Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001020-07.2023.4.03.6113

RELATOR: Gab. 42 - DES. FED. RENATA LOTUFO

APELANTE: LEANDRO ANTONIO OVIDIO COSTA

Advogados do(a) APELANTE: DIOVANA HENRIQUE BASTOS DE SOUZA - MG130513-A, THAYARA FERNANDA PEREIRA ANDRADE - MG213382-A

APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001020-07.2023.4.03.6113

RELATOR: Gab. 42 - DES. FED. RENATA LOTUFO

APELANTE: LEANDRO ANTONIO OVIDIO COSTA

Advogados do(a) APELANTE: DIOVANA HENRIQUE BASTOS DE SOUZA - MG130513-A, THAYARA FERNANDA PEREIRA ANDRADE - MG213382-A

APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

R E L A T Ó R I O

 

A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL RENATA LOTUFO (Relatora):    

Trata-se de recurso de apelação interposto por LEANDRO ANTONIO OVIDIO COSTA em face da sentença a qual julgou improcedente o seu pedido inicial. Em síntese, objetivava-se a anulação da consolidação da propriedade e autorização para purgação da mora.

Em síntese, sustenta a parte apelante que as disposições contidas na Lei nº. 9.514/97 atuam no sentido de inviabilizar o direito à moradia, uma vez que determinam a retirada da habitação do cidadão, por ato do próprio agente financeiro. Afirma que não houve sua notificação pessoal, nem foi oportunizado meios de renegociar o débito. Salienta que deve haver a intimação pessoal para purgar a mora, bem como a respeito das datas dos leilões. Por fim, requer o provimento do recurso.

Ausente o recolhimento de preparo recursal por ser beneficiária da justiça gratuita.

Foram apresentadas contrarrazões pela CEF (ID 282242076).

Subiram os autos a esta Eg. Corte para julgamento.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001020-07.2023.4.03.6113

RELATOR: Gab. 42 - DES. FED. RENATA LOTUFO

APELANTE: LEANDRO ANTONIO OVIDIO COSTA

Advogados do(a) APELANTE: DIOVANA HENRIQUE BASTOS DE SOUZA - MG130513-A, THAYARA FERNANDA PEREIRA ANDRADE - MG213382-A

APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

V O T O

 

A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL RENATA LOTUFO (Relatora):    

Versa a presente ação a respeito de pedido de anulação da consolidação da propriedade do imóvel, bem como a autorização para purgação da mora.

Compulsando os autos, verifica-se que foi firmado "Contrato de Compra e Venda de Terreno e Mútuo para Construção de Unidade Habitacional, Alienação Fiduciária em Garantia, Fiança e Outras Obrigações – Programa Minha Casa, Minha Vida (PMCMV) – Recursos do FGTS com Utilização dos Recursos da Conta Vinculada do FGTS do(s) devedor(es)"; tratando-se, portanto, de execução extrajudicial da garantia de alienação fiduciária, conforme afirmado na Cláusula 15 do contrato (ID 282242037) e R.7 da matrícula do imóvel (ID 282242038, p. 3).

Inicialmente, não há que se falar em inaplicabilidade da Lei nº 9.514/97 ao presente caso, haja vista a sua perfeita compatibilidade com os ditames constitucionais.

Vale dizer que, no RE 860.631/SP, o STF decidiu pela constitucionalidade do procedimento adotado pela Lei nº 9.514/97, pondo fim a qualquer discussão a seu respeito. Nesse sentido, é a tese fixada no Tema 982/STF:

É constitucional o procedimento da Lei nº 9.514/1997 para a execução extrajudicial da cláusula de alienação fiduciária em garantia, haja vista sua compatibilidade com as garantias processuais previstas na Constituição Federal.

Dessa forma, deve-se atentar ao procedimento regulado pela Lei nº 9.514/97, a qual dispõe sobre o Sistema Financeiro Imobiliário e institui a alienação fiduciária de coisa imóvel e dá outras providências. 

De início é de ressaltar que a alienação fiduciária de coisa imóvel é utilizada em contratos de mútuo em que o devedor, em síntese, recebe recursos do credor, fazendo a transferência da propriedade resolúvel do imóvel dado em garantia.  

O art. 22 da referida lei especifica:  

Art. 22. A alienação fiduciária regulada por esta Lei é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa imóvel.  

Para tanto, é necessário que o contrato seja registrado no Cartório de Registro de Imóveis a fim de constituir-se a propriedade fiduciária. Dessa forma, conforme o parágrafo único do art. 23, da Lei n° 9514/1997, ocorre o desdobramento da posse, tornando-se o fiduciante (devedor) possuidor direto da coisa imóvel e o fiduciário (credor) possuidor indireto.

Outrossim, a lei prevê expressamente que o descumprimento contratual, no todo ou em parte, ocasiona o antecipado vencimento da dívida e a consolidação da propriedade em nome da instituição financeira, o que, consequentemente, autoriza a realização do leilão público para alienação do imóvel a fim de possibilitar a quitação do débito. 

Analisando a matrícula do imóvel, consoante o teor do AV. 9 (ID 285322786, p. 3 - autos originários) nota-se que houve a consolidação da propriedade do imóvel em questão em nome da credora fiduciária Caixa Econômica Federal, porquanto decorreu o prazo legal sem o devedor fiduciante ter comparecido ao Registro Imobiliário para efetuar o pagamento das prestações.

Ressalto que o art. 26, §§1º e 3º, da Lei 9.514/97 prevê o prazo de 15 dias para purgação da mora, bem como a intimação por meio do oficial do Registro de Imóveis:  

Art. 26. Vencida e não paga, no todo ou em parte, a dívida e constituído em mora o fiduciante, consolidar-se-á, nos termos deste artigo, a propriedade do imóvel em nome do fiduciário.

§ 1º Para os fins do disposto neste artigo, o fiduciante, ou seu representante legal ou procurador regularmente constituído, será intimado, a requerimento do fiduciário, pelo oficial do competente Registro de Imóveis, a satisfazer, no prazo de quinze dias, a prestação vencida e as que se vencerem até a data do pagamento, os juros convencionais, as penalidades e os demais encargos contratuais, os encargos legais, inclusive tributos, as contribuições condominiais imputáveis ao imóvel, além das despesas de cobrança e de intimação.” 

§ 3º A intimação far-se-á pessoalmente ao fiduciante, ou ao seu representante legal ou ao procurador regularmente constituído, podendo ser promovida, por solicitação do oficial do Registro de Imóveis, por oficial de Registro de Títulos e Documentos da comarca da situação do imóvel ou do domicílio de quem deva recebê-la, ou pelo correio, com aviso de recebimento. 

De acordo com procedimento da referida lei, a consolidação da propriedade será averbada no registro de imóveis após decorrido o prazo de 30 dias. A lei ainda ressalva que, até a data da averbação da consolidação da propriedade fiduciária, é assegurado ao devedor fiduciante pagar as parcelas vencidas e despesas de que trata o art. 27, §3º, II.  

Pois bem, resta evidente, consoante o AV. 9 da matrícula do imóvel, que transcorreu o prazo para purgação da mora sem o efetivo pagamento pelo devedor, sendo, portanto, consolidada a propriedade em nome da CEF. 

Ressalta-se que a certidão do Oficial de Registro de Imóveis possui fé pública e, portanto, goza de presunção relativa de veracidade. Para que seja afastada, necessária prova inequívoca em sentido contrário, o que não se encontra presente nos autos. 

A propósito, salienta-se, ainda, que qualquer pedido de suspensão ou anulação de atos relativos ao procedimento de execução extrajudicial com base em irregularidades procedimentais deve ser acompanhado da demonstração pelo devedor de que foi frustrada a sua intenção de purgar a mora, a qual permitiria o prosseguimento regular da relação obrigacional.

Ademais, o ajuizamento da ação (28/04/2023) dias antes da realização do leilão (1ª Praca: 02/05/2023 e 2ª Praça: 17/05/2023) induz à conclusão de que a parte devedora teria tido ciência inequívoca da data, hora e local do leilão.  

Essa, inclusive, vem sendo a orientação adotada por essa E. Corte em casos similares de pedidos de suspensão de leilão:                                

AGRAVO DE INSTRUMENTO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BEM IMÓVEL. CONSTITUCIONALIDADE DA LEI Nº 9.514/1997. REGULARIDADE DO PROCEDIMENTO. DIFICULDADES FINANCEIRAS. PRAZO PARA PURGAÇÃO DA MORA RESPEITADO. (...)  

- Pelas dinâmicas naturais de tempo, o ajuizamento de ação dias antes da realização de leilão induz à clara conclusão de a parte ter tido plena ciência desse ato em tempo hábil ao exercício de seu eventual direito (de purgação da mora ou de preferência). Nesses casos, o propósito material da comunicação prévia resta devidamente comprovado, razão pela qual a juntada aos autos do documento correspondente pode ser dispensada em favor da coerente avaliação do conjunto argumentativo e probatório.  

- Essa é a orientação do E.STJ para casos nos quais os devedores demonstram que tiveram ciência inequívoca da data, hora e local do leilão, ingressando com ação para suspensão da praça, de modo a indicar a inexistência de prejuízo (brocardo pas de nullité sans grief).   

- O devedor-fiduciante ajuizou ação judicial em primeira instância depois da publicação da Lei nº 13.465/2017 (DOU de 12/07/2017), mencionando interesse em purgar a mora.   

- Contudo, em razão da alteração promovida pela Lei nº 13.465/2017, impossível a purgação da mora após a averbação da consolidação da propriedade. Assim, cabe à parte-autora exercer o direito de preferência na aquisição do imóvel, até a data da realização do segundo leilão, nos termos do art. 27, §2º-B, da Lei nº 9.514/1997.   

- Não há ilegalidade na forma a ser utilizada para satisfação dos direitos da credora fiduciária, sendo inadmissível obstá-la de promover atos expropriatórios ou de venda, sob pena de ofender ao disposto nos artigos 26 e 27, da Lei nº 9.514/1997.   

- A parte agravante pretende a purgação da mora (a destempo) e a suspensão dos atos expropriatórios, não havendo pleito para a solução da dívida na forma legalmente admitida.   

- Agravo de instrumento não provido. (grifos nossos)   

(TRF 3ª Região, 2ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5030362-06.2022.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal JOSE CARLOS FRANCISCO, julgado em 23/04/2023, DJEN DATA: 28/04/2023)                            

"AGRAVO DE INSTRUMENTO. SFH. AÇÃO ANULATÓRIA. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. INADIMPLEMENTO. CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE. AUSÊNCIA DE VÍCIO. LEILÕES EXTRAJUDICIAIS. CIÊNCIA INEQUÍVOCA DOS LEILÕES. TEMPO HÁBIL PARA PURGAÇÃO DA MORA OU DO DIREITO DE PREFERÊNCIA. TUTELA PROVISÓRIA. AUSENTES OS REQUISITOS. RECURSO DESPROVIDO. (...)   

7. Observo, que apesar de afastada a aplicação subsidiária dos arts. 29 a 41 do DL nº70/66 para as hipóteses de execução garantida por alienação fiduciária, se apresenta possível ao devedor fiduciante, nos moldes do §2º-B do art. 27 da Lei nº 9.514/97, incluído pela Lei nº 13.465/2017, o direito de preferência para aquisição do imóvel até a data de realização do segundo leilão, mediante o pagamento do preço correspondente ao valor da dívida, somados os encargos legais, tributos e despesas inerentes ao procedimento de cobrança e leilão, inclusive custas e emolumentos.    

8. No que tange à notificação pessoal para o leilão, observo que a parte autora agravante ajuizou a demanda originária em 14.12.2022, requerendo a suspensão dos leilões designados para 20.12.2022 (1ªPraça), e 04.01.2023 (2ª Praça), do qual se pode presumir que o devedor possuía ciência inequívoca da realização do leilão extrajudicial em tempo hábil ao exercício do direito de purgação da mora ou de preferência.    

9. Não se vislumbra presente na tese da agravante a probabilidade do direito alegado necessário ao deferimento da tutela provisória para suspensão dos leilões, eis que não ficou demonstrado a presença de quaisquer vícios no procedimento de execução extrajudicial da Lei 9.514/97.   

10. Agravo de instrumento desprovido.

(TRF 3ª Região, 2ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5000414-82.2023.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal LUIZ PAULO COTRIM GUIMARAES, julgado em 20/04/2023, DJEN DATA: 24/04/2023)  

Quanto ao momento para a purgação da mora, necessário tecer algumas considerações.  

De início, cumpre consignar que a redação original do art. 39, II, da Lei nº 9.514/1997, que previa a aplicação subsidiária do art. 34 do Decreto-Lei nº 70/1966, estabelecia que o devedor-fiduciante podia purgar a mora em 15 dias após a intimação pessoal (art. 26, § 1º, dessa Lei nº 9.514/1997, ou até a assinatura do auto de arrematação do bem imóvel em leilão (art. 34 do Decreto-Lei nº 70/1966).  

No entanto, a Lei nº 13.465/2017 alterou a redação do art. 39, II, da Lei nº 9.514/1997, que passou a vigorar nos seguintes termos:  

Art. 39. Às operações de crédito compreendidas no sistema de financiamento imobiliário, a que se refere esta Lei: 

(...)   

II - aplicam-se as disposições dos arts. 29 a 41 do Decreto-Lei nº 70, de 21 de novembro de 1966, exclusivamente aos procedimentos de execução de créditos garantidos por hipoteca.

Assim, depreende-se da nova redação do art. 39, II, da Lei nº 9.514/1997 (dada pela Lei nº 13.465/2017), que contratos firmados com cláusula de alienação fiduciária de coisa imóvel em garantia não se enquadram no “procedimentos de execução de créditos garantidos por hipoteca”.  

Portanto, a partir da inovação legislativa (após 11/07/2017), não se aplicam mais os dispositivos referidos às hipóteses de execuções garantidas por alienação fiduciária em garantia de bem imóvel.  

Desse modo, conclui-se que no caso do contrato em discussão, firmado no âmbito do Sistema Financeiro Imobiliário, previsto na Lei n. 9.514/97, ou seja, submetido à alienação fiduciária em garantia, não há mais que se falar em aplicação subsidiária do Decreto-Lei nº 70/1966.  

Além disso, a Lei nº 13.465, de 11/07/2017 introduziu na Lei nº 9.514/97 o art. 26-A e o § 2º-B no art. 27, in verbis:   

Art. 26-A. Os procedimentos de cobrança, purgação de mora e consolidação da propriedade fiduciária relativos às operações de financiamento habitacional, inclusive as operações do Programa Minha Casa, Minha Vida, instituído pela Lei no11.977, de 7 de julho de 2009, com recursos advindos da integralização de cotas no Fundo de Arrendamento Residencial (FAR), sujeitam-se às normas especiais estabelecidas neste artigo.  

§ 1o  A consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário será averbada no registro de imóveis trinta dias após a expiração do prazo para purgação da mora de que trata o § 1o do art. 26 desta Lei.  

§ 2o  Até a data da averbação da consolidação da propriedade fiduciária, é assegurado ao devedor fiduciante pagar as parcelas da dívida vencidas e as despesas de que trata o inciso II do § 3o do art. 27, hipótese em que convalescerá o contrato de alienação fiduciária.”  

Art. 27 (...)  

§ 2º-B.  Após a averbação da consolidação da propriedade fiduciária no patrimônio do credor fiduciário e até a data da realização do segundo leilão, é assegurado ao devedor fiduciante o direito de preferência para adquirir o imóvel por preço correspondente ao valor da dívida, somado aos encargos e despesas de que trata o § 2o deste artigo, aos valores correspondentes ao imposto sobre transmissão inter vivos e ao laudêmio, se for o caso, pagos para efeito de consolidação da propriedade fiduciária no patrimônio do credor fiduciário, e às despesas inerentes ao procedimento de cobrança e leilão, incumbindo, também, ao devedor fiduciante o pagamento dos encargos tributários e despesas exigíveis para a nova aquisição do imóvel, de que trata este parágrafo, inclusive custas e emolumentos.  

Dessa maneira, verifica-se que com a referida alteração legislativa restou definido o marco temporal em que o devedor fiduciante pode realizar o pagamento das parcelas em atraso, com a continuidade do contrato, qual seja, até a data da averbação da consolidação da propriedade fiduciária (art. 26-A, §§ 1º e 2º).  

Além disso, também ficou definido que o fiduciante tem o direito de preferência em adquirir definitivamente o imóvel (art. 27, § 2º-B) até a data da realização do segundo leilão, desde que pague o valor integral do contrato e demais despesas decorrentes da consolidação da propriedade.  

Assim, com a referida alteração legislativa restou definido que;  

i) Até a data da averbação da consolidação da propriedade em favor do credor: o devedor fiduciante  poderá pagar as parcelas em atraso, com a continuidade do contrato;

ii) Após a consolidação da propriedade em favor do credor:  o devedor fiduciante poderá exercer o seu direito de preferência na aquisição do imóvel, até a data da realização do segundo leilão, desde que pague o valor integral do contrato e demais despesas decorrentes da consolidação da propriedade. 

Sobre o direito intertemporal acerca das alterações da Lei nº 13.465/2017 no art. 27 da Lei nº 9.514/1997, como já assentado por esta E. Corte, ficou definido o momento em que o devedor manifesta a sua vontade de purgar a mora como marco temporal para aplicação da Lei nº 13.465/17.  

Assim sendo, se a manifestação de vontade do fiduciante se deu durante a aplicação subsidiária do art. 34 do Decreto-Lei nº 70/66, resta lícito a purgação da mora - pelo valor das parcelas em atraso, com os devidos acréscimos - até a assinatura do auto de arrematação.  

 Por outro lado, se a manifestação de vontade foi realizada após 11/07/2017, possível a purgação da mora pelas parcelas em atraso, com acréscimos, apenas até a data da averbação da consolidação da propriedade fiduciária. Após essa data, fica assegurado ao devedor fiduciante, até a data da realização do segundo leilão, o direito de preferência para adquirir o imóvel pelo preço corresponde ao valor integral da divide, somado aos encargos e despesas.  

Esse é o entendimento firmado nessa E. Corte:                                     

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSO CIVIL. JUSTIÇA GRATUITA. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BEM IMÓVEL. CONSTITUCIONALIDADE DA LEI Nº 9.514/1997. REGULARIDADE DO PROCEDIMENTO. DIFICULDADES FINANCEIRAS. PRAZO PARA PURGAÇÃO DA MORA RESPEITADO. (...) 

- O devedor-fiduciante ajuizou ação judicial em primeira instância depois da publicação da Lei nº 13.465/2017 (DOU de 12/07/2017), mencionando interesse em purgar a mora.  

- Contudo, em razão da alteração promovida pela Lei nº 13.465/2017, impossível a purgação da mora após a averbação da consolidação da propriedade. Assim, cabe à parte-autora exercer o direito de preferência na aquisição do imóvel, até a data da realização do segundo leilão, nos termos do art. 27, §2º-B, da Lei nº 9.514/1997. 

- Não há ilegalidade na forma a ser utilizada para satisfação dos direitos da credora fiduciária, sendo inadmissível obstá-la de promover atos expropriatórios ou de venda, sob pena de ofender ao disposto nos artigos 26 e 27, da Lei nº 9.514/1997. 

- A parte agravante pretende a purgação da mora (a destempo) e a suspensão dos atos expropriatórios, não havendo pleito para a solução da dívida na forma legalmente admitida.  

- Agravo de instrumento provido em parte. (grifos nossos)  

(TRF 3ª Região, 2ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5026003-13.2022.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal JOSE CARLOS FRANCISCO, julgado em 22/03/2023, DJEN DATA: 27/03/2023)"                                         

APELAÇÃO. SFH. AÇÃO ANULATÓRIA. CÉDULA DE CRÉDITO IMOBILIÁRIO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. INADIMPLEMENTO. CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE. AUSÊNCIA DE VÍCIO. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO. (...)  

7. Observo, que apesar de afastada a aplicação subsidiária dos arts. 29 a 41 do DL nº70/66 para as hipóteses de execução garantida por alienação fiduciária, se apresenta possível ao devedor fiduciante, nos moldes do §2º-B do art. 27 da Lei nº 9.514/97, incluído pela Lei nº 13.465/2017, o direito de preferência para aquisição do imóvel até a data de realização do segundo leilão, mediante o pagamento do preço correspondente ao valor da dívida, somados os encargos legais, tributos e despesas inerentes ao procedimento de cobrança e leilão, inclusive custas e emolumentos.    

8. Observa-se que a apelante não comprovou a notificação pessoal do mutuário acerca das datas dos leilões. Consta na matrícula do imóvel que os leilões extrajudiciais realizados em 15.03.2022 e 30.03.2022 foram negativos e não consta qualquer informação sobre a notificação pessoal.  

9. A sentença a quo merece reforma. Não há necessidade de se dar início a outro procedimento de execução extrajudicial, no entanto, a CEF deverá observar a necessidade de notificação pessoal para as datas do leilão extrajudicial e o direito de preferência para aquisição do imóvel até a data de realização do segundo leilão, nos moldes do §2º-B do art. 27 da Lei n. 9.514/97, incluído pela Lei n. 13.465/2017.  

10. Apelação provida. (grifos nossos)  

(TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5001271-62.2022.4.03.6112, Rel. Desembargador Federal LUIZ PAULO COTRIM GUIMARAES, julgado em 16/03/2023, DJEN DATA: 21/03/2023)

Na hipótese em análise, a parte autora ingressou com a ação em 28/04/2023, já sob a vigência da alteração legislativa trazida pela Lei nº 13.465/2017, de modo que teria apenas o direito de preferência na aquisição do bem até o segundo o leilão.

De qualquer sorte, a parte apelante lançou mão de argumentos genéricos, não demonstrando interesse em purgar a mora ou exercer o seu direito de preferência.

Como já analisado anteriormente, verifica-se que em razão do atraso dos pagamentos das parcelas devidas pelo devedor fiduciante, e após a notificação do devedor para purgar a mora que se quedou inerte, foi consolidado a propriedade em favor do credor fiduciário, estando o procedimento extrajudicial na fase de leilão.

Destarte, além de demonstrar o vício quanto à ausência da notificação, deve a parte, simultaneamente, demonstrar que a sua intenção é de purgar a mora ou exercer o seu direito de preferência, demonstrando as condições de fazê-lo e, portanto, adimplindo integralmente o contrato.

Por conseguinte, não vislumbro vícios no procedimento extrajudicial, aptos a ensejar a sua nulidade.

Nos termos do art. 85, § 11, do CPC, em atenção aos parâmetros do art. 85, § 2º, do CPC, especialmente no tocante ao grau de zelo profissional e ao trabalho despendido em grau recursal, majoro em 1% (um por cento) o montante fixado na instância de origem a título de honorários advocatícios, totalizando 11% (onze por cento) sobre o valor da causa. Sua exigibilidade, contudo, deverá ficar suspensa em razão do deferimento de gratuidade da justiça, nos termos do art. 98, § 3º do CPC.   

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso de apelação.

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

APELAÇÃO. CONTRATOS. SFH. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. SUSPENSÃO DE LEILÃO. REGULARIDADE NO PROCEDIMENTO DE EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. PURGAÇAO DA MORA ATÉ ASSINATURA DO AUTO DE ARREMATAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.

- Impende mencionar que a alienação fiduciária de coisa imóvel é utilizada em contratos de mútuo em que o devedor, em síntese, recebe recursos do credor, fazendo a transferência da propriedade resolúvel do imóvel dado em garantia.

- A lei prevê expressamente que o descumprimento contratual, no todo ou em parte, ocasiona o antecipado vencimento da dívida e a consolidação da propriedade em nome da instituição financeira, o que, consequentemente, autoriza a realização do leilão público para alienação do imóvel a fim de possibilitar a quitação do débito.

- Analisando a matrícula do imóvel, nota-se que houve a consolidação da propriedade do imóvel em questão em nome da credora fiduciária Caixa Econômica Federal, sem que houvesse a purgação da mora, conforme certidão de decurso de prazo .

- Qualquer pedido de suspensão ou anulação de atos relativos ao procedimento de execução extrajudicial com base em irregularidades procedimentais deve ser acompanhado da demonstração pelo devedor de que foi frustrada a sua intenção de purgar a mora, a qual permitiria o prosseguimento regular da relação obrigacional.

- No caso em tela, resta evidente que transcorreu o prazo para purgação da mora sem o efetivo pagamento pelo devedor, sendo, portanto, consolidada a propriedade em nome da CEF.

- Ademais, o ajuizamento da ação (28/04/2023) dias antes da realização do leilão (1ª Praca: 02/05/2023 e 2ª Praça: 17/05/2023) induz à conclusão de que a parte devedora teria tido ciência inequívoca da data, hora e local do leilão.  

- Assim, nos termos da legislação em vigor, não cabe mais a purgação da mora após a consolidação da propriedade fiduciária, restando ao devedor apenas o exercício do direito de preferência, 

- Destarte, além de demonstrar o vício quanto à ausência da notificação, deve a parte, simultaneamente, demonstrar que a sua intenção é de purgar a mora ou exercer o seu direito de preferência, demonstrando as condições de fazê-lo e, portanto, adimplindo integralmente o contrato, o que não ocorreu no presente caso.

-  Apelação desprovida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.