
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0006859-40.2014.4.03.6105
RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE
APELANTE: LUIZ KIMIAKI WADA
Advogados do(a) APELANTE: GUSTAVO FRONER MINATEL - SP210198-A, JULIANA CAMARGO AMARO FAVARO - SP258184-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0006859-40.2014.4.03.6105 RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE APELANTE: LUIZ KIMIAKI WADA Advogado do(a) APELANTE: GUSTAVO FRONER MINATEL - SP210198-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: [ialima] R E L A T Ó R I O Apelação interposta por Luiz Kimiaki Wada contra sentença que, julgou improcedente o pedido de anulação dos débitos objeto do Processo Administrativo n. º 10830.600365/2015-87, referente à glosa de imposto de renda pessoa física – IRPF incidente deduções declaradas como pagamentos de pensão alimentícia (Id 92567362, p. 91/94). Opostos embargos de declaração (Id 92567362, p. 101/104), não foram conhecidos (Id 92567362, p. 105/106). Aduz (Id 92567362, p. 108/128) que: a) a possibilidade de dedução da base de cálculo do IRPF de valores pagos a título de pensão alimentícia está prevista no artigo 8°, inciso II, alínea “f", da Lei n° 9.250/95; b) o legislador assegurou aos contribuintes, que realizam despesas a título de pensão alimentícia fixada judicialmente, o direito de deduzir os valores pagos da base de cálculo do imposto de renda desde que o referido dever decorra de decisão judicial, de acordo homologado judicialmente ou de escritura pública; c) a norma tributária não exige como condição para o gozo da dedução a comprovação da dependência econômica, até porque essa condição será analisada pelo juízo competente (Vara de Família e Sucessões), não cabendo à administração ou ao juízo federal questionar os alimentos fixados judicialmente, sob pena de usurpação de competência; d) não se pode afirmar legitimamente que os pagamentos efetuados são mera liberalidade, mas cumprimento de sentença judicial de mérito que, uma vez proferida, o obriga a suportar a despesa fixa e mensal que reduz seu patrimônio; e) os efeitos da sentença que homologou o acordo firmado entre as partes impõem o dever de recolher mensalmente alimentos, sob pena de cumprimento coercitivo; f) a dedução de valores pagos aos filhos a título de pensão alimentícia (artigo 77 do Decreto n. º 3.000/1999) não se confunde com a condição de dependente, regulada pelo artigo 78; g) o legislador trata a dedução de dependente e de pensão alimentícia como institutos autônomos, traçando para cada espécie requisitos próprios que deverão ser observados pelo contribuinte para no cálculo do IRPF. Em contrarrazões (Id 92567362, p. 131/134), a União requer o desprovimento do recurso. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0006859-40.2014.4.03.6105 RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE APELANTE: LUIZ KIMIAKI WADA Advogado do(a) APELANTE: GUSTAVO FRONER MINATEL - SP210198-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O I - Dos fatos Ação proposta por Luiz Kimiaki Wada contra a União, com vista de anulação dos débitos objeto do Processo Administrativo n. º 10830.600365/2015-87, referente à glosa de imposto de renda pessoa física – IRPF incidente deduções declaradas como pagamentos de pensão alimentícia. II – Da aplicação da lei processual Inicialmente, ressalta-se que a sentença recorrida foi proferida em 13.10.2014 (Id 92567362, p. 91/94), razão pela qual, aplicada a regra do tempus regit actum, segundo a qual os atos jurídicos se regem pela lei vigente à época em que ocorreram, o recurso será analisado à luz do Diploma Processual Civil de 1973 (Enunciados Administrativos n. º 01 e 03/2016, do STJ). III – Do imposto de renda Cinge-se a questão à legalidade da glosa de valores deduzidos do imposto de renda pessoa física à título de pensão alimentícia. Sobre o tema, dispõem os artigo 4° e 8º, da Lei nº 9.250/95, verbis: Art. 4 °. Na determinação da base de cálculo sujeita à incidência mensal do imposto de renda poderão ser deduzidas: (...) II - as importâncias pagas a título de pensão alimentícia em face das normas do Direito de Família, quando em cumprimento de decisão judicial, inclusive a prestação de alimentos provisionais, de acordo homologado judicialmente, ou de escritura pública a que se refere o art. 1.124-A da Lei n° 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil. Art. 8º A base de cálculo do imposto devido no ano-calendário será a diferença entre as somas: (...) II - das deduções relativas: (...) f) às importâncias pagas a título de pensão alimentícia em face das normas do Direito de Família, quando em cumprimento de decisão judicial, inclusive a prestação de alimentos provisionais, de acordo homologado judicialmente, ou de escritura pública a que se refere o art. 1.124-A da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil; [destaquei] A pensão alimentícia, também denominada alimentos, conforme ensina Maria Helena Diniz[1], citando o civilista Orlando Gomes, são as prestações para satisfação das necessidades vitais de quem não pode provê-las por si. Compreende o que é imprescindível à vida da pessoa como alimentação, vestuário, habitação, tratamento médico, transporte, diversões, e, se a pessoa alimentada for menor de idade, ainda verbas para sua instrução e educação (CC, art. 1.701, in fine). De acordo a Lei n. º 9.250/95, podem ser deduzidos da base de cálculo do IRPF os valores pagos a título de pensão alimentícia, desde que decorrentes de decisão judicial, de acordo homologado judicialmente ou de escritura pública. É a dedução, no âmbito do imposto de renda, o abatimento da base de cálculo do tributo por meio da inclusão de despesas legalmente determinadas, entre as quais a pensão alimentícia, que tem como fundamento a preservação da dignidade da pessoa humana (artigo 3º da Constituição) e o da solidariedade social e familiar, em razão do vínculo de parentesco, conjugal ou convivencial. No caso, os valores objeto de glosa pela fiscalização referem-se ao acordo objeto dos autos n. º 114.01.2005.040415, homologado pelo Juízo da 2ª Vara de Família e Sucessões da Comarca de Campinas/SP (Id 92568040, p. 69), no qual restou estabelecido o pagamento de ajuda mensal a Carolina da Silveira Wada, Cláudia da Silveira Wada e Lucas da Silveira Wada, filhos do recorrente. Observa-se, contudo, que beneficiários já alcançaram a maioridade civil, têm formação superior completa e já estão no exercício da atividade profissional (Id 92568040, p. 184/194), situação que descaracteriza a dependência econômica presumida (artigo 35, §1º, da Lei n. º 9.250/95) e a natureza assistencial da verba, de modo que a origem judicial (decorrente de ato de jurisdição voluntária, sem análise do mérito pelo juízo) não é suficiente para fruir do benefício previsto no 4º, inciso II, da Lei n.º 9.250/1996. Ressalte-se que não há impedimento que obste a prestação pecuniária ofertada pelo recorrente aos filhos. No entanto, a obrigação estabelecida com fundamento no Direito de Família não mais se configura como desoneração no âmbito tributário após o término da presunção legal de dependência econômica e, nos termos do artigo 111 do CTN, assume as feições do instituto da doação, sobre o qual incide o tributo. Nesse sentido: TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. PENSÃO ALIMENTÍCIA. HOMOLOGAÇÃO JUDICIAL. FILHO MAIOR DE 24 ANOS DE IDADE. EXERCÍCIO PROFISSIONAL. DESCARACTERIZAÇÃO DA DEPENDÊNCIA. INDEDUTIBILIDADE DO IRPF. BENEFÍCIO FISCAL. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA E RESTRITIVA. INDEPENDÊNCIA DO DIREITO DE FAMÍLIA DA DEFINIÇÃO DOS EFEITOS TRIBUTÁRIOS. CESSAÇÃO LEGAL DO DEVER DE SUSTENTO. REPERCUSSÃO AUTOMÁTICA NA EFICÁCIA TRIBUTÁRIA DESONERATIVA. OPÇÃO PELO NÃO EXERCÍCIO DA AÇÃO JUDICIAL DE EXONERAÇÃO DA PENSÃO. LIBERALIDADE DO DEVEDOR. PERSISTÊNCIA DO PAGAMENTO POR ATO DE VONTADE DO ALIMENTANTE. VOLUNTARIEDADE ÀS CUSTAS DA ARRECADAÇÃO FISCAL. IMPOSSIBILIDADE. EXTINÇÃO DO BENEFÍCIO COM O ADVENTO DA MAIORIDADE. ACÓRDÃO RECORRIDO MANTIDO. 1. O recorrente se insurge contra Acórdão que recusou direito à dedução da base de cálculo do IRPF de pensão alimentícia paga a filhos maiores de 24 anos, plenamente capazes e no exercício das respectivas profissões. A pensão foi fixada judicialmente em 1990, quando os filhos eram menores. Entendeu o Tribunal de origem que o aporte financeiro concedido a filhos posteriormente à maioridade caracteriza-se como doação, incidindo, portanto, imposto de renda. (...) 7. Por fim, em relação ao mérito propriamente dito da invocada afronta ao art. 4º, II, da Lei 9.250/1996, melhor sorte não resta ao recurso. O referido dispositivo deve ser interpretado no contexto normativo em que inserido, à luz do inciso III e do art. 8º, II, "b", "c", "f" §3º e 35, III, §1º, todos do mesmo diploma legal, os quais estão a vincular de forma direta ou indireta a dependência econômica à dedução permitida da base de cálculo do IR. A ratio legis da dedução fiscal é o dever de sustento que onera os rendimentos percebidos pelo contribuinte em razão da lei ou de sentença judicial. Cessado o dever de sustento, cessa o benefício fiscal, independentemente de ação judicial de exoneração que tem os seus efeitos restritos ao Direito de Família. 8. Uma vez descaracterizada legalmente a dependência presumida, e ilidida a natureza assistencial da verba dedutível, não basta invocar a origem judicial da pensão regularmente adimplida para ter direito ao benefício fiscal do art. 4º, II, da Lei 9.250/1996. A pensão dedutível do art. 4º, II, da Lei 9.250/1996 somente alcança os filhos dependentes que se enquadrem na condição prevista no art. 35, III e §1º da Lei do Imposto de Renda. Fora dessas hipóteses, nada obsta que o contribuinte continue a pagar pensão para os filhos enquanto não desonerado judicialmente dessa obrigação familiar. Só não pode fazê-lo às custas de subsídio estatal e em detrimento da base de incidência do IRPF que estaria indefinidamente reduzida ao exclusivo talante e liberalidade do pagador da pensão, que já preenche as condições legais para exoneração do encargo. 9. O regime civil ou familiar da pensão alimentícia estabelecida judicialmente não se confunde com os respectivos efeitos tributários da verba destinada a esse desiderato. O art. 111 do CTN recomenda interpretação restritiva à legislação tributária que disponha sobre benefício fiscal. Precedentes do STJ. O pagamento de pensão nas circunstâncias dos autos equipara-se, para fins fiscais, a doação, e nessa condição se sujeita à incidência do IRPF. 10. Considerando o contexto normativo da previsão de dedução fiscal da pensão alimentícia fixada judicialmente e paga a filho após os 24 anos de idade, e a necessidade de se empreender interpretação sistemática e restritiva das hipóteses de benefício fiscal previstas na legislação tributária, nada há a reparar no Acórdão recorrido, que corretamente aplicou o direito federal ao caso concreto. 11. Recurso Especial conhecido em parte, e nessa parte não provido. (STJ, REsp n. 1.665.481/PR, Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, j. 19.09.2017, destaquei). TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. PENSÃO ALIMENTICIA. ACORDO HOMOLOGADO JUDICIALMENTE. FILHOS MAIORES DE 24 ANOS. DEDUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. MULTA. CABIMENTO. RECURSO NÃO PROVIDO. - Cinge-se a controvérsia acerca da legalidade da dedução da base de cálculo do imposto de renda dos valores relativos à pensão alimentícia pagos aos filhos maiores. - A Lei 9.250/1995 (arts. 4º, 8º) possibilita a dedução do Imposto de Renda da importância paga a título de pensão alimentícia, desde que em cumprimento a decisão judicial ou a acordo homologado judicialmente. - O art. 10, inciso II da Lei nº 8.383/91 aduz que na determinação da base de cálculo sujeita à incidência mensal do imposto de renda poderão ser deduzidas as importâncias pagas em dinheiro a título de alimentos ou pensões, em cumprimento de acordo ou decisão judicial, inclusive a prestação de alimentos provisionais. - A interpretação da legislação relativa ao imposto de renda deve ser homogênea, harmonizada a todo Sistema Tributário Nacional, o que pressupõe que a pensão alimentícia é dedutível da base de cálculo do imposto de renda, desde que devidamente comprovada. - O C. Superior Tribunal de Justiça tem se posicionado no sentido de que a dedução de pensão alimentícia paga por força de decisão judicial deve restringir-se às hipóteses de dependência estipuladas no artigo 35, da Lei 9.250/1995, de modo que a concessão de alimentos fora das hipóteses legais, praticada por mera liberalidade, não produz efeitos na esfera tributária, no sentido de autorizar dedução de tais valores da base de cálculo do imposto de renda, por força da exigência de interpretação literal e restritiva da legislação tributária prevista no artigo 111 do CTN. - A despeito da existência de homologação judicial do ato de vontade de prestar alimentos, os filhos do autor eram todos maiores no momento da autuação (28, 34 e 39 anos), e não há nos autos qualquer comprovação, que demonstre a dependência legal ou qualquer outro fato ensejador da benesse. - A pretensão de dedução fiscal dos valores pagos a título de pensão alimentícia aos filhos maiores de 24 anos, sem comprovação de dependência, não encontra amparo por ausência de previsão legal. (...) - Apelação não provida. (TRF 3ª Região, Sexta Turma, AC 5011232-53.2019.4.03.6105, Rel. Des. Fed. Souza Ribeiro, j. 26.01.2024, destaquei). Por fim, saliente-se que as questões relativas aos artigos 1.694 do Código Civil, 77 e 78 do Decreto n. º 3000/1999, 49 e 50 da IN SRF n° 15/01, não têm condão de alterar esse entendimento pelos motivos já apontados. IV – Do dispositivo Ante o exposto, nego provimento à apelação. É como voto. [1] Curso de direito civil brasileiro: direito de família. v.5. São Paulo: Editora Saraiva, 2023. E-book. ISBN 9786553627802. Disponível em: https://app.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786553627802/. Acesso em: 14 mar. 2024.
E M E N T A
TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO. IRPF. PENSÃO ALIMENTÍCIA. FILHOS MAIORES. TÉRMINO DA PRESUNÇÃO LEGAL DE DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. NATUREZA DE DOAÇÃO. INCIDÊNCIA DO TRIBUTO. RECURSO DESPROVIDO.
- A sentença recorrida foi proferida em antes da vigência da Lei n.º 13.105/2015 (NCPC), razão pela qual, aplicada a regra do tempus regit actum, segundo a qual os atos jurídicos se regem pela lei vigente à época em que ocorreram, o recurso será analisado à luz do Diploma Processual Civil de 1973 (Enunciados Administrativo n.º 01 e 03/2016, do STJ).
- De acordo a Lei n. º 9.250/95, podem ser deduzidos da base de cálculo do IRPF os valores pagos a título de pensão alimentícia, desde que decorrentes de decisão judicial, de acordo homologado judicialmente ou de escritura pública.
- É a dedução, no âmbito do imposto de renda, o abatimento da base de cálculo do tributo por meio da inclusão de despesas legalmente determinadas, entre as quais a pensão alimentícia, que tem como fundamento a preservação da dignidade da pessoa humana (artigo 3º da Constituição) e o da solidariedade social e familiar, em razão do vínculo de parentesco, conjugal ou convivencial.
- Os beneficiários já alcançaram a maioridade civil, têm formação superior completa e já estão no exercício da atividade profissional, situação que descaracteriza a dependência econômica presumida (artigo 35, §1º, da Lei n. º 9.250/95) e a natureza assistencial da verba, de modo que a origem judicial (decorrente de ato de jurisdição voluntária, sem análise do mérito pelo juízo) não é suficiente para fruir do benefício previsto no 4º, inciso II, da Lei n.º 9.250/1996.
- Não há impedimento que obste a prestação pecuniária ofertada pelo recorrente aos filhos, no entanto, a obrigação estabelecida com fundamento no Direito de Família não mais se configura como desoneração no âmbito tributário após o término da presunção legal de dependência econômica e, nos termos do artigo 111 do CTN, assume as feições do instituto da doação, sobre o qual incide o tributo.
- Apelação desprovida.