Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000078-04.2017.4.03.6139

RELATOR: Gab. 04 - DES. FED. ALESSANDRO DIAFERIA

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

APELADO: NAIR DOMINGUES BATISTA

Advogado do(a) APELADO: RAFAEL ANTUNES DE LIMA ARANTES - SP348120-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000078-04.2017.4.03.6139

RELATOR: Gab. 04 - DES. FED. ALESSANDRO DIAFERIA

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

 

APELADO: NAIR DOMINGUES BATISTA

Advogado do(a) APELADO: RAFAEL ANTUNES DE LIMA ARANTES - SP348120-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

Trata-se de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal contra Nair Domingues Batista, postulando a anulação do contrato de “compra e venda com financiamento habitacional” firmado entre a ré e a Caixa Econômica Federal no âmbito do Programa Minha Casa Minha Vida – Faixa 1, bem como do respectivo registro junto ao Cartório de Registro de Imóveis de Itapeva ou a proibição de realização do registro. Também requer a expedição de mandado de imissão na posse em favor da Caixa Econômica Federal para desocupação do imóvel e reinclusão em programa habitacional. Pleiteia, ainda, a condenação da ré ao pagamento de R$700,00 (setecentos reais), pro rata die, por mês de ocupação do imóvel, desde o recebimento das chaves até a data da efetiva desocupação, devidamente corrigidos, bem como a indenizar eventual deterioração causada ao imóvel, em favor do Fundo de Arrendamento Residencial – FAR. Por fim, pugna pela condenação da ré ao pagamento de valor não inferir a R$ 7.000,00 (sete mil reais) a título de dano moral coletivo, também em favor do FAR, e que seja a ré proibida de obter futuros benefícios habitacionais e seja declarada a má-fé da posse exercida pela ré sobre o imóvel no período de ocupação.

Foi proferida decisão indeferindo a inicial e julgando extinto o feito sem resolução do mérito, com fundamento no art. 485, I, do CPC, em relação aos pedidos de anulação do registro do imóvel, de expedição de mandado de imissão na posse em favor da Caixa Econômica Federal, de condenação da ré a indenizar eventual deterioração do imóvel, de proibição de que a ré obtenha futuros benefícios habitacionais e de declaração de má-fé da posse exercida pela ré sobre o imóvel no período de ocupação. Por meio desta mesma decisão também foi determinada a emenda da inicial (ID 123721756).

Por decisão de ID 123721759, o Juízo de primeiro grau recebeu a emenda à inicial e deferiu o pedido de liminar para “determinar a proibição de que a ré Nair Domingues Batista obtenha a posse direta e de que receba as chaves do imóvel do Residencial Morada do Bosque, ressalvada a reserva do imóvel até o deslinde da causa, sem que se proceda à sua destinação a outro beneficiário do PMCMV”.

Foi deferido pedido de ingresso da Caixa Econômica Federal como litisconsorte do autor (ID 123721884) e, também, pedido de produção de prova oral formulado pelo Ministério Público Federal (ID 123721900).

Sobreveio a prolação de sentença de improcedência do pedido inicial, sem condenação ao pagamento de custas e honorários advocatícios (ID 123721945).

Recorre o Ministério Público Federal, sustentando que a ré se inscreveu no Programa Minha Casa Minha Vida omitindo informação de que era titular de outro imóvel residencial e que, portanto, incorreu em fraude. Reitera a parte apelante os pedidos formulados na inicial (ID 123721948).

Com contrarrazões, subiram os autos (ID 123721952).

A Subsecretaria de Registro e Informações Processuais – UFOR fez a remessa dos autos à Procuradoria Regional da República, que apresentou parecer, manifestando-se pelo provimento do recurso de apelação (ID 127438815).

É o relatório.

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000078-04.2017.4.03.6139

RELATOR: Gab. 04 - DES. FED. ALESSANDRO DIAFERIA

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

 

APELADO: NAIR DOMINGUES BATISTA

Advogado do(a) APELADO: RAFAEL ANTUNES DE LIMA ARANTES - SP348120-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

Narra o Ministério Público Federal em sua peça inaugural que foram implantados na cidade de Itapeva/SP dois projetos do Programa Minha Casa Minha Vida - Faixa 1, destinados à população com renda familiar de até R$1.600,00, e que, por meio de cruzamento de bancos de dados tais como ITESP, CDHU, FHNIS e CADMUT, verificou-se a existência de 253 casos suspeitos de fraude, entre os quais o de Nair Domingues Batista, ora ré.

Aduz o “parquet” na inicial que a ré realizou cadastro no referido programa habitacional em 18/03/2015, declarando não possuir imóvel residencial e ser sua família composta por duas pessoas, ela e o filho Rafael Domingues Batista, com renda familiar de R$ 780,00.

Consta, ainda, da exordial que com tais informações a ré foi habilitada no Programa e, em 24/12/2015, adquiriu a propriedade de uma unidade habitacional do Residencial Morada do Bosque, Bairro de Cima – Itapeva/SP.

Também consta que a investigação se iniciou após a Câmara Municipal ter realizado o cruzamento de dados dos candidatos do PMCMV com outros bancos de dados e que, então, foram realizadas visitas de assistentes sociais do Município às residências das pessoas dos casos considerados suspeitos.

Relata o MPF que, com as investigações, foi apurado que a ré é proprietária do imóvel descrito na matrícula n.º 30.957, situado no Rua Iperó, n.º 462, Vila Nova, Itapeva/SP, o qual fora doado pelo Município à ré e a Alice Domingues Batista por instrumento particular datado de 22/01/2007, sendo que ambas figuram como contribuintes de IPTU do referido imóvel.  

Segundo a inicial, a assistente social Lidiane Assunção de A. Lima e a psicóloga Patrícia Luísa dos Santos, vinculadas à Prefeitura Municipal de Itapeva, realizaram visita à residência da ré em 23/11/2015 e que o parecer elaborado após a visita “expressamente consignou que a ré não atende aos critérios do programa, já que ‘comprovado que a mesma possui imóvel em seu nome’”. Também consta que a ré por diversas vezes afirmou residir no referido imóvel: no cadastro no programa, no relatório social de 23/11/215 e no contrato aquisitivo firmado com o FAR em 24/12/2015.

Sustenta o “parquet” que pelo fato de Nair Domingues Batistaser proprietária de outro imóvel residencial, jamais poderia ter sido habilitada e contemplada no Minha Casa Minha Vida faixa 1”, concluindo que a ré incorreu em fraude.

Proferida sentença de improcedência do pedido, dela recorre o Ministério Público Federal.

Antes de iniciar o exame do apelo ministerial, anoto que, conforme orientação consolidada no Superior Tribunal de Justiça, a Lei de Ação Popular (Lei 4.717/65), a Lei de Ação Civil Pública (Lei 7.347/85) e a Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92) formam um microssistema legal de proteção aos direitos coletivos, de modo que se aplica à ação civil pública o disposto no art. 19 da Lei 4.717/65, verbis: “A sentença que concluir pela carência ou pela improcedência da ação está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal; da que julgar a ação procedente caberá apelação, com efeito suspensivo”.

Confira-se:

 

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. REEXAME NECESSÁRIO. NÃO CABIMENTO. APLICAÇÃO, POR ANALOGIA, DO ART. 19 DA LEI 4.717/1965.

1. Segundo jurisprudência consolidada desta Corte, a Lei da Ação Popular (Lei 4.717/65), a Lei da Ação Civil Pública (Lei 7.347/85) e a Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92) formam o denominado microssistema legal de proteção aos interesses ou direitos coletivos, por isso "a supressão de lacunas legais deve ser, a priori, buscada dentro do próprio microssistema" (REsp 1.447.774/SP, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 21/8/2018, DJe 27/8/2018).

2. Aplica-se o art. 19 da Lei n. 4.717/65 por analogia às ações civis públicas, de forma que a sentença de procedência não deve ser submetida ao reexame necessário, afastando-se o disposto no art. 475 do CPC/73.

3. Agravo interno não provido.

(AgInt no REsp n. 1.749.850/SC, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 29/5/2023, DJe de 1/6/2023.)

 

 

PROCESSO CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. REEXAME NECESSÁRIO. CABIMENTO.

1. Trata-se de agravo interno interposto pelo SINDICATO DOS PROFISSIONAIS DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, contra decisão que deu provimento ao recurso especial, para estabelecer o entendimento de que as sentenças de improcedência de ação civil pública sujeitam-se indistintamente ao reexame necessário.

2. Por aplicação analógica da primeira parte do art. 19 da Lei n. 4.717/1965, as sentenças de improcedência de ação civil pública sujeitam-se indistintamente ao reexame necessário. Nesse sentido: EREsp 1.220.667/MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 30/6/2017.

3. Agravo interno não provido.

(AgInt no REsp n. 1.817.056/ES, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 22/10/2019, DJe de 20/11/2019.)

 

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. SENTENÇA QUE EXTINGUIU O PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, POR CARÊNCIA DE AÇÃO (FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL). REEXAME NECESSÁRIO. CABIMENTO. APLICAÇÃO DO ART. 19 DA LEI 4.717/1965. ENTENDIMENTO DESTA CORTE SUPERIOR. AGRAVO INTERNO DA FEDERAÇÃO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1. Nos termos do que decidido pelo Plenário do STJ, aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (Enunciado Administrativo 2).

2. Conforme o entendimento desta Corte Superior, o art. 19 da Lei 4.717/1965 aplica-se analogicamente, também, às Ações Civis Públicas, para submeter as sentenças de improcedência ao reexame necessário. Julgados: AgInt no REsp. 1.264.666/SC, Rel. Min. SÉRGIO KUKINA, DJe 22.9.2016; AgRg no REsp. 1.219.033/RJ, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 25.4.2011.

3. Ao contrário do que alegado pela parte agravante, o art. 19 da Lei 4.717/1965 incide, também, para as hipóteses de carência de ação, conforme a expressa dicção do dispositivo legal.

4. No presente caso, tendo a sentença julgado extinto o processo sem resolução de mérito, justamente pela carência de ação (fls. 347/351) - falta de interesse processual, prevista no art. 267, VI do CPC/1973 -, e considerando a jurisprudência deste STJ quanto à aplicação analógica do sobredito art. 19 às Ações Civis Públicas, é mesmo imprescindível o reexame necessário.

5. Ainda que existisse eventual vício na decisão singular, este seria convalidado pelo julgamento do presente Agravo Interno perante o Órgão Colegiado, sendo incabível o reconhecimento de nulidade.

Julgados: AgInt no REsp. 1.709.018/SP, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 2.8.2018; AgInt no REsp. 1.533.044/AC, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, DJe 2.2.2017.

6. Agravo Interno da Federação a que se nega provimento.

(AgInt no REsp n. 1.547.569/RJ, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 17/6/2019, DJe de 27/6/2019.)

 

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REPARAÇÃO DE DANOS AO ERÁRIO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. REMESSA NECESSÁRIA. ART. 19 DA LEI Nº 4.717/64. APLICAÇÃO.

1. Por aplicação analógica da primeira parte do art. 19 da Lei nº 4.717/65, as sentenças de improcedência de ação civil pública sujeitam-se indistintamente ao reexame necessário. Doutrina.

2. Recurso especial provido.

(REsp n. 1.108.542/SC, relator Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 19/5/2009, DJe de 29/5/2009.)

 

 

Assim, considerando que no caso dos autos foi proferida sentença de improcedência do pedido, submete-se à remessa oficial, ora tida por interposta.

Isto estabelecido, observa-se que o Ministério Público Federal formulou os seguintes pedidos na inicial:

 

“4. Ao final, seja julgada procedente a presente ação, confirmando-se a tutela provisória deferida, para o fim de:

4.1 Decretar-se a nulidade do contrato de compra e venda com financiamento habitacional firmado entre a ré e a Caixa Econômica Federal;

4.2 Decretar-se a nulidade do registro de imóveis respectivo, (matrícula11) do Cartório de Registro de Imóveis de Itapeva, ou, nos termos do art. 324, §1º, II do Código de Processo Civil, proibir-se a efetivação do registro ainda não realizado;

4.3 Proibir-se que a ré obtenha a posse direta e que receba as chaves do imóvel, ou, nos termos do art. 324, §1º, II do Código de Processo Civil, expedir-se Mandado de Imissão na Posse, em favor da Caixa Econômica Federal, com prazo de 15 (quinze) dias para desocupação voluntária do imóvel; destinando-se então o imóvel à pronta reinclusão no programa habitacional;

4.4 Condenação da ré, nos termos do art. 324, §1º, II do Código de Processo Civil, ao pagamento de R$700,00 (setecentos reais), pro rata die, por mês de eventual ocupação do imóvel, contados da data de recebimento das chaves, até a data da efetiva desocupação, devidamente corrigidos à data do pagamento, a título de indenização por danos materiais e enriquecimento indevido, ao Fundo de Arrendamento Residencial – FAR (CNPJ 03.190.167/0001-50);

4.5 Condenação da ré, também a título de indenização por danos materiais, a indenizar prontamente a eventual deterioração causada ao imóvel, a ser apurada em fase de liquidação de sentença, nos termos do art. 324, §1º, II do Código de Processo Civil, ao Fundo de Arrendamento Residencial - FAR;

4.6 Condenação da ré ao pagamento de valor fixado ao prudente arbítrio jurisdicional, em patamar não inferior a R$7.000,00 (sete mil reais), a título de dano moral coletivo, ao Fundo de Arrendamento Residencial – FAR;

4.7 Condenação da ré a ser mantida, para todos os efeitos legais afetos à vedação que obtenha futuros benefícios habitacionais, nos cadastros da Caixa Econômica Federal e em outros bancos de dados públicos análogos, como contemplada pelo Programa Minha Casa Minha Vida, faixa 1, tal como consta atualmente;

4.8 Declaração, nos termos do art. 324, §1º, II do Código de Processo Civil, para todos os efeitos legais, do caráter de má-fé da posse eventualmente exercida pela ré sobre o imóvel durante todo o período de ocupação.”

 

Verifica-se, ainda, que o Juízo de primeiro grau proferiu decisão indeferindo a inicial e julgando extinto o feito sem resolução do mérito com relação aos seguintes pedidos:

 

“1) INDEFIRO em parte o pedido de item 4.2, no que respeita à pretensão de decretar a nulidade do registro de imóveis, nos termos do art. 330, III, do CPC, pelo que julgo extinto o processo, sem resolução do mérito, na forma do art. 485, I, do CPC;

2) INDEFIRO em parte o pedido de item 4.3, no que respeita à pretensão de se determinar a expedição de mandado de imissão na posse, em favor da Caixa Econômica Federal, nos termos do art. 330, III, do CPC, pelo que julgo extinto o processo, sem resolução do mérito, na forma do art. 485, I, do CPC;

3) INDEFIRO os pedidos de itens 4.5 e 4.8, nos termos do art. 330, III, do CPC, pelo que julgo extinto o processo, sem resolução do mérito, na forma do art. 485, I, do CPC;

4) INDEFIRO o pedido de item 4.7, nos termos do art. 330, caput, e §1º, III, do CPC, nos termos do art. 330, caput, e §1º, I, do CPC, pelo que julgo extinto o processo, sem resolução do mérito, na forma do art. 485, I, do CPC, e;

5) DETERMINO ao autor que EMENDE a petição inicial, no prazo de 30 (trinta) dias, para apresentar aos autos a íntegra dos documentos que precederam à instauração do procedimento PIC 1.34.038.000148/2016/59, sob pena de indeferimento.”

 

Conforme informações do sistema PJe - 2º Grau, contra a referida decisão interlocutória o Ministério Público Federal interpôs agravo de instrumento (nº 5012804-94.2017.4.03.0000), o qual não foi conhecido por decisão contra a qual não foi manejado recurso, tendo o “decisum” transitado em julgado em 07/12/2023.

Neste cenário, considerando que, em relação aos pedidos elencados acima, o feito foi extinto sem resolução do mérito por decisão interlocutória já transitada em julgado, conclui-se que a sentença de mérito diz respeito apenas aos pedidos remanescentes.

Assim, o apelo ministerial não ultrapassa o juízo de admissibilidade no ponto em que reitera pedidos em relação aos quais a inicial foi indeferida.

Passo, então, a examinar os pedidos para os quais houve pronunciamento de mérito na sentença, a saber: anulação do contrato de financiamento imobiliário firmado entre a ré a CEF; proibição de realização do respectivo registro junto ao cartório competente; reinclusão do imóvel em programa habitacional; condenação da parte ré ao pagamento de valores a título de danos materiais e dano moral coletivo.

O Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV) foi instituído pela Lei 11.977/2009, tendo por finalidade criar mecanismos de incentivo à produção e aquisição de novas unidades habitacionais ou requalificação de imóveis urbanos e produção ou reforma de habitações rurais, para famílias com renda mensal de até R$ 4.650,00 (art. 1º, “caput”).

É o Poder Executivo que definirá os parâmetros de priorização e enquadramento dos beneficiários do PMCMV (art. 3º, §3º, inciso I), sendo que os Estados, Municípios e Distrito Federal poderão fixar outros critérios de seleção de beneficiários, previamente aprovados pelos respectivos conselhos locais de habitação, quando existentes, e em conformidade com as respectivas políticas habitacionais e as regras estabelecidas pelo Poder Executivo federal (art. 3º, §4º).

Foi editado o Decreto 7.499/2011 regulamentando o PMCMV, sendo que, segundo disposto no art. 8º, as operações realizadas com recursos provenientes da integralização de cotas no FAR (Fundo de Arrendamento Residencial) e recursos transferidos ao FDS (Fundo de Desenvolvimento Social), beneficiarão famílias com renda mensal de até R$ 1.600,00.

Sobreveio, também, a Portaria Interministerial 477/2013, dos Ministérios das Cidades, Fazenda, e Planejamento, Orçamento e Gestão, assim dispondo:

 

Art. 1o As operações com recursos advindos da integralização de cotas do Fundo de Arrendamento Residencial (FAR), contratadas no âmbito do Programa Nacional de Habitação Urbana (PNHU), integrante do Programa Minha Casa, Minha Vida (PMCMV), ficam regulamentadas nos termos desta Portaria, no que se refere a:
 I - requisitos de enquadramento dos beneficiários;

II - valor da subvenção econômica;

III - participação financeira dos beneficiários.

 

Art. 2o As operações têm por objetivo atender a famílias com renda bruta mensal de até R$ 1.600,00 (um mil e seiscentos reais), desde que observadas as seguintes condições:

I - o beneficiário não seja proprietário ou promitente comprador de imóvel residencial ou detentor de financiamento habitacional em qualquer localidade do país;

II - o beneficiário não tenha recebido benefício de natureza habitacional oriundo de recursos orçamentários da União, do FAR, do FDS ou de descontos habitacionais concedidos com recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).
 
Parágrafo único. Não ficará impedido de contratar as operações de que trata o caput o beneficiário que houver recebido subvenções ou descontos destinados à aquisição de material de construção, para fins de conclusão, ampliação, reforma ou melhoria de unidade habitacional.

(negrito nosso)

 

Em 06 de agosto de 2015 foi editada a Portaria Interministerial nº 412 do Ministério das Cidades, que aprova o Manual de Instruções para Seleção de Beneficiários do Programa Minha Casa, Minha Vida – PMCMV. Destaco o teor do item 2.1 do referido Manual:

 

2 CRITÉRIOS DE PRIORIZAÇÃO DOS CANDIDATOS

2.1 Para fins de seleção dos candidatos a beneficiários, os municípios, estados e Distrito Federal deverão observar, obrigatoriamente, condições de enquadramento e critérios nacionais de priorização, podendo adotar, ainda, até 3 (três) critérios adicionais.

2.1.1 As condições de enquadramento dos candidatos a beneficiários são:

a) renda familiar compatível com a modalidade; e

b) não ser proprietário, cessionário ou promitente comprador de imóvel residencial.

(negrito nosso)

 

Nota-se que a inscrição no Programa Minha Casa Minha Vida depende do preenchimento de diversos requisitos, determinando a Lei 11.977/09 a observância da regulamentação do Poder Executivo federal e também dos entes federativos locais. No Município de Itapeva, o PMCMV é regulamentado pelo Decreto nº 8.324/2014.

Feitas essas considerações, passo à análise do caso concreto.

A controvérsia estabelecida nos autos recai na ocorrência ou não de fraude consistente em suposta omissão de informação de que a ré já era proprietária de um imóvel residencial, onde morava com seu filho.

Dos elementos produzidos no procedimento investigatório levado a cabo pelo Ministério Público Federal, observa-se que em 23/11/2015 foi realizada entrevista com a ré em sua residência, na Rua Iperó, nº 462, Vila Nova – Itapeva/SP, pela assistente social Lidiane Assunção de A. Lima e pela psicóloga Patrícia Luísa dos Santos, vinculadas à Prefeitura Municipal de Itapeva/SP, destacando-se o seguinte trecho do relatório de ID 123721743 - Pág. 5:

 

“Segundo a Sra. Nair, é pensionista e recebe o valor de R$ 788,00 e a residência é uma herança deixada pela mãe (falecida), na qual também pertence a sua irmã Alice Domingues Batista (falecida).

Há 35 anos a Sra. Nair relata que reside no endereço citado acima, com seu filho Rafael Domingues Batista, 32 anos, garçom e a decisão de se inscrever no Programa Minha Casa Minha Vida é porque a sobrinha quer vender a residência e diante de tal situação não terá condições de comprar outro imóvel”.

 

Concluem as subscritoras do relatório que Nair Domingues Batista “não atende os critérios para inclusão no Programa Minha Casa Minha Vida, já que comprovado que a mesma possui imóvel em seu nome”.

O contrato de financiamento imobiliário para aquisição de imóvel residencial situado no loteamento Morada do Bosque, no âmbito do Programa Minha Casa Minha Vida – SFH/FAR, foi assinado pela ré, junto à Caixa Econômica Federal, em 24/12/2015 (ID 123721744 - Pág. 1 a ID 123721747 - Pág. 4).

Segundo a matrícula nº 30.957 junto ao Registro de Imóveis de Itapeva/SP, o imóvel localizado na rua Iperó foi adquirido pela Prefeitura Municipal de Itapeva em 19/07/2007 e doado a Nair Domingues Batista e Alice Domingues Batista por instrumento particular datado de 22/01/2007 e registrado em 18/08/2009, constando que a doação foi realizada "com a colaboração do Governo do Estado de São Paulo, através da Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo ‘José Gomes da Silva’ - ITESP, vinculada à Secretaria da Justiça e da defesa da Cidadania” (ID 123721752 - Pág. 2).

Conforme memoria descritivo de ID 123721768 - Pág. 8, o referido imóvel está situado em área de 92,12m2.

Em 10/05/2017 foi realizada diligência por técnico do Ministério Público Federal no imóvel localizado na Rua Iperó, nº 462, transcrevendo-se o seguinte trecho da respectiva certidão (ID 123721754 - Pág. 5):

 

“No dia 10 de maio do corrente ano (2017) fui até o endereço da rua Iperó 462, Vila Nova. Fui atendido por Rafael Domingues Batista Maia o qual me declarou que reside no imóvel com sua mãe, Nair Domingues Batista. Declarou também que o imóvel em questão foi herança deixada por sua falecida Avó e que o mesmo não pertence somente a eles e possui outros herdeiros. Rafael disse não estar de posse de nenhuma documentação referente ao imóvel.”

 

Em sua contestação, a ré sustenta que “o imóvel o qual consta matrícula de nº 30.957 registrado em seu nome e de sua irmã Alice Domingues Batista é fruto de herança deixada por sua genitora Maria Domingues Batista” e que “após seu óbito a ré e sua irmã como herdeiras providenciaram junto a Prefeitura Municipal de Itapeva e o ITESP a regularização dos documentos do imóvel, passando-se este às suas propriedades em junho de 2009”.

Também aduz que a “coproprietária Alice, irmã da ré veio a falecer no ano de 2011, deixando sua parte do imóvel aos seus filhos e herdeiros Aline Batista de Lima e Danilo Batista, também já falecido deixando seu quinhão à sua irmã Aline”, e que o imóvel está à venda, sendo que com o valor do quinhão que lhe cabe não conseguiria realizar a compra de qualquer outro imóvel. Sustenta a ré que o fato de ser coproprietária deste imóvel não impede sua participação no Programa (ID 123721767).

O Juízo sentenciante entendeu que a norma infralegal que regulamenta o Programa Minha Casa Minha Vida não proíbe a inscrição de coproprietário e que “considerando que o terreno só contém uma casa e que pertence a duas pessoas, a posse direta da metade do imóvel pode ser exigida a qualquer tempo, de modo que a autoria não teria onde morar”.

De fato, considerando os objetivos previstos em lei do Programa Minha Casa Minha Vida, a situação de titularidade da propriedade de um imóvel em condomínio guarda peculiaridades, especialmente quando os coproprietários são de unidades familiares diferentes, como no caso dos autos. Além disso, o terreno da residência da ré não é de tamanho vultoso e, pelo que consta, somente há uma casa edificada.   

Ademais, é de grande relevância para a solução do caso o depoimento da testemunha Patrícia Luísa dos Santos Galdino, psicóloga, que trabalhou no Programa Minha Casa Minha Vida a fim de averiguar o preenchimento dos requisitos necessários para regular inscrição no Programa.

A referida testemunha declarou se recordar de ter entrevistado a ré, e que esta afirmou morar com o filho numa casa que recebeu de herança da falecida mãe e que também pertencia à irmã, que também já tinha falecido. Declarou, ainda, a testemunha que elaborou um pequeno relatório contendo as informações prestadas pela ora ré sobre a renda e a casa.

Neste cenário, constata-se que a ré não escondeu a informação sobre a casa quando entrevistada por pessoa responsável pela averiguação da regularidade das inscrições no Programa. Ou seja, a Caixa Econômica Federal teria como, por meios próprios, apurar a situação da ré administrativamente e eventualmente excluí-la do Programa se entendesse que seria o caso.

Com efeito, conforme a documentação acostada aos autos, a entrevista da ré pela assistente social e pela psicóloga que estavam trabalhando no Programa foi realizada em 23/11/2015, ao passo que o contrato de financiamento imobiliário somente foi assinado em 24/12/2015, ou seja, um mês depois, tempo hábil para a adoção de providências se este fosse o caso.

Também digno de nota que, conforme consta da própria inicial, a ré não se furtou de informar para fins de inscrição no PMCMV o endereço do imóvel objeto de questionamentos como sendo o de sua residência. Vale dizer, a hipótese não é de tentativa de deixar às sombras o fato da existência do referido imóvel. Com as informações prestadas pela ré, os responsáveis pelo Programa poderiam obter, sem maiores obstáculos, informações sobre a titularidade da propriedade.  

Se foi permitido que Nair Domingues Batista assinasse o contrato de financiamento imobiliário mesmo após a elaboração de relatório concluindo pelo não preenchimento dos requisitos em razão da existência do imóvel em questão, os motivos para tanto são imputáveis aos responsáveis pelo Programa, que poderiam ou não acolher a recomendação do relatório.

Cumpre salientar que, conforme exegese do art. 113 do Código Civil, nos negócios jurídicos a má-fé não se presume, devendo ser devidamente comprovada, o que não ocorreu no caso dos autos.

Ao contrário, o que se observa da análise do conjunto probatório é que a ré não tentou ludibriar a psicóloga que a entrevistou, tendo prontamente prestado informações sobre a casa onde residia com o filho, o que corrobora sua versão apresentada em contestação de que a ré e a irmã receberam a casa da mãe e que, após o óbito da genitora, providenciaram a regularização do imóvel, e que “não houve tentativa de subterfúgio ou má fé. A ré somente se inscreveu no programa pelo fato de não ter seu direito fundamental à moradia garantido, já que sua permanência no citado imóvel é temporária e sua condição de coproprietária não é suficiente para lhe garantir abrigo permanente”.

Enfim, não se vislumbra dos elementos carreados aos autos tenha a ré agido de forma dolosa a caracterizar a conduta ilícita imputada na exordial pelo Ministério Público Federal.

Destaco, por oportuno, precedente desta Corte em caso similar, concluindo pela inexistência de prova de má-fé:

 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. FINANCIAMENTO HABITACIONAL. PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA COM RECURSOS DO FUNDO DE ARRENDAMENTO RESIDENCIAL – PMCMV-FAR. FRAUDE NOS DADOS DECLARADOS PARA GARANTIR HABILITAÇÃO NO PROGRAMA. INOCORRÊNCIA. RENDA FAMILIAR E PROPRIEDADE DE IMÓVEL RESIDENCIAL. AUSÊNCIA DE DOLO.

1. Preliminarmente, considerados os limites de devolução da apelação (artigo 1.009, § 1º, CPC) e o trânsito em julgado do acórdão proferido no AI 5010848-09.2018.4.03.0000, não se conhece do apelo ministerial quanto aos pleitos de condenação da ré à indenização pela deterioração causada ao imóvel e de manutenção da situação de contemplada pelo PMCMV nos cadastros da CEF e órgãos públicos para fins de impedimento a obter futuros benefícios habitacionais.

2. No mérito, os dados declarados pela ré ao PMCMV e imputados falsos pelo autor da ação resumem-se, basicamente, ao seu estado civil e, portanto, composição do núcleo familiar e respectiva renda, e ao requisito de não ser proprietária de imóvel residencial.

3. No exame da primeira imputação, insta considerar que, conforme revela contexto probatório documental e testemunhal dos autos, a ré tem dois filhos, sendo o mais velho pessoa com deficiência, que recebe benefício assistencial de prestação continuada (LOAS) desde 17/04/2006, demandando cuidados em tempo integral, razão pela qual não exerce atividade laboral desde 2007. Denota-se, pois, que a renda de um salário mínimo vigente em 2014 (R$ 724,00) declarada na inscrição do programa habitacional correspondia ao benefício assistencial recebido pelo filho deficiente.

4. Sobre a união estável com Gigliotti Moreira, a ré sustentou que quando de sua inscrição no PMCMV (em setembro de 2014) já se encontrava separada de seu companheiro (desde junho do mesmo ano), que retornou ao convívio familiar somente três meses depois de contemplada no programa e empossada no imóvel, versão que não restou confrontada pela diligência administrativa realizada em 19/12/2017 no âmbito do procedimento do Ministério Público Federal. Ainda que assim não fosse, a renda média de R$ 1.400,00 auferida pelo companheiro da ré somada ao benefício assistencial recebido pelo filho deficiente no valor correspondente ao salário mínimo vigente no país não ultrapassava a renda familiar de até R$ 1.600,00 exigida pela legislação de regência do programa habitacional.

5. Tampouco depõe contra a ré o fato de figurar como proprietária de um VW/Gol 1999/1999, um GM/Corsa 2002/2002 e uma moto Honda/CG150 2014/2014, primeiramente porque a legislação aplicável não impõe qualquer limitação à propriedade de bens móveis automotores, segundo porque, ao contrário do alegado, tal propriedade nada comprova acerca da renda auferida, dada a antiga data de fabricação dos carros, que já contavam com mais de dez anos à data da inscrição no PMCMV, assim como por ter a ré esclarecido que um dos carros e a moto eram de seu irmão, tendo-lhe apenas emprestado o nome, que não tinha restrições para aquisição, sendo confirmado pelas testemunhas em Juízo que a ré não tinha veículos.

6. No tocante à imputação de copropriedade do imóvel matrícula 23.652, verifica-se, realmente, que a ré figura no respectivo registro imobiliário juntamente com seus quatro irmãos, à época todos impúberes, como adquirentes desde 15/12/1999 de um terreno de 275m², com duas casas de 95,72m² e 95,75m².

7. A copropriedade do imóvel não foi negada pela ré que, pelo contrário, aduziu ter relatado tal fato no ato da inscrição no PMCMV perante a Prefeitura Municipal, quando informada que não existia óbice à participação no programa habitacional, já que não era a única proprietária do bem. Tal circunstância afasta o dolo e má-fé imputados à ré pelo autor da ação, não subsistindo, assim, a alegada prática de fraude para garantir habilitação no Programa Minha Casa Minha Vida. Não obstante a independência entre as instâncias cível e criminal, cumpre ressaltar que mesma conclusão foi reconhecida, com trânsito em julgado em 25/08/2021, também na Ação Penal 0000137-43.2018.4.03.6139, instaurada para apuração de eventual crime de estelionato praticado contra a Caixa Econômica Federal (artigo 171, § 3º, CP), em razão dos mesmos fatos ora sub judice.

8. Deste modo, afastada a imputada intenção maliciosa na conduta da ré e adstritos aos limites da causa de pedir exposta na inicial, não cabe cogitar de nulidade do contrato de mútuo habitacional pelo PMCMV e respectivo registro imobiliário.

9. Ademais, segundo consta dos autos, no imóvel herdado em copropriedade com seus irmãos, moravam a ré, com seus dois filhos, além de dois irmãos, mãe e avós. À ré e seus dois filhos cabia residir em um cômodo com banheiro, cujo tamanho era menor que o da sala de audiências. Neste contexto, bem procedeu a sentença ao registrar que “o fato de a ré ser proprietária da quinta parte de um lote de aproximadamente 250m² e menos de 200m² de área construída, em condomínio com cinco irmãos, sabendo-se ainda que sua mãe mora em um dos imóveis e um irmão em outro, não configura a hipótese pretendida pelo legislador que impede a mulher de participar do PMCMV, porque a ideia do legislador é a de que quem tem moradia digna não obste o direito do outro que não tem. Essa medida de imóvel talvez fosse suficiente para ser dividida entre pessoas solteiras e saudáveis, mas a ré tem dois filhos e marido e um dos seus filhos é deficiente, de modo que o imóvel do qual ela é coproprietária não satisfaz o direito constitucional de ter moradia digna. [...] Enfim, ser coproprietária da quinta parte de um imóvel de 250m², com área construída de aproximadamente 200m², não configura óbice à ré para participação no PMCMV, na medida em que não é a literalidade da lei que deve prevalecer, mas o sentido constitucional do direito à moradia digna, que a ré não tinha até receber a casa do Programa”.

10. Apelação parcialmente conhecida e, nesta extensão, desprovida, e remessa oficial, tida por submetida, desprovida.

(TRF 3ª Região, 1ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000240-62.2018.4.03.6139, Rel. Desembargador Federal LUIS CARLOS HIROKI MUTA, julgado em 25/10/2023, DJEN DATA: 30/10/2023, negrito nosso)

                                         

Diante do exposto, conheço em parte do recurso de apelação do Ministério Público Federal e, na parte conhecida, nego-lhe provimento, e nego provimento à remessa oficial, tida por interposta, nos termos supra.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

 

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA. ALEGAÇÃO DE FRAUDE. AUSÊNCIA DE PROVA.  

- Hipótese dos autos que é de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal contra mutuária do Programa Minha Casa Minha Vida, alegando o autor que a ré, ao realizar sua inscrição, omitiu que era coproprietária de outro imóvel no mesmo Município. 

- Proferida sentença de improcedência do pedido, dela recorre o Ministério Público Federal. 

- Conforme orientação consolidada no Superior Tribunal de Justiça, a Lei de Ação Popular (Lei 4.717/65), a Lei de Ação Civil Pública (Lei 7.347/85) e a Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92) formam um microssistema legal de proteção aos direitos coletivos, de modo que se aplica à ação civil pública o disposto no art. 19 da Lei 4.717/65, que prevê que a sentença de improcedência do pedido está sujeita ao duplo grau de jurisdição.  

- Caso em que o Juízo de primeiro grau proferiu decisão indeferindo a inicial e julgando extinto o feito sem resolução do mérito com relação a parte dos pedidos formulados na inicial, tendo sido impugnada por agravo de instrumento, que não foi conhecido por decisão desta Corte já transitada em julgado. Assim, o apelo ministerial não ultrapassa o juízo de admissibilidade no ponto em que reitera pedidos em relação aos quais a inicial foi indeferida.  

- Inscrição no Programa Minha Casa Minha Vida que depende do preenchimento de diversos requisitos, determinando a Lei 11.977/09 a observância da regulamentação do Poder Executivo federal e também dos entes federativos locais. 

- Caso em que a ré não tentou omitir a existência do imóvel do qual era coproprietária juntamente com a irmã, tendo relatado a situação em entrevista realizada por assistente social e psicóloga antes mesmo da assinatura do contrato de financiamento. Ou seja, os responsáveis pelo PMCMV teriam como, por meios próprios, apurar a situação da ré administrativamente e eventualmente excluí-la do Programa se entendessem que seria o caso. 

- Conforme exegese do art. 113 do Código Civil, nos negócios jurídicos a má-fé não se presume, devendo ser devidamente comprovada, o que não ocorreu no caso dos autos.  Precedente da Corte em caso similar.  

- Recurso de apelação do Ministério Público Federal conhecido em parte e, na parte conhecida, desprovido. Remessa oficial, tida por interposta, desprovida. 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma decidiu, por unanimidade, conhecer em parte do recurso de apelação do Ministério Público Federal e, na parte conhecida, negar-lhe provimento, e negar provimento à remessa oficial, tida por interposta, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.