Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001083-74.2000.4.03.6000

RELATOR: Gab. 04 - DES. FED. ALESSANDRO DIAFERIA

APELANTE: COMPANHIA NACIONAL DE ABASTECIMENTO

Advogados do(a) APELANTE: DIEGO MOITINHO CANO DE MEDEIROS - SP316975-A, DIOGO MAGNANI LOUREIRO - SP313993-A, SILVIA ELIANE DE CARVALHO DIAS - SP355917-A

APELADO: SÓCRATES MOYA RODRIGUES, AGRO CINTRA COMERCIO DE CEREAIS E REPRESENTACOES LTDA - ME, JOSE INACIO DA SILVA, MARIA ZULEIKA BARBOSA CINTRA

Advogado do(a) APELADO: CLEUIR FREITAS RAMOS - MS6195-A
Advogado do(a) APELADO: ARLINDO BRAZILINO DA CONCEICAO - MS9922

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001083-74.2000.4.03.6000

RELATOR: Gab. 04 - DES. FED. ALESSANDRO DIAFERIA

APELANTE: COMPANHIA NACIONAL DE ABASTECIMENTO

Advogados do(a) APELANTE: DIEGO MOITINHO CANO DE MEDEIROS - SP316975-A, DIOGO MAGNANI LOUREIRO - SP313993-A, SILVIA ELIANE DE CARVALHO DIAS - SP355917-A

APELADO: SÓCRATES MOYA RODRIGUES, AGRO CINTRA COMERCIO DE CEREAIS E REPRESENTACOES LTDA - ME, JOSE INACIO DA SILVA, MARIA ZULEIKA BARBOSA CINTRA

Advogado do(a) APELADO: CLEUIR FREITAS RAMOS - MS6195-A
Advogado do(a) APELADO: ARLINDO BRAZILINO DA CONCEICAO - MS9922

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de ação ajuizada pela COMPANHIA NACIONAL DE ABASTECIMENTO - CONAB em face de AGRO CINTRA COMÉRCIO DE CEREAIS E REPRESENTAÇÕES LTDA e outros, por meio da qual pretende a condenação da parte ré à indenização por danos materiais, decorrentes do descumprimento de contratos de depósito firmado entre as partes.

Por sentença proferida em ID 97502684, fls. 232/238, foi reconhecida a prescrição, julgando-se extinto o feito, com resolução de mérito, com base no artigo 269, IV, do CPC/73, vigente à época. A parte autora foi condenada ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em R$1.000,00.

Apela a CONAB, sustentando inaplicabilidade do prazo prescricional previsto no artigo 11, parágrafo primeiro, do Decreto 1.102/1903 (ID 97502684, fls. 243/262).

Sem contrarrazões, subiram os autos.

Em ID 109405618, a CONAB requereu a correção de desconformidades na digitalização dos autos. No entanto, sobreveio a notícia de que os autos físicos não foram localizados pela Secretaria da Vara onde tramitou o processo (ID 288572696).

É o relatório.

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001083-74.2000.4.03.6000

RELATOR: Gab. 04 - DES. FED. ALESSANDRO DIAFERIA

APELANTE: COMPANHIA NACIONAL DE ABASTECIMENTO

Advogados do(a) APELANTE: DIEGO MOITINHO CANO DE MEDEIROS - SP316975-A, DIOGO MAGNANI LOUREIRO - SP313993-A, SILVIA ELIANE DE CARVALHO DIAS - SP355917-A

APELADO: SÓCRATES MOYA RODRIGUES, AGRO CINTRA COMERCIO DE CEREAIS E REPRESENTACOES LTDA - ME, JOSE INACIO DA SILVA, MARIA ZULEIKA BARBOSA CINTRA

Advogado do(a) APELADO: CLEUIR FREITAS RAMOS - MS6195-A
Advogado do(a) APELADO: ARLINDO BRAZILINO DA CONCEICAO - MS9922

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

Tempestivo o recurso e preenchidos os demais requisitos de admissibilidade, passo ao exame da matéria devolvida a esta Corte.

Inicialmente, constato que as desconformidades na digitalização apontadas pela apelante não impossibilitam o julgamento do recurso.

A parte autora narra na inicial que firmou junto à parte ré contratos de depósito, por prazo indeterminado, por meio do qual os réus, na condição de fiéis depositários, ficaram habilitados a receber, para guarda e conservação, os estoques de produtos vinculados à Política de Garantia de Preços Mínimos - PGPM, mantidos pela União Federal. Afirma que lhe foi restituída apenas parte dos produtos armazenados, razão pela qual requer o pagamento de indenização correspondente aos produtos não restituídos, à multa pecuniária e às tarifas de armazenagem.

O juiz prolator da sentença reconheceu a ocorrência da prescrição, entendendo aplicável ao caso o prazo prescricional previsto no artigo 11, parágrafo primeiro, do Decreto 1.102/1903, que assim dispõe:

 

§ 1º - A indenização devida pelos armazéns gerais nos casos referidos neste artigo, será correspondente ao preço da mercadoria e em bom estado no lugar e no tempo em que devia ser entregue.

O direito à indenização prescreve em três meses, contados do dia em que a mercadoria foi ou devia ser entregue.

 

A sentença não merece reforma.

Inicialmente, observa-se que referido Decreto regulou de forma específica o depósito realizado em armazéns gerais. Trata-se, portanto, de norma especial que afasta a aplicação das normas gerais estabelecidas pelo Código Civil de 1916, razão pela qual o art. 1.807 deste diploma legal, ao revogar “as Ordenações, Alvarás, Leis, Decretos, Resoluções, Usos e Costumes concernentes às matérias de direito civil reguladas neste Código”, não o alcançou.

Desta forma, para a pretensão ressarcimento em virtude de perda de produtos estocados em armazém geral, aplica-se o prazo prescricional trimestral previsto no artigo 11, parágrafo primeiro, do Decreto 1.102/1903, em detrimento do prazo geral estabelecido no Código Civil.

Também fica afastada a alegação no sentido de que o Decreto 1.102/1903 teria sido revogado pela Lei 9.973/00 e pelo Decreto 3.855/01, em primeiro lugar, por ser aquela a legislação vigente à época dos fatos, pouco importando eventual revogação posterior. No mais, estas duas normas, ao tratarem sobre a armazenagem de produtos agropecuários, nada dispuseram a respeito de prazo prescricional para pretensão indenizatória, a indicar a inexistência de ab-rogação do Decreto 1.102/1903. Além disso, o próprio artigo 6º, §1º, do Decreto 3.855/01, ao prever a responsabilidade do depositário por danos aos produtos depositados, faz remissão à “legislação específica”, mais um indicativo de ausência de revogação, permanecendo vigente, portanto, o prazo trimestral originalmente previsto.

É nesse sentido a jurisprudência do E. STJ:

 

RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE COBRANÇA - DEPÓSITO EM ARMAZÉNS GERAIS - INDENIZAÇÃO - QUEBRA PARCIAL DA MERCADORIA DEPOSITADA - PRESCRIÇÃO - MOMENTO DA ARGÜIÇÃO - DECRETO N.º 1.102/1903.

1. A teor do art. 162 do Código Civil/1916, que hoje encontra correspondência no art. 193 do Código Civil vigente, a prejudicial de prescrição pode ser suscitada em qualquer grau de jurisdição, pela parte a que aproveita. Assim, cuidando-se de prescrição extintiva, argüida ainda em grau de jurisdição ordinária, irrelevante o fato da questão ter sido trazida apenas em sede de apelação, mesmo que não deduzida na fase própria de defesa .

2. Inegável a aplicação do disposto no art. 11 do Decreto n.º 1.102/1903 quando o pedido é de indenização em pecúnia ou restituição dos produtos estocados em armazém geral, em razão da responsabilidade deste pelos bens recebidos em depósito que desapareceram ou vieram a perecer. Conquanto seja demasiado exíguo o prazo prescricional de três meses, esta é a vontade do legislador e deve-se aplicar a regra albergada na legislação específica .

3. O Código Civil de 1916, por seu artigo 1807, revogou todas as anteriores normas de direito civil incompatíveis com o Diploma ou que por ele passaram a ser inteiramente reguladas. Deste modo, considerando que o texto de 1916 tratou apenas de modo geral do contrato de depósito, não há se falar em revogação do Decreto n.º 1.102/1903 que traz as regras específicas a respeito das empresas de armazéns gerais.

4. Tomando-se em conta que a presente ação traduz pretensão de restituição de mercadoria ou ressarcimento em pecúnia em virtude de perda de produtos estocados em armazém geral, valendo-se do princípio da especialidade, é de se aplicar a prescrição trimestral estabelecida no art. 11, do decreto 1.102/1903. Assim, proposta a ação somente em 1997, forçoso o reconhecimento de que, in casu, operou-se a prescrição, sendo de rigor a extinção da ação nos moldes do art. 269, IV, do CPC .

5. Recurso especial do réu conhecido e provido.

(REsp 767.246/RJ, Rel. Ministro JORGE SCARTEZZINI, QUARTA TURMA, julgado em 19/10/2006, DJ 27/11/2006, p. 289)

 

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ARMAZÉNS GERAIS. PRESCRIÇÃO. TRIMESTRAL. DECRETO N. 1.102/1903. Art. 177 DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. INAPLICABILIDADE. PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE.

1. O prazo prescricional nas ações de indenização contra armazéns gerais é de três meses, consoante o disposto no art. 11 do Decreto n. 1.102/1903, afastada a incidência do art. 177 do Código Civil de 1916, tendo em vista o princípio da especialidade.

2. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg no REsp 797733/RJ - 4ª Turma - rel. Min. MARIA ISABEL GALLOTTI, j. 19/10/2010, v.u., DJe 11/11/2010)

 

DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. PRESCRIÇÃO . AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DEPÓSITO EM ARMAZÉNS GERAIS. SUB-ROGAÇÃO DE DIREITOS. APLICAÇÃO DO CDC.

- Em ação de indenização, sendo a causa de pedir o inadimplemento contratual, não incide o prazo prescricional estabelecido no art. 27 do CDC, aplicável somente à hipótese de danos decorrentes de acidente de consumo. Precedentes.

- Em observância ao princípio da especialidade, aplica-se o prazo prescricional de três meses, estabelecido no art. 11 do Decreto nº 1.102/1903, em relação à pretensão indenizatória dirigida contra armazém geral.

Recurso especial não conhecido.

(REsp 476458/SP - 3ª Turma - rel. Min. NANCY ANDRIGHI, j. 04/08/2005, v.u., DJ 29/08/2005 p. 329)

 

Também deste modo já decidiu esta Corte:                                        

 

PROCESSO CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. PRESCRIÇÃO. ART. 11, § 1º, DECRETO 1102/1903. 1. Art. 11, § 1º, do Decreto nº 1.102/1.903. PRAZO PRESCRIÇÃO DE TRÊS MESES. EXTINÇÃO EX OFFICIO. APELAÇÃO PREJUDICADA.

1. Em observância ao princípio da especialidade, aplica-se o prazo prescricional de três meses, estabelecido no art. 11 do Decreto nº 1.102/1903, em relação à pretensão indenizatória dirigida contra armazém geral. Precedentes do STJ.

2. Na hipótese dos autos, o contrato de depósito é datado de 04/04/1988, referente às safras 87/88, conforme consta dos autos.

3. A ação, contudo, foi ajuizada apenas em 09.12.1997, logo, bem depois de prescrita a pretensão.

4. Extinção ex officio.

5. Apelação prejudicada.

(TRF 3ª Região, QUINTA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1337877 - 0006675-07.1997.4.03.6000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES, julgado em 05/11/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/11/2018 )                                                                                 

 

CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. ARMAZÉNS GERAIS. RETENÇÃO TEMPORÁRIA DE MERCADORIA. DECLASSIFICAÇÃO DE MERCADORIA CONFIADA À GUARDA. REDUÇÃO DO QUANTITATIVO. INDENIZAÇÃO. LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA. DECRETO 1.102/1903. PRESCRIÇÃO TRIMESTRAL. RECONHECIMENTO DE OFÍCIO. APELO PREJUDICADO.

1. O Decreto nº 1.102/1903, que instituiu regras para o estabelecimento de empresas de armazéns gerais, disciplinando seus direitos e obrigações, estabelece, em seu art. 11, § 1º, o prazo prescricional para exercício de pretensão indenizatória em face dos armazéns gerais.

2. Por outro lado, o Código Civil de 1916, vigente ao tempo da celebração do contrato objeto da presente demanda, tratou apenas de modo geral sobre o contrato de depósito, de modo que, no caso em tela, tratando-se de ação cuja pretensão veiculada consiste na restituição de mercadoria ou ressarcimento em pecúnia em virtude da perda de produtos estocados em armazém geral, o prazo prescricional a ser aplicado será aquele previsto pelo Decreto nº 1.102/1903, em observância ao princípio da especialidade.

3. O prazo prescricional nas ações de indenização contra armazéns gerais é de 3 (três) meses, consoante o disposto no art. 11, § 1º, do Decreto nº 1.102/1903, afastada a incidência do art. 177, do Código Civil de 1916. Precedentes.

4. Havendo transcorrido aproximadamente dez anos entre a constatação dos danos cuja reparação se pretende e o ajuizamento da presente ação , deve ser reconhecida a prescrição da pretensão autoral.

5. Prescrição reconhecida de ofício. Apelo do réu prejudicado.

(TRF 3ª Região, PRIMEIRA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1456722 - 0001675-10.2003.4.03.6002, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA, julgado em 18/09/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:25/09/2018 )                                                                                    

 

PROCESSO CIVIL. PRESCRIÇÃO. ART. 11, § 1º, DECRETO 1102/1903. 1. Art. 11, § 1º, do Decreto nº 1.102/1.903. PRAZO PRESCRIÇÃO DE TRÊS MESES. APELAÇÃO IMPROVIDA.

1. Em observância ao princípio da especialidade, aplica-se o prazo prescricional de três meses, estabelecido no art. 11 do Decreto nº 1.102/1903, em relação à pretensão indenizatória dirigida contra armazém geral. Precedentes do STJ.

2. Na hipótese dos autos, o documento de fls. 42/43 informa que a armazenagem dos produtos perduraria de fevereiro de 1985 a novembro de 1985.

3. A ação, contudo, foi ajuizada apenas em 31.10.2006, logo, bem depois de prescrita a pretensão.

4. Apelação improvida.

(TRF 3ª Região, QUINTA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1589624 - 0003336-38.2006.4.03.6125, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES, julgado em 07/08/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:15/08/2017 )

 

Diante do exposto, nego provimento ao recurso, nos termos supra.

É como voto.



E M E N T A

DIREITO CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. PERDA DE PRODUTOS ESTOCADOS EM ARMAZÉM. PRESCRIÇÃO.

I - Pretensão de ressarcimento em virtude de perda de produtos estocados em armazém geral que se submete ao prazo prescricional trimestral previsto no artigo 11, parágrafo primeiro, do Decreto 1.102/1903. Precedentes do STJ e desta Corte.

II – Recurso desprovido.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.