTADOR. CONTRATO DE LOCAÇÃO. PRESUNÇÃO DE BOA-FÉ DO PROPRIETÁRIO. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO DESPROVIDAS. 

1.  A questão devolvida a esta E. Corte diz respeito ao cabimento da pena de perdimento do veículo automotor utilizado na prática de ilícito fiscal. 

2. Extrai-se da análise do Decreto-Lei 37/1966 (arts. 95, 96 e 104), do Decreto-Lei 1.455/1976 (art. 24) e do Decreto-Lei 6.759/2009 (arts. 674 e 688) que a aplicação da pena de perdimento em razão do cometimento de ilícito fiscal deve levar em conta, na análise do caso concreto, a eventual reincidência na conduta infracional a justificar o afastamento da presunção de boa-fé do proprietário, assim como a gravidade do fato e proporcionalidade entre o valor da mercadoria e do veículo apreendidos.  

3. Semelhante interpretação foi conferida pelo extinto Tribunal Federal de Recursos na edição da Súmula 138: “A pena de perdimento de veículo, utilizado em contrabando ou descaminho, somente se justifica se demonstrada, em procedimento regular, a responsabilidade do seu proprietário na prática do ilícito". 

4. No caso vertente, trata-se de empresa que atua na locação de veículos com abrangência territorial nacional e cuja boa-fé não pode ser afastada pelo simples argumento de que, ao operar em região de fronteira, assume os riscos de ter seus veículos utilizados para a prática de ilícitos fiscais.  

5. Se, como alegado pelo fisco, é sabido que os muitos infratores utilizam veículos alugados para não se sujeitar à pena de perdimento, a solução não parece ser punir indistintamente o locador, mas intensificar a fiscalização desses veículos, que geralmente possuem elementos de fácil identificação visual, como adesivos próprios e, atualmente, as próprias placas em letras vermelhas. 

6. Exigir que as locadoras façam uma análise prévia do histórico do locatário no COMPROT, por exemplo, além de não ter respaldo na legislação, esbarra em disposições antidiscriminatórias do Código de Defesa do Consumidor, a saber, art. 39, II e IX.  

7. Precedentes (REsp 1817179/RS, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/09/2019, DJe 02/10/2019 / TRF 3ª Região, 4ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000785-78.2020.4.03.6005, Rel. Desembargador Federal MARLI MARQUES FERREIRA, julgado em 07/01/2022, DJEN DATA: 03/02/2022 / TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5001514-41.2019.4.03.6005, Rel. Desembargador Federal LUIS ANTONIO JOHONSOM DI SALVO, julgado em 20/12/2021, Intimação via sistema DATA: 21/01/2022 / TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0010819-91.2015.4.03.6000, Rel. Desembargador Federal LUIS CARLOS HIROKI MUTA, julgado em 23/04/2021, DJEN DATA: 04/05/2021). 

8. Remessa necessária e apelação desprovidas. 

(TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000892-22.2020.4.03.6006, Rel. Desembargador Federal CONSUELO YATSUDA MOROMIZATO YOSHIDA, julgado em 03/10/2023, Intimação via sistema DATA: 04/10/2023) (g.n.)

                                       

DIREITO TRIBUTÁRIO. ADMINISTRATIVO. ADUANEIRO. PENA DE PERDIMENTO. ADUANEIRO. LIBERAÇÃO VEÍCULO. AUSÊNCIA DE DOLO OU MÁ-FÉ DO PROPRIETÁRIO.  APELAÇÃO DESPROVIDA.

1- A pena de perdimento imposta encontra-se prevista no inciso V do artigo 104 e inciso X do artigo 105 do Decreto-Lei 37/66, regulamentado pelo artigo 688 do Regulamento Aduaneiro (Decreto n 6.759/2009):

2- No caso a conduta ilícita restou configurada eis que as mercadorias estrangeiras sem documentação estavam sendo transportadas no interior do veículo.

3- O cerne da questão consiste em verificar se a autora, empresa locadora de veículos e proprietária do automóvel apreendido, deve ser responsabilizada pelo fato delituoso praticado pelo condutor que utilizou o veículo para entrar no país com mercadorias estrangeiras de forma irregular.

4-O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento no sentido de que, para ser aplicada a pena de perdimento, deve haver prova de que o proprietário é responsável: (AgRg no REsp 1181297/PR, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/08/2016, DJe 15/08/2016)

5- No caso, o veículo em questão é de propriedade da autora, conforme se verifica dos documentos juntados nos autos. Contudo,  não restou comprovada a sua participação na infração ou, pelo menos, o seu conhecimento acerca do uso ilegal do veículo, devendo ser considerada a boa-fé da empresa autora. Deve-se ressaltar que a pena de perdimento consiste numa restrição extrema ao direito de propriedade do particular, direito protegido constitucionalmente, não se podendo permitir excessos na sua aplicação e o nosso ordenamento não admite a responsabilidade de quem não tenha praticado ou concorrido com a infração aduaneira, havendo necessidade de se demonstrar a má-fé do proprietário.

6-Portanto, não demonstrada a má-fé da autora, a pena de perdimento do veículo em seu desfavor revelou-se ilegal, devendo a sentença ser mantida.

7-Apelação não provida.

(TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5007675-77.2022.4.03.6000, Rel. Desembargador Federal NERY DA COSTA JUNIOR, julgado em 30/08/2023, DJEN DATA: 15/09/2023)

 

DIREITO ADUANEIRO E TRIBUTÁRIO. INTRODUÇÃO IRREGULAR DE MERCADORIA ESTRANGEIRA. PENA DE PERDIMENTO DO VEÍCULO TRANSPORTADOR. CONTRATO DE LOCAÇÃO. PRESUNÇÃO DE BOA-FÉ DO PROPRIETÁRIO. APELAÇÃO DESPROVIDA.

1.  A questão devolvida a esta E. Corte diz respeito ao cabimento da pena de perdimento do veículo automotor utilizado na prática de ilícito fiscal.

2. Extrai-se da análise do Decreto-Lei 37/1966 (arts. 95, 96 e 104), do Decreto-Lei 1.455/1976 (art. 24) e do Decreto-Lei 6.759/2009 (arts. 674 e 688) que a aplicação da pena de perdimento em razão do cometimento de ilícito fiscal deve levar em conta, na análise do caso concreto, a eventual reincidência na conduta infracional a justificar o afastamento da presunção de boa-fé do proprietário, assim como a gravidade do fato e proporcionalidade entre o valor da mercadoria e do veículo apreendidos.

3. Semelhante interpretação foi conferida pelo extinto Tribunal Federal de Recursos na edição da Súmula 138: “A pena de perdimento de veículo, utilizado em contrabando ou descaminho, somente se justifica se demonstrada, em procedimento regular, a responsabilidade do seu proprietário na prática do ilícito".

4. No caso vertente, trata-se de empresa que atua na locação de veículos com abrangência territorial nacional e cuja boa-fé não pode ser afastada pelo simples argumento de que, ao operar em região de fronteira, assume os riscos de ter seus veículos utilizados para a prática de ilícitos fiscais.

5. Se, como alegado pelo fisco, é sabido que os muitos infratores utilizam veículos alugados para não se sujeitar à pena de perdimento, a solução não parece ser punir indistintamente o locador, mas intensificar a fiscalização desses veículos, que geralmente possuem elementos de fácil identificação visual, como adesivos próprios e, atualmente, as próprias placas em letras vermelhas.

6. Exigir que as locadoras façam uma análise prévia do histórico do locatário no COMPROT, por exemplo, além de não ter respaldo na legislação, esbarra em disposições antidiscriminatórias do Código de Defesa do Consumidor, a saber, art. 39, II e IX.

7. Precedentes (REsp 1817179/RS, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/09/2019, DJe 02/10/2019 / TRF 3ª Região, 4ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000785-78.2020.4.03.6005, Rel. Desembargador Federal MARLI MARQUES FERREIRA, julgado em 07/01/2022, DJEN DATA: 03/02/2022 / TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5001514-41.2019.4.03.6005, Rel. Desembargador Federal LUIS ANTONIO JOHONSOM DI SALVO, julgado em 20/12/2021, Intimação via sistema DATA: 21/01/2022 / TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0010819-91.2015.4.03.6000, Rel. Desembargador Federal LUIS CARLOS HIROKI MUTA, julgado em 23/04/2021, DJEN DATA: 04/05/2021).

8. Apelação desprovida. Majorados para 11% os honorários advocatícios de sucumbência fixados na sentença, mantida a base de cálculo.

(TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5002200-62.2021.4.03.6005, Rel. Desembargador Federal CONSUELO YATSUDA MOROMIZATO YOSHIDA, julgado em 28/04/2023, DJEN DATA: 03/05/2023) (g.n.)

                                       

Dessa forma, não restando comprovada a responsabilidade da parte autora, proprietária do veículo apreendido, na prática do ilícito aduaneiro, deve ser anulado o ato administrativo de perdimento do veículo de marca Volkswagen, modelo GOL 1.0L MC4, placa RFI-3F49, cor cinza, fabricação / modelo 2020 / 2021, chassi 9BWAG45U2MT044031.

                                    

Em atenção ao disposto no artigo 85, §11, do CPC, ficam os honorários advocatícios majorados em 1%, respeitando-se os limites previstos nos §§ 2º e 3º do mesmo artigo.

 

Ante o exposto, nego provimento à apelação da União, e, por consequência, majoro os honorários advocatícios em 1%, nos termos do artigo 85, §11, do CPC, respeitando-se os limites previstos nos §§ 2º e 3º do mesmo artigo, mantendo, na íntegra, a r. sentença de 1º grau de jurisdição.

 

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

PROCESSUAL CIVIL. ADUANEIRO. TRIBUTÁRIO. AÇÃO DE PROCEDIMENTO COMUM. PERDIMENTO DE VEÍCULO. TEMA 1.041/STJ. NÃO APLICAÇÃO AO CASO CONCRETO. EMPRESA LOCADORA PROPRIETÁRIA DO VEÍCULO APREENDIDO. RESPONSABILIDADE DO PROPRIETÁRIO NÃO DEMONSTRADA. PRESUNÇÃO DE BOA-FÉ. MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO DA UNIÃO DESPROVIDA.

1. Cinge-se a controvérsia dos autos no cabimento da pena de perdimento de veículo automotor, de propriedade de locadora de veículos, utilizado para o cometimento de ilícito aduaneiro.   

2. Considerando que a presente ação objetiva a anulação de ato administrativo de perdimento de veículo e fora ajuizada por empresa com atividade preponderante voltada à locação desse tipo de bem móvel, o Tema nº 1.041/STJ não se aplica ao caso em análise.

3. A pena de perdimento de veículo, prevista na legislação aduaneira e aplicada pela Receita Federal do Brasil, constitui uma sanção decorrente de condenação em processo administrativo-fiscal, pela prática de ilícitos graves, como contrabando e descaminho, dentre outros, que geram danos ao erário.

4. A aplicação da pena de perdimento de veículo está disciplinada no inciso V do artigo 104 do Decreto-Lei nº 37/66, nos artigos 23, 24 e 27 do Decreto-Lei nº 1.455/1976 e no inciso V do artigo 688 do Decreto-Lei nº 6.759/2009. Por sua vez, os agentes do crime e sua responsabilização estão especificados nos artigos 94 e 95 do Decreto-Lei nº 37/66 e no artigo 674 do Decreto-Lei nº 6.759/2009.

5. No que tange à responsabilidade do proprietário do veículo automotor utilizado na prática do ato ilícito aduaneiro foi editada a súmula nº 138 do extinto Tribunal Federal de Recursos: “A pena de perdimento de veículo, utilizado em contrabando ou descaminho, somente se justifica se demonstrada, em procedimento regular, a responsabilidade do seu proprietário na prática do ilícito".

6. No caso concreto, depreende-se da exordial que no dia 20 de setembro de 2020, a parte autora, pessoa jurídica, proprietária do veículo de marca Volkswagen, modelo GOL 1.0L MC4, placa RFI-3F49, cor cinza, fabricação / modelo 2020 / 2021, chassi 9BWAG45U2MT044031 (ID 277959761), celebrou um contrato de locação deste veículo com a pessoa física, Sra. Paula Fernanda Calixto, que indicou como motorista adicional a Sra. Emanuelli Calixto de Freitas, com data prevista de término, em 22 de setembro de 2020 (ID 277959761). Relata a parte autora, na inicial, que na data do término do contrato de locação, referido veículo, de sua propriedade, não foi devolvido à sua posse direta, na data e local definidos nos termos do contrato, e que foi surpreendida com a notícia da apreensão deste. Do auto de infração juntado ao presente feito nº 147800-14497/2021, lavrado em 11 de fevereiro de 2021 (ID 277959763), verifica-se que, no dia 22 de setembro de 2020, foi feita a apreensão do veículo em questão, na posse da motorista indicada como adicional, Sra. Emanuelli Calixto de Freitas, que o utilizou para a prática do ilícito fiscal de transporte mercadorias de origem estrangeira, desacompanhadas de documentação comprobatória de sua importação regular no país. Consequentemente, foi aplicada pela Receita Federal do Brasil a pena de perdimento do veículo apreendido, de propriedade da parte autora.

7. Cumpre analisar, no presente feito, a responsabilidade da parte autora, locadora de veículos, no cometimento da citada infração aduaneira.

8. De acordo com o §2º do artigo 688 do Decreto nº 6.759/2009: “Para efeitos de aplicação do perdimento do veículo, na hipótese do inciso V, deverá ser demonstrada, em procedimento regular, a responsabilidade do proprietário do veículo na prática do ilícito”. (g.n.)

9. Trata-se a parte autora de empresa que tem como atividade preponderante a locação de veículos automotores, atuando, de forma regular e com fins lucrativos, em diversas cidades brasileiras.

10. Relevante, por certo, que a parte autora já esteve envolvida em outros ilícitos semelhantes, em razão de sua atividade desenvolvida, sendo notória a grande quantidade de registros de infrações fiscais dessa natureza, com esse modus operandi. Ou seja, um agente criminoso usufruindo de um bem alheio para o cometimento de delito. Nessa circunstância, não se pode afastar, desde logo, a boa-fé da parte autora no negócio jurídico celebrado, de modo que o fato desta não ter realizado prévia consulta ao sistema de Comunicação e Protocolo - COMPROT, para averiguar o histórico de antecedentes criminais dos seus consumidores, antes de efetivar o negócio jurídico, não permite que lhe seja estendida a responsabilidade pelo ilícito fiscal, por ausência de previsão legal. Ademais, a recusa do aluguel do veículo ao consumidor, em caso de localização de antecedente criminal, configuraria prática abusiva, vedada pelo Código de Defesa do Consumidor (art. 39 CDC).

11. Do conjunto probatório carreado aos autos, depreende-se que a parte autora, em que pese ser proprietária do veículo apreendido, estava exercendo suas atividades de forma regular, não restando comprovada a sua atuação no ilícito aduaneiro de internalização de mercadorias estrangeiras desprovidas de documentação fiscal, nem mesmo restou demonstrado o seu conhecimento sobre a possibilidade de uso ilegal do veículo pelo condutor-locatário, que foi flagrado na posse das mercadorias apreendidas.

12. Não restando comprovada a responsabilidade da parte autora, proprietária do veículo apreendido, na prática do ilícito aduaneiro, deve ser anulado o ato administrativo de perdimento do veículo de marca Volkswagen, modelo GOL 1.0L MC4, placa RFI-3F49, cor cinza, fabricação / modelo 2020 / 2021, chassi 9BWAG45U2MT044031.

13. Majoração dos honorários advocatícios nos termos do artigo 85, §11, CPC, respeitados os limites dos §§2º e 3º do mesmo artigo.

14. Apelação da União desprovida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação da União, e, por consequência, majorou os honorários advocatícios em 1%, nos termos do artigo 85, §11, do CPC, respeitando-se os limites previstos nos §§ 2º e 3º do mesmo artigo, mantendo, na íntegra, a r. sentença de 1º grau de jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.