APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004402-97.2021.4.03.6106
RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
APELANTE: CB SAO JOSE DO RIO PRETO COMERCIO DE ALIMENTOS LTDA
Advogado do(a) APELANTE: MARCIO RAFAEL GAZZINEO - CE23495-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004402-97.2021.4.03.6106 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO APELANTE: CB SAO JOSE DO RIO PRETO COMERCIO DE ALIMENTOS LTDA Advogado do(a) APELANTE: MARCIO RAFAEL GAZZINEO - CE23495-A APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (Relator): Trata-se de ação ordinária ajuizada por CB SÃO JOSÉ DO RIO PRETO COMÉRCIO DE ALIMENTOS LTDA., visando ao afastamento das empregadas gestantes do trabalho presencial, o enquadramento como salário-maternidade dos valores pagos às trabalhadoras afastadas por força da Lei nº 14.151/21, bem como à declaração do direito à compensação dos pagamentos feitos a tal título com contribuições previdenciárias. A sentença reconheceu a falta de interesse de agir superveniente quanto ao pedido de afastamento das empregadas gestantes do trabalho presencial, nos termos do artigo 485, VI, do CPC, e julgou os demais pedidos improcedentes. A parte autora foi condenada ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% do valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (ID 288254409). Apelação da parte autora, na qual informa que, diante da impossibilidade de realização das atividades de forma remota, as empregadas gestantes tiveram de ser afastadas da função durante a vigência da Lei nº. 14.151/21. Afirma que foi necessário contratar outras pessoas para exercer as funções das empregadas afastadas. Sustenta que a proteção à saúde e à maternidade é dever do Estado. Afirma, ainda, que o ônus do pagamento dos salários à empregadas durante o período não pode recair sobre a empregadora, uma vez que não há contraprestação de trabalho. Pugna pela aplicação, por analogia, do artigo 394-A, § 3º, da CLT e da Solução de Consulta Cosit nº. 287/2019, aplicável aos casos em que a empregada gestante fica impossibilitada de realizar suas atividades presenciais em razão da insalubridade do ambiente de trabalho (ID 288254412). A União Federal apresentou contrarrazões (ID 288254418). É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004402-97.2021.4.03.6106 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO APELANTE: CB SAO JOSE DO RIO PRETO COMERCIO DE ALIMENTOS LTDA Advogado do(a) APELANTE: MARCIO RAFAEL GAZZINEO - CE23495-A APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (Relator): Com a devida vênia, à luz das disposições do art. 10 do Regimento Interno deste E.TRF, o problema posto nos autos é essencialmente de direito público (logo, de competência das Turmas da Segunda Seção desta Corte) porque diz respeito a pedido de imputação ou ressarcimento de verbas salariais, formulado por empregador privado em face do poder público federal, quanto a pagamentos feitos em favor de empregadas gestantes no contexto da pandemia causada pelo novo coronavírus. A meu ver, é secundária a maneira pela qual se dá a imputação ou ressarcimento (concessão de salário maternidade, compensação com contribuição previdenciária, pagamento em dinheiro ou outra via). Todavia, reconheço que restou consolidado o entendimento pela competência das Turmas da Primeira Seção, conforme decidido pelo Órgão Especial deste E.TRF, no Conflito de Competência Cível 5015710-81.2022.4.03.0000, Relator Desembargador Federal Antônio Cedenho, em 2/09/2022, posicionamento ao qual me curvo em favor da celeridade processual e da pacificação dos litígios. As circunstâncias extraordinárias geradas pela pandemia exigiram esforços de todos os segmentos (privados e públicos) em favor da preservação da vida e da saúde, sem descuidar dos também relevantes aspectos da produção, distribuição e comercialização de bens e serviços. Proposto o estado de calamidade (art. 84, XXVIII, da Constituição, Messagem nº 93, de 18/03/2020), sobreveio sua instauração pelo Congresso Nacional (art. 49, XVIII, da ordem de 1988, Decreto Legislativo n° 06, de 20/03/2020), motivando a Lei Complementar n ° 101/2000, a Lei Complementar nº 173/2020, e centenas de outros atos normativos, além de mudanças constitucionais (Emendas nºs 106/2020, 109/2021, 119/2022 e 121/2022). Todos esses atos foram editados em ambiente marcado por enormes incertezas, preocupações justificadas, perdas devastadoras de vidas humanas, expressivos impactos na dinâmica econômica privada e relevantes gastos públicos (nacionais e subnacionais). Ainda assim, as respostas foram dadas em cumprimento aos imperativos do Estado de Direito, de modo que o ordenamento jurídico pautou as tarefas extraordinárias do setor privado e dos entes estatais, evitando fragmentações que poderiam desorganizar o atendimento às necessidades emergenciais. Sem prejuízo de suas atribuições pertinentes à saúde, a União Federal se serviu de sua competência legislativa privativa para tratar de direito do trabalho (art. 21, I, da Constituição) e editou a Lei nº 14.151/2021 (alterada pela Lei nº 14.311/2022), segundo a qual, durante o período de pandemia decorrente do novo coronavírus, a empregada gestante (ainda não totalmente imunizada) permanecerá afastada da atividade de laboral presencial, devendo ficar à disposição do empregador para atividades em seu domicílio (por teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma a distância, admitida a alteração das funções durante esse período extraordinário), para o qual terá direito à sua remuneração paga pelo contratante. Essa Lei nº 14.151/2021 está assim redigida: Art. 1º Durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do coronavírus SARS-CoV-2, a empregada gestante que ainda não tenha sido totalmente imunizada contra o referido agente infeccioso, de acordo com os critérios definidos pelo Ministério da Saúde e pelo Plano Nacional de Imunizações (PNI), deverá permanecer afastada das atividades de trabalho presencial. (Redação dada pela Lei nº 14.311, de 2022) § 1º A empregada gestante afastada nos termos do caput deste artigo ficará à disposição do empregador para exercer as atividades em seu domicílio, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho a distância, sem prejuízo de sua remuneração. (Incluído pela Lei nº 14.311, de 2022) § 2º Para o fim de compatibilizar as atividades desenvolvidas pela empregada gestante na forma do § 1º deste artigo, o empregador poderá, respeitadas as competências para o desempenho do trabalho e as condições pessoais da gestante para o seu exercício, alterar as funções por ela exercidas, sem prejuízo de sua remuneração integral e assegurada a retomada da função anteriormente exercida, quando retornar ao trabalho presencial. (Incluído pela Lei nº 14.311, de 2022) § 3º Salvo se o empregador optar por manter o exercício das suas atividades nos termos do § 1º deste artigo, a empregada gestante deverá retornar à atividade presencial nas seguintes hipóteses: (Incluído pela Lei nº 14.311, de 2022) I - após o encerramento do estado de emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do coronavírus SARS-CoV-2; (Incluído pela Lei nº 14.311, de 2022) II - após sua vacinação contra o coronavírus SARS-CoV-2, a partir do dia em que o Ministério da Saúde considerar completa a imunização; (Incluído pela Lei nº 14.311, de 2022) III - mediante o exercício de legítima opção individual pela não vacinação contra o coronavírus SARS-CoV-2 que lhe tiver sido disponibilizada, conforme o calendário divulgado pela autoridade de saúde e mediante o termo de responsabilidade de que trata o § 6º deste artigo; (Incluído pela Lei nº 14.311, de 2022) IV - (VETADO). (Incluído pela Lei nº 14.311, de 2022) § 4º (VETADO). (Incluído pela Lei nº 14.311, de 2022) § 5º (VETADO). (Incluído pela Lei nº 14.311, de 2022) § 6º Na hipótese de que trata o inciso III do § 3º deste artigo, a empregada gestante deverá assinar termo de responsabilidade e de livre consentimento para exercício do trabalho presencial, comprometendo-se a cumprir todas as medidas preventivas adotadas pelo empregador. (Incluído pela Lei nº 14.311, de 2022) § 7º O exercício da opção a que se refere o inciso III do § 3º deste artigo é uma expressão do direito fundamental da liberdade de autodeterminação individual, e não poderá ser imposta à gestante que fizer a escolha pela não vacinação qualquer restrição de direitos em razão dela. (Incluído pela Lei nº 14.311, de 2022) Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Logo, a Lei nº 14.151/2021 (antes e depois da Lei nº 14.311/2022) tem conteúdo de direito do trabalho, atende à estrita legalidade (art. 22, I, e também ao art. 201, II, ambos da ordem de 1988) e representa regra especial para situação distinta da previsão geral do art. 394-A da CLT, não se revelando como empréstimo compulsório, imposto extraordinário ou nova contribuição social (art. 148, I, art. 154 e art. 195, §4º, todos da Constituição), muito menos aumento de exação já existente que ampare pleito de compensação de indébito, o que afasta argumentos quanto a aspectos tributários. A empregada gestante está habilitada para o trabalho (desde que não presencial) e fica à disposição do empregador, razão pela qual não há amparo para a concessão indiscriminada de benefício previdenciário de salário-maternidade (art. 71, art. 71-A, art. 71-B e art. 71-C, da Lei nº 8.213/1991, Convenção nº 103 da OIT e Decreto nº 10.088/2019), e nem se trata de transferência do ônus do Estado para o setor privado. É verdade que há ampla diversidade de tarefas decorrentes das relações de emprego, perfis e qualificações pessoais distintas entre gestantes, além de ambientes muito diferentes em cada domicílio, tornando presumivelmente bastante heterogênea a efetiva realização de teletrabalho ou de outra forma à distância. Também é crível que, em casos específicos, seja inviável qualquer trabalho não presencial realizado por empregadas gestantes. Contudo, a redução ou a excepcional inviabilidade do trabalho realizado por empregadas gestantes não pode ser imputada ao Estado, que tão somente adotou medidas trabalhistas legítimas de preservação de todos os interesses envolvidos no extraordinário período da pandemia. Não tivesse o poder público arcado com expressivas obrigações financeiras nesse período emergencial, e transferido ao setor privado todo e qualquer obrigação para com seus empregados (incluindo as gestantes), seria possível invocar violação à isonomia, mas não como fez a Lei nº 14.151/2021, que se contextualiza de modo juridicamente adequando, necessário e solidário ao ambiente temporário para o qual se destina. Assim, o Estado não pode ser obrigado ao pagamento dessas verbas trabalhistas devidas pelo empregador. Note-se que, na tramitação do projeto que resultou na Lei nº 14.151/2021, foi rejeitada emenda propondo a equiparação da remuneração das gestantes afastadas ao salário-maternidade. E mesmo antes das alterações feitas pela Lei nº 14.311/2022, restava evidente que se tratava de obrigação do empregador custear o salário de sua empregada gestante, durante o período da pandemia. Em suma, no exercício de sua competência normativa e valendo-se de suas atribuições discricionárias, o legislador federal deu encaminhamento consentâneo com os elementos que estiveram presentes na situação de calamidade gerada pela pandemia, distribuindo equitativamente os ônus temporários entre todos os envolvidos. Nesse contexto, o controle judicial é inviável porque não houve manifesta ou objetiva violação da discricionariedade política por parte do legislador. No âmbito deste E.TRF já se formou entendimento pela validade das disposições da Lei nº 11.151/2021, como se nota nos seguintes julgados que trago à colação: TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EMPREGADAS GESTANTES AFASTADAS NA FORMA DA LEI 14.151/2021. TUTELA DE URGÊNCIA DEFERIDA PARA EQUIPARAÇÃO DA REMUNERAÇÃO PAGA AO SALÁRIO-MATERNIDADE E COMPENSAÇÃO COM CONTRIBUIÇÕES DEVIDAS SOBRE A FOLHA DE SALÁRIO. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS. RECURSO PROVIDO. (...) 3. No caso dos autos, não há fumus boni iuris. No intuito de preservar a saúde da gestante durante a crise de saúde pública decorrente da pandemia de COVID-19, a Lei nº 14.151/2021 estabeleceu o afastamento compulsório das empregadas nessa condição, sem prejuízo de sua remuneração, mantendo-se à disposição do empregador para a realização de outras atividades por meio de trabalho remoto. 4. O texto legal vai ao encontro do quanto previsto no artigo 201, inciso II, da Constituição da República, ao instituir política pública de proteção à mãe e ao nascituro até que se estabeleça o controle sanitário da pandemia. 5. Não obstante, a Lei nº 14.151/2021 é silente quanto ao término da situação excepcional. É igualmente silente quanto aos ônus decorrentes do afastamento compulsório das empregadas gestantes. Nesse contexto, recai sobre o empregador, exclusivamente, o ônus econômico do afastamento das empregadas gestantes. 6. Embora haja aparente omissão legislativa, deve-se considerar que, na tramitação do projeto de lei, foi apresentada emenda ao projeto, propondo a equiparação da remuneração das gestantes afastadas ao salário-maternidade, tendo sido a proposta foi rejeitada. Assim, não cabe ao Poder Judiciário suprir a decisão legislativa e atuar como legislador positivo. 7. É vedado o uso de analogia ou equidade para estender benefício tributário ou mesmo dispensar a cobrança de tributo, conforme determina o § 2º do artigo 108 do Código Tributário Nacional. Precedente. 8. Ausentes os requisitos ensejadores da concessão da tutela provisória de urgência, no caso.Precedente. 9. Agravo de instrumento provido.” (TRF3. AGRAVO DE INSTRUMENTO / SP 5000060-91.2022.4.03.0000. Primeira Turma. Relator: Desembargador Federal Hélio Nogueira. Data do Julgamento: 12/05/2022. Data da Publicação/Fonte: Intimação via sistema, 18/05/2022) AGRAVO DE INSTRUMENTO. EMERGÊNCIA DE SAÚDE PÚBLICA DE IMPORTÂNCIA NACIONAL DECORRENTE DO NOVO CORONAVÍRUS. AFASTAMENTO DO TRABALHO PRESENCIAL DAS EMPREGADAS GESTANTES. ART. 1º DA LEI Nº 14.151/21. IMPOSSIBILIDADE DE EXERCÍCIO DO TELETRABALHO NÃO ALTERA A NATUREZA DO SALÁRIO-MATERNIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE RESPONSABILIZAÇÃO DA AUTARQUIA PREVIDENCIÁRIA PELO PAGAMENTO DA REMUNERAÇÃO DEVIDA ÀS EMPREGADAS GESTANTES IMPOSSIBILITADAS DE TRABALHAR REMOTAMENTE EM RAZÃO DA ÁREA DE ATUAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO ANTES DO TRÂNSITO EM JULGADO DA DECISÃO DEFINITIVA. ART. 170-A DO CTN. SÚMULA Nº 212/STJ. DECISÃO AGRAVADA REFORMADA. AGRAVO PROVIDO. AGRAVO INTERNO PREJUDICADO. (...) 2. Ao dispor sobre o afastamento da empregada gestante das atividades de trabalho presencial durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do novo coronavírus, o artigo 1º da Lei nº 14.151/2021 determinou que no período em que durar a situação emergencial decorrente do Coronavírus as empregadas gestantes serão afastadas do trabalho presencial e ficarão à disposição dos respectivos empregadores para exercer suas atividades em regime de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho à distância. 3. Trata-se à evidência, de situação excepcional causada pela pandemia da Covid19 e que busca proteger a gestante da possibilidade de contágio da grave enfermidade mediante a substituição das atividades presenciais pelo regime de teletrabalho ou trabalho remoto. Nestas condições, eventual impossibilidade de exercício do teletrabalho em alguma área específica não tem o condão de alterar a natureza dos valores pagos a título de remuneração para benefício previdenciário, in casu, o salário-maternidade. 4. Anoto, por relevante, que nos termos do artigo 71 da Lei nº 8.213/91 “O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade”. Nestas condições, não tendo ocorrido a condição legal para o pagamento do benefício em questão, não há que se falar na responsabilização da autarquia previdenciária pelo pagamento da remuneração devida às empregadas gestantes que, em razão da área de atuação, estão impossibilitadas de trabalhar remotamente, como pretende a agravada. 5. No caso concreto, não há comprovação inequívoca, ao menos em análise própria deste momento processual, de que há incompatibilidade do trabalho em home office para as empregadas gestantes da agravada. Ainda que assim não fosse, registro que eventual incompatibilidade de desempenho da atividade laboral de empregadas gestantes em regime de teletrabalho deve ser objeto de debate no âmbito da relação de trabalho, não gerando qualquer obrigação da autarquia previdenciária em ressarcir ao empregador o valor correspondente. 6. Por fim, quanto ao pedido de autorização para compensação ou restituição de valores em sede de tutela antecipada, registro que tal procedimento encontra expressa vedação legal no artigo 170-A do CTN, segundo o qual “É vedada a compensação mediante o aproveitamento de tributo, objeto de contestação judicial pelo sujeito passivo, antes do trânsito em julgado da respectiva decisão judicial” (negritei). 7. Cabe observar também que o C. STJ firmou o entendimento, sedimentado na Súmula nº 212, que desautoriza o acolhimento do pedido de liminar nos termos em que formulado pela impetrante, ao anotar que “A compensação de créditos tributários não pode ser deferida em ação cautelar ou por medida liminar cautelar ou antecipatória”. 8. Agravo provido para indeferir a tutela de urgência pleiteada pela agravada nos autos de origem. Agravo interno prejudicado. (TRF3. AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO / SP 5026689-39.2021.4.03.0000. Primeira Turma. Relator: Desembargador Federal WILSON ZAUHY. Data do Julgamento: 03/05/2022. Data da Publicação/Fonte: Intimação via sistema, 09/05/2022) Conforme exposto, sem razão as impetrantes, pois o legislador federal, ao exercer a competência legislativa no âmbito de suas atribuições discricionárias, deu ao caso uma solução adequada ao quadro fático decorrente da pandemia de COVID-19, mediante a distribuição equitativa dos ônus entre todos os agentes sociais, sendo inviável o controle jurisdicional dos critérios escolhidos, os quais não desbordaram da competência constitucional traçada no tocante à elaboração das leis. No caso dos autos, a parte autora informa que, devido à sua atividade, de restaurante, não é passível de realização de trabalho à distância pelas gestantes. Trata-se de motivo insuficiente para desonerar a empresa de suas obrigações legais. Ante o exposto, nego provimento à apelação. Em vista do trabalho adicional desenvolvido na fase recursal e considerando o conteúdo da controvérsia, com fundamento no art. 85, § 11, do CPC, a verba honorária fixada em primeiro grau de jurisdição deve ser majorada em 10%, e observada a publicação da decisão recorrida a partir de 18/03/2016, inclusive (E.STJ, Agravo Interno nos Embargos de Divergência 1.539.725/DF, Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, 2ª Seção, DJe de 19/10/2017). É o voto.
E M E N T A
DIREITO TRABALHISTA. DIREITO PÚBLICO. PANDEMIA. NOVO CORONAVÍRUS. ESTADO DE CALAMIDADE. EMPREGADA GESTANTE. TELETRABALHO. LEI Nº 14.151/2021. IMPUTAÇÃO OU RESSARCIMENTO PELO PODER PÚBLICO. IMPOSSIBILIDADE. LICENÇA-MATERNIDADE. DESCARACTERIZAÇÃO. DISTRIBUIÇÃO TEMPORÁRIA DE ÔNUS.
- Sem prejuízo de suas atribuições pertinentes à saúde, a União Federal se serviu de sua competência legislativa privativa para tratar de direito do trabalho (art. 21, I, da Constituição) e editou a Lei nº 14.151/2021 (alterada pela Lei nº 14.311/2022), segundo a qual, durante o período de pandemia decorrente do novo coronavírus, a empregada gestante (ainda não totalmente imunizada) permanecerá afastada da atividade de laboral presencial, devendo ficar à disposição do empregador para atividades em seu domicílio (por teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma a distância, admitida a alteração das funções durante esse período extraordinário), para o qual terá direito à sua remuneração paga pelo contratante.
- Logo, a Lei nº 14.151/2021 (antes e depois da Lei nº 14.311/2022) tem conteúdo de direito do trabalho, atende à estrita legalidade (art. 22, I, e também ao art. 201, II, ambos da ordem de 1988) e representa regra especial para situação distinta da previsão geral do art. 394-A da CLT, não se revelando como empréstimo compulsório, imposto extraordinário ou nova contribuição social (art. 148, I, art. 154 e art. 195, §4º, todos da Constituição), muito menos aumento de exação já existente que ampare pleito de compensação de indébito, o que afasta argumentos quanto a aspectos tributários. A empregada gestante está habilitada para o trabalho (desde que não presencial) e fica à disposição do empregador, razão pela qual não há amparo para a concessão indiscriminada de benefício previdenciário de salário-maternidade (art. 71, art. 71-A, art. 71-B e art. 71-C, da Lei nº 8.213/1991, Convenção nº 103 da OIT e Decreto nº 10.088/2019), e nem se trata de transferência do ônus do Estado para o setor privado.
- É verdade que há ampla diversidade de tarefas decorrentes das relações de emprego, perfis e qualificações pessoais distintas entre gestantes, além de ambientes muito diferentes em cada domicílio, tornando presumivelmente bastante heterogênea a efetiva realização de teletrabalho ou de outra forma a distância. Também é crível que, em casos específicos, seja inviável qualquer trabalho não presencial realizado por empregadas gestantes. Contudo, a redução ou a excepcional inviabilidade do trabalho realizado por empregadas gestantes não pode ser imputada ao Estado, que tão somente adotou medidas trabalhistas legítimas de preservação de todos os interesses envolvidos no extraordinário período da pandemia.
- Não tivesse o poder público arcado com expressivas obrigações financeiras nesse período emergencial, e transferido ao setor privado todo e qualquer obrigação para com seus empregados (incluindo as gestantes), seria possível invocar violação à isonomia, mas não como fez a Lei nº 14.151/2021, que se contextualiza de modo juridicamente adequando, necessário e solidário ao ambiente temporário para o qual se destina. Assim, o Estado não pode ser obrigado ao pagamento dessas verbas trabalhistas devidas pelo empregador.
- No caso dos autos, a parte autora informa que, devido às suas atividades, não é possível a permanência das gestantes no local de trabalho, tampouco a realização de trabalho à distância. Trata-se de motivo insuficiente para desonerar a empresa de suas obrigações legais.
- Apelação improvida.