Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5030694-40.2021.4.03.6100

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

APELANTE: PRIME AGRO COMERCIAL LTDA

Advogado do(a) APELANTE: KELLY GERBIANY MARTARELLO - PR28611-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5030694-40.2021.4.03.6100

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

APELANTE: PRIME AGRO COMERCIAL LTDA

Advogado do(a) APELANTE: KELLY GERBIANY MARTARELLO - PR28611-A

APELADO: DELEGADO DA ALFANDEGA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM SÃO PAULO, DELEGADO DA ALFÂNDEGA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM SÃO PAULO (ALF/SPO), UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

 

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

Trata-se de apelação interposta por Prime Agro Comercial  Ltda., em face da r. sentença que denegou a segurança nos autos do mandado de segurança impetrado em face do DELEGADO DA ALFÂNDEGA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM SÃO PAULO (ALF/SPO), objetivando liminar para determinar que a Impetrada se abstenha de impor à Impetrante o recolhimento do antidumping sobre o alho de NCMs 0703.20.10 e 0703.20.90, importado da China o qual tem como fornecedora a exportadora chinesa QINGDAO MUYI INTERNATIONAL TRADING CO., LTD (SALES CONTRACT n.º 20210923A), produtos do gênero alimentício descritos como Alhos Frescos, Tipo Especial, os quais serão desembaraçados Município de São Paulo/SP, especificamente no Porto Seco da MULTILOG localizado no Distrito de Mooca, até decisão final no presente processo”.

Informa que pretende importar da República Popular da China, produtos estes fornecidos pela empresa exportadora chinesa QINGDAO MUYI INTERNATIONAL TRADING CO., LTD, localizada na província de Shandong, República Popular da China, de gênero alimentício descritos como Alhos Frescos, Tipo Especial, os quais serão desembaraçados no Porto Seco da MULTILOG localizado no Distrito de Mooca/SP. E que o produto é integrante da Tarifa Externa Comum do Tratado Internacional do Mercosul, classificado pelo código internacional NCM sob o nº 0703.2010 e 07020.90.

Alega, em síntese, que, por ingerência política da ANAPA (Associação Nacional de Produtores de Alho), foram expedidas resoluções e circulares que, adotando critérios e pesquisas de conteúdo dúbio, criam barreira tarifária elevando o preço do produto no mercado interno mediante a aplicação de altos impostos e de sobretaxas, não para proteger a indústria nacional, mas para impedir a livre concorrência dessas importações no mercado brasileiro, em desfavor do consumidor final, eis que a imposição desta sobretaxa onera sobremaneira o preço do produto final no Brasil.

Sustenta que a Portaria nº 4.593/2019 foi expedida pela SECINT (Secretaria Especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais), agente incompetente para a fixação dos direitos antidumping, na medida que a competência legal para a fixação desta medida de defesa comercial é da Câmara de Comércio Exterior (CAMEX), nos termos do artigo 6º da Lei 9019/95, violando o princípio da legalidade estrita.

Após tecer considerações sobre a investigação e aplicação de medidas antidumping, alega que o valor foi apurado de forma incorreta, vez que incluiu impostos diretos a título de “valor normal”, o que não encontra amparo no art. 14, inc. II do Decreto nº 8.058/2013.

Sugere que “excluindo-se os impostos (R$ 3,54/kg na fase de embalagem; imposto proporcional ao “alho seco a embalar”) e seus efeitos sobre o lucro”, a margem absoluta de dumping deveria ser ajustada e reduzida de R$ 0,78/Kg para R$ 0,42/Kg, diferentemente do proposto pelo DECOM.

Conclui que, sendo inconstitucional e ilegal o dumping imposto sobre o alho proveniente da China, notadamente de NCMs 0703.20.10 e 0703.20.90., também está eivada de ilegalidade a cobrança do Imposto de Importação acima dos patamares estabelecidos pelo Tratado do MERCOSUL.

Alega que não podem as taxas antidumping incidir sobre toda e qualquer importação de alhos provenientes da China, notadamente do Alho Tipo Especial, que não é produzido no Brasil.

A aplicação da sobretaxa, em conjunto com o Imposto de Importação, eleva o preço do produto, em detrimento do consumidor final, ferindo, ainda, a livre concorrência.

Liminar indeferida.

A União solicitou seu ingresso no feito.

Notificada, a autoridade impetrada prestou informações, suscitando preliminar de ilegitimidade passiva.

Sobreveio informação acerca do indeferimento da tutela recursal requerida pela impetrante em sede de agravo de instrumento.

O MM. Juiz a quo,  nos termos do artigo 487, I do Código de Processo Civil, DENEGOU A SEGURANÇA. Sem condenação em honorários advocatícios, a teor do artigo 25 da Lei nº 12.016/2009. Custas processuais na forma da lei.

Em razões recursais, pleiteia o impetrante a reforma do decisum com a concessão da segurança.

Requer liminarmente a concessão da antecipação da tutela recursal, suspendendo-se liminarmente qualquer cobrança a título de antidumping sobre o alho de NCMs 0703.20.10 e 0703.20.90, importado da China tendo em vista o latente periculum in mora acarretado à Apelante, somado à presença do fumus boni iuris, para fins de afastar, até o exame definitivo deste mandamus, as ilegalidades acarretadas pelas Resolução Camex nº 47/2017 e a eficácia da Portaria SECINT  nº4.593/19, determinando que a Apelada se abstenha de impor à Apelante o recolhimento do antidumping sobre o alho de NCMs 0703.20.10 e 0703.20.90, importado da China, o qual tem como fornecedora a exportadora chinesa QINGDAO MUYI INTERNATIONAL TRADING CO; b) Ao final, seja  reformada integralmente a sentença que deixou de reconhecer o direito líquido e certo da Apelante, nos termos da fundamentação com a condenação da Apelada ao ressarcimento das custas processuais adiantadas pela Apelante.

Com contrarrazões, vieram os autos.

O ilustre Representante do Ministério Público Federal opina pelo regular prosseguimento do feito.

É o Relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 


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APELADO: DELEGADO DA ALFANDEGA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM SÃO PAULO, DELEGADO DA ALFÂNDEGA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM SÃO PAULO (ALF/SPO), UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

 

 

 

V O T O

 

Trata-se de apelação interposta por Prime Agro Comercial  Ltda., em face da r. sentença que denegou a segurança nos autos do mandado de segurança impetrado em face do DELEGADO DA ALFÂNDEGA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM SÃO PAULO (ALF/SPO), objetivando liminar para determinar que a Impetrada se abstenha de impor à Impetrante o recolhimento do antidumping sobre o alho de NCMs 0703.20.10 e 0703.20.90, importado da China o qual tem como fornecedora a exportadora chinesa QINGDAO MUYI INTERNATIONAL TRADING CO., LTD (SALES CONTRACT n.º 20210923A), produtos do gênero alimentício descritos como Alhos Frescos, Tipo Especial, os quais serão desembaraçados Município de São Paulo/SP, especificamente no Porto Seco da MULTILOG localizado no Distrito de Mooca, até decisão final no presente processo”.

Sem razão a apelante a r. sentença será mantida.

Senão vejamos.

A questão em debate cinge-se à legalidade ou não da exigência de recolhimento do valor relativo ao direito antidumping na importação de alho chinês, com base na Portaria SECINT nº 4.593, de 2 de outubro de 2019, editada com fundamento no Decreto nº 9.745/2019, através da qual foi prorrogado o direito antidumping, por um prazo de até 5 (cinco) anos, aplicado às importações brasileiras de alhos especiais frescos ou refrigerados, originárias da China.

Recorde-se que a Medida Provisória nº 870/2019, convertida na Lei nº 13.844/2019, revogou tacitamente o art. 6º da Lei nº 9.019/1995, que dizia competir à CAMEX a fixação dos direitos antidumping provisórios ou definitivos, em virtude da sua transferência para o Ministério da Economia.

Assim, o Ministério da Economia incorporou as competências relacionadas ao comércio exterior, sendo bem de ver que tais atribuições ficaram sob a incumbência da Secretaria Especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais:

“Art. 31. Constituem áreas de competência do Ministério da Economia: (...)

 VII - fiscalização e controle do comércio exterior;

 (...)

XXIII - políticas de comércio exterior;

XXIV - regulamentação e execução dos programas e das atividades relativas ao comércio exterior; XXV - aplicação dos mecanismos de defesa comercial;

 (...)

 XXVI - participação em negociações internacionais relativas ao comércio exterior;"

"Art. 32. Integram a estrutura básica do Ministério da Economia:

 (...) VI - a Secretaria Especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais...”

Além dessas competências genéricas, a Lei nº 13.844/2019 também transferiu para o Ministério da Economia a competência para a aplicação dos mecanismos de defesa comercial (dentre os quais se inserem as medidas antidumping), conforme se extrai do seu art. 31, XXV.

Por seu turno, o Dec. nº 9.679, de 02 de janeiro de 2019 – Regimento Interno do Ministério da Economia, atribuiu à Secretaria de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais do Ministério da Economia, competência para fixar direitos antidumping, compensatórios e salvaguardas.

Posteriormente, o Dec. nº 9.745, de 08 de abril de 2019, que alterou o mencionado Regimento, foi expresso ao asseverar que à Secretaria Especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais compete fixar direitos antidumping e compensatórios, provisórios ou definitivos, e salvaguardas.

Finalmente, o Dec. nº 10.044, de 04 de outubro de 2019, que revogou o inciso V do art. 82 do Dec. nº 9.745/2019, passou a dispor que integra a CAMEX o Comitê-Executivo de Gestão, ao qual compete, dentre outros atos necessários à consecução dos objetivos da política de comércio exterior, fixar direitos antidumping e compensatórios, provisórios ou definitivos, e salvaguardas.

Dessarte, no período compreendido entre 30 de janeiro de 2019 a 06 de outubro de 2019, a prorrogação do direito antidumping, nos termos do art. 82, inciso V a VII do Anexo I do Dec. nº 9.745/2019, competia à Secretaria Especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais (SECINT).

Vale dizer, no referido período, as competências em matéria de defesa comercial hoje atribuídas ao Gecex/CAMEX eram desempenhadas pela Secretaria Especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais (SECINT), de maneira que a prorrogação do direito antidumping ora em análise foi definida por ato do Secretário Especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais através da Portaria SECINT nº 4.593/2019.

A Portaria SECINT nº 4.593/2019, prorrogou o direito antidumping por um prazo de até cinco anos, aplicado às importações brasileiras de alhos frescos ou refrigerados, independentemente de quaisquer classificações, provenientes da China.

Em suma, nos primeiros meses do ano de 2019, até a entrada em vigor do Dec. nº 10.044/2019, que reestruturou a CAMEX, essa competência para fixação dos direitos antidumping foi transferida ao Secretário Especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais do Ministério da Economia, motivo pelo qual a prorrogação do direito antidumping do alho chinês, que anteriormente estava fixado na Resolução CAMEX nº. 80/2013, foi corretamente levada a efeito pela Portaria SECINT nº. 4.593/2019, sendo certo que os atos praticados, que culminaram com a edição da Portaria SECINT nº 4.593/2019, simplesmente colocaram em execução a autorização Estatal inicialmente contida na Medida Provisória nº 870/2019, convertida na Lei nº 13.844/2019, sem alteração na parte que delimitou a área de competência do Ministério da Economia, em matéria de comércio exterior.

Por essa razão, o ato normativo que rege o direito antidumping definitivo aplicado a importações brasileiras de alhos frescos ou refrigerados originários da China, desde 3 de outubro de 2019, é a Portaria SECINT nº 4.593/2019.

De outra parte, atente-se que, no exercício da sua competência constitucionalmente prevista, o Poder Executivo produz não só atos concretos de administração e gestão, mas também atos complementares à lei, aptos a introduzir modificação em relação a uma situação jurídica anterior.

Desse modo, não é demasiado afirmar que os Decretos nº 9.679 e nº 9.745, ambos de 2019, erigem-se como decretos autônomos, cuja fonte de validade e legitimidade provém diretamente da Constituição Federal, que no seu art. 84, VI, "a" dispõe que “(...) compete privativamente ao Presidente da República (...) dispor, mediante decreto (...) sobre organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos (...)”.

Via de consequência, importa reconhecer que o artigo 2º, incisos XV e XVI, do Decreto nº 4.732, de 2003, assim como o art. 2º do Decreto nº 8.058, de 2013 e o art. 6º da Lei nº 9.019, de 1995, foram tacitamente revogados pelo artigo 77, incisos VI e VII, do Decreto nº 9.679, de 2019, que possui a natureza de decreto autônomo.

Ressalte-se que os valores cobrados a título de direitos antidumping ou compensatórios, provisórios ou definitivos, não são tributos, mas, sim, receitas originárias enquadradas na categoria de entradas compensatórias, previstas no parágrafo único do art. 3º da Lei nº. 4320, de 17 de março de 1964 (art.10 da Lei n.9019/95).

Nesses termos, ao agente aduaneiro é atribuída, somente, a função de fiscalizar o recolhimento dos valores no momento do desembaraço aduaneiro (caput do art.7º, da Lei n.9019/1995).

Por tudo isso, não havendo pagamento espontâneo pelo importador, ou existindo inconformidade na declaração de importação, revela-se obrigatória a exigência, de ofício, dos direitos antidumping no momento do desembaraço aduaneiro, suspendendo o despacho aduaneiro até o pagamento da sobretaxa em questão.

A jurisprudência do c. Superior Tribunal de Justiça é pacífica quanto à legalidade e legitimidade das medidas antidumping adotadas pela Câmara de Comércio Exterior, inclusive em relação à higidez do processo administrativo, in verbis:

"MANDADO DE SEGURANÇA. COMÉRCIO EXTERIOR. DIREITO ANTIDUMPING. IMPORTAÇÃO DE ALHO FRESCO E REFRIGERADO ORIGINÁRIO DA REPÚBLICA POPULAR DA CHINA. RESOLUÇÃO CAMEX 52/2007. LEGITIMIDADE.

1. Segundo as normas previstas no Decreto 1.602/95, que disciplina a aplicação de medidas antidumping, "considera-se prática de dumping a introdução de um bem no mercado doméstico, inclusive sob as modalidades de drawback, a preço de exportação inferior ao valor normal" (art. 4º), entendido como tal "o preço efetivamente praticado para o produto similar nas operações mercantis normais, que o destinem a consumo interno no país exportador" (art. 5º). Todavia, "encontrando-se dificuldades na determinação do preço comparável no caso de importações originárias de país que não seja predominantemente de economia de mercado, onde os preços domésticos sejam em sua maioria fixados pelo Estado, o valor normal poderá ser determinado com base no preço praticado ou no valor construído do produto similar, em um terceiro país de economia de mercado, ou no preço praticado por este país na exportação para outros países (...)" (art. 7º).

2. O "Protocolo de Acessão da República Popular da China à Organização Mundial de Comércio" (integrado ao direito brasileiro pelo Decreto 5.544/2005) não conferiu a esse País, desde logo, a condição de país predominantemente de economia de mercado. Segundo decorre de seus termos, a acessão da China ao Acordo da OMC foi aprovada para ocorrer de forma gradual e mediante condições. Justamente por isso, o art. 15 do Protocolo reservou aos demais membros da OMC, durante quinze anos, a faculdade de utilizar, nos casos de investigação de prática de dumping que envolvam produtos chineses, a metodologia aplicável a países que não sejam predominantemente de economia de mercado.

3. É legítima, portanto, a Resolução CAMEX 52/2007, que, (a) com base na faculdade prevista no referido Protocolo, e (b) considerando não ter sido demonstrado, nas investigações levadas a cabo, que a produção e comercialização de alho na China ocorre em regime de economia de mercado, (c) adotou, para a apuração da prática de dumping desse produto, dados colhidos em terceiro país (a Argentina), segundo a metodologia prevista no art. 7º do Decreto 1.602/95.

4. Segurança denegada."(MS 13413/DF - Rel. Ministro ALBINO TEORI ZAVASCKI - Primeira Seção - j. 24/09/2008 - DJe 06/10/2008)

"ADMINISTRATIVO E ECONÔMICO. IMPORTAÇÃO DE ALHOS FRESCOS DA REPÚBLICA POPULAR DA CHINA. SISTEMA BRASILEIRO DE COMÉRCIO EXTERIOR E DEFESA COMERCIAL. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. APLICAÇÃO DE MEDIDA PROTETIVA: DIREITO ANTIDUMPING. LEI N. 9.019/95, CÓDIGOS ANTIDUMPING E DE SUBSÍDIOS E MEDIDAS COMPENSATÓRIAS DO GATT, DECRETOS N. 1.602/95, 1.751/95 e 1.488/95. OPORTUNIDADE DE MANIFESTAÇÃO DE IMPORTADORES, EXPORTADORES E PRODUTORES DO BEM DE CONSUMO OBJETO DA MEDIDA PROTETIVA. CIRCULAR N. 1, DE 8 DE JANEIRO DE 2001, DA SECRETARIA DE COMÉRCIO EXTERIOR DO MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO, INDÚSTRIA E COMÉRCIO - SECEX. DESNECESSIDADE DE OITIVA DE TODOS OS ATORES DO RAMO ESPECÍFICO DA ATIVIDADE ECONÔMICA EM ANÁLISE. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO EM QUE HOUVE MANIFESTAÇÃO DE PARTE REPRESENTATIVA DE SUJEITOS ECONÔMICOS DO SETOR. RESOLUÇÃO N. 41, DE 19 DE DEZEMBRO DE 2001, DA CÂMARA DE COMÉRCIO EXTERIOR - CAMEX. HIGIDEZ DO PROCEDIMENTO. RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO.

1. A pretensão consiste em afastar o recolhimento de US$ 0,48/kg (quarenta e oito cents de dólar norte-americano por quilograma), referente a direito antidumping, previsto na Resolução Camex n. 41/2001, na importação de alhos frescos da República Popular da China.

2. Alegou-se que o procedimento administrativo que culminou na medida antidumping (Resolução n. 41 da Câmara de Comércio Exterior - Camex, de 19 de dezembro de 2001) está eivado de nulidade, pois não especificou todos os importadores efetivamente notificados e integrantes do polo passivo, razão porque a empresa ora recorrente, embora também importadora de alho da China, não participou em momento nenhum da investigação instaurada e, por isso, não poderia ser submetida à medida protetiva econômica.

3. O ordenamento jurídico brasileiro conta com regras que visam a coibir condutas anticoncorrenciais internacionais e a proteger a produção e a indústria domésticas, (Lei n. 9.019/95, Códigos Antidumping e de Subsídios e Medidas Compensatórias do GATT) e procedimento administrativo específico a ser seguido no âmbito do Sistema Brasileiro de Comércio Exterior e de Defesa Comercial, especialmente por meio dos Decretos n. 1.602/95, 1.751/95 e 1.488/95, que devem ser seguidos a fim de garantir às partes o direito à ampla defesa e ao contraditório, e impingir proteção aos interesses comerciais domésticos públicos, sem olvidar os agentes particulares da atividade econômica.

4. Está-se a questionar a higidez do procedimento administrativo que culminou na aplicação de medida antidumping, concretizada na Resolução n. 41/2001 da Câmara de Comércio Exterior - Camex, especificamente, quanto ao art. 57, § 2º, do Decreto n. 1.602/95.

5. A Secretaria de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio - Secex, publicou a Circular Secex n. 1, de 8 de janeiro de 2001, em que se verificam: a realização de investigação técnico-comercial exaustiva e aprofundada a respeito do mercado, do produto e dos atores que seriam influenciados pela imposição da medida antidumping e; a oportunidade dada às partes interessadas para se manifestarem acerca da investigação.

6. No procedimento administrativo que culmina na aplicação da medida protetiva, não se exige a participação de todos os importadores, exportadores e produtores do bem de consumo objeto do direito antidumping. sob pena de inviabilizar o escopo protetivo legalmente previsto. É disposição do próprio Decreto n. 1.602/95 que, no caso em que o número de exportadores, produtores e importadores conhecidos seja de tal sorte expressivo que torne impraticável a determinação de margem individual de dumping para cada um desses atores econômicos, o exame poderá se limitar, a um número razoável de partes interessadas, por meio de amostragem estatisticamente válida com base nas informações disponíveis no momento da seleção.

7. Para que o procedimento administrativo culmine legitimamente na medida antidumping, não se exige a especificação de todos os importadores, exportadores ou produtores, mas apenas se oportunize às partes interessadas e conhecidas, a manifestação acerca da investigação.

8. In casu, tal oportunidade foi concretizada pela Secretaria de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio - Secex, pela publicação da Circular Secex n. 1, de 8 de janeiro de 2001, no Diário Oficial da União de 9 de janeiro de 2001, e efetivamente realizada pelas partes interessadas, conforme o Anexo à Resolução n. 41, de 19 de dezembro de 2001, da Câmara de Comércio Exterior - Camex , em petição protocolizada pela Associação Nacional dos Produtores de alho - ANAPA, respostas aos questionários por várias associações de produtores domésticos, outros tantos importadores e, ainda, exportadores chineses. Além do mais, foi enviado convite, para participar da audiência final, a representantes de todas as partes interessadas conhecidas, da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), da Câmara de Comércio Exterior, das Confederações Nacionais de Agricultura (CNA), do Comércio (CNC) e da Indústria (CNI), da Secretaria da Receita Federal, da Procuradoria da Fazenda Nacional, da Casa Civil e dos Ministérios da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, da Fazenda e das Relações Exteriores.

9. Portanto, o procedimento administrativo que culminou na medida antidumping relativa ao recolhimento de US$ 0,48/kg (quarenta e oito cents de dólar norte-americano por quilograma), previsto na Resolução camex n. 41/2001, na importação de alho s frescos da República Popular da China, atendeu aos ditames da Lei n. 9.019/95, dos Códigos Antidumping e de Subsídios e Medidas Compensatórias do GATT, e, especialmente, do procedimento administrativo seguido no âmbito do Sistema Brasileiro de Comércio Exterior e de Defesa Comercial, regulamentado nos Decretos n. 1.602/95, 1.751/95 e 1.488/95.

10. Recurso especial não provido."(REsp 946945/SP - Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES - Segunda Turma - j. 17.05.2011 - DJe 30/05/2011).

No mesmo sentido é o entendimento desta e. Corte, verbis:

"ADMINISTRATIVO E TRIBUTÁRIO. DIREITO ANTIDUMPING. IMPORTAÇÃO DE ALHO FRESCO OU REFRIGERADO DA REPÚBLICA POPULAR DA CHINA. RESOLUÇÃO CAMEX 41/2001. LEGALIDADE E LEGITIMIDADE. A Resolução CAMEX nº 41, de 19 de dezembro de 2001, resolveu encerrar a investigação de revisão do direito antidumping aplicado sobre as importações de alhos frescos ou refrigerados, classificados nos itens 0703.21.12 e 0703.20.90 da Nomenclatura Comum do Mercosul - NCM, originárias da República Popular da China - RPC, com a fixação da sobretaxa de US$0,48/kg. Precedentes do STJ e desta Corte. Apelação desprovida."(AC 00079259020024036100, DESEMBARGADORA FEDERAL MARLI FERREIRA, TRF3 - QUARTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:20/02/2014 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)

"PROCESSUAL. AGRAVO INOMINADO. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE DOS RECURSOS. ADMINISTRATIVO. DIREITO ANTIDUMPING. ALHO FRESCO IMPORTADO DA CHINA. RESOLUÇÃO CAMEX N. 41/2001. SOBRETAXA AO IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO. LEGITIMIDADE. DESPROVIMENTO DO AGRAVO.

1 - Inicialmente, vale ressaltar que de decisão proferida com fundamento no art. 557 do Código de Processo Civil, como no caso dos autos, é cabível o agravo legal ou inominado, e não o agravo regimental previsto no art. 250 (e seguintes) do Regimento Interno desta Corte. Contudo, tendo em vista a tempestividade na interposição do recurso, bem como o princípio da fungibilidade recursal e da celeridade processual, conheço do agravo interposto como sendo o previsto no § 1º, do artigo 557 do aludido diploma processual.

2 - No caso em discussão, o cerne da controvérsia consiste em aferir a legitimidade do ato administrativo impugnado, imposto com fulcro na Resolução n. 41, de 19 de dezembro de 2001, da Câmara de Comércio Exterior - CAMEX. Cumpre mencionar tratar-se o dumping de prática comercial de exportação por preço inferior ao vigente no mercado interno, visando a conquista de mercados e a eliminação da concorrência local. Tal prática, portanto, quando constatada, é reprimida pelos governos nacionais, por meio de medidas antidumping que tem por objetivo neutralizar os efeitos danosos à indústria nacional, causados pelas importações objeto de dumping, por meio da aplicação de alíquotas específicas, também denominadas "sobretaxas", sobre o valor aduaneiro da mercadoria. 3 - Nesse desiderato, o Acordo de Implementação do artigo VI do GATT (ou Acordo Antidumping) foi aprovado por meio do Decreto n. 1.355, de 30 de dezembro de 1994, tendo a Lei 9.019/95 disposto sobre a aplicação dos direitos antidumping e medidas compensatórias, bem como os Decretos n. 1.602/95 e 1.751/95, estabelecendo os procedimentos administrativos relativos à aplicação das medidas antidumping, assentando os métodos para a verificação de produtos importados no país, com valores inferiores aos praticados no comércio local. Por sua vez, a Lei n. 9.019, de 30 de março de 1995 (D.O.U. de 31/3/95), em seu art. 1º e parágrafo único, bem como no art. 11, dispôs sobre a aplicação dos direitos previstos no Acordo Antidumping e no Acordo de Subsídios e Direitos Compensatórios, bem como sobre a competência da CAMEX.

4 - Por seu turno, a CAMEX elaborou a Resolução n. 41, de 19 de dezembro de 2001, assim dispondo: "Art. 1º Encerrar a investigação de revisão do direito antidumping definitivo aplicado sobre as importações de alho s frescos ou refrigerados, classificados nos itens 0703.20.10 e 0703.20.90 da Nomenclatura Comum do MERCOSUL - NCM, originárias da República Popular da China - RPC, com a fixação de direito antidumping específico de US$ 0,48/kg (quarenta e oito centavos de dólar estadunidense por quilograma). Art. 2º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação e terá vigência de até cinco anos, nos termos do disposto no art. 57 do Decreto n. 1.602, de 23 de agosto de 1995." Nesse contexto, tem-se que a aplicação de medidas antidumping depende da análise de provas materiais e do exame objetivo dos efeitos dos produtos importados sobre o preço de produtos similares e, por conseguinte, da avaliação de possíveis prejuízos ao mercado interno. 5 - Por oportuno, nada obsta a comparação do preço do alho oriundo da China com o proveniente da Argentina, não cabendo ao Poder Judiciário substituir a Administração na fixação de critérios técnicos de apuração da prática do dumping, nem de adentrar na valoração do mérito administrativo, ressalvando-se a ocorrência de manifesta ilegalidade do ato administrativo, o que não restou comprovado. 6 - Por sua vez, cumpre ressaltar que o Protocolo de Acessão da República Popular da China à Organização Mundial de Comércio, integrado ao direito brasileiro pelo Decreto n. 5.544, de 22 de setembro de 2005, foi aprovado para ocorrer, não de forma imediata e integral, mais sim de forma gradual e mediante condições. A mesma norma que incluíra a China à OMC traz regras transitórias, possibilitando a adoção de medidas excepcionais, como por exemplo, o antidumping com regramento distinto, as quais foram aceitas pela própria China. No referido protocolo, ficou reservada aos demais membros da OMC a faculdade de utilizar, nos casos de investigação de prática de dumping que envolva produtos chineses, a metodologia apropriada a países de economia de mercado ou a aplicável a países que não o são. Estabeleceu, ainda, em seu inciso "d", que essa faculdade terá duração de 15 anos contados da data da acessão da China à Organização, ou seja, até 2016, conforme redação do Art. 15, do Anexo ao Decreto n. 5.544/2005, do Protocolo de Acessão da República Popular da China à Organização Mundial de Comércio. 7 - Vale salientar que os atos de controle aduaneiro têm como objetivo precípuo o interesse nacional, a teor do estabelecido no art. 237 da Constituição Federal, e se destinam a fiscalizar, restringindo ou limitando a importação ou a exportação de determinados bens, no que encontra amparo legal a autoridade administrativa para imposição de medidas cabíveis e legalmente previstas na proteção desse interesse. 8 - Portanto, no que tange ao mérito, compreendo que o agravo em exame não reúne condições de acolhimento, porquanto o r. provimento hostilizado foi prolatado em precisa aplicação das normas de regência e está adequado ao entendimento jurisprudencial predominante, mormente nesta Corte, em cognição harmônica e pertinente a que, ao meu sentir, seria atribuída por esta Colenda Turma, encontrando-se a espécie bem amoldada ao permissivo contido no art. 557, caput, do CPC. 9 - Agravo inominado não provido." (AC 00032234420074036127, DESEMBARGADOR FEDERAL NERY JUNIOR, TRF3 - TERCEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:22/11/2013 ..FONTE_REPUBLICACAO:.).

Diante do exposto, nego provimento à apelação.

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

 

 

APELAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO ANTIDUMPING. ALHO FRESCO IMPORTADO DA CHINA. PORTARIA SECINT nº 4.593/2019. SOBRETAXA AO IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO. HIGIDEZ DO PROCEDIMENTO. APELAÇÃO IMPROVIDA.

1. A questão em debate cinge-se à legalidade ou não da exigência de recolhimento do valor relativo ao direito antidumping na importação de alho chinês, com base na Portaria SECINT nº 4.593, de 2 de outubro de 2019, editada com fundamento no Decreto nº 9.745/2019, através da qual foi prorrogado o direito antidumping, por um prazo de até 5 (cinco) anos, aplicado às importações brasileiras de alhos especiais frescos ou refrigerados, originárias da China.

2. O Decreto nº 10.044, de 04/10/2019, passou a dispor que integra a CAMEX o Comitê-Executivo de Gestão, ao qual compete, dentre outros atos necessários à consecução dos objetivos da política de comércio exterior, fixar direitos antidumping e compensatórios, provisórios ou definitivos, e salvaguardas.

3. O ato normativo que rege o direito antidumping definitivo aplicado a importações brasileiras de alhos frescos ou refrigerados originários da China, desde 3 de outubro de 2019, é a Portaria SECINT nº 4.593/2019.

4. O Poder Executivo produz não só atos concretos de administração e gestão, mas também atos complementares à lei, aptos a introduzir modificação em relação a uma situação jurídica anterior.

5. Os valores cobrados a título de direitos antidumping ou compensatórios, provisórios ou definitivos, não são tributos, mas, sim, receitas originárias enquadradas na categoria de entradas compensatórias,  previstas no parágrafo único do art. 3º da Lei nº. 4320, de 17 de março de 1964 (art.10 da Lei n.9019/95).

6. Nesses termos, ao agente aduaneiro é atribuída, somente, a função de fiscalizar o recolhimento dos valores no momento do desembaraço aduaneiro (caput do art.7º, da Lei n.9019/1995).

7. Por tudo isso, não havendo pagamento espontâneo pelo importador, ou existindo inconformidade na declaração de importação, revela-se obrigatória a exigência, de ofício, dos direitos antidumping no momento do desembaraço aduaneiro, suspendendo o despacho aduaneiro até o pagamento da sobretaxa em questão.

8. Apelação improvida.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, à unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do voto do Des. Fed. MARCELO SARAIVA (Relator), com quem votaram o Juiz Fed. Conv. LEONEL FERREIRA e o Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE. Ausente, justificadamente, o Des. Fed. WILSON ZAUHY (em férias) , nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.