Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5019687-51.2021.4.03.6100

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO

APELANTE: CLEAN FIELD COMERCIO DE PRODUTOS ALIMENTICIOS LTDA

Advogado do(a) APELANTE: OCTAVIO TEIXEIRA BRILHANTE USTRA - SP196524-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5019687-51.2021.4.03.6100

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO

APELANTE: CLEAN FIELD COMERCIO DE PRODUTOS ALIMENTICIOS LTDA

Advogado do(a) APELANTE: OCTAVIO TEIXEIRA BRILHANTE USTRA - SP196524-A

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R E L A T Ó R I O

 

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):

 

Trata-se de remessa necessária e apelação interposta por CLEAN FIELD COMÉRCIO DE PRODUTOS ALIMENTÍCIOS LTDA, em mandado de segurança impetrado contra ato do DELEGADO DA DELEGACIA DE FISCALIZAÇÃO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM SÃO PAULO (DEFIS/SPO), em que se postulou:

 

“(...) c) Seja julgado integralmente procedente o pedido para que seja concedida a segurança pleiteada, para extinguir o processo com julgamento do mérito declarando o direito da Impetrante, deduzir em dobro as despesas do PAT diretamente do lucro tributável, nos termos do artigo 1º, da Lei nº 6.321/76, afastando-se as limitações impostas pelo art. 1º do Decreto nº 5/91, e pelos Decretos nºs 3.000/99, 78.676/76 e 9.580/18;

d) Cumulativamente ao pedido anterior, conceder o direito da Impetrante de aplicar a limitação de 4% (quatro por cento) efetivamente sobre o total do Imposto de Renda devido, considerando, inclusive, o adicional do imposto de renda (10%);

e) Ainda, reconhecer a aplicabilidade do benefício de dedução em dobro das despesas do PAT diretamente sobre o lucro tributável, para fins de apuração da CSLL;

f) Seja afastada a limitação da norma infra legal que “fixou custos máximos para as refeições individuais oferecidas pelo programa de alimentação do trabalhador, para fins de dedução do imposto de renda da pessoa jurídica, dada a exorbitância em relação à Lei 6.321/76”, e ainda, com base no Parecer 2623/2008, autorizando a Procuradoria não recorrer, a Impetrante requer, de plano, o afastamento da limitação imposta pela a Instrução Normativa DRF nº 267/2002.

g) Requer ainda, que nos exercícios em que for apurado prejuízo fiscal, ou base de cálculo de IRPJ e CSLL negativa, seja permitido que a Impetrante realize a contabilização das despesas com PAT em sua apuração, com o consequente aumento de seu prejuízo fiscal, permitindo ainda a utilização do prejuízo fiscal até seu limite de 30%, nos termos previstos na Legislação vigente;

h) A declaração ao direito de compensação/restituição do respectivo indébito tributário dos últimos 5 (cinco) anos anteriores a ação, inclusive os recolhidos durante o trâmite da presente ação, com tributos administrados pela RFB;

i) À atualização dos créditos mencionados no item anterior pela aplicação da Taxa SELIC, nos termos da legislação; e

j) Ao ressarcimento do montante recolhido a título custas e demais despesas processuais relacionadas com o presente mandamus. (...)”

 

A r. sentença ID 285776337 dispôs:

 

“(...) Isto posto, DEFIRO PARCIALMENTE A SEGURANÇA, para reconhecer o direito da parte impetrante de apurar e recolher o Imposto de Renda de Pessoa Jurídica sem as limitações impostas pelo Decreto nº 10.854/2021, de modo a deduzir as despesas com o Programa de Alimentação do Trabalhador – PAT diretamente sobre o lucro tributável, observado o percentual máximo estabelecido no art. 5º da Lei nº 9.532/1997, bem como  autorizo a compensação do quanto recolhido indevidamente, após o trânsito em julgado, observado o prazo prescricional de 05 (cinco) anos, contado de cada recolhimento indevido, nos termos das disposições legais infralegais pertinentes ao exercício da compensação tributária.  

Oportunamente, remetam-se os autos o E. TRF da 3ª Região par reexame necessário (art. 14, §1º, da Lei nº 12.016/2009).

Sem condenação em honorários, nos termos do art. 25 da Lei n. 12.016/2009. 

 

Embargos de declaração opostos pela impetrante (ID 285776344), rejeitados (ID 285776350).

 

Em suas razões recursais (ID 285776353), a parte impetrante postulou a reforma parcial da r. sentença, a fim de que seja:

 

“a) Reconhecido o benefício de dedução em dobro das despesas do PAT diretamente sobre o lucro tributável, para fins de apuração da CSLL;

b) reconhecido o direito à dedução em dobro do PAT também ao adicional do imposto de renda;

c) Nos exercícios em que for apurado prejuízo fiscal, ou base de cálculo de IRPJ e CSLL negativa, seja permitido que a Apelante realize a contabilização das despesas com PAT em sua apuração, com o consequente aumento de seu prejuízo fiscal, permitindo ainda a utilização do prejuízo fiscal até seu limite de 30% e

d) Seja reconhecido o direito da Apelante à compensação/restituição dos valores indevidamente recolhidos a este título nos últimos cinco anos anteriores ao ajuizamento da ação, além dos efetuados no curso do presente processo.”

 

Devidamente processado o feito, com contrarrazões da União (ID 285776360), foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.

 

O Ministério Público Federal, não vislumbrando interesse público que justificasse sua intervenção, manifestou-se pelo regular processamento do feito (ID 285923532).

 

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


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V O T O

 

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):

 

Do princípio da congruência

 

Segundo o princípio da congruência, fixados os limites da lide pela parte autora, veda-se ao magistrado decidir além (ultra petita), aquém (citra petita) ou diversamente do pedido (extra petita), consoante artigo 492 do CPC/2015.

A parte impetrante pleiteou o afastamento das (i) “(...) limitações impostas pelo art. 1º do Decreto nº 5/91, e pelos Decretos nºs 3.000/99, 78.676/76 e 9.580/18; e o afastamento da“(...) limitação imposta pela a Instrução Normativa DRF nº 267/2002 (...)”. (g.n.)

Em sua decisão, o juiz a quo concedeu a segurança, reconhecendo o direito ao afastamento das “(...) limitações impostas pelo Decreto nº 10.854/2021 (...).” (g.n.)

Logo, a sentença, neste aspecto, é extra petita, restando violado o princípio da congruência insculpido no art. 460 do CPC/73, atual art. 492 do CPC/2015.

 

Conveniente esclarecer que a violação ao princípio da congruência traz, no seu bojo, agressão ao princípio da imparcialidade, porquanto concede algo não pedido, e do contraditório, na medida em que impede a parte contrária de exercer integralmente seu direito de defesa.

 

O caso, entretanto, não é de remessa dos autos à 1ª instância, uma vez que a legislação autoriza expressamente o julgamento imediato do processo quando presentes as condições para tanto.

 

É o que se extrai do art. 1.013, § 3º, II, do Código de Processo Civil:

 

"A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada. 

(...) 

§ 3º. Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde logo o mérito quando: 

(...)

II - Decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites do pedido ou da causa de pedir".

 

Considerando que a causa encontra-se madura para julgamento - presentes os elementos necessários ao seu deslinde - e que o contraditório e a ampla defesa restaram assegurados - com a citação válida do ente autárquico - e, ainda, amparado pela legislação processual aplicável, passo ao exame do mérito da demanda.

 

Do mérito

 

O Programa de Alimentação do Trabalhador – PAT, instituído na Lei n.º 6.321/76, hodiernamente regulamentado no Decreto n.º 10.854/21, consiste em ação governamental voltada à promoção da melhoria da condição nutricional dos trabalhadores. Ressalta-se que referida Lei concedeu benefício fiscal na apuração do imposto sobre a renda das pessoas jurídicas devidamente inscritas no Ministério do Trabalho e Previdência.

 

Consoante dispõe o artigo 1º da Lei n.º 6.321/76, “as pessoas jurídicas poderão deduzir do lucro tributável, para fins de apuração do imposto sobre a renda, o dobro das despesas comprovadamente realizadas no período-base em programas de alimentação do trabalhador previamente aprovados pelo Ministério do Trabalho e Previdência.” No entanto, referida dedução está limitada a quatro por cento do imposto de renda devido, nos termos do que preceituam os artigos 5º e 6º, I, da Lei nº 9.532/97.

 

Verifica-se que a legislação de regência define a sistemática de apuração do benefício fiscal de forma expressa, com distinção entre a limitação do valor referente ao benefício fiscal passível de dedução do imposto de renda devido e a forma de cálculo do montante de benefício dedutível, pela qual a dedução do dobro das despesas com alimentação é realizada sobre o lucro tributável. Na mesma linha é o entendimento jurisprudencial:

 

“RECURSO DO PARTICULAR: AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. PROGRAMA DE ALIMENTAÇÃO DO TRABALHADOR - PAT. ART. 1º, DA LEI N. 6.321/76. FORMA DE CÁLCULO. DEDUÇÃO SOBRE O LUCRO TRIBUTÁVEL DA EMPRESA E NÃO SOBRE O IMPOSTO DE RENDA DEVIDO, O QUE REFLETE NO CÁLCULO DO ADICIONAL DO IMPOSTO DE RENDA, AFASTANDO A VEDAÇÃO CONSTANTE DO ART. 3º, §4º, DA LEI N. 9.249/95. LIMITAÇÃO DA DOBRA A 4% DO IMPOSTO DE RENDA DEVIDO E NÃO A 4% DO LUCRO TRIBUTÁVEL.

1. Muito embora esta Corte tenha posicionamento no sentido de que a dedução do dobro das despesas comprovadamente gastas com o Programa de Alimentação do Trabalhador - PAT deve se dar por sobre o lucro tributável (e não por sobre o imposto de renda devido), diferentemente, a limitação da dobra deve obedecer ao limite de 4% (quatro por cento) do imposto de renda devido e não a 4% do lucro tributável. Isto porque tal limite está expresso nos arts. 5º e 6º, I, da Lei n. 9.532/97.

2. Se o artigo 1º, da Lei nº 6.321/76, é claro no sentido de que a dedução do PAT recai sobre o lucro tributável (não tendo sido revogado no ponto pela legislação posterior, pois a Lei n. 9.532/97 tratou apenas dos limites e não da base de cálculo do benefício), os arts. 5º e 6º, I, da Lei n. 9.532/97, são claros no sentido de que o limite da dedução recai sobre o imposto de renda devido. São duas coisas distintas: o cálculo do benefício (lucro tributável) e o limite do benefício (imposto de renda devido).

3. Agravo interno do PARTICULAR não provido.”

(AgInt nos EDcl nos EDcl no REsp 1.926.785/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/02/2022, DJe 02/03/2022) [grifo nosso]

 

No que tange ao adicional de imposto de renda, devido relativamente à “parcela do Lucro Real, presumido ou arbitrado, que exceder o valor resultante da multiplicação de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) pelo número de meses do respectivo período de apuração”, ressalta-se haver disposição legal vedando quaisquer deduções (artigo 3º, § 4º, da Lei n.º 9.249/1995: "O valor do adicional será recolhido integralmente, não sendo permitidas quaisquer deduções").

 

Quanto aos benefícios fiscais do PAT ora discutidos (artigo 1º da Lei n.º 6.321/76), a jurisprudência já se consolidou no sentido de que estes também repercutem sobre o adicional do IRPJ, justamente porque a forma de cálculo deste benefício fiscal se dá por meio da dedução do dobro das despesas com alimentação sobre o lucro tributável.

 

Uma vez que o adicional é calculado sobre o valor do lucro tributável excedente ao limite legal, é evidente que a redução do lucro tributável, decorrente da dedução da dobra, implica em alteração do valor relativo ao adicional, situação absolutamente diversa da dedução de benefício fiscal diretamente sobre o valor do adicional, esta, sim, vedada na lei.

 

 

Nessa esteira, confira-se o entendimento do Superior Tribunal de Justiça e deste Tribunal:

 

“PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. ART. 1.022 DO CPC/2015. OMISSÃO RELEVANTE. INTEGRAÇÃO DO JULGADO. IMPOSTO DE RENDA. PROGRAMA DE ALIMENTAÇÃO DO TRABALHADOR - PAT. ART. 1º DA LEI 6.321/76. FORMA DE CÁLCULO. DEDUÇÃO SOBRE O LUCRO TRIBUTÁVEL DA EMPRESA E NÃO SOBRE O IMPOSTO DE RENDA DEVIDO. REFLEXO NO CÁLCULO DO ADICIONAL DO IMPOSTO DE RENDA, AFASTANDO A VEDAÇÃO CONSTANTE DO ART. 3º, §4º, DA LEI 9.249/95. LIMITAÇÃO DA DOBRA A 4% DO IMPOSTO DE RENDA DEVIDO E NÃO A 4% DO LUCRO TRIBUTÁVEL.

[...]

3. Este Tribunal Superior já se pronunciou no sentido de que conquanto "esta Corte tenha posicionamento no sentido de que dedução do dobro das despesas comprovadamente gastas com o Programa de Alimentação do Trabalhador - PAT deve se dar por sobre o lucro tributável (e não por sobre o imposto de renda devido), diferentemente, a limitação da dobra deve obedecer ao limite de 4% (quatro por cento) do imposto de renda devido e não a 4% do lucro tributável. Isto porque tal limite está expresso nos arts. 5º e 6º, I, da Lei n. 9.532/97" (AgInt nos EDcl nos EDcl no REsp 1.926.785/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/02/2022, DJe 02/03/2022).

4. Na espécie, o acórdão embargado deve ser integrado para constar que o provimento do recurso especial refere-se à declaração do direito da parte impetrante de calcular o incentivo fiscal, relacionado ao desconto em dobro das despesas com o PAT, sobre o lucro da empresa, chegando-se, assim, ao lucro real sobre o qual é calculado o adicional do imposto de renda, aplicando-se a limitação de 4% (quatro por cento) sobre o total do imposto de renda devido, após a inclusão do adicional.

5. Embargos de declaração acolhidos, com fins integrativos.

(EDcl no AgInt no REsp n. 1.971.496/RS, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe de 26/5/2022)

TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PROGRAMA DE ALIMENTAÇÃO AO TRABALHADOR (PAT). LEI 6.321/1976. BENEFÍCIO FISCAL. INCIDÊNCIA SOBRE O LUCRO TRIBUTÁVEL. LEI 9.532/1997. ADICIONAL DO IMPOSTO DE RENDA. FORMA DE CÁLCULO.

1. A Lei 6.321/1976, que instituiu o PAT (Programa de Alimentação ao Trabalhador), estabelece em seu art. 1º que as pessoas jurídicas poderão deduzir do lucro tributável, para fins de apuração do imposto sobre a renda, o dobro das despesas comprovadamente realizadas no período base em programas de alimentação do trabalhador previamente aprovados pelo Ministério do Trabalho e Previdência.

2. A restrição do referido benefício efetuada mediante normas infralegais por certo está eivada de ilegalidade, pois extrapola os limites estabelecidos em lei, de modo a violar o disposto no art. 99 do CTN, segundo o qual o conteúdo e o alcance dos decretos restringem-se aos das leis em função das quais sejam expedidos, determinados com observância das regras de interpretação estabelecidas nesta Lei.

3.Por outro lado, de acordo com disposição de natureza legal posterior, concernente ao disposto nos arts. 5º e 6º, I, ambos da Lei 9.532/1997, a limitação da dobra deve obedecer ao limite de 4% (quatro por cento) do imposto de renda devido. Neste ponto, portanto, a pretensão do contribuinte não comporta acolhimento.

4. O contribuinte tem direito a calcular o desconto em dobro das despesas com o PAT sobre o lucro da empresa, de modo a se apurar o lucro real. Sobre esse montante, será calculado o adicional do imposto de renda, aplicando-se a limitação de quatro pontos percentuais sobre o total do imposto de renda devido, após a inclusão do adicional. Precedentes do STJ.

5. Referida Corte Superior tem reiteradamente esclarecido que a dedução em apreço ocorre antes do cálculo do adicional do IRPJ e, por esta razão, não viola o art. 3º, § 4º, da Lei 9.249/1995, pois esse dispositivo incide em momento contábil posterior, de modo que a integralidade nele mencionada já é formada com as deduções antecedentes sobre o lucro tributável. Dessa forma, a dedução das despesas com o PAT refletirá de forma indireta no adicional de dez por cento do IRPJ. Precedentes do STJ.

6. No caso concreto, à exceção do pleito de afastamento do disposto nos arts. 5º e 6º, I, ambos da Lei 9.532/1997, as demais pretensões do contribuinte (ilegalidade de restrições mediante normas infralegais e repercussão no adicional do IRPJ) estão em sintonia com os entendimentos explanados acima.

7. Diante da pacificação da controvérsia no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, com concessão do provimento jurisdicional aos demais contribuintes que o postulam, estão presentes os requisitos para o deferimento do pedido nesta fase processual.

8. Agravo de instrumento do contribuinte parcialmente provido.

(TRF 3ª Região, 3ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5001750-24.2023.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal CONSUELO YATSUDA MOROMIZATO YOSHIDA, julgado em 26/06/2023, Intimação via sistema DATA: 26/06/2023)”

“AGRAVO DE INSTRUMENTO – MANDADO DE SEGURANÇA - APURAÇÃO DO VALOR DE IRPJ - INCENTIVO FISCAL - DEDUÇÃO DO DO PROGRAMA DE ALIMENTAÇÃO DO TRABALHADOR - PAT.

1. Os benefícios fiscais ora tratados se aplicam ao adicional do imposto de renda, devendo-se, em primeiro lugar, proceder-se à dedução sobre o lucro da empresa, resultando no lucro real, sobre o qual deverá ser calculado o adicional. Precedentes.

2. As normas infralegais que estabelecem custos máximos das refeições individuais dos trabalhadores para fins de cálculo da dedução do PAT, bem como aquelas que alteram a base de cálculo da referida dedução para fazê-la incidir no IRPJ resultante, ofendem os princípios da estrita legalidade e da hierarquia das normas, por exorbitarem de seu caráter regulamentar. Precedentes.

3. Agravo de instrumento não provido.

(TRF 3ª Região, 6ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5002885-08.2022.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal MAIRAN GONCALVES MAIA JUNIOR, julgado em 14/08/2023, Intimação via sistema DATA: 17/08/2023)”

 

Didaticamente, para fins de ilustrar a correta apuração do imposto de renda devido com o aproveitamento do benefício fiscal relacionado ao PAT:

(i) identificação do valor limite para aproveitamento do benefício fiscal: sem dedução da dobra sobre o lucro tributável, a pessoa jurídica deverá calcular o total de imposto de renda devido, incluído o adicional. Do resultado total obtido, o montante equivalente a 4% (quatro por cento) representará o limite para aproveitamento do benefício fiscal relativo ao PAT.

 

(ii) dedução da dobra: a pessoa jurídica deverá deduzir do lucro tributável o dobro das despesas com o PAT, sobre este resultado fará incidir a alíquota do imposto de renda e aquela relativa ao adicional;

 

(iii) valor total de imposto de renda devido: a diferença entre o resultado obtido nos itens “i” e “ii” não poderá exceder o montante do limitador de 4% (quatro por cento) apurada no item “i”, de sorte que, não havendo excesso ao limitador, o valor de imposto de renda com o benefício fiscal corresponderá àquele apurado no item “ii”; na hipótese de haver excesso, o valor total de imposto de renda devido observará o limitador e o excedente a esse limitador poderá, se o caso, ser aproveitado em exercícios financeiros subsequentes, na forma do artigo 1º, § 2º, da Lei n.º 6.321/1976.

 

Por seu turno, tem-se que o poder regulamentar é uma das formas de manifestação da função normativa do Poder Executivo, que no exercício dessa atribuição pode editar atos normativos que visem explicitar a lei, para sua fiel execução. No ordenamento jurídico brasileiro (artigo 84, IV, da CF), nos limites do princípio da legalidade, o ato regulamentar se limita a estabelecer normas sobre a forma como a lei será cumprida pela Administração, de sorte que não pode estabelecer normas contra legem ou ultra legem, nem pode inovar na ordem jurídica, criando direitos, obrigações, proibições, medidas punitivas (PIETRO, Maria Sylvia Zanella di. Direito Administrativo. 36. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2024, p. 132-133).

 

Estabelecidos os contornos legislativos das deduções referentes ao Programa de Alimentação do Trabalhador, não é possível a admissão de normas infralegais com previsões restritivas nesse aspecto, isto é, que ultrapassem a sua função regulamentar (art. 99 do CTN), o que se verifica com definições de custos máximos das refeições individuais dos trabalhadores para fins de cálculo da dedução do PAT ou mesmo com alterações da base de cálculo da referida dedução para fazê-la incidir no IRPJ resultante. O mesmo raciocínio é partilhado pela jurisprudência:

 

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. TUTELA PROVISÓRIA. PROGRAMA DE ALIMENTAÇÃO DO TRABALHADOR – PAT. DEDUÇÃO DO LUCRO TRIBUTÁVEL. DECRETO º 10.854/2021. ALTERAÇÃO DA BASE DE CÁLCULO. PROBABILIDADE DO DIREITO. PERIGO NA DEMORA.

1.Embora fosse sempre desejável uma tutela exauriente e definitiva contemporânea à exordial, a realidade é que a instrução processual, a formação do convencimento e o exercício do contraditório demandam tempo. Quando esse tempo é incompatível com o caso concreto, tutelas de cognição sumária, posto que sofrem limitações quanto à profundidade, são necessárias.

2.No caso das tutelas provisórias de urgência, requerem-se, para sua concessão, elementos que evidenciem a probabilidade do direito, perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo e a ausência de perigo de irreversibilidade da decisão.

3.O Programa de Alimentação do Trabalhador - PAT, benefício fiscal previsto pela Lei nº 6.321/76, deve ser deduzido do lucro tributável, conforme disposto em seu artigo 1º.

4.O Decreto nº 10.854/2021, assim como os Decretos nos 78.676/76, 05/91, 3.000/99 e 9.580/2018, extrapolou sua função regulamentar, sem respaldo legal, ao impor limites à aplicação do benefício, desrespeitando, assim, os princípios da estrita legalidade e da hierarquia das leis.

5.Agravo de instrumento improvido.

(TRF 3ª Região, 3ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5001773-04.2022.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal NERY DA COSTA JUNIOR, julgado em 15/07/2022, Intimação via sistema DATA: 22/07/2022)”

 

Desta sorte, extrapolam seu poder regulamentar as disposições dos Decretos nºs 78.676/76, 05/1991, 3.000/1999, 9.580/2018 e Instrução Normativa SRF nº 267/2002, ao estabelecerem que a dedução seria feita sobre o imposto de renda devido e fixarem limites máximos de custo unitário de cada refeição:

 

Decreto nº 78.676/76:

“Art. 1° A utilização do incentivo fiscal previsto na Lei nº 6.321, de 14 de abril de 1976, para alimentação do trabalhador far-se-á diretamente, através de dedução do Imposto sobre a Renda devido pelas pessoas jurídicas, em valor equivalente à aplicação da alíquota cabível sobre a soma das despesas de custeio realizadas na execução de programas previamente aprovados pelo Ministério do Trabalho, atendendo os limites e condições previstos neste Decreto.” (g.n.)

 

Decreto nº 05/91:

“Art. 1° A pessoa jurídica poderá deduzir, do Imposto de Renda devido, valor equivalente à aplicação da alíquota cabível do Imposto de Renda sobre a soma das despesas de custeio realizadas, no período-base, em Programas de Alimentação do Trabalhador, previamente aprovados pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social - MTPS, nos termos deste regulamento.” (g.n.)

 

Decreto nº 3.000/99:

“Art. 581. A pessoa jurídica poderá deduzir, do imposto devido, valor equivalente à aplicação da alíquota do imposto sobre a soma das despesas de custeio realizadas, no período de apuração, em programas de alimentação do trabalhador, nos termos desta Seção (Lei nº 6.321, de 14 de abril de 1976, art. 1º).

Parágrafo único. As despesas de custeio admitidas na base de cálculo do incentivo são aquelas que vierem a constituir o custo direto e exclusivo do serviço de alimentação, podendo ser considerados, além da matéria-prima, mão-de-obra, encargos decorrentes de salários, asseio e os gastos de energia diretamente relacionados ao preparo e à distribuição das refeições.”

“Art. 582. A dedução está limitada a quatro por cento do imposto devido em cada período de apuração, podendo o eventual excesso ser transferido para dedução nos dois anos-calendário subseqüentes (Lei nº 6.321, de 1976, art. 1º, §§ 1º e 2º, e Lei nº 9.532, de 1997, art. 5º).

Parágrafo único. O total da dedução deste artigo e a referida no inciso I do art. 504, não poderá exceder a quatro por cento do imposto devido (Lei nº 9.532, de 1997, art. 6º, inciso I).” (g.n.)

 

 

Decreto nº 9.580/2018:

“Art. 641. A pessoa jurídica poderá deduzir do imposto sobre a renda devido o valor equivalente à aplicação da alíquota do imposto sobre a soma das despesas de custeio realizadas no período de apuração, no PAT, instituído pela Lei nº 6.321, de 14 de abril de 1976 , nos termos estabelecidos nesta Seção (Lei nº 6.321, de 1976, art. 1º) .

Parágrafo único. As despesas de custeio admitidas na base de cálculo do incentivo são aquelas que vierem a constituir o custo direto e exclusivo do serviço de alimentação, e poderão ser considerados, além da matéria-prima, da mão de obra, dos encargos decorrentes de salários, do asseio e dos gastos de energia diretamente relacionados ao preparo e à distribuição das refeições.

Art. 642. A dedução de que trata o art. 641 fica limitada a quatro por cento do imposto sobre a renda devido em cada período de apuração e o excesso poderá ser transferido para dedução nos dois anos-calendário subsequentes (Lei nº 6.321, de 1976, art. 1º, § 1º e § 2º ; e Lei nº 9.532, de 1997, art. 5º ).” (g.n.)

 

Instrução Normativa SRF nº 267/2002:

“Art. 2º A pessoa jurídica poderá deduzir do imposto devido o valor equivalente à aplicação da alíquota do imposto sobre a soma das despesas de custeio realizadas no período de apuração em programas de alimentação do trabalhador (PAT) nos termos desta Seção, sem prejuízo da dedutibilidade das despesas, custos ou encargos.

§ 1º As despesas de custeio admitidas no cálculo do incentivo são aquelas que vierem a constituir o custo direto e exclusivo do serviço de alimentação, podendo ser considerados, além da matéria-prima, mão-de-obra, encargos decorrentes de salários, asseio e os gastos de energia diretamente relacionados com o preparo e a distribuição das refeições, deduzidos os valores correspondentes à participação do trabalhador a que se refere o § 2º do art. 6º.

§ 2º O benefício fica limitado ao valor da aplicação da alíquota do imposto sobre o resultado da multiplicação do número de refeições fornecidas no período de apuração pelo valor de R$ 1,99 (um real e noventa e nove centavos), correspondente a oitenta por cento do custo máximo da refeição de R$ 2,49 (dois reais e quarenta e nove centavos).

Art. 3º A dedução está limitada a quatro por cento do imposto devido em cada período de apuração, observado o limite global previsto no art. 54.

Parágrafo único. A parcela excedente ao limite referido neste artigo poderá ser deduzida do imposto devido em períodos de apuração subseqüentes, observado o prazo máximo de dois anos-calendário subseqüentes àquele em que ocorreram os gastos.” (g.n.)

 

Por fim, reitere-se que o benefício de dedução em dobro das despesas referentes ao Programa de Alimentação ao Trabalhador do lucro tributável é direcionado, por força de lei, apenas ao IRPJ e ao seu adicional, ambos de mesma natureza, não se estendendo à Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL, inclusive em razão da interpretação restritiva conferida ao art. 1º da Lei nº 6.321/76, o qual concede o benefício fiscal tão somente ao IRPJ. Confira-se:

 

“TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. PROGRAMA DE ALIMENTAÇÃO AO TRABALHADOR (PAT). LEI 6.321/1976. BENEFÍCIO FISCAL. AFASTAMENTO DA RESTRIÇÃO TRAZIDA PELO DECRETO 10.854/2021. BENEFÍCIO FISCAL QUE NÃO ABRANGE A APURAÇÃO DA CSLL.[...] 7. O incentivo fiscal em apreço concerne a uma dedução extra que se refere apenas à apuração do IRPJ. Ante a especificidade do benefício, não se mostra cabível uma interpretação ampliativa para incluir a possibilidade de dedução também com relação à apuração da CSLL, pois se trata de tributo diverso, objeto de regramento próprio. Precedente do TRF4. [...]” (TRF3, 3ª Turma, ApelRemNec 5036852-14.2021.4.03.6100, relatora Desembargadora Federal Consuelo Yoshida, j. 03.10.2023)

 

Reconheço o direito do contribuinte à apuração do IRPJ na forma das Leis n.ºs 6.321/1976 e 9.532/1997, sem as restrições impugnadas constantes de atos infralegais.

 

Observado o prazo quinquenal de prescrição disposto no artigo 168, I, do CTN, contado da data do ajuizamento desta ação, reconheço o direito à compensação dos valores recolhidos indevidamente.  

 

Quanto ao ponto, o reconhecimento do direito à compensação não é de cunho de meramente declaratório, mas, sim, condenatório, uma vez que obriga a União a suportar a compensação daquilo cuja conclusão, em regra, implicaria execução nos próprios autos. 

 

Na forma dos artigos 39, § 4º, da Lei n.º 9.250/95 e 3º da Emenda Constitucional n.º 113/2021, bem como das teses fixadas nos Temas n.º 810/TSF e 905/STJ, os créditos serão atualizados pela taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia – Selic (composta de taxa de juros moratórios e correção monetária), calculada a partir do recolhimento indevido (Súmula STJ n.º 162) até o mês anterior ao da repetição, vedada sua cumulação com quaisquer outros índices.  

 

Após o trânsito em julgado (artigo 170-A do CTN), poderá ser requerida a compensação do indébito administrativamente junto à Secretaria da Receita Federal do Brasil, observando-se o disposto nos artigo 74 da Lei n.° 9.430/96 e artigo 26-A da Lei n.º 11.457/2007, vigentes na data da propositura da ação, ressalvando-se o direito de proceder à compensação em conformidade com normas posteriores, desde que atendidos os requisitos próprios, nos termos da tese firmada pelo c. STJ no julgamento do Tema Repetitivo n.º 265 (REsp n.º 1.137.738/SP).  

 

Ressalta-se que compete à Secretaria da Receita Federal do Brasil disciplinar os procedimentos necessários para o requerimento administrativo da compensação (artigo 74, § 14, da Lei n.° 9.430/96 e artigo 26-A, § 2º, da Lei n.º 11.457/2007). 

 

No exercício de seu direito à compensação, resta assegurado à parte impetrante a realização dos procedimentos contábeis e fiscais cabíveis para ajustamento do resultado tributável nos respectivos anos-calendário.

 

Na hipótese de apuração de prejuízo fiscal (PF), assegura-se a adoção da técnica fiscal de compensação gradual de prejuízos, prevista nos artigos 42 e 58 da Lei n.º 8.981/1995 e 15 e 16 da Lei n.º 9.065/1995, observada a limitação legal de 30% (trinta por cento), conforme assentando no Tema de Repercussão Geral n.º 117/STF.

 

No aproveitamento de PF, ante o disposto nos artigos 4º, parágrafo único, e 6º da Lei n.º 9.249/1995, resta vedada a incidência de qualquer atualização monetária, haja vista entendimento de se trata de favor, benefício, fiscal (confira-se: STJ, REsp 2080216, relator Ministro Herman Benjamin, decisão monocrática, DJe 30.06.2023).

 

No que tange à restituição, em espécie, do indébito, tem-se que, na via administrativa, encontra-se expressamente assegurada e regulamentada nos artigos 165 do CTN, 66, § 2º, da Lei n.º 8.383/91 e 73 da Lei 9.430/96:

 

CTN: “Art. 165. O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento, ressalvado o disposto no § 4º do artigo 162, nos seguintes casos:

I - cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maior que o devido em face da legislação tributária aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido; [...]” (g.n..)

 

Lei n.º 8.383/91: “Art. 66. Nos casos de pagamento indevido ou a maior de tributos, contribuições federais, inclusive previdenciárias, e receitas patrimoniais, mesmo quando resultante de reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória, o contribuinte poderá efetuar a compensação desse valor no recolhimento de importância correspondente a período subseqüente. [...]

§ 2º É facultado ao contribuinte optar pelo pedido de restituição. [...]” (g.n.)

 

Lei n.º 9.430/96: “Art. 73. A restituição e o ressarcimento de tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil ou a restituição de pagamentos efetuados mediante DARF e GPS cuja receita não seja administrada pela Secretaria da Receita Federal do Brasil será efetuada depois de verificada a ausência de débitos em nome do sujeito passivo credor perante a Fazenda Nacional.”

 

Contudo, na hipótese da restituição decorrente de decisão judicial, estabeleceu-se dissenso jurisprudencial quanto à possibilidade de sua realização na via administrativa, ainda que não houvesse óbice da Administração Tributária.

 

A questão resulta do quanto disposto no artigo 100 da Constituição, que estabelece que os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim.

 

O e. Supremo Tribunal Federal, em 08.08.2015, no julgamento do Tema de Repercussão Geral n.º 831, delimitado como “obrigatoriedade de pagamento, mediante o regime de precatórios, dos valores devidos pela Fazenda Pública entre a data da impetração do mandado de segurança e a efetiva implementação da ordem concessiva”, reafirmou sua jurisprudência e firmou tese no sentido de que “o pagamento dos valores devidos pela Fazenda Pública entre a data da impetração do mandado de segurança e a efetiva implementação da ordem concessiva deve observar o regime de precatórios previsto no artigo 100 da Constituição Federal”.

 

Posteriormente, em 13.09.2019, a Corte Suprema julgou procedente a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n.º 250/DF para estabelecer a necessidade de uso de precatórios no pagamento de dívidas da Fazenda Pública, independente de o débito ser proveniente de decisão concessiva de mandado de segurança, ressalvada a exceção prevista no § 3º do art. 100 da Constituição da República (obrigações definidas em leis como de pequeno valor):

 

“ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. CONCESSÃO DE MANDADO DE SEGURANÇA. VALORES DEVIDOS. EXCLUSÃO DO REGIME DE PRECATÓRIO. LESÃO AOS PRECEITOS FUNDAMENTAIS DA ISONOMIA, DA IMPESSOALIDADE E OFENSA AO DEVIDO PROCESSO CONSTITUCIONAL. ATRIBUIÇÃO DE EFEITO VINCULANTE À ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL SOBRE A MATÉRIA. ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL JULGADA PROCEDENTE. 1. Apesar de ter sido dirimida a controvérsia judicial no julgamento do Recurso Extraordinário n. 889.173 (Relator o Ministro Luiz Fux, Plenário virtual, DJe 14.8.2015), a decisão proferida em recurso extraordinário com repercussão geral não estanca, de forma ampla e imediata, situação de lesividade a preceito fundamental resultante de decisões judiciais: utilidade da presente arguição de descumprimento de preceito fundamental. 2. Necessidade de uso de precatórios no pagamento de dívidas da Fazenda Pública, independente de o débito ser proveniente de decisão concessiva de mandado de segurança, ressalvada a exceção prevista no § 3º do art. 100 da Constituição da República (obrigações definidas em leis como de pequeno valor). Precedentes. 3. Arguição de descumprimento de preceito fundamental julgada procedente.” (STF, Pleno, ADPF 250, relatora Ministra Cármen Lúcia, j. 13.09.2019)

 

Ainda, em 10.02.2010, no julgamento pelo c. Superior Tribunal de Justiça do Tema Repetitivo n.º 228 (REsp n.ºs 1.114.404/MG e 937.890/SP), delimitado como “questiona-se se é facultado ao contribuinte que detém crédito contra a Fazenda Pública por tributo indevidamente pago optar pela restituição via precatório ou compensação, conforme previsão legal do ente tributante”, e assim analisado, fixou-se a tese no sentido de que “o contribuinte pode optar por receber, por meio de precatório ou por compensação, o indébito tributário certificado por sentença declaratória transitada em julgado”, posteriormente convertida na Súmula STJ n.º 461.

 

É importante frisar que, após o decidido pelo e. STF, a Secretaria da Receita Federal do Brasil passou a obstar a restituição, na via administrativa, de valores decorrentes de condenação judicial, conforme se verifica no Parecer PGFN/CAT n.º 2.093/2011, na Solução de Consulta COSIT n.º 239/2019, e posteriores redações das Instruções Normativas que regulam a restituição tributária na via administrativa, em relação àquela que constava do artigo 70 da revogada Instrução Normativa RFB n.º 900/2008.

 

Não obstante, a Corte Superior vinha adotando entendimento no sentido de que o contribuinte pode optar pela restituição na via administrativa, mormente em sede de mandado de segurança, conforme precedentes de suas 1ª e 2ª Turmas:

 

“PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CRÉDITOS PRESUMIDOS DE ICMS. EXCLUSÃO DA BASE DE CÁLCULO DO IRPJ/CSLL. MANDADO DE SEGURANÇA OBJETIVANDO A DECLARAÇÃO DO DIREITO À RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO NA VIA ADMINISTRATIVA. CABIMENTO. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO NO STJ. OMISSÃO E CONTRADIÇÃO. INEXISTÊNCIA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS. [...]

4. Também em relação à possibilidade de se assegurar, na via administrativa, o direito à restituição do indébito tributário reconhecido por decisão judicial em mandado de segurança, o acórdão embargado seguiu a jurisprudência firmada por ambas as turmas integrantes da Primeira Seção de que "o mandado de segurança é via adequada para declarar o direito à compensação ou restituição de tributos, sendo que, em ambos os casos, concedida a ordem, os pedidos devem ser requeridos na esfera administrativa, restando, assim, inviável a via do precatório, sob pena de conferir indevidos efeitos retroativos ao mandamus" (AgInt no REsp 1.895.331/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 24/05/2021, DJe 11/06/2021). [...]” (STJ, 1ª Turma, EDcl/REsp 1951855, relator Ministro Paulo Sérgio Domingues, j. 13.03.2023)

 

“TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO INCIDENTE SOBRE A COMERCIALIZAÇÃO DA PRODUÇÃO RURAL. MANDADO DE SEGURANÇA. ADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. POSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO OU RESTITUIÇÃO ADMINISTRATIVA DO INDÉBITO TRIBUTÁRIO. 1. Conforme consignado na decisão agravada, o acórdão recorrido encontra-se em sintonia com a jurisprudência do STJ, que se firmou no sentido de que a opção pela compensação ou restituição do indébito, na forma da Súmula 461 do STJ c/c os arts. 66, § 2º, da Lei 8.383/1991 e 74, caput, da Lei 9.4390/1996, se refere à restituição administrativa do indébito, e não à restituição por precatório ou RPV. Isso porque a pretensão manifestada na via mandamental de condenação da Fazenda Nacional à restituição de tributo indevidamente pago no passado, possibilitando o posterior recebimento desse valor pela mediante precatório, implica utilização do Mandado de Segurança como substitutivo da ação de cobrança, o que não se admite, conforme entendimento cristalizado na Súmula 269 do STF. 2. Agravo Interno não provido.” (STJ, 2ª Turma, AgInt/AREsp 1945394, relator Ministro Herman Benjamin, j. 21.02.2022)

 

Sedimentando a questão, o Tribunal Pleno do e. Supremo Tribunal Federal reconheceu repercussão geral à matéria (Tema n.º 1.262 – RE 1.420.691) e, reafirmando sua jurisprudência, firmou tese no sentido de que “não se mostra admissível a restituição administrativa do indébito reconhecido na via judicial, sendo indispensável a observância do regime constitucional de precatórios, nos termos do art. 100 da Constituição Federal”: Segue a ementa do acórdão:

 

“Recurso extraordinário. Representativo da controvérsia. Direito constitucional e tributário. Restituição administrativa do indébito reconhecido na via judicial. Inadmissibilidade. Observância do regime constitucional de precatórios (CF, art. 100). Questão constitucional. Potencial multiplicador da controvérsia. Repercussão geral reconhecida com reafirmação de jurisprudência. Decisão recorrida em dissonância com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Recurso extraordinário provido. 1. Firme a jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal no sentido de que os pagamentos devidos pela Fazenda Pública em decorrência de pronunciamentos jurisdicionais devem ser realizados por meio da expedição de precatório ou de requisição de pequeno valor, conforme o valor da condenação, consoante previsto no art. 100 da Constituição da República 2. Recurso extraordinário provido. 3. Fixada a seguinte tese: Não se mostra admissível a restituição administrativa do indébito reconhecido na via judicial, sendo indispensável a observância do regime constitucional de precatórios, nos termos do art. 100 da Constituição Federal.” (STF, Pleno, relatora Ministra Rosa Weber, j. 21.08.2023)

 

 

Em consonância com o entendimento da Corte Suprema, a quem compete assegurar o devido atendimento dos preceitos da Carta, entendo que é incabível a restituição, em espécie, na via administrativa.

 

Assim, uma vez reconhecida judicialmente a existência de valores de tributos recolhidos indevidamente ou a maior, cabe ao contribuinte optar pela sua compensação, na via administrativa, ou por sua restituição, por meio de precatório.

 

Quanto ao ponto, cabe destacar a situação peculiar do contribuinte que, por opção própria, elege a via judicial mandamental para satisfação de seus direitos.

 

Previsto na Constituição (artigo 5º, LXIX) como garantia fundamental para proteção de direito líquido e certo, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público, o mandado de segurança não se confunde – nem pode ser confundido – com ação de cobrança, sob pena de se aviltar seu caráter garantidor de direitos fundamentais especialmente protegidos pela Carta.

 

Nesse sentido, a Corte Suprema já editara os enunciados de Súmula n.ºs 269 (“O mandado de segurança não é substitutivo de ação de cobrança”) e 271 (“Concessão de mandado de segurança não produz efeitos patrimoniais em relação a período pretérito, os quais devem ser reclamados administrativamente ou pela via judicial própria”).

 

Destaca-se que a Lei n.º 12.016/2009, que disciplina o mandado de segurança, estabeleceu em seu artigo 14, § 4º, que “o pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias assegurados em sentença concessiva de mandado de segurança a servidor público da administração direta ou autárquica federal, estadual e municipal somente será efetuado relativamente às prestações que se vencerem a contar da data do ajuizamento da inicial”.

 

Nessa compreensão de executoriedade, na própria via mandamental, de valores devidos a partir da impetração, reafirmada pelo e. STF para o quanto devido pela Fazenda Pública independentemente da natureza jurídica do crédito, entendo que somente seria possível a restituição do indébito tributário, por meio de cumprimento de sentença nos próprios autos do mandado de segurança, apenas dos valores devidos a partir da impetração, até a efetiva implementação da ordem concessiva, e, quanto aos valores pretéritos à impetração reconhecidos na ordem concessiva, caberia ao contribuinte, nas vias próprias, pugnar pela restituição por meio de precatório.

 

Contudo, com ressalva deste entendimento pessoal, em respeito ao princípio da colegialidade, adoto o entendimento firmado por esta 3ª Turma no sentido de que a restituição do indébito tributário é cabível, inclusive, por meio de cumprimento de sentença nos próprios autos do mandado de segurança (confira-se: TRF3, 3T, ApCiv 5000980-25.2023.4.03.6113, relator Desembargador Federal Nery Junior, j. 22.11.2023).

 

Custas na forma da lei. Sem condenação em honorários advocatícios, conforme disposição do artigo 25 da Lei n.º 12.016/09.

 

Ante o exposto, de ofício, anulo em parte a r. sentença de 1º grau especificamente no que tange à tributação pelo IRPJ, por se tratar de sentença extra petita, dando por prejudicada a remessa necessária, assim como, prejudicada em parte a apelação da parte impetrante exclusivamente neste aspecto; na parte conhecida do apelo, referente à tributação pela CSLL, nego-lhe provimento; por fim, com supedâneo no art. 1.013, §3º, II, do Código de Processo Civil, julgo parcialmente procedente o pedido deduzido na inicial, concedendo parcialmente a segurança, a fim de assegurar à parte impetrante a apuração do IRPJ sem as restrições previstas nos Decretos nºs 78.676/76, 05/1991, 3.000/1999, 9.580/2018 e Instrução Normativa SRF nº 267/2002; para estabelecer a forma de cálculo do benefício fiscal e do imposto devido, bem como os parâmetros para o aproveitamento do prejuízo fiscal, nos termos supra definidos; condenar a União na devolução destes valores, observado o lapso prescricional quinquenal contado da data do ajuizamento desta ação, devidamente atualizados pela Selic, desde a data do recolhimento indevido até o mês anterior ao da repetição, bem como reconhecer o direito da parte impetrante à opção pela restituição, exclusivamente por meio do regime de precatórios, ou pela compensação, a ser realizada na via administrativa de acordo com os parâmetros supra definidos.

 

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. SENTENÇA EXTRA PETITA. NULIDADE PARCIAL. RESTRITA AO IRPJ CAUSA MADURA. POSSIBILIDADE DE JULGAMENTO. IRPJ. PAT. RESTRIÇÃO DO BENEFÍCIO FISCAL POR ATOS INFRACONSTITUCIONAIS. IMPOSSIBILIDADE. FORMA DE CÁLCULO. DEDUÇÃO SOBRE O LUCRO TRIBUTÁVEL. REFLEXO NO ADICIONAL DO IMPOSTO. LIMITAÇÃO AO VALOR TOTAL DEVIDO. COMPENSAÇÃO. RESTITUIÇÃO EXCLUSIVAMENTE POR MEIO DE PRECATÓRIO. AJUSTAMENTO DE RESULTADO TRIBUTÁVEL. APROVEITAMENTO DE PREJUÍZO FISCAL. EXTENSÃO DO BENEFÍCIO FISCAL À CSLL. IMPOSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA. SENTENÇA  ANULADA NA PARTE RELATIVA AO IRPJ. REMESSA NECESSÁRIA PREJUDICADA. APELAÇÃO DA PARTE IMPETRANTE PREJUDICADA QUANTO AO IRPJ E DESPROVIDA QUANTO À CSLL. CONCEDIDA PARCIALMENTE A SEGURANÇA QUANTO AO IRPJ.

1. Segundo o princípio da congruência, fixados os limites da lide pela parte autora, veda-se ao magistrado decidir além (ultra petita), aquém (citra petita) ou diversamente do pedido (extra petita), consoante artigo 492 do CPC/2015. A parte impetrante pleiteou o afastamento das (i) “(...) limitações impostas pelo art. 1º do Decreto nº 5/91, e pelos Decretos nºs 3.000/99, 78.676/76 e 9.580/18; e o afastamento da“(...) limitação imposta pela a Instrução Normativa DRF nº 267/2002 (...)”. (g.n.) Em sua decisão, o juiz a quo concedeu a segurança, reconhecendo o direito ao afastamento das “(...) limitações impostas pelo Decreto nº 10.854/2021 (...).” (g.n.) Logo, a sentença, neste aspecto, é extra petita, restando violado o princípio da congruência insculpido no art. 460 do CPC/73, atual art. 492 do CPC/2015.

2. O Programa de Alimentação do Trabalhador – PAT, instituído na Lei n.º 6.321/76, hodiernamente regulamentado no Decreto n.º 10.854/21, consiste em ação governamental voltada à promoção da melhoria da condição nutricional dos trabalhadores. Ressalta-se que referida Lei concedeu benefício fiscal na apuração do imposto sobre a renda das pessoas jurídicas devidamente inscritas no Ministério do Trabalho e Previdência.

3. Consoante dispõe o artigo 1º da Lei n.º 6.321/76, “as pessoas jurídicas poderão deduzir do lucro tributável, para fins de apuração do imposto sobre a renda, o dobro das despesas comprovadamente realizadas no período-base em programas de alimentação do trabalhador previamente aprovados pelo Ministério do Trabalho e Previdência.” No entanto, referida dedução está limitada a quatro por cento do imposto de renda devido, nos termos do que preceituam os artigos 5º e 6º da Lei nº 9.532/97.

4. Verifica-se que a legislação de regência define a sistemática de apuração do benefício fiscal de forma expressa, com distinção entre a limitação do valor referente ao benefício fiscal passível de dedução do imposto de renda devido e a forma de cálculo do montante de benefício dedutível, pela qual a dedução do dobro das despesas com alimentação é realizada sobre o lucro tributável. Precedentes.

5. No que tange ao adicional de imposto de renda, devido relativamente à “parcela do Lucro Real, presumido ou arbitrado, que exceder o valor resultante da multiplicação de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) pelo número de meses do respectivo período de apuração”, ressalta-se haver disposição legal vedando quaisquer deduções (artigo 3º, § 4º, da Lei n.º 9.249/1995: "O valor do adicional será recolhido integralmente, não sendo permitidas quaisquer deduções").

6. Quanto aos benefícios fiscais do PAT ora discutidos (artigo 1º da Lei n.º 6.321/76), a jurisprudência já se consolidou no sentido de que estes também repercutem sobre o adicional do IRPJ, justamente porque a forma de cálculo deste benefício fiscal se dá por meio da dedução do dobro das despesas com alimentação sobre o lucro tributável. Uma vez que o adicional é calculado sobre o valor do lucro tributável excedente ao limite legal, é evidente que a redução do lucro tributável, decorrente da dedução da dobra, implica em alteração do valor relativo ao adicional, situação absolutamente diversa da dedução de benefício fiscal diretamente sobre o valor do adicional, esta, sim, vedada na lei.

7. Didaticamente, para fins de ilustrar a correta apuração do imposto de renda devido com o aproveitamento do benefício fiscal relacionado ao PAT: (i) identificação do valor limite para aproveitamento do benefício fiscal: sem dedução da dobra sobre o lucro tributável, a pessoa jurídica deverá calcular o total de imposto de renda devido, incluído o adicional. Do resultado total obtido, o montante equivalente a 4% (quatro por cento) representará o limite para aproveitamento do benefício fiscal relativo ao PAT; (ii) dedução da dobra: a pessoa jurídica deverá deduzir do lucro tributável o dobro das despesas com o PAT, sobre este resultado fará incidir a alíquota do imposto de renda e aquela relativa ao adicional; (iii) valor total de imposto de renda devido: a diferença entre o resultado obtido nos itens “i” e “ii” não poderá exceder o montante do limitador de 4% (quatro por cento) apurada no item “i”, de sorte que, não havendo excesso ao limitador, o valor de imposto de renda com o benefício fiscal corresponderá àquele apurado no item “ii”; na hipótese de haver excesso, o valor total de imposto de renda devido observará o limitador e o excedente a esse limitador poderá, se o caso, ser aproveitado em exercícios financeiros subsequentes, na forma do artigo 1º, § 2º, da Lei n.º 6.321/1976.

8. O poder regulamentar é uma das formas de manifestação da função normativa do Poder Executivo, que no exercício dessa atribuição pode editar atos normativos que visem explicitar a lei, para sua fiel execução. No ordenamento jurídico brasileiro (artigo 84, IV, da CF), nos limites do princípio da legalidade, o ato regulamentar se limita a estabelecer normas sobre a forma como a lei será cumprida pela Administração, de sorte que não pode estabelecer normas contra legem ou ultra legem, nem pode inovar na ordem jurídica, criando direitos, obrigações, proibições, medidas punitivas (PIETRO, Maria Sylvia Zanella di. Direito Administrativo. 36. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2024, p. 132-133).

9. Estabelecidos os contornos legislativos das deduções referentes ao Programa de Alimentação do Trabalhador, não é possível a admissão de normas infralegais com previsões restritivas nesse aspecto, isto é, que ultrapassem a sua função regulamentar (art. 99 do CTN), o que se verifica com definições de custos máximos das refeições individuais dos trabalhadores para fins de cálculo da dedução do PAT ou mesmo com alterações da base de cálculo da referida dedução para fazê-la incidir no IRPJ resultante.

10. Extrapolam seu poder regulamentar as disposições dos Decretos nºs 78.676/76, 05/1991, 3.000/1999 e 9.580/2018 e Instrução Normativa SRF nº 267/2002, ao estabelecerem que a dedução seria feita sobre o imposto de renda devido e fixarem limites máximos de custo unitário de cada refeição.

11. Reitere-se que o benefício de dedução em dobro das despesas referentes ao Programa de Alimentação ao Trabalhador do lucro tributável é direcionado, por força de lei, apenas ao IRPJ e ao seu adicional, ambos de mesma natureza, não se estendendo à Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL, inclusive em razão da interpretação restritiva conferida ao art. 1º da Lei nº 6.321/76, o qual concede o benefício fiscal tão somente ao IRPJ.

12. Reconhecido o direito do contribuinte à apuração do IRPJ sem as restrições impugnadas constantes dos referidos atos infralegais.

13. Observado o prazo quinquenal de prescrição disposto no artigo 168, I, do CTN, contado da data do ajuizamento desta ação, reconhecido o direito à compensação dos valores recolhidos indevidamente a título de IRPJ.  

14. Quanto ao ponto, o reconhecimento do direito à compensação não é de cunho de meramente declaratório, mas, sim, condenatório, uma vez que obriga a União a suportar a compensação daquilo cuja conclusão, em regra, implicaria execução nos próprios autos. 

15. Na forma dos artigos 39, § 4º, da Lei n.º 9.250/95 e 3º da Emenda Constitucional n.º 113/2021, bem como das teses fixadas nos Temas n.º 810/TSF e 905/STJ, os créditos serão atualizados pela taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia – Selic (composta de taxa de juros moratórios e correção monetária), calculada a partir do recolhimento indevido (Súmula STJ n.º 162) até o mês anterior ao da repetição, vedada sua cumulação com quaisquer outros índices.  

16. Após o trânsito em julgado (artigo 170-A do CTN), poderá ser requerida a compensação do indébito administrativamente junto à Secretaria da Receita Federal do Brasil, observando-se o disposto nos artigo 74 da Lei n.° 9.430/96 e artigo 26-A da Lei n.º 11.457/2007, vigentes na data da propositura da ação, ressalvando-se o direito de proceder à compensação em conformidade com normas posteriores, desde que atendidos os requisitos próprios, nos termos da tese firmada pelo c. STJ no julgamento do Tema Repetitivo n.º 265 (REsp n.º 1.137.738/SP).  

17. Ressalta-se que compete à Secretaria da Receita Federal do Brasil disciplinar os procedimentos necessários para o requerimento administrativo da compensação (artigo 74, § 14, da Lei n.° 9.430/96 e artigo 26-A, § 2º, da Lei n.º 11.457/2007). 

18. No exercício de seu direito à compensação, resta assegurado à parte impetrante a realização dos procedimentos contábeis e fiscais cabíveis para ajustamento do resultado tributável nos respectivos anos-calendário.

19. Na hipótese de apuração de prejuízo fiscal (PF), assegura-se a adoção da técnica fiscal de compensação gradual de prejuízos, prevista nos artigos 42 e 58 da Lei n.º 8.981/1995 e 15 e 16 da Lei n.º 9.065/1995, observada a limitação legal de 30% (trinta por cento), conforme assentando no Tema de Repercussão Geral n.º 117/STF. No aproveitamento de PF, ante o disposto nos artigos 4º, parágrafo único, e 6º da Lei n.º 9.249/1995, resta vedada a incidência de qualquer atualização monetária, haja vista entendimento de se trata de favor, benefício, fiscal (confira-se: STJ, REsp 2080216, relator Ministro Herman Benjamin, decisão monocrática, DJe 30.06.2023).

20. O e. Supremo Tribunal Federal, em 08.08.2015, no julgamento do Tema de Repercussão Geral n.º 831, delimitado como “obrigatoriedade de pagamento, mediante o regime de precatórios, dos valores devidos pela Fazenda Pública entre a data da impetração do mandado de segurança e a efetiva implementação da ordem concessiva”, reafirmou sua jurisprudência e firmou tese no sentido de que “o pagamento dos valores devidos pela Fazenda Pública entre a data da impetração do mandado de segurança e a efetiva implementação da ordem concessiva deve observar o regime de precatórios previsto no artigo 100 da Constituição Federal”. Em 13.09.2019, a Corte Suprema julgou procedente a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n.º 250/DF para estabelecer a necessidade de uso de precatórios no pagamento de dívidas da Fazenda Pública, independente de o débito ser proveniente de decisão concessiva de mandado de segurança, ressalvada a exceção prevista no § 3º do art. 100 da Constituição da República (obrigações definidas em leis como de pequeno valor). Ainda, em 10.02.2010, no julgamento pelo c. Superior Tribunal de Justiça do Tema Repetitivo n.º 228 (REsp n.ºs 1.114.404/MG e 937.890/SP), delimitado como “questiona-se se é facultado ao contribuinte que detém crédito contra a Fazenda Pública por tributo indevidamente pago optar pela restituição via precatório ou compensação, conforme previsão legal do ente tributante”, e assim analisado, fixou-se a tese no sentido de que “o contribuinte pode optar por receber, por meio de precatório ou por compensação, o indébito tributário certificado por sentença declaratória transitada em julgado”, posteriormente convertida na Súmula STJ n.º 461.  Sedimentando a questão, o Tribunal Pleno do e. Supremo Tribunal Federal reconheceu repercussão geral à matéria (Tema n.º 1.262 – RE 1.420.691) e, reafirmando sua jurisprudência, firmou tese no sentido de que “não se mostra admissível a restituição administrativa do indébito reconhecido na via judicial, sendo indispensável a observância do regime constitucional de precatórios, nos termos do art. 100 da Constituição Federal

21. Em consonância com o entendimento da Corte Suprema, a quem compete assegurar o devido atendimento dos preceitos da Carta, entende-se ser incabível a restituição, em espécie, na via administrativa. Assim, uma vez reconhecida judicialmente a existência de valores de tributos recolhidos indevidamente ou a maior, cabe ao contribuinte optar pela sua compensação, na via administrativa, ou por sua restituição, por meio de precatório. 

22. Adota-se o entendimento firmado por esta 3ª Turma no sentido de que a restituição do indébito tributário é cabível, inclusive, por meio de cumprimento de sentença nos próprios autos do mandado de segurança.

23. Custas na forma da lei. Sem condenação em honorários advocatícios, conforme disposição do artigo 25 da Lei n.º 12.016/09.

24. Sentença anulada em parte, especificamente no que tange à tributação pelo IRPJ. Prejudicada a remessa necessária. Prejudicada a apelação da parte impetrante na parte referente ao IRPJ e, na parte conhecida relativa à CSLL, negado provimento ao apelo. Concedida parcialmente a segurança quanto ao IRPJ.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, A Turma, por unanimidade, de ofício, anulou em parte a r. sentença de 1º grau especificamente no que tange à tributação pelo IRPJ, por se tratar de sentença extra petita, dando por prejudicada a remessa necessária, assim como, prejudicada em parte a apelação da parte impetrante exclusivamente neste aspecto; na parte conhecida do apelo, referente à tributação pela CSLL, negou-lhe provimento; por fim, com supedâneo no art. 1.013, §3º, II, do Código de Processo Civil, julgou parcialmente procedente o pedido deduzido na inicial, concedendo parcialmente a segurança, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.