Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5015114-67.2021.4.03.6100

RELATOR: Gab. 42 - DES. FED. RENATA LOTUFO

APELANTE: JUNTA COMERCIAL DO ESTADO DE SAO PAULO

APELADO: AIRBNB PLATAFORMA DIGITAL LTDA

Advogados do(a) APELADO: JOAO PAULO TAGLIARI - RS110408-A, JULIA PEREIRA KLARMANN - SP326408-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5015114-67.2021.4.03.6100

RELATOR: Gab. 42 - DES. FED. RENATA LOTUFO

APELANTE: PRESIDENTE DA JUNTA COMERCIAL DO ESTADO DE SÃO PAULO (JUCESP), JUNTA COMERCIAL DO ESTADO DE SAO PAULO

 

APELADO: AIRBNB PLATAFORMA DIGITAL LTDA

Advogados do(a) APELADO: JOAO PAULO TAGLIARI - RS110408-A, JULIA PEREIRA KLARMANN - SP326408-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

A Exma. Senhora Desembargadora Federal Renata Lotufo (Relatora):

Trata-se de recurso de apelação da JUNTA COMERCIAL DO ESTADO DE SÃO PAULO (JUCESP) em face de sentença, que concedeu a segurança, com fundamento no art. 487, inciso I do CPC, confirmando medida liminar concedida (ID 283007506), determinando que a autoridade apontada como coatora proceda às devidas anotações, para promover o arquivamento dos atos societários de AIRBNB PLATAFORMA DIGITAL LTDA., desde que inexistentes outros óbices (ID 283008336).

Em suas razões recursais a JUCESP, em suma, alega que o art. 3º da Lei nº 11.638/07 dispôs que as sociedades de grande porte, ainda que não constituídas sob a forma de sociedade de ações, devem observar as regras da Lei nº 6.404/76 no que diz respeito à escrituração, elaboração de demonstrações financeiras e obrigatoriedade de auditoria. Aduz que as demonstrações financeiras devem ser publicadas conforme dispõem os arts. 176 e 289,§1º da Lei nº 6.404/76. Ressalta que a deliberação nº 02 da JUCESP observa as normas em questão, bem como o teor da decisão proferida pelo Juízo da 25ª Vara Cível Federal de São Paulo, nos autos de nº 2008.61.00.030305-7, que determinou a publicação de balanços financeiros por empresas de grande porte. Requer pela reforma da sentença, a fim de que o pedido formulado seja julgado improcedente (ID 283008338).

 Com contrarrazões da AIRBNB PLATAFORMA DIGITAL LTDA, pugnando pelo não provimento do recurso de apelação (ID 283008343).

Instado a se manifestar no feito, o Ministério Público Federal opinou pelo não provimento do recurso de apelação, com manutenção da sentença (ID283344689).

Subiram os autos a esta E. Corte.

É o relatório

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5015114-67.2021.4.03.6100

RELATOR: Gab. 42 - DES. FED. RENATA LOTUFO

APELANTE: PRESIDENTE DA JUNTA COMERCIAL DO ESTADO DE SÃO PAULO (JUCESP), JUNTA COMERCIAL DO ESTADO DE SAO PAULO

 

APELADO: AIRBNB PLATAFORMA DIGITAL LTDA

Advogados do(a) APELADO: JOAO PAULO TAGLIARI - RS110408-A, JULIA PEREIRA KLARMANN - SP326408-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

V O T O

 

A Exma. Senhora Desembargadora Federal Renata Lotufo (Relatora):

O caso em apreço cuida-se de mandado de segurança impetrado AIRBNB PLATAFORMA DIGITAL LTDA. em face do PRESIDENTE DA JUNTA COMERCIAL DO ESTADO DE SÃO PAULO (JUCESP), objetivando o arquivamento de seus atos societários pela autoridade apontada como coatora.

Narra a parte impetrante que o pedido de registro de arquivamento de ata de reunião dos sócios realizada em 30/04/2021 esteve condicionado ao cumprimento do disposto no da Deliberação nº 02 da JUCESP, para haver seu deferimento.  

Cumpre esclarecer que a controvérsia dos autos cinge-se à exigência promovida pela autoridade coatora, consistente na exigência de publicação de suas demonstrações financeiras como requisito obrigatório para o arquivamento de seus atos societários junto à JUCESP. 

O fundamento para tal exigência é a Deliberação JUCESP nº 02/2015, na qual se exige que as sociedades empresárias e cooperativas consideradas de grande porte cumpram tal determinação, nos termos da Lei n. 11.638/2007.

Ocorre que a jurisprudência desta Corte Regional se direcionou à conclusão de que tal deliberação administrativa extrapolou o seu poder regulamentar, na medida em que a exigência em questão não estaria amparada pelo art. 3º da Lei n. 11.638/2007.

Tal dispositivo legal prevê a observância somente às regras de escrituração e elaboração de demonstrações financeiras pelas sociedades de grande porte não constituídas sob a forma de sociedades anônimas.

Assim, considera-se ilegal a extensão da apontada exigência às correspondentes publicações, tendo em vista, ainda, a aplicação do princípio da legalidade à Administração Pública, nos termos do art. 37, caput, da Constituição da República.

Nesse sentido, registre-se os seguintes precedentes da 2ª Turma desta Corte:

MANDADO DE SEGURANÇA. DELIBERAÇÃO Nº 2/2015 DA JUCESP. ILEGALIDADE DO ATO.

- Caso dos autos que é de mandado de segurança impetrado contra ato pelo qual é exigida das sociedades de grande porte, ainda que não constituídas sob a forma de sociedade por ações, a publicação de balanço anual e demonstrações financeiras no diário oficial e em jornal de grande circulação como condição para registro de ato societário, sobrevindo a prolação de sentença de concessão da ordem.

- A jurisprudência desta Corte, em exegese do artigo 3º da Lei 11.638/07, firmou orientação no sentido da ilegalidade da Deliberação n.º 2/2015 da JUCESP por extrapolar o âmbito do poder regulamentar.

- Recurso e remessa oficial desprovidos. 

(TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5004557-21.2021.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal AUDREY GASPARINI, julgado em 12/12/2023, Intimação via sistema DATA: 15/12/2023)                                                              

 

PROCESSO CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. PUBLICAÇÃO DE DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRAS. EMPRESAS DE GRANDE PORTE. ARQUIVAMENTO DE ATOS SOCIETÁRIOS. DELIBERAÇÃO JUCESP 02, de 25/03/2015. ILEGALIDADE.

- O art. 3º da Lei nº 11.638/2007 obrigou que sociedades de grande porte obedeçam ao previsto na Lei nº 6.404/1976 no que concerne a “escrituração e elaboração de demonstrações financeiras e a obrigatoriedade de auditoria independente por auditor registrado na Comissão de Valores Mobiliários”, deixando de fazer expressa referência à obrigatoriedade de publicação das respectivas demonstrações financeiras. A exigência de publicação dessas demonstrações (mesmo para sociedades não constituídas na forma de S.A.) é implicitamente exigida pelo art. 3º da Lei nº 11.638/2007, porque vai ao encontro de exigências contemporâneas de transparência e de acesso à informação, conclusão reforçada pela compreensão do art. 176 e do art. 289, ambos da Lei nº 6.404/1976 (com alterações).

- Contudo, mesmo não sendo feita a publicação de demonstrações financeiras, Juntas Comerciais não podem se negar a acolher e realizar registros de atos societários, consoante estabelecido na Deliberação JUCESP 02, de 25/03/2015, sob pena de ofensa aos mesmos sistemas de proteção de interesses privados e públicos que impõem o registro desses atos societários.

- Restrições impostas por órgãos públicos de registro têm sido consideradas violadoras da livre iniciativa e a demais mandamentos da ordem econômica constitucional, porque tais bloqueios podem resultar na impossibilidade de empresas continuarem operando na pressuposta e desejada regularidade. No E.STF, Súmulas 70, 323 e 547, REs 63.026 e 63.647 e também ADIs 394-1 e 173-DF.

- O art. 37, I a V, da Lei nº 8.934/1994 (com as alterações da Lei nº 10.194/2001), bem como o art. 1.150 e seguintes do Código Civil, conduzem à conclusão no sentido de que anterior publicação das demonstrações financeiras de sociedade de grande porte não pode ser exigida para o arquivamento de atos societários. Precedentes deste E.TRF da 3ª Região.

- A Deliberação nº 02/2015 foi revogada pela Deliberação 01/2022, que, atualmente, também se encontra revogada pela Deliberação nº 29/2023, em consonância com o entendimento proferido pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial nº 1824891 - RJ (2019/0119281-0) que excluiu a obrigatoriedade das empresas limitadas de grande porte de publicarem suas demonstrações contábeis.

- Remessa oficial e apelação desprovidas.

(TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5020180-28.2021.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal JOSE CARLOS FRANCISCO, julgado em 07/12/2023, Intimação via sistema DATA: 14/12/2023)

         

Convém mencionar que, no precedente anteriormente transcrito, de Relatoria do Exmo. Desembargador Federal Carlos Francisco, ainda que tenha havido a ressalva de seu entendimento pessoal quanto à interpretação do mencionado art. 3º da Lei n. 11.638/2007, foi considerada ilegal a exigência das publicações em questão para o arquivamento dos atos societários das sociedades limitadas de grande porte.

Assim, não merece reforma a sentença proferida pelo Juízo de primeira instância. 

Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO  a apelação e a remessa oficial, nos termos da fundamentação acima delineada. 

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA.MANDADO DE SEGURANÇA. ARQUIVAMENTO DE ATOS SOCIETÁRIOS. EMPRESAS DE GRANDE PORTE. PUBLICAÇÃO DE DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRAS. DELIBERAÇÃO JUCESP Nº 2 DE 23/03/2015.ILEGALIDADE.

- A jurisprudência desta Corte firmou orientação no sentido da ilegalidade da Deliberação nº 2/2015 da JUCESP, pois extrapolaria o âmbito do poder regulamentar.

- A exigência de publicação de demonstrações financeiras como requisito obrigatório para o arquivamento de atos societários junto à JUCESP não encontra respaldo no art.3º da Lei nº 11.638/07

-  Apelação e remessa necessária desprovidas. 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação e à remessa necessária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.