Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001395-61.2020.4.03.6000

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: PAULO DE ASSUNCAO RONTON, MARTA DE JESUS PAES RONTON

Advogado do(a) APELANTE: CYNTHIA RENATA SOUTO VILELA - MS10909-A

APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, EMPRESA GESTORA DE ATIVOS - EMGEA

Advogado do(a) APELADO: SERVIO TULIO DE BARCELOS - SP295139-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001395-61.2020.4.03.6000

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: PAULO DE ASSUNCAO RONTON, MARTA DE JESUS PAES RONTON

Advogado do(a) APELANTE: CYNTHIA RENATA SOUTO VILELA - MS10909-A

APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, EMPRESA GESTORA DE ATIVOS - EMGEA

Advogado do(a) APELADO: SERVIO TULIO DE BARCELOS - SP295139-A

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R E L A T Ó R I O

 

 

 

 

O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (Relator): Cuida-se de ação ordinária ajuizada por Paulo de Assunção Ronton e Marta de Jesus Paes Ronton em face da Caixa Econômica Federal (CEF) e da Empresa Gestora de Ativos (EMGEA), objetivando a revisão de contrato de financiamento imobiliário com alienação fiduciária em garantia, com pedido de indenização por danos morais e tutela antecipada.

Indeferido o pedido de tutela antecipada. Após instrução processual, sobreveio sentença que julgou improcedente o pedido, nos termos do art. 487, I, do CPC.

A parte-autora apelou alegando, em síntese, que conforme simulação de aquisição do imóvel fora convencionado financiamento com taxa de 5,1161% ao ano, no entanto, houve alteração da taxa de forma unilateral pela CEF, que aumentou para 7,3997% ao ano, deixando evidente que foi aplicado juro diverso do contratado. Afirma, ainda, que o sistema SAC não vem sendo corretamente aplicado, uma vez que o valor das parcelas não apresenta redução. Alega que tal ocorre em razão da obrigatoriedade de contratação do seguro, que é abusiva. Reitera o pedido de condenação da CEF ao pagamento de indenização por danos morais.

Com contrarrazões, subiram os autos a este E. Tribunal.

É o breve relatório. Passo a decidir.

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001395-61.2020.4.03.6000

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: PAULO DE ASSUNCAO RONTON, MARTA DE JESUS PAES RONTON

Advogado do(a) APELANTE: CYNTHIA RENATA SOUTO VILELA - MS10909-A

APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, EMPRESA GESTORA DE ATIVOS - EMGEA

Advogado do(a) APELADO: SERVIO TULIO DE BARCELOS - SP295139-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

 

 

O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (Relator): Inicialmente, lembro que contrato é um negócio jurídico bilateral na medida em que retrata o acordo de vontades com o fim de criar, modificar ou extinguir direitos, gerando obrigações aos envolvidos; vale dizer, o contrato estabelece relação jurídica entre credor e devedor, podendo aquele exigir o cumprimento da prestação por este assumida.

Há dois vetores que norteiam as relações contratuais: o primeiro é autonomia de vontade, que confere às partes liberdade para estabelecer ou não avenças, fixando seu conteúdo desde que em harmonia com as leis e a ordem pública; o segundo é obrigatoriedade, pois uma vez firmado o acordo de vontades, as partes devem cumprir o contratado (primado “pacta sunt servanda”), garantidor da seriedade e da segurança jurídica. Qualquer alteração do contrato deverá ocorrer de forma voluntária e bilateral, salvo em casos como mudanças decorrentes de atos normativos supervenientes (cuja eficácia se viabilize sem prejuízo ao ato jurídico perfeito e ao direito adquirido) ou situações imprevistas e extraordinárias que alterem o equilíbrio do que foi pactuado.

Contratos que envolvam operações de crédito (em regra mútuos) relacionadas a imóveis residenciais têm sido delimitados por atos legislativos, notadamente em favor da proteção à moradia (descrita como direito fundamental social no art. 6º da Constituição de 1988). Nesse contexto emergem contratos firmados com cláusula de alienação fiduciária de coisa imóvel em garantia, nos termos da Lei nº 9.514/1997.

A figura da alienação fiduciária é tradicional no direito brasileiro, sendo aceita amplamente como modalidade contratual, muito embora algumas de suas características tenham sido abrandadas pela interpretação constitucional (dentre elas, a impossibilidade de prisão civil, tal como assentado pelo E. STF na Súmula Vinculante 31, em razão da interação entre o Pacto de San José da Costa Rica e o sistema jurídico brasileiro).

Conforme o art. 22 e seguintes da Lei nº 9.514/1997, o contrato de mútuo firmado com cláusula de alienação fiduciária em garantia é negócio jurídico pelo qual o devedor (fiduciante) recebe recursos financeiros do credor (fiduciário), ao mesmo tempo em que faz a transferência da propriedade resolúvel de coisa imóvel; mediante a constituição da propriedade fiduciária (que se dá por registro do contrato no Cartório de Registro de Imóveis), ocorre o desdobramento da posse, tornando-se o fiduciante possuidor direto e o fiduciário possuidor indireto da coisa imóvel. Com o pagamento da dívida e seus encargos, resolve-se a propriedade fiduciária e o fiduciante obterá a propriedade plena do imóvel, devendo o fiduciário fornecer (no prazo legal, a contar da data de liquidação da dívida) o respectivo termo de quitação ao fiduciante.

Ocorre que o contrato celebrado nos termos da Lei nº 9.514/1997 possui cláusula relativa a regime de satisfação da obrigação diversa de mútuos firmados com garantia hipotecária. Na hipótese de descumprimento contratual pelo fiduciante, haverá o vencimento antecipado da dívida e, decorrido o prazo para purgação da mora, a propriedade do imóvel será consolidada em nome da credora fiduciária, que deverá alienar o bem para satisfação de seu direito de crédito. Ou seja, vencida e não paga a dívida (no todo ou em parte) e constituído em mora o fiduciante, mantida a inadimplência, a propriedade do imóvel será consolidada em nome do fiduciário, conforme procedimento descrito na Lei nº 9.514/1997, viabilizando o leilão do bem. Se o valor pelo qual o bem é arrematado em leilão foi superior ao valor da dívida, o credor deverá dar ao devedor o excedente, mas em sendo inferior, ainda assim haverá extinção da dívida (art. 26-A, §§3º e 4º e art. 27, §4º, da Lei nº 9.514/1997).

Dificuldades financeiras não são fundamentos jurídicos para justificar o inadimplemento de obrigações livremente assumidas pelo devedor-fiduciante, porque a alteração do contrato exige voluntário e bilateral acordo de vontade. Também não há legislação viabilizando que o devedor deixe de pagar as prestações avençadas por enfrentar desafios financeiros, do mesmo modo que essa circunstância unilateral não altera o equilíbrio do que foi pactuado (já que o objeto é o mútuo com alienação fiduciária de coisa imóvel). Ademais, contratos firmados com cláusula de alienação fiduciária de bem imóvel em garantia já desfrutam de previsões especiais nos termos da Lei nº 9.514/1997, integrando políticas públicas que atendem à proteção do direito fundamental à moradia, mesmo que não integrem operações do Programa Minha Casa - Minha Vida (Lei nº 11.977/2009), com recursos advindos da integralização de cotas no Fundo de Arrendamento Residencial (FAR).

Alega a parte autora que conforme simulação de aquisição do imóvel fora convencionado financiamento com taxa de 5,1161% ao ano, no entanto, houve alteração da taxa de forma unilateral pela CEF, que aumentou para 7,3997% ao ano, deixando evidente que foi aplicado juro diverso do contratado. Afirma, ainda, que o sistema SAC não vem sendo corretamente aplicado, uma vez que o valor das parcelas não apresenta redução. Alega que tal ocorre em razão da obrigatoriedade de contratação do seguro, que é abusiva. Reitera o pedido de condenação da CEF ao pagamento de indenização por danos morais.

No caso dos autos, a parte-autora celebrou, com a CEF, contrato por instrumento particular de compra e venda de unidade isolada e mútuo com obrigações e alienação fiduciária – Programa carta de crédito individual – FGTS, em 09/12/2013, no valor de R$ 63.360,00, a serem pagos em 360 prestações, atualizadas por meio do sistema SAC, com taxa de juros nominal de 7,1600% ao ano e taxa de juros efetiva de 7,3997% ao ano (id 279106614).

É pacífica a possibilidade de utilização da Tabela Price, bem como dos sistemas SAC ou SACRE nos contratos de mútuo habitacional, visto que referidos métodos de amortização não provocam desequilíbrio econômico-financeiro, tampouco geram enriquecimento ilícito ou qualquer outra ilegalidade. Tais sistemas, que aplicam juros compostos (não necessariamente capitalizados), encontram previsão contratual e legal, sendo amplamente aceitos na jurisprudência pátria.

Anote-se que o contrato prevê a utilização do Sistema de Amortização Constante - SAC, o qual faz com que as prestações sejam gradualmente reduzidas com o passar do tempo.

Tal sistema consiste num método em que as parcelas tendem a reduzir ou, no mínimo, a se manter estáveis, o que não causa prejuízo ao mutuário, havendo, inclusive, a redução do saldo devedor com o decréscimo de juros, os quais não são capitalizados. Nesse sentido:

 

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. SFH. MÚTUO COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. REVISÃO CONTRATUAL. SISTEMA DE AMORTIZAÇÃO CONSTANTE - SAC. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS: INOCORRÊNCIA. 

1. O sistema de prévia correção do saldo devedor no procedimento de amortização é operação que se ajusta ao princípio da correção monetária do valor financiado e não fere a comutatividade das obrigações pactuadas, uma vez que o capital emprestado deve ser remunerado pelo exato prazo em que ficou à disposição do mutuário.

2. Ressalte-se que não há norma constitucional vedando a capitalização de juros, de tal sorte que poderia ser instituída pela lei ordinária. Inexiste, igualmente, dispositivo na Constituição Federal limitando ou discriminando os acréscimos em razão da mora. Assim, estipular correção monetária e juros ou qualquer outro encargo, inclusive os que guardem semelhança com os do sistema financeiro, é matéria entregue à discricionariedade legislativa.

3. O Superior Tribunal de Justiça, contudo, no julgamento representativo de controvérsia do REsp 1070297/PR, submetido à sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, pacificou entendimento segundo o qual, nos contratos celebrados no âmbito do SFH, é vedada a capitalização de juros em qualquer periodicidade.

4. Por sua vez, os contratos de mútuo habitacional encontram limites próprios, em normas específicas, tais como as Leis n. 8.100/1990 e 8.692/1993. Diversamente do que acontece genericamente nos contratos de mútuo, os mútuos inerentes ao SFH encontram previsão legal de amortização mensal da dívida (artigo 6°, "c", da Lei nº 4.380/1964).

5. Dessa disposição decorre, para as instituições operadoras dos recursos do SFH, a possibilidade de utilização da Tabela Price - bem como da SACRE e da SAC (atualmente os três sistemas mais praticados pelos bancos) - para o cálculo das parcelas a serem pagas. Por esses sistemas de amortização, as prestações são compostas de um valor referente aos juros e de outro valor, referente à própria amortização.

6. Os três sistemas importam juros compostos (mas não necessariamente capitalizados), que encontram previsão contratual e legal, sem qualquer violação à norma constitucional. Utilizando-se o sistema SAC, as prestações e os acessórios são reajustados pelo mesmo índice que corrige o saldo devedor, permitindo a quitação do contrato no prazo estipulado. Assim, quando as prestações são calculadas de acordo com o SAC, os juros serão progressivamente reduzidos, de modo que sua utilização, tomada isoladamente, não traz nenhum prejuízo ao devedor. Precedentes.

7. No caso dos autos, verifica-se que o encargo diminui com o passar do tempo, o que infirma qualquer alegação de que a ré vem descumprindo as cláusulas contratuais, ou cometendo abusos.

8. Ademais, é assente na jurisprudência que nos contratos firmados pelo Sistema de Amortização Constante - SAC não se configura o anatocismo.

9. Cumpre consignar que o pacto em análise não se amolda ao conceito de contrato de adesão, não podendo ser analisado sob o enfoque social, considerando que a entidade financeira não atua com manifestação de vontade, já que não tem autonomia para impor as regras na tomada do mútuo que viessem a lhe favorecer, devendo seguir as regras impostas pela legislação específica do Sistema Financeiro Imobiliário, criado pela Lei n. 4.380/64.

10. Não se discute a aplicação das medidas protetivas ao consumidor, previstas no Código de Defesa do Consumidor, aos contratos de mútuo habitacional vinculados ao SFH que não sejam vinculados ao FCVS e que tenham sido assinados posteriormente à entrada em vigor da Lei nº 8.078/1990, conforme já pacificado pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

11. Essa proteção, porém, não é absoluta e deve ser invocada de forma concreta, comprovando o mutuário efetivamente a existência de abusividade das cláusulas contratuais ou de excessiva onerosidade da obrigação pactuada. Assim, não tendo a parte apelante comprovado a existência de eventual abuso no contrato firmado, fica vedada a revisão do contrato mediante mera alegação genérica nesse sentido.

12. Apelação desprovida.

(TRF 3ª Região, 1ª Turma,  ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5005418-31.2017.4.03.6105, Rel. Desembargador Federal HELIO EGYDIO DE MATOS NOGUEIRA, julgado em 03/04/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 14/04/2020).

 

A parte autora juntou aos autos simulação feita no sítio eletrônico da CEF, em 10/12/2013, com taxa de juros nominal de 5,0000% ao ano e taxa de juros efetiva de 5,1161% ao ano (id 279106605).

A CEF apresentou contestação, defendendo a regularidade do que restou estipulado contratualmente; juntou aos autos a Planilha de Evolução do Financiamento (id 279106747).

Não se justifica a revisão pretendida pela parte autora, pois o contrato livremente celebrado entre as partes prevê expressamente a utilização do sistema SAC, a taxa de juros, o encargo inicial, a forma de amortização e de atualização do saldo devedor.

Ademais, consta expressamente na simulação apresentada que “os resultados obtidos representam apenas uma simulação e não valem como proposta, pois estão sujeitos a alterações de acordo com a apuração da capacidade de pagamento e à aprovação da análise de crédito a ser efetuada pela Caixa. Poderá haver alteração das taxas, dos prazos máximos e das demais condições, sem aviso prévio. A contratação está condicionada à disponibilidade de recursos para sua região e ao atendimento das exigências do programa”.

Por outro lado, observa-se da Planilha de evolução do financiamento que, ao contrário do que alega a parte autora, as prestações vêm diminuindo com o passar do tempo.

Por fim, a contratação do seguro habitacional é obrigatória para os imóveis que são objeto de financiamento no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, conforme artigos 20 e 21 do Decreto-Lei nº 70/1966.

Assim, para que a contratação do seguro seja considerada abusiva, é necessário que se comprove que as quantias cobradas a este título são consideravelmente superiores às taxas praticadas no mercado, ou caso a parte autora pretenda exercer sua faculdade de contratar o seguro junto à instituição de sua preferência, o que não ocorreu no caso. Nesse sentido, os seguintes julgados:

 

RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. TAXA REFERENCIAL (TR). LEGALIDADE. SEGURO HABITACIONAL. CONTRATAÇÃO OBRIGATÓRIA COM O AGENTE FINANCEIRO OU POR SEGURADORA POR ELE INDICADA. VENDA CASADA CONFIGURADA.

1. Para os efeitos do art. 543-C do CPC:

1.1. No âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, a partir da Lei 8.177/91, é permitida a utilização da Taxa Referencial (TR) como índice de correção monetária do saldo devedor. Ainda que o contrato tenha sido firmado antes da Lei n.º 8.177/91, também é cabível a aplicação da TR, desde que haja previsão contratual de correção monetária pela taxa básica de remuneração dos depósitos em poupança, sem nenhum outro índice específico.

1.2. É necessária a contratação do seguro habitacional, no âmbito do SFH. Contudo, não há obrigatoriedade de que o mutuário contrate o referido seguro diretamente com o agente financeiro, ou por seguradora indicada por este, exigência esta que configura "venda casada", vedada pelo art. 39, inciso I, do CDC.

2. Recurso especial parcialmente conhecido e, na extensão, provido.

(STJ, REsp 969.129/MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 09/12/2009, DJe 15/12/2009).

 

PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO - SFH. CDC. SEGURO. ANATOCISMO. APELAÇÃO IMPROVIDA.

I - O CDC se aplica às instituições financeiras (Súmula 297 do STJ), mas as cláusulas dos contratos do SFH observam legislação cogente imperando o princípio pacta sunt servanda. A teoria da imprevisão e o princípio rebus sic standibus requerem a demonstração de que não subsistem as circunstâncias fáticas que sustentavam o contrato, justificando o pedido de revisão contratual. Mesmo nos casos em que se verifica o prejuízo financeiro, a nulidade pressupõe a incidência dos termos do artigo 6º, V, artigo 51, IV e § 1º do CDC, sendo o contrato de adesão espécie de contrato reconhecida como regular pelo próprio CDC em seu artigo 54.

II - O artigo 14 da Lei nº 4.380/64 e os artigos 20 e 21 do Decreto-lei 73/66, preveem a obrigatoriedade de contratação de seguro para os imóveis que são objeto e garantia de financiamento pelas normas do SFH. A alegação de venda casada só se sustenta se as quantias cobradas a título de seguro forem consideravelmente superiores às taxas praticadas por outras seguradoras em operação similar, ou se a parte Autora pretender exercer a faculdade de contratar o seguro junto à instituição de sua preferência.

(...)

V - Apelação improvida.

(TRF 3ª Região, 1ª Turma,  ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5005838-36.2017.4.03.6105, Rel. Desembargador Federal VALDECI DOS SANTOS, julgado em 28/11/2019, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 16/12/2019).

 

Não comprovadas irregularidades no que inicialmente restou pactuado, não se mostra possível o acolhimento da pretensão da parte autora, devendo ser mantido o contrato em questão, livremente entabulado pelas partes.

Em vista do trabalho adicional desenvolvido na fase recursal e considerando o conteúdo da controvérsia, com fundamento no art. 85, §11, do CPC, a verba honorária fixada em primeiro grau de jurisdição deve ser majorada em 10%, respeitados os limites máximos previstos nesse mesmo preceito legal, e observada a publicação da decisão recorrida a partir de 18/03/2016, inclusive (E.STJ, Agravo Interno nos Embargos de Divergência 1.539.725/DF, Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, 2ª seção, DJe de 19/10/2017). Observe-se o art. 98, § 3º, do CPC, em vista de a parte ser beneficiária de gratuidade.

Pelas razões expostas, NEGO PROVIMENTO à apelação.

É o voto.

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

 

 

APELAÇÃO CÍVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BEM IMÓVEL. REVISÃO CONTRATUAL. SISTEMA SAC. TAXA DE JUROS. SEGURO HABITACIONAL. IRREGULARIDADES NÃO DEMONSTRADAS.

- Dificuldades financeiras não são motivos jurídicos para justificar o inadimplemento de obrigações livremente assumidas pelo devedor-fiduciante, porque a alteração do contrato exige voluntária e bilateral acordo de vontade. Também não há legislação viabilizando inadimplência por esse motivo, do mesmo modo que essa circunstância unilateral não altera o equilíbrio do que foi pactuado entre as partes.

- É pacífica a possibilidade de utilização da Tabela Price, bem como dos sistemas SAC ou SACRE nos contratos de mútuo habitacional, visto que referidos métodos de amortização não provocam desequilíbrio econômico-financeiro, tampouco geram enriquecimento ilícito ou qualquer outra ilegalidade. Tais sistemas, que aplicam juros compostos (não necessariamente capitalizados), encontram previsão contratual e legal, sendo amplamente aceitos na jurisprudência pátria.

- O contrato prevê a utilização do Sistema de Amortização Constante - SAC, o qual faz com que as prestações sejam gradualmente reduzidas com o passar do tempo. Tal sistema não implica em capitalização de juros e consiste num método em que as parcelas tendem a reduzir ou, no mínimo, a se manter estáveis, o que não causa prejuízo ao mutuário, havendo, inclusive, a redução do saldo devedor com o decréscimo de juros, os quais não são capitalizados.

- Não se justifica a revisão pretendida pela parte autora, pois o contrato livremente celebrado entre as partes prevê expressamente a utilização do sistema SAC, a taxa de juros, o encargo inicial, a forma de amortização e de atualização do saldo devedor.

- A contratação do seguro habitacional é obrigatória para os imóveis que são objeto de financiamento no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, conforme artigos 20 e 21 do Decreto-Lei nº 70/1966.

- Para que a contratação do seguro seja considerada abusiva, é necessário que se comprove que as quantias cobradas a este título são consideravelmente superiores às taxas praticadas no mercado, ou caso a parte autora pretenda exercer sua faculdade de contratar o seguro junto à instituição de sua preferência, o que não ocorreu no caso.

- Não comprovadas irregularidades no que inicialmente restou pactuado, não se mostra possível o acolhimento da pretensão da parte autora.

- Apelação não provida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.