APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001527-35.2022.4.03.6102
RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA
APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
APELADO: SAVEGNAGO-SUPERMERCADOS LTDA
Advogados do(a) APELADO: DANILO MARQUES DE SOUZA - SP273499-A, FABIO PALLARETTI CALCINI - SP197072-A
OUTROS PARTICIPANTES:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001527-35.2022.4.03.6102 RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: SAVEGNAGO-SUPERMERCADOS LTDA Advogados do(a) APELADO: DANILO MARQUES DE SOUZA - SP273499-A, FABIO PALLARETTI CALCINI - SP197072-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de embargos de declaração (ID 285936187) opostos por Savegnago-Supermercados Ltda., em face de v. acórdão (ID 285656477) que, por unanimidade, acolho a preliminar de sentença ultra petita, reduzindo-a aos limites objetivos da demanda e, no mérito, deu parcial provimento ao apelo e a remessa oficial para afastar a possibilidade de restituição administrativa. O v. acórdão foi proferido em sede de mandado de segurança impetrado por Savegnago-Supermercados Ltda. em face do Delegado da Receita Federal do Brasil em Ribeirão Preto, objetivando obter provimento jurisdicional que reconheça o direito à apuração do IRPJ e respectivo adicional com os benefícios concedidos pela Lei n° 6.321/76, sem as restrições impostas por decretos. Requer, ainda, que seja reconhecido o direito de compensar/restituir os valores recolhidos indevidamente, atualizados pela taxa SELIC. Para melhor compreensão, transcreve-se a ementa do v. acórdão embargado: "PROCESSUAL CIVIL. PRELIMINAR SENTENÇA ULTRA PETITA ACOLHIDA. MANDADO DE SEGURANÇA. PROGRAMA DE ALIMENTAÇÃO DO TRABALHADOR PAT. DEDUÇÃO DO LUCRO TRIBUTÁVEL. IRPJ. DECRETOS Nº 05/91 e 10.854/2021. OFENSA AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. ALTERAÇÃO DA BASE DE CÁLCULO. 1. Afastada a preliminar de que a impetração se dirigiu contra lei em tese, já que no caso dos autos resta evidenciado o intuito de evitar os efeitos concretos da aplicação do Decreto n° 5/1991 e do Decreto nº 10.854.2021. 2. Rejeitada a preliminar de ausência de juntada de prova pré-constituída da existência do direito vindicado, já que a impetrante carreou aos autos documentação suficiente ao embasamento do pleito (Id n° 260222182). 3. Merece acolhimento o argumento de que a sentença foi ultra petita, considerando que não consta da inicial pedido no tocante ao deferimento de apuração da CSLL a deduzir as despesas de custeio do PAT, razão pela qual deve a sentença ser reduzida aos limites objetivos da demanda. 4. O Programa de Alimentação ao Trabalhador - PAT é o incentivo fiscal aplicável às pessoas jurídicas que tenham despesas em programas de alimentação fornecidos aos seus empregados, permitindo a dedução em dobro dos valores gastos com a alimentação de seus empregados sobre o IRPJ, consoante dispõe o art. 1º da Lei nº 6.321/1976. 5. A legislação em testilha inaugurou na ordem jurídica prevendo que a benesse fiscal em comento consistiria na possibilidade de dedução do lucro tributável, para fins de IR, pelas pessoas jurídicas, do dobro das despesas efetivamente realizadas em programas de alimentação de seus trabalhadores, com limitação de dedução ao máximo de 5% (isoladamente) e 10% (cumulativamente) do lucro mencionado, no período base, consoante artigo 1º, caput e §1º, regulamentado pelo Decreto n.º 78.676/76. Posteriormente, entrou em vigor a Lei nº 9.532/97 que, em seus artigos 5º e 6º, trouxe alterações na matéria. 6. Da leitura da instituidora do PAT, denota-se que restou estabelecida a dedução do dobro das despesas realizadas em programas de alimentação do trabalhador sobre o lucro tributável para fins de apuração do IRPJ, por sua vez o Decreto regulamentador estipulou que a dedução seria sobre o montante do tributo devido, assim, constata-se que o Decreto nº 5/91 ultrapassou os limites de sua competência e inovou na ordem jurídica. 7. O Decreto nº 10.854/21 extrapolou sua função regulamentar, violando o princípio da legalidade tributária, na medida em que estabeleceu limitações não existentes na lei que dispõe sobre o benefício fiscal, visto que o regulamento não pode incluir no sistema positivo qualquer norma que gere direitos ou obrigações novos. 8. Revejo posicionamento anterior e passo a adotar a orientação firmada pelo E. Supremo Tribunal Federal, a fim de consignar a impossibilidade da utilização da via administrativa para restituição de indébito fiscal reconhecido judicialmente, mantido o direito à compensação de acordo com os critérios apontados e a expedição de precatório/requisitório nos moldes do Tema 831 do E. STF. 9. Os valores indevidamente recolhidos deverão ser corrigidos pela taxa SELIC e poderão ser compensados entre quaisquer tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, observadas as ressalvas do art. 26-A, da Lei nº 11.457/07, o disposto no art. 74 da Lei nº 9.430/96 e demais dispositivos vigentes na data da propositura da ação, após o trânsito em julgado da decisão, nos termos do art. 170-A do CTN. 9. Acolhida preliminar de sentença ultra petita, reduzindo-a aos limites objetivos da demanda. Apelo e remessa oficial providos em parte para afastar a possibilidade de restituição administrativa." A embargante, em suas razões, alega que o mandado de segurança é via adequada tanto para declarar o direito à compensação quanto o direito à restituição do indébito. Em ambos os casos, o pronunciamento declaratório transitado em julgado na esfera judicial é passível trilhar a via administrativa para efetiva repetição do indébito, é passível de instruir ação independente de cobrança, mas jamais pode perpassar pela fila precatória, sob pena de conferir indevidos efeitos patrimoniais retroativos ao Mandado de Segurança, em evidente contrariedade com a Súmula 271 do E. STF. Alega, ainda, que o v. acórdão condiciona a compensação dos valores recolhidos indevidamente à legislação vigente à época da propositura do mandado de segurança. Entretanto, ao assim proceder, é omisso, pois não justifica a inaplicabilidade do Tema Repetitivo 345 do E. STJ (Leading case REsp 1.164.452 MG) ao caso concreto. Por fim, o v. acórdão incorre também em erro material, pois o andamento constante no PJE não reflete a realidade dos autos, pois consta o conhecimento e não provimento do recurso do advogado subscritor. Intimada, a parte embargada manifestou-se nos autos (ID 286580163). É o relatório.
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001527-35.2022.4.03.6102 RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: SAVEGNAGO-SUPERMERCADOS LTDA Advogados do(a) APELADO: DANILO MARQUES DE SOUZA - SP273499-A, FABIO PALLARETTI CALCINI - SP197072-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Como é cediço, os embargos de declaração, a teor do disposto no art. 1.022 do CPC, somente têm cabimento nos casos de obscuridade ou contradição (inc. I), de omissão (inc. II) ou de erro material (inc. III). Conforme o disposto no v. acórdão, quanto à restituição de valores, deve-se consignar que o mandado de segurança não é a via adequada para obter efeitos patrimoniais pretéritos à impetração, conforme entendimento do E. Supremo Tribunal Federal pacificado por meio das Súmulas nº 269 e nº 271, porquanto a legislação de regência não prevê fase de liquidação no âmbito mandamental, razão pela qual não cabe a restituição administrativa de indébito fiscal. Além disso, a restituição administrativa de indébito fiscal decorrente de decisão judicial possibilitaria pagamento em pecúnia ao contribuinte, em flagrante violação ao disposto no artigo 100, da Constituição Federal. Precedentes do STF (RE nº 1372080/SP, Relator Ministro Gilmar Mendes, j. em 27/04/2022, Data de Publicação: 03/05/2022 e RE nº 1367549/SP, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, j. em 24/02/2022, Data de Publicação: 02/03/2022). Todavia, no julgamento do RE nº 889.173/MS (Tema 831 do STF), a Suprema Corte determinou que os pagamentos devidos pela Fazenda Pública em razão de decisão judicial proferida em ação mandamental devem se dar mediante a expedição de precatório ou de requisição de pequeno valor, conforme o valor da condenação, nos termos do artigo 100 da Constituição Federal, apenas quanto ao montante apurado entre a data da impetração do mandado de segurança e a da efetiva implementação da ordem concessiva de segurança. A respeito: STF - ARE: 1393633/PR, Relator Min. NUNES MARQUES, Data de Julgamento: 02/03/2023, DJe-043 DIVULG 07/03/2023 PUBLIC 08/03/2023). Desse modo, revejo posicionamento anterior e passo a adotar a orientação firmada pelo E. Supremo Tribunal Federal, a fim de consignar a impossibilidade da utilização da via administrativa para restituição de indébito fiscal reconhecido judicialmente, mantido o direito à compensação de acordo com os critérios apontados e a expedição de precatório/requisitório nos moldes do Tema 831 do E. STF. Ademais, considerando a data do ajuizamento da demanda e o decidido pelo e. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.137.738/SP, sob o regime dos recursos repetitivos, no qual foi firmado o entendimento de que "em se tratando de compensação tributária, deve ser considerado o regime jurídico vigente à época do ajuizamento da demanda, não podendo ser a causa julgada à luz do direito superveniente". (destaque nosso) No mais, o direito da impetrante à compensação administrativa, regulada pelo regime normativo vigente no momento do encontro de contas, deve ser analisado pela Autoridade administrativa, desde de que atenda aos requisitos próprios. Quanto ao erro material no v. acórdão com razão a embargante. Cabe, ainda, esclarecer que a lei abre duas exceções ao princípio da irretratabilidade da decisão de mérito pelo mesmo julgador que a proferiu, conforme o disposto no art. 494, inciso I, CPC "in verbis": "Art. 494. Publicada a sentença, o juiz só poderá alterá-la: I - para corrigir-lhe, de ofício ou a requerimento da parte, inexatidões materiais ou erros de cálculo; II - por meio de embargos de declaração." Nesse passo, o inciso I refere-se a vícios que se percebem à primeira vista, sem necessidade de maior exame, tornando evidente que o texto da decisão não traduziu a vontade do prolator da sentença. Nesse sentido, a título ilustrativo, transcrevo o seguinte precedente jurisprudencial: "Ocorrendo erro material na parte dispositiva do voto condutor e da ementa do acórdão, poderá ser sanado a qualquer tempo, uma vez que remanescerá incólume o conteúdo da decisão proferida."(STJ-3ª Turma, REsp 26.790-RS, Rel. Min. Waldemar Zveiter, j. 30.11.92, receberam os embs., para esclarecer que foi integral, e não parcial, o provimento do recurso, v.u., DJU 1.2.93, p. 463. In: Código de Processo Civil e legislação processual em vigor. 30ª ed., 1999, Theotonio Negrão). Consoante decisão supracitada, na correção do erro material não há qualquer alteração de fundo no julgado, ou seja, de sua leitura se verifica qual a intenção do julgador de modo que a simples correção de uma palavra, termo, inclusive frase não vai alterar em nada o direito da parte ou trazer-lhe qualquer prejuízo ou benefício que antes já não houvera sido verificado. Sobre o erro material são várias as conclusões jurisprudenciais: "Erro material é aquele perceptível primo ictu oculi e sem maior exame, a traduzir desacordo entre a vontade do juiz e a expressa na sentença." (STJ, 2ª Turma, REsp 15.649, Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro, j. 17.11.93, DJ 6.12.93, p. 26.653). "Para que se configure o erro material não basta a simples inexatidão; impõe-se que dele resulte, inequivocadamente, efetiva contradição com o conteúdo do ato judicial." (TFR, 5ª Turma, AG 53.892, Rel. Min. Geraldo Sobral, j. 27.2.89, DJ 15.5.89, p. 7935). E, ainda: "O erro material da sentença corrigido pelo Egrégio Tribunal não implica em nulidade daquela". (STJ, 1ª Turma, REsp. 20.865-1, Rel. Min. Garcia Vieira, j. 10.6.92, DJU 3.8.92, p. 11.257). No caso, houve evidente erro material no andamento processual, pois constou a interposição de recurso pelo patrono da impetrante e não provido, no entanto, somente houve recurso de apelação pela União Federal. Deste modo, onde se lê: “CONHECIDO O RECURSO DE DANILO MARQUES DE SOUZA - CPF: 337.323.318-65 (ADVOGADO) E NÃO-PROVIDO CONHECIDO O RECURSO DE UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL - CNPJ: 00.394.460/0216-53 (APELANTE) E PROVIDO” Leia-se: “CONHECIDO O RECURSO DE UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL - CNPJ: 00.394.460/0216-53 (APELANTE) E PARCIALMENTE PROVIDO” Diante do exposto, acolho parcialmente os embargos de declaração, para sanar o erro material apontado. É o voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ERRO MATERIAL. CORREÇÃO. EMBARGOS PARCIALMENTE ACOLHIDOS.
1. Na correção do erro material não há qualquer alteração de fundo no julgado, ou seja, de sua leitura se verifica qual a intenção do julgador de modo que a simples correção de uma palavra, termo, inclusive frase não vai alterar em nada o direito da parte ou trazer-lhe qualquer prejuízo ou benefício que antes já não houvera sido verificado.
2. Tendo constado no andamento processual do v. acórdão a interposição de dois recursos, quando na verdade somente a União Federal interpôs recurso de apelação, os embargos de declaração devem ser parcialmente acolhidos para o fim de corrigir o erro material apontado.
3. Demais omissões ou contradições inexistentes.
4. Embargos parcialmente acolhidos.