APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0009047-55.2013.4.03.6100
RELATOR: Gab. 42 - DES. FED. RENATA LOTUFO
APELANTE: UNIÃO FEDERAL
APELADO: SAMIR ABUJAMRA
Advogado do(a) APELADO: GUSTAVO GIMENES MAYEDA ALVES - SP249849-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0009047-55.2013.4.03.6100 RELATOR: Gab. 42 - DES. FED. RENATA LOTUFO APELANTE: UNIÃO FEDERAL APELADO: SAMIR ABUJAMRA Advogado do(a) APELADO: GUSTAVO GIMENES MAYEDA ALVES - SP249849-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL RENATA LOTUFO (Relatora): Trata-se de Apelação interposta pela UNIÃO (ID 133985348) em face de sentença proferida pelo Juízo da 24ª Vara Cível Federal de São Paulo/SP que, nos autos de ação ordinária ajuizada por SAMIR ABUJAMRA, julgou procedente o pedido inicial, extinguindo o feito com resolução do mérito, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para declarar a nulidade das cobranças de laudêmio e diferença de laudêmio lançadas em desfavor do autor às fls. 93, 95 e 97 dos autos físicos. Condenou-se a ré ao pagamento das custas e honorários advocatícios no valor de 10% do valor da causa devidamente atualizado nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal (ID 133985340 – p. 115/121). Sustenta, em síntese, que, nos termos do art. 47, § 1º, da Lei n. 9.636/98, o termo inicial do prazo decadencial dá-se a partir do conhecimento, por iniciativa da União, ou por solicitação do interessado das circunstâncias e fatos que caracterizam a hipótese de incidência da receita patrimonial, ficando limitada a cinco anos a cobrança de créditos relativos a período anterior ao conhecimento. Aduz que, em 1994, a parte autora transferiu o domínio útil para a empresa Sten Borup Sorensen e, em 2003, tal empresa procedeu à transferência para Waldemar Schwab. Contudo, somente em 16.03.2009, a União teria tido ciência da aludida transferência, por meio de notificação expedida nos autos do Mandado de Segurança n. 2009.61.00.005841-9. Alega que, portanto, teria até o ano de 2019 para proceder aos respectivos lançamentos para a constituição dos créditos de laudêmio, sendo que tal prazo findaria no ano de 2019. Acrescenta que o adquirente tem o dever de comunicar a Secretaria do Patrimônio da União – SPU a respeito da cessão, de modo que não poderia o prazo decadencial ter início anteriormente ao correspondente cumprimento. Requer o provimento do presente recurso para reformar a sentença, julgando-se improcedente a pretensão apresentada pelo apelado. O apelado apresentou contrarrazões (ID 133985351), bem como interpôs recurso adesivo (ID 133985353) pleiteando a majoração dos honorários advocatícios para R$ 20.000,00 (vinte mil reais), tendo em vista valor irrisório fixado na sentença. Intimada, a apelante apresentou contrarrazões ao recurso adesivo (ID 285087598). É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0009047-55.2013.4.03.6100 RELATOR: Gab. 42 - DES. FED. RENATA LOTUFO APELANTE: UNIÃO FEDERAL APELADO: SAMIR ABUJAMRA Advogado do(a) APELADO: GUSTAVO GIMENES MAYEDA ALVES - SP249849-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL RENATA LOTUFO (Relatora): Diante da assunção do acervo correspondente ao presente recurso em 13.04.2023 (ATO PRES n. 4733, de 13.04.2023), procedo à sua análise, tratando-se de feito distribuído em 07.06.2020. Do exame dos autos, extrai-se que a presente ação foi ajuizada objetivando a declaração de nulidade dos lançamentos realizados a título de diferença de laudêmio devidas em 14.12.1994 para o imóvel de RIP n. 63110002052-46 (apartamento) e de laudêmio devido em 03.07.2003 para os imóveis de RIP 63110100107-82 (vaga n. 90) e 63110100108-63 (vaga n. 93). Conforme anteriormente relatado, segundo as alegações veiculadas pela apelante, em 1994 o apelado transferiu o domínio útil dos imóveis para a empresa Sten Borup Sorensen e, em 2003, tal empresa procedeu à transferência para Waldemar Schwab. Contudo, somente em 16.03.2009, a União teria tido ciência da aludida transferência, por meio de notificação expedida nos autos do Mandado de Segurança n. 2009.61.00.005841-9. DO REGRAMENTO JURÍDICO ATINENTE À PRESCRIÇÃO E À DECADÊNCIA Cumpre mencionar que, anteriormente ao advento da Lei n. 9.636/98, a União não estava sujeita ao prazo decadencial para a constituição do crédito em questão, mas somente ao prazo prescricional quinquenal do art. 1º do Decreto n. 20.910/32, aplicado em decorrência do princípio da isonomia, não havendo que se falar no prazo prescricional vintenário previsto no Código Civil de 1916. Por ocasião de sua publicação, a mencionada lei passou a prever de forma expressa, em seu art. 47, o prazo prescricional de cinco anos para a pretensão relacionada às receitas patrimoniais da União. Assim, somente a partir de 24.08.99, com a vigência da Lei n. 9.821/1999, a qual alterou o mencionado dispositivo legal, é que os créditos correspondentes a tais receitas passaram a se sujeitar ao prazo decadencial de cinco anos para a respectiva constituição, mediante lançamento. Observe-se, outrossim, que a partir desse momento, o § 1º do art. 47 passou a prever que o prazo decadencial em questão conta-se do instante em que o respectivo crédito poderia ser constituído, a partir do conhecimento por iniciativa da União ou por solicitação do interessado das circunstâncias e fatos que caracterizam a hipótese de incidência da receita patrimonial, ficando limitada a cinco anos a cobrança de créditos relativos a período anterior ao conhecimento. Posteriormente, a partir de 30.03.2004, com o advento da Lei n. 10.852/2004, estendeu-se o prazo decadencial para dez anos, mantendo-se, contudo, o prazo prescricional de cinco anos para a exigência dos créditos vinculados às receitas em questão. A interpretação atinente aos temas de prescrição e decadência decorrente da evolução legislativa foi debatida pela 1ª Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, por meio do regime dos Recursos Representativos de Controvérsia, nos seguintes termos: PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. TERRENOS DE MARINHA. COBRANÇA DA TAXA DE OCUPAÇÃO. PRESCRIÇÃO. DECRETO-LEI 20.910/32 E LEI Nº 9.636/98. DECADÊNCIA. LEI 9.821/99. PRAZO QUINQUENAL. LEI 10.852/2004. PRAZO DECENAL MARCO INTERRUPTIVO DA PRESCRIÇÃO. ART. 8º, § 2º, DA LEI 6.830/80. REFORMATIO IN PEJUS. NÃO CONFIGURADA. VIOLAÇÃO DO ART. 535, II, CPC. INOCORRÊNCIA. 1. O prazo prescricional, para a cobrança da taxa de ocupação de terrenos de marinha, é de cinco anos, independentemente do período considerado, uma vez que os débitos posteriores a 1998, se submetem ao prazo quinquenal, à luz do que dispõe a Lei 9.636/98, e os anteriores à citada lei, em face da ausência de previsão normativa específica, se subsumem ao prazo encartado no art. 1º do Decreto-Lei 20.910/1932. Precedentes do STJ: AgRg no REsp 944.126/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe 22/02/2010; AgRg no REsp 1035822/RS, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJe 18/02/2010; REsp 1044105/PE, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, DJe 14/09/2009; REsp 1063274/PE, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, DJe 04/08/2009; EREsp 961064/CE, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, Rel. p/ Acórdão Ministro CASTRO MEIRA, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe 31/08/2009. 2. A relação de direito material que enseja o pagamento da taxa de ocupação de terrenos de marinha é regida pelo Direito Administrativo, por isso que inaplicável a prescrição delineada no Código Civil. 3. O art. 47 da Lei 9.636/98, na sua evolução legislativa, assim dispunha: Redação original: "Art. 47. Prescrevem em cinco anos os débitos para com a Fazenda Nacional decorrentes de receitas patrimoniais. Parágrafo único. Para efeito da caducidade de que trata o art. 101 do Decreto-Lei no 9.760, de 1946, serão considerados também os débitos alcançados pela prescrição." Redação conferida pela Lei 9.821/99: "Art. 47. Fica sujeita ao prazo de decadência de cinco anos a constituição, mediante lançamento, de créditos originados em receitas patrimoniais, que se submeterão ao prazo prescricional de cinco anos para a sua exigência. § 1º O prazo de decadência de que trata o caput conta-se do instante em que o respectivo crédito poderia ser constituído, a partir do conhecimento por iniciativa da União ou por solicitação do interessado das circunstâncias e fatos que caracterizam a hipótese de incidência da receita patrimonial, ficando limitada a cinco anos a cobrança de créditos relativos a período anterior ao conhecimento. § 2º Os débitos cujos créditos foram alcançados pela prescrição serão considerados apenas para o efeito da caracterização da ocorrência de caducidade de que trata o parágrafo único do art. 101 do Decreto-Lei no 9.760, de 1946, com a redação dada pelo art. 32 desta Lei." Redação conferida pela Lei 10.852/2004: "Art. 47. O crédito originado de receita patrimonial será submetido aos seguintes prazos: I - decadencial de dez anos para sua constituição, mediante lançamento; e II - prescricional de cinco anos para sua exigência, contados do lançamento. § 1º O prazo de decadência de que trata o caput conta-se do instante em que o respectivo crédito poderia ser constituído, a partir do conhecimento por iniciativa da União ou por solicitação do interessado das circunstâncias e fatos que caracterizam a hipótese de incidência da receita patrimonial, ficando limitada a cinco anos a cobrança de créditos relativos a período anterior ao conhecimento. § 2º Os débitos cujos créditos foram alcançados pela prescrição serão considerados apenas para o efeito da caracterização da ocorrência de caducidade de que trata o parágrafo único do art. 101 do Decreto-Lei no 9.760, de 1946, com a redação dada pelo art. 32 desta Lei." 4. Em síntese, a cobrança da taxa in foco, no que tange à decadência e à prescrição, encontra-se assim regulada: (a) o prazo prescricional, anteriormente à edição da Lei 9.363/98, era quinquenal, nos termos do art. 1º, do Decreto 20.910/32; (b) a Lei 9.636/98, em seu art. 47, institui a prescrição qüinqüenal para a cobrança do aludido crédito; (c) o referido preceito legal foi modificado pela Lei 9.821/99, que passou a vigorar a partir do dia 24 de agosto de 1999, instituindo prazo decadencial de cinco anos para constituição do crédito, mediante lançamento, mantendo-se, todavia, o prazo prescricional qüinqüenal para a sua exigência; (d) consectariamente, os créditos anteriores à edição da Lei nº 9.821/99 não estavam sujeitos à decadência, mas somente a prazo prescricional de cinco anos (art. 1º do Decreto nº 20.910/32 ou 47 da Lei nº 9.636/98); (e) com o advento da Lei 10.852/2004, publicada no DOU de 30 de março de 2004, houve nova alteração do art. 47 da Lei 9.636/98, ocasião em que foi estendido o prazo decadencial para dez anos, mantido o lapso prescricional de cinco anos, a ser contado do lançamento. 5. In casu, a exigência da taxa de ocupação de terrenos de marinha refere-se ao período compreendido entre 1991 a 2002, tendo sido o crédito constituído, mediante lançamento, em 05.11.2002 (fl. 13), e a execução proposta em 13.01.2004 (fl. 02) 6. As anuidades dos anos de 1990 a 1998 não se sujeitam à decadência, porquanto ainda não vigente a Lei 9.821/99, mas deveriam ser cobradas dentro do lapso temporal de cinco anos anteriores ao ajuizamento da demanda, razão pela qual encontram-se prescritas as parcelas anteriores a 20/10/1998. 7. As anuidades relativas ao período de 1999 a 2002 sujeitam-se a prazos decadencial e prescricional de cinco anos, razão pela qual os créditos referentes a esses quatro exercícios foram constituídos dentro do prazo legal de cinco anos (05.11.2002) e cobrados também no prazo de cinco anos a contar da constituição (13.01.2004), não se podendo falar em decadência ou prescrição do crédito em cobrança. 8. Contudo, em sede de Recurso Especial exclusivo da Fazenda Nacional, impõe-se o não reconhecimento da prescrição dos créditos anteriores a 20/10/1998, sob pena de incorrer-se em reformatio in pejus. 9. Os créditos objeto de execução fiscal que não ostentam natureza tributária, como sói ser a taxa de ocupação de terrenos de marinha, têm como marco interruptivo da prescrição o despacho do Juiz que determina a citação, a teor do que dispõe o art. 8º, § 2º, da Lei 6.830/1980, sendo certo que a Lei de Execuções Fiscais é lei especial em relação ao art. 219 do CPC. Precedentes do STJ: AgRg no Ag 1180627/SP, PRIMEIRA TURMA, DJe 07/05/2010; REsp 1148455/SP, SEGUNDA TURMA, DJe 23/10/2009; AgRg no AgRg no REsp 981.480/SP, SEGUNDA TURMA, Dje 13/03/2009; e AgRg no Ag 1041976/SP, SEGUNDA TURMA, DJe 07/11/2008. 10. É defeso ao julgador, em sede de remessa necessária, agravar a situação da Autarquia Federal, à luz da Sumula 45/STJ, mutatis mutandis, com mais razão erige-se o impedimento de fazê-lo, em sede de apelação interposta pela Fazenda Pública, por força do princípio da vedação da reformatio in pejus. Precedentes desta Corte em hipóteses análogas: RESP 644700/PR, DJ de 15.03.2006; REsp 704698/PR, DJ de 16.10.2006 e REsp 806828/SC, DJ de 16.10.2006. 11. No caso sub examine não se denota o agravamento da situação da Fazenda Nacional, consoante se infere do excerto voto condutor do acórdão recorrido: "(...) o primeiro ponto dos aclaratórios se baseia na reformatio in pejus. O acórdão proferido, ao negar provimento à apelação, mantém os termos da sentença, portanto, reforma não houve. O relator apenas utilizou outra fundamentação para manter a decisão proferida, o que não implica em modificação da sentença" (fl. 75) 12. Os Embargos de Declaração que enfrentam explicitamente a questão embargada não ensejam recurso especial pela violação do artigo 535, II, do CPC, tanto mais que, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão. 13. Recurso Especial provido, para afastar a decadência, determinando o retorno dos autos à instância ordinária para prosseguimento da execução. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/2008. (REsp n. 1.133.696/PE, relator Ministro Luiz Fux, Primeira Seção, julgado em 13/12/2010, DJe de 17/12/2010) – destaque nosso. No mesmo sentido tem entendido a 2ª Turma dessa Corte Regional quanto às hipóteses de laudêmio (TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5001109-34.2017.4.03.6115, Rel. Desembargador Federal LUIZ PAULO COTRIM GUIMARAES, julgado em 29/07/2021, Intimação via sistema DATA: 02/08/2021). No que diz respeito, especificamente, à interpretação correspondente ao § 1º do art. 47 da Lei n. 9.636/98, a questão foi enfrentada pelo C. Superior Tribunal de Justiça no Tema 1142, tendo o respectivo julgamento sido assim ementado: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. TERRENO DE MARINHA. CESSÃO DE DIREITOS. FATO GERADOR. LAUDÊMIO. DECADÊNCIA. TERMO INICIAL. CIÊNCIA DA UNIÃO (SPU). EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO. LIMITAÇÃO TEMPORAL. CINCO ANOS ANTERIORES À CIÊNCIA DA TRANSAÇÃO. OBSERVÂNCIA. 1. O art. 3º do Decreto-Lei n. 2.398/1987, com redação introduzida pela Lei n. 13.465/2017, dispõe que a transferência onerosa, entre vivos, do domínio útil e da inscrição de ocupação de terrenos da União ou de cessão de direito a eles relativos dependerá do prévio recolhimento do laudêmio pelo vendedor, em quantia correspondente a 5% (cinco por cento) do valor atualizado do domínio pleno do imóvel, excluídas as benfeitorias. 2. A celebração do contrato de compra e venda é suficiente como fato gerador do laudêmio, pois o legislador estabeleceu como uma das hipóteses de incidência a mera cessão de direitos, a qual ocorre tão logo o negócio jurídico particular produza os seus efeitos, prescindindo, para fins de cobrança do laudêmio, do registro do respectivo título no cartório de registro de imóveis. 3. A inexistência de registro imobiliário da transação (contratos de gaveta) não impede a caracterização do fato gerador do laudêmio, sob pena de incentivar a realização de negócios jurídicos à margem da lei somente para evitar o pagamento dessa obrigação pecuniária. 4. O art. 47, § 1º, da Lei n. 9.636/1998, estabelece que o prazo decadencial para constituição do crédito não tributário conta-se a partir do conhecimento por iniciativa da União. 5. Até que a credora seja cientificada da ocorrência do fato gerador, não se pode exigir, em regra, que adote providência para constituir formalmente o crédito. 6. A legislação limita a cinco anos a cobrança de créditos relativos ao período anterior ao conhecimento do fato gerador daqueles. 7. Não há razão jurídica para afastar essa disposição legal quanto ao laudêmio devido em casos de cessões particulares relativos ao período anterior ao conhecimento do fato gerador, visto que o legislador não diferenciou receitas patrimoniais periódicas (como foro e taxa) das esporádicas (como o laudêmio). 8. Tese jurídica firmada: a) a inexistência de registro imobiliário da transação (contratos de gaveta) não impede a caracterização do fato gerador do laudêmio, sob pena de incentivar a realização de negócios jurídicos à margem da lei somente para evitar o pagamento dessa obrigação pecuniária; b) o termo inicial do prazo para a constituição dos créditos relativos ao laudêmio tem como data-base o momento em que a União toma conhecimento, por iniciativa própria ou por solicitação do interessado, da alienação do imóvel, consoante exegese do § 1º do art. 47 da Lei n. 9.636/1998, com a redação dada pela Lei n. 9.821/1999, não sendo, portanto, a data em que foi consolidado o negócio jurídico entre os particulares o marco para a contagem do prazo decadencial, tampouco a data do registro da transação no cartório de imóvel; c) o art. 47 da Lei n. 9.636/1998 rege toda a matéria relativa a decadência e prescrição das receitas patrimoniais não tributárias da União Federal, não havendo razão jurídica para negar vigência à parte final do § 1º do art. 47 do aludido diploma legal quanto à inexigibilidade do laudêmio devido em casos de cessões particulares, relativas a período anterior ao conhecimento do fato gerador, visto que o legislador não diferenciou receitas patrimoniais periódicas (como foro e taxa) das esporádicas (como o laudêmio). 9. No caso concreto, a SPU não pode exigir os valores relativos ao laudêmio decorrente da transação efetivada em 31/03/2004, por ter transcorrido mais de cinco anos da data do conhecimento dos fatos pela autoridade administrativa (16/03/2018), consoante regra prevista no § 1º do art. 47 da Lei n. 9.636/1998. 10. Recurso julgado sob a sistemática do art. 1.036 e seguintes do CPC/2015 e do art. 256-N e seguintes do Regimento Interno do STJ. 11. Recurso especial não provido. (REsp n. 1.951.346/SP, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Seção, julgado em 10/5/2023, DJe de 19/5/2023.) – destaque nosso. Em tal contexto, conclui-se que, em decorrência do aludido julgamento, fixaram-se os entendimentos segundo os quais: i) a mera cessão de caráter obrigacional constitui hipótese de incidência para o laudêmio; ii) o termo inicial decadencial é o momento no qual a União toma conhecimento do fato gerador de seu crédito; iii) o fato gerador do crédito deve ter ocorrido no quinquênio que antecedeu o conhecimento do ente público a respeito dele; e iv) atendida esta última condição, a União terá 10 anos para constituir o crédito e 5 anos para cobrá-lo. DA ANÁLISE DO CASO CONCRETO No caso dos autos, o apelado ajuizou a presente ação ordinária objetivando a declaração de nulidade dos lançamentos realizados a título de diferença de laudêmio devida em 14.12.1994 para o imóvel de RIP n. 63110002052-46 (apartamento) e de laudêmio devido em 03.07.2003 para os imóveis de RIP 63110100107-82 (vaga n. 90) e 63110100108-63 (vaga n. 93). Suas alegações dizem respeito à nulidade dos lançamentos realizados em seu nome, tendo em vista a transmissão do domínio útil dos imóveis mencionados a Sten Borup Sorensen em 14.12.1994. Na sentença, acolheu-se a preliminar suscitada, reconhecendo-se a prescrição e a decadência dos débitos mencionados nos seguintes termos: (...) Em relação aos créditos de laudêmio sob os imóveis de RIP 6311.0100107-82 e 6311.0100108-63, cobrados em 05/03/2013 em relação ao período de apuração de 03/07/2003, a par de qualquer discussão acerca da ocorrência da prescrição ou decadência, é certo e inafastável que indevidos, visto que a escritura de compra e venda do imóvel foi registrada em 23 de janeiro de 1995 (fls. 26/36). Em sendo o laudêmio a taxa paga à União pela transmissão do direito útil sobre imóveis localizados em terrenos da marinha por ocasião de transações de compra e venda com escritura pública definitiva, é certo que a cobrança de laudêmio em relação à venda e compra posterior, ocorrida em 2003, não lhe pode ser imputada. Nem se diga quanto ao argumento da União de ausência de comunicação da transferência pelo ora autor, ante a farta documentação nos autos a demonstrar a sua ciência inequívoca acerca da transferência do imóvel desde ao menos 2001 (fl. 38), além das sentenças judiciais já transitadas em julgado proferidas nos autos das ações 2004.61.00.031894-8 e 005841-72.2009.403.6100, reconhecendo a inexistência de relação jurídica que obrigue o autor ao pagamento das taxas de ocupação do imóvel a partir do exercício de 1995 (ID 133985340 – p. 121). Colhe-se das razões recursais da apelante que não são trazidos elementos tendentes a afastar a conclusão apontada pelo r. Juízo de primeiro grau, a respeito da ciência da União ao menos desde o ano de 2001, em razão das ações judiciais anteriormente ajuizadas pelo ora apelado. Assim, passa-se à análise dos débitos em questão, partindo-se de tal premissa. DA DIFERENÇA DE LAUDÊMIO CORRESPONDENTE À ALIENAÇÃO OCORRIDA EM 1994 No que diz respeito aos débitos correspondentes ao ano de 1994, anteriormente, portanto, à Lei n. 9.821/1999, estavam esses sujeitos exclusivamente ao prazo prescricional quinquenal, a partir da data do ato ou fato do qual se originou (inteligência do art. 1º do Decreto n. 20.910/32), qual seja, a data do registro da cessão em questão por meio de escritura pública, ocorrida em 14.12.1994, tendo sido a alienação comunicada em 15.10.2001 (ID 133985338 – p. 41). Assim, o débito em questão foi alcançado pela prescrição em 13.12.1999, sendo, portanto, inexigível o débito constante cobrança em questão, tendo em vista que a cobrança deu-se em 04.03.2013 (ID 133985338 – p. 95/96). DO LAUDÊMIO CORRESPONDENTE À ALIENAÇÃO OCORRIDA EM 2003 Quanto aos débitos correspondentes ao ano de 2003, é certo que a SPU foi comunicada pelo apelado a respeito da transferência dos imóveis, ocorrida em 14.12.1994, por meio de documento protocolado, igualmente, em 15.10.2001 (ID 133985338 – p. 41), bem como em decorrência das ações judiciais anteriormente ajuizadas, conforme mencionado no excerto da sentença transcrito no presente Voto. No contexto apresentado, foi cumprido o dever de comunicação à SPU acerca da cessão de direitos relativos à ocupação de imóveis da União, fazendo cessar a responsabilidade do alienante (in TRF 3ª Região, 2ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5019280-17.2018.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal OTAVIO PEIXOTO JUNIOR, julgado em 09/09/2022, Intimação via sistema DATA: 30/09/2022 e TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0004586-26.2016.4.03.6103, Rel. Desembargador Federal LUIZ PAULO COTRIM GUIMARAES, julgado em 30/06/2022, DJEN DATA: 05/07/2022). Sendo assim, conforme exposto na sentença, inexigíveis as DARF emitidas em seu nome (ID 133985338 – p. 96), por alienação posterior, ocorrida em 2003. Mantém-se, portanto, a sentença recorrida. DA ANÁLISE DO RECURSO ADESIVO O apelado, SAMIR ABUJAMRA, pleiteia a majoração dos honorários advocatícios para R$ 20.000,00 (vinte mil reais), tendo em vista valor irrisório fixado na sentença. A União, em primeiro grau, foi condenada ao pagamento de honorários advocatícios no valor de 10% sobre o valor atribuído à causa devidamente atualizado. Por ocasião do ajuizamento da ação, em 17.05.2013, foi atribuído à causa o valor de R$ 5.547,62 (cinco mil, quinhentos e quarenta e sete reais e sessenta e dois centavos). Os novos critérios trazidos pelo Código de Processo Civil foram objeto de debate pela Corte Especial do E. Superior Tribunal de Justiça, no Tema Repetitivo n. 1076, cuja tese firmada restou assim ementada: "PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL SOB O RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS. ART. 85, §§ 2º, 3°, 4°, 5°, 6º E 8º, DO CPC. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. VALORES DA CONDENAÇÃO, DA CAUSA OU PROVEITO ECONÔMICO DA DEMANDA ELEVADOS. IMPOSSIBILIDADE DE FIXAÇÃO POR APRECIAÇÃO EQUITATIVA. [...] RECURSO JULGADO SOB A SISTEMÁTICA DO ART. 1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015, C/C O ART. 256-N E SEGUINTES DO REGIMENTO INTERNO DO STJ. (...) 24. Teses jurídicas firmadas: i) A fixação dos honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados. É obrigatória nesses casos a observância dos percentuais previstos nos §§ 2º ou 3º do artigo 85 do CPC - a depender da presença da Fazenda Pública na lide -, os quais serão subsequentemente calculados sobre o valor: (a) da condenação; ou (b) do proveito econômico obtido; ou (c) do valor atualizado da causa. ii) Apenas se admite arbitramento de honorários por equidade quando, havendo ou não condenação: (a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou (b) o valor da causa for muito baixo. [...] 26. Recurso julgado sob a sistemática do art. 1.036 e seguintes do CPC/2015 e art. 256-N e seguintes do Regimento Interno do STJ." (REsp 1850512 SP, relator Ministro Og Fernandes, Corte Especial, julgado em 16/3/2022, DJe de 31/5/2022) (REsp 1877883 SP, relator Ministro Og Fernandes, Corte Especial, julgado em 16/3/2022, DJe de 31/5/2022) (REsp 1906623 SP, relator Ministro Og Fernandes, Corte Especial, julgado em 16/3/2022, DJe de 31/5/2022) (REsp 1906618 SP, relator Ministro Og Fernandes, Corte Especial, julgado em 16/3/2022, DJe de 31/5/2022). Na hipótese dos autos, considero o valor atualizado da causa muito baixo, tendo-se, igualmente, por parâmetro o grau de zelo do profissional, a natureza da causa, bem como o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço (inteligência do art. 85, § 2º, CPC), ante a previsão contida no § 8º do mesmo dispositivo legal. Conforme anteriormente exposto, nessa hipótese, a legislação permite o arbitramento de honorários advocatícios, os quais fixo em R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Ainda, nos termos do art. 85, § 11, do CPC, em atenção aos parâmetros do art. 85, § 2º, do CPC, especialmente no tocante ao grau de zelo profissional e ao trabalho despendido em grau recursal, majoro o montante em questão para que totalize R$ 5.500,00 (cinco mil e quinhentos reais). Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à Apelação da União e DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso adesivo interposto por Samir Abujamra para arbitrar os honorários advocatícios sucumbenciais em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), com fundamento no art. 85, § 8º, do Código de Processo Civil, os quais restam majorados para R$ 5.500,00 (cinco mil e quinhentos reais), nos termos do § 11 do mesmo dispositivo legal. É o voto.
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. ADMINISTRATIVO. LAUDÊMIO. PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA. DECRETO-LEI N. 20.190/1932, LEIS N. 9.636/1998, 9.821/1999 E 10.852/2004.
- Ação anulatória ajuizada objetivando a declaração de nulidade dos lançamentos realizados a título de diferença de laudêmio devida em 14.12.1994 para o imóvel de RIP n. 63110002052-46 (apartamento) e de laudêmio devido em 03.07.2003 para os imóveis de RIP 63110100107-82 (vaga n. 90) e 63110100108-63 (vaga n. 93).
- Anteriormente ao advento da Lei n. 9.636/98, a União não estava sujeita ao prazo decadencial para a constituição do crédito em questão, mas somente ao prazo prescricional quinquenal do art. 1º do Decreto n. 20.910/32, não havendo que se falar no prazo prescricional vintenário previsto no Código Civil de 1916.
- A partir de 24.08.99, com a vigência da Lei n. 9.821/1999, a qual alterou o mencionado dispositivo legal, é que os créditos correspondentes a tais receitas passaram a se sujeitar ao prazo decadencial de cinco anos para a respectiva constituição, mediante lançamento.
- Com o advento da Lei n. 10.852/2004, a partir de 30.03.2004, estendeu-se o prazo decadencial para dez anos, mantendo-se, contudo, o prazo prescricional de cinco anos para a exigência dos créditos vinculados às receitas em questão (REsp n. 1.133.696/PE, relator Ministro Luiz Fux, Primeira Seção, julgado em 13/12/2010, DJe de 17/12/2010, julgado pelo regime do art. 543-C do CPC de 1973).
- No que diz respeito, especificamente, à interpretação correspondente ao § 1º do art. 47 da Lei n. 9.636/98, a questão foi enfrentada pelo C. Superior Tribunal de Justiça no Tema 1142 (REsp n. 1.951.346/SP, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Seção, julgado em 10/5/2023, DJe de 19/5/2023).
- No caso dos autos, quanto aos débitos correspondentes ao ano de 1994, anteriormente, portanto, à Lei n. 9.821/1999, estavam esses sujeitos exclusivamente ao prazo prescricional quinquenal, a partir da data do ato ou fato do qual se originou (inteligência do art. 1º do Decreto n. 20.910/32), qual seja, a data do registro da cessão em questão por meio de escritura pública, ocorrida em 14.12.1994. Assim, o débito em questão foi alcançado pela prescrição em 13.12.1999, sendo, portanto, inexigível o débito constante na DARF emitida no ano de 2013, constante dos autos.
- Quanto ao laudêmio correspondente ao ano de 2003, foi cumprido o dever de comunicação à SPU acerca da cessão de direitos relativos à ocupação de imóveis da União, fazendo cessar a responsabilidade do alienante (in TRF 3ª Região, 2ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5019280-17.2018.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal OTAVIO PEIXOTO JUNIOR, julgado em 09/09/2022, Intimação via sistema DATA: 30/09/2022 e TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0004586-26.2016.4.03.6103, Rel. Desembargador Federal LUIZ PAULO COTRIM GUIMARAES, julgado em 30/06/2022, DJEN DATA: 05/07/2022). Sendo assim, nos termos da sentença, inexigíveis as DARF emitidas em nome do apelado, por alienação posterior, ocorrida em 2003.
- Análise do recurso adesivo: valor da causa considerado muito baixo, tendo-se, igualmente, por parâmetro o grau de zelo do profissional, a natureza da causa, bem como o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço (inteligência do art. 85, § 2º, CPC), ante a previsão contida no § 8º do mesmo dispositivo legal. Tema 1076/STJ.
- Arbitramento de honorários advocatícios em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), os quais restam majorados, totalizando R$ 5.500,00 (cinco mil e quinhentos reais).
- Apelação da União desprovida e Recurso adesivo interposto por Samir Abujamra parcialmente provido para arbitrar os honorários advocatícios sucumbenciais em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), com fundamento no art. 85, § 8º, do Código de Processo Civil, os quais restam majorados para R$ 5.500,00 (cinco mil e quinhentos reais), nos termos do § 11 do mesmo dispositivo legal.