Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
10ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001810-22.2018.4.03.6127

RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LEILA PAIVA

APELANTE: HELIO HUBER DA SILVA

Advogado do(a) APELANTE: MARIA CECILIA DE SOUZA - SP150409-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001810-22.2018.4.03.6127

RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LEILA PAIVA

APELANTE: HELIO HUBER DA SILVA

Advogado do(a) APELANTE: MARIA CECILIA DE SOUZA - SP150409-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

 

 

R E L A T Ó R I O

 

 

A Senhora Desembargadora Federal Leila Paiva (Relatora):

Trata-se de apelação interposta pela parte autora em ação previdenciária objetivando a concessão de benefício de aposentadoria por tempo de contribuição para a pessoa com deficiência.

A parte autora pleiteou a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição para a pessoa com deficiência grave desde a DER (11/08/2017), por ser portadora de visão monocular desde os anos 1980.  

Contestada a demanda, sobreveio a r. sentença que julgou procedente o pedido (ID 146154565 - Págs. 1/7) e, na sequência, a apelação interposta pelo INSS (ID 146154567 - Págs. 1/3).

Esta C. Turma deu provimento à apelação do INSS para anular a r. sentença de primeiro grau e determinar o retorno dos autos à origem para o regular processamento do feito, oportunizando-se a produção de nova prova pericial, a ser realizada, nos termos da Portaria Interministerial SDH/MPS/MF/MOG/AGU 1, de 27 de janeiro de 2014, com oportuna prolação de nova decisão de mérito (ID 160451132 - Págs. 1/6). 

Baixados aos autos à origem, sobreveio a r. sentença de primeiro grau (ID 278793283) que julgou improcedentes os pedidos e condenou a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa, suspendendo a sua exigibilidade, nos termos do artigo 98, § 3º, do CPC. 

A parte autora alega que:

- o laudo pericial concluiu que a deficiência apresentada, no caso a visão monocular - cegueira de um olho, é de natureza leve; 

- embora não tenha cumprido os requisitos para a aposentação na DER, continuou trabalhando e vertendo contribuições ao RGPS, de modo que faz jus à aposentação para a pessoa com deficiência leve em sede reafirmação da DER (28/08/2020), ou seja, quando implementou os requisitos necessários à concessão do referido benefício.

Requer, por fim, o provimento da apelação e a reforma da r. sentença, com a concessão do benefício pretendido.

Sem contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte Regional.

É o relatório.

 

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 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
10ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001810-22.2018.4.03.6127

RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LEILA PAIVA

APELANTE: HELIO HUBER DA SILVA

Advogado do(a) APELANTE: MARIA CECILIA DE SOUZA - SP150409-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

A Senhora Desembargadora Federal Leila Paiva (Relatora):

Cinge-se a controvérsia à possibilidade de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência.

A apelação preenche os requisitos de admissibilidade e merece ser conhecida.

DA APOSENTADORIA DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA

A aposentadoria da pessoa com deficiência segurada do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), devida aos segurados, foi disciplinada pela Lei Complementar nº 142, de 08/05/2013, em obediência ao § 1º do artigo 201 da Constituição da República.

A lei de regência foi regulamentada pelos artigos 70-A a 70-J do Decreto nº 3.048/1999, com redação dos Decretos nºs 8.145, de 03/12/2013, e 10.410, de 30/06/2020, comas modificações posteriores.

A concessão do benefício depende da comprovação do grau de deficiência na data da entrada do requerimento (DER) ou do implemento dos requisitos, por meio de avaliação biopsicossocial realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar, na forma do artigo 70-A, do Decreto nº 3.048/1999.

O tempo de contribuição foi fixado pelo artigo 3º da Lei Complementar nº 142, de 08/05/2013, in verbis:

Art. 3º É assegurada a concessão de aposentadoria pelo RGPS ao segurado com deficiência, observadas as seguintes condições: 

I - aos 25 (vinte e cinco) anos de tempo de contribuição, se homem, e 20 (vinte) anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência grave; 

II - aos 29 (vinte e nove) anos de tempo de contribuição, se homem, e 24 (vinte e quatro) anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência moderada; 

III - aos 33 (trinta e três) anos de tempo de contribuição, se homem, e 28 (vinte e oito) anos, se mulher, no caso de segurado com deficiência leve; ou (...) 

Parágrafo único. Regulamento do Poder Executivo definirá as deficiências grave, moderada e leve para os fins desta Lei Complementar. 

Art. 4o A avaliação da deficiência será médica e funcional, nos termos do Regulamento. 

 Verifica-se que a diminuição do tempo de contribuição dependerá do grau de deficiência grave, moderada ou leve, cuja avaliação deverá, necessariamente, ser médica e funcional, na forma dos artigos 3º, parágrafo único, e 4º, acima transcritos.

Para tanto, foi editada a Portaria Interministerial SDH/MPS/MF/MOG/AGU Nº 1, de 27/01/2014, que “aprova o instrumento destinado à avaliação do segurado da Previdência Social e à identificação dos graus de deficiência, bem como define impedimento de longo prazo, para os efeitos do Decreto nº 3.048, de 6 de maio de 1999”.

Dispõe o artigo 2º da Portaria Interministerial nº 1/2014,in verbis:

Art. 2º Competeà perícia própria do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, por meio de avaliação médica e funcional, para efeito de concessão da aposentadoria da pessoa com deficiência, avaliar o segurado e fixar a data provável do início da deficiência e o respectivo grau, assim como identificar aocorrência de variação no grau de deficiência e indicar os respectivos períodos em cada grau.  

§ 1º A avaliação funcional indicada no caput será realizada com base no conceito de funcionalidade disposto na Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde - CIF, da Organização Mundial de Saúde, e mediante a aplicação do Índice de Funcionalidade Brasileiro Aplicado para Fins de Aposentadoria - IFBrA, conforme o instrumento anexo a esta Portaria. 

 § 2º A avaliação médica e funcional, disposta no caput, será realizada pela perícia própria do INSS, a qual engloba a perícia médica e o serviço social, integrantes do seu quadro de servidores públicos. 

 § 3º O instrumento de avaliação médica e funcional, destinado à avaliar o segurado, e constante do anexo a esta Portaria, será objeto de revisão por instância técnica específica instituída no âmbito do Ministério da Previdência Social, no prazo máximo de um ano, a contar da data de publicação deste ato normativo, podendo haver revisões posteriores. 

A aferição da incapacidade e seu grau deve observar o Índice de Funcionalidade Brasileiro Aplicado para Fins de Classificação e Concessão da Aposentadoria da Pessoa com Deficiência, o IF-BrA, que é apurado pela soma da pontuação aplicável, seguida da incidência da variação do Método Linguístico Fuzzy.

Nesse diapasão, não se afigura suficiente a realização de perícia médica desprovida do preenchimento dos quesitos específicos, que se destinam à identificação técnica da classificação da deficiência, a partir de considerações subjetivas relacionadas à qualificação individual do segurado.

Além disso, é imprescindível a realização de laudos conjuntos, médico e funcional, conforme preconizado pela Portaria Interministerial nº 1/2014, estabelecendo a pontuação individualizada, com a conclusão pela existência ou não de deficiência, assim como fixação de graduação suficiente para concessão do benefício de aposentadoria.

No caso dos autos, o r. Perito Judicial, não obstante a sua indiscutível expertise, não produziu o laudo médico de acordo com o Índice de Funcionalidade Brasileiro Aplicado para Fins de Classificação e Concessão da Aposentadoria da Pessoa com Deficiência, o IF-BrA, pois não foram atribuídos pontos para as diversas atividades, segundo a tabela de aplicação de pontuação, que estabelece, em resumo: 25 pontos, para atividade que a pessoa com deficiência não realiza ou é totalmente dependente de terceiros; 50 pontos no caso de a realização da atividade depender do auxílio de terceiros; 75 pontos, quando o avaliado tem possibilidade de praticar a atividade de forma modificada ou adaptada; e 100 pontos indicativos de ausência de restrição ou limitação, com total independência para realização da atividade (ID 278793201 e ID 278793211).

Nesse aspecto, afere-se da conclusão pericial médica que a deficiência seria de grau leve em razão do diagnóstico “de cegueira no olho esquerdo, e no olho direito tem acuidade visual de 20/25”, com esteio nos critérios presentes na Classificação Estatística Internacional das Doenças e Problemas relacionados à Saúde (CID-10), o que difere dos parâmetros acima referidos (ID 278793222).

Oportuno salientar que nem sequer houve a realização de perícia social, a ser conduzida por assistente social, imprescindível para a aferição de eventual deficiência, bem como a correspondente gradação.

Frise-se que a tabela de atribuição de pontos, a ser utilizada na avaliação funcional e no exame médico pericial, é dividida em sete domínios: sensorial; comunicação; mobilidade; cuidados pessoais; vida doméstica; educação, trabalho e vida econômica; e socialização e vida comunitária.

Após obtida a primeira pontuação, sobre ela incide a variação decorrente do Modelo Linguístico Fuzzy, cabendo aos peritos funcional e médico sopesarem as deficiências e a sua relevância na vida do segurado nos respectivos domínios, a saber: a) deficiência auditiva, aplicável aos domínios da comunicação e socialização; b) deficiência intelectual, cognitiva e mental, em face do domínio da vida doméstica e socialização; c) deficiência motora, analisada na esfera da mobilidade e dos cuidados pessoais; e d) deficiência visual, sob o ângulo do domínio da mobilidade e da vida doméstica.

Nesse diapasão, a conclusão do Perito Judicial no laudo médico acostado aos autos, por si, não é suficiente à constatação do grau de deficiência da parte autora, eis que somente a avaliação da pontuação obtida pela soma dos laudos médico e funcional poderá conduzir à conclusão da deficiência de grau leve, moderado ou grave.

É de rigor, portanto, a anulação da sentença para que o feito retorne à fase de instrução, para fins de realização de perícias médica e funcional, na forma estabelecida pela Portaria Interministerial SDH/MPS/MF/MOG/AGU Nº 1, de 27/01/2014, no sentido de perscrutar o grau de deficiência da parte autora, mediante a apresentação de conclusão, decorrente da pontuação de ambos os laudos, que aponte especificamente: a) deficiência grave: pontuação ≤ 5.739; b) deficiência moderada: pontuação ≥ a 5.740 e ≤ a 6.354; c) deficiência leve: pontuação ≥ a 6.355 e ≤ a 7.584; ou d) insuficiente para concessão do benefício: pontuação ≥ a 7.585.

 DISPOSITIVO

Posto isso, de ofício, anulo a r. sentença recorrida, determinando a remessa dos autos à Vara de origem, para seu regular processamento, restando prejudicada a apelação interposta pela parte autora.

É como voto.



E M E N T A

APOSENTADORIA DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. ÍNDICE DE FUNCIONALIDADE BRASILEIRO APLICADO PARA FINS DE CLASSIFICAÇÃO E CONCESSÃO DA APOSENTADORIA DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA (IF-BRA). MÉTODO LINGUÍSTICO FUZZY. LAUDO CONJUNTO. IMPRESCINDIBILIDADE.

- A aposentadoria da pessoa com deficiência segurada do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), devida aos segurados, foi disciplinada pela Lei Complementar nº 142, de 08/05/2013, em obediência ao § 1º do artigo 201 da Constituição da República.

- A lei de regência foi regulamentada pelos artigos 70-A a 70-J do Decreto nº 3.048/1999, com redação dos Decretos nºs 8.145, de 03/12/2013, e 10.410, de 30/06/2020, comas modificações posteriores.

- A concessão do benefício depende da comprovação do grau de deficiência na data da entrada do requerimento (DER) ou do implemento dos requisitos, por meio de avaliação biopsicossocial realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar, na forma do artigo 70-A, do Decreto nº 3.048/1999.

- A aferição da incapacidade e seu grau deve observar o Índice de Funcionalidade Brasileiro Aplicado para Fins de Classificação e Concessão da Aposentadoria da Pessoa com Deficiência, o IF-BrA, que é apurado pela soma da pontuação aplicável, seguida da incidência da variação do Método Linguístico Fuzzy.

- Nesse diapasão, não se afigura suficiente a realização de perícia médica desprovida do preenchimento dos quesitos específicos, que se destinam à identificação técnica da classificação da deficiência, a partir de considerações subjetivas relacionadas à qualificação individual do segurado.

- Além disso, é imprescindível a realização de laudos conjuntos, médico e funcional, conforme preconizado pela Portaria Interministerial nº 1/2014, estabelecendo a pontuação individualizada, com a conclusão pela existência ou não de deficiência, assim como fixação de graduação suficiente para concessão do benefício de aposentadoria.

- A tabela de atribuição de pontos, a ser utilizada na avaliação funcional e no exame médico pericial, é dividida em sete domínios: sensorial; comunicação; mobilidade; cuidados pessoais; vida doméstica; educação, trabalho e vida econômica; e socialização e vida comunitária.

- Após obtida a primeira pontuação, sobre ela incide a variação decorrente do Modelo Linguístico Fuzzy, cabendo aos peritos funcional e médico sopesarem as deficiências e a sua relevância na vida do segurado nos respectivos domínios, a saber: a) deficiência auditiva, aplicável aos domínios da comunicação e socialização; b) deficiência intelectual, cognitiva e mental, em face do domínio da vida doméstica e socialização; c) deficiência motora, analisada na esfera da mobilidade e dos cuidados pessoais; e d) deficiência visual, sob o ângulo do domínio da mobilidade e da vida doméstica.

- De rigor, portanto, a anulação da sentença para que o feito retorne à fase de instrução, para fins de realização de perícias médica e funcional, na forma estabelecida pela Portaria Interministerial SDH/MPS/MF/MOG/AGU Nº 1, de 27/01/2014, no sentido de perscrutar o grau de deficiência da parte autora, mediante a apresentação de conclusão, decorrente da pontuação de ambos os laudos, que aponte especificamente: a) deficiência grave: pontuação ≤ 5.739; b) deficiência moderada: pontuação ≥ a 5.740 e ≤ a 6.354; c) deficiência leve: pontuação ≥ a 6.355 e ≤ a 7.584; ou d) insuficiente para concessão do benefício: pontuação ≥ a 7.585.

- Sentença anulada de ofício. Apelação prejudicada.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Turma, por unanimidade, decidiu anular a r. sentença de ofício, determinando a remessa dos autos à Vara de origem, para seu regular processamento, restando prejudicada a apelação interposta pela parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.