Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma

REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 5030946-09.2022.4.03.6100

RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE

PARTE AUTORA: CLAUDIO ATANASILDO CORREA ROLDOS

Advogado do(a) PARTE AUTORA: TIAGO DE SOUZA MUHARRAM - SP389379-A

PARTE RE: UNIÃO FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 5030946-09.2022.4.03.6100

RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE

PARTE AUTORA: CLAUDIO ATANASILDO CORREA ROLDOS

Advogado do(a) PARTE AUTORA: TIAGO DE SOUZA MUHARRAM - SP389379-A

PARTE RE: DIRETOR DO DEPARTAMENTO DE IMIGRAÇÃO DA SUPERINTENDÊNCIA DA POLÍCIA FEDERAL NO ESTADO DE SÃO PAULO, UNIÃO FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

hrc 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Remessa necessária de sentença que, nos autos de mandado de segurança, concedeu a ordem, extinguiu o processo com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para confirmar a liminar em definitivo e determinar que seja recebido e processado o pedido de autorização de residência de Cláudio Atanasildo Correa Roldos, independentemente da conclusão do procedimento que apura possível infração administrativa. Sem condenação ao pagamento de honorários advocatícios, ex vi do artigo 25 da Lei nº 12.016/09 (ID. 285156736).

 

ID. 285156747, manifestação da União no sentido de que não interporá recurso.

 

ID. 286563521, da Ministério Público Federal no sentido do desprovimento da remessa necessária.

 

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 5030946-09.2022.4.03.6100

RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE

PARTE AUTORA: CLAUDIO ATANASILDO CORREA ROLDOS

Advogado do(a) PARTE AUTORA: TIAGO DE SOUZA MUHARRAM - SP389379-A

PARTE RE: DIRETOR DO DEPARTAMENTO DE IMIGRAÇÃO DA SUPERINTENDÊNCIA DA POLÍCIA FEDERAL NO ESTADO DE SÃO PAULO, UNIÃO FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

hrc 

 

 

 

 

V O T O

 

Remessa necessária de sentença que, nos autos de mandado de segurança, concedeu a ordem, extinguiu o processo com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para confirmar a liminar em definitivo e determinar que seja recebido e processado o pedido de autorização de residência de Cláudio Atanasildo Correa Roldos, independentemente da conclusão do procedimento que apura possível infração administrativa. Sem condenação ao pagamento de honorários advocatícios, ex vi do artigo 25 da Lei nº 12.016/09 (ID. 285156736).

 

Trata-se de mandamus impetrado por Cláudio Atanasildo Correa Roldos com o objetivo de determinar que seu requerimento de autorização de residência seja processado antes da resposta de seu recurso administrativo, ocasião em que o impetrante discordou da imposição de multa por estada irregular no Brasil.

 

Ressalta-se, conforme consignado por esta relatoria no recurso de agravo de instrumento interposto pelo impetrante, que está comprovado nos autos que a parte autora reside no Brasil há anos, onde se casou com uma brasileira em 2010 (ID. 269612015) e com ela teve três filhos nascidos no país entre 2012 e 2019 (ID 269612018, ID 269612022 e ID 269612024). 

Acerca da questão, oportuno ressaltar o que dispõe a Constituição Federal sobre os direitos e garantias fundamentais (grifei):  

  

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:    

 (...)    

 III - a dignidade da pessoa humana;    

 (...)   

    

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:    

 I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;    

 (...)   

 IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.    

    

Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:   

 (...)   

 II - prevalência dos direitos humanos;   

 (...)   

   

Em cumprimento aos comandos constitucionais, foi editada a Lei nº 13.445/2017 (Lei de Migração), que estabeleceu, entre seus princípios e garantias previstos no artigo 3º, o direito à reunião familiar como forma de dar efetividade aos pilares que regem a política migratória brasileira, consoante se verifica do artigo 30 do citado diploma legal:  

  

Art. 30. A residência poderá ser autorizada, mediante registro, ao imigrante, ao residente fronteiriço ou ao visitante que se enquadre em uma das seguintes hipóteses:   

 I - a residência tenha como finalidade:   

 (...)   

  i) reunião familiar;  

 (...)    

  

Constata-se que a Constituição consagra a cidadania e a dignidade da pessoa humana como fundamentos do Estado Democrático de Direito, que constitui a República Federativa do Brasil. Daí decorre que o Estado tem também a finalidade de promover o bem-estar de todos, reduzir as desigualdades sociais, proteger a família, afastar qualquer situação de tratamento desumano e prestar assistência social aos necessitados.  

 

O impetrante tem esposa e filhos brasileiros, o que impede de ser expulso do território nacional. É o que dispõe o artigo 55 da Lei nº 13.445/2017:  

  

Art. 55. Não se procederá à expulsão quando:  

 (...)  

 II - o expulsando:  

a) tiver filho brasileiro que esteja sob sua guarda ou dependência econômica ou socioafetiva ou tiver pessoa brasileira sob sua tutela;  

b) tiver cônjuge ou companheiro residente no Brasil, sem discriminação alguma, reconhecido judicial ou legalmente; 

 (...)  

  

Não se trata de confundir o regime jurídico da expulsão com o da autorização de residência. A questão que se coloca é a de que o estrangeiro, ainda que tenha ultrapassado o prazo de permanência no país e não tenha autorização para residência definitiva, não pode ser obrigado a deixar o território nacional. O intuito da norma é a proteção da família, tanto no sentido econômico quanto socioafetivo. Se já preenche um dos requisitos para permanecer no país, a regularização de sua situação migratória é medida que se impõe.  

 

Na espécie, o óbice para o processamento do pedido de autorização de residência não se encontra na lei e sim em ato infralegal. A Instrução Normativa nº 198-DG/PF, que disciplina os procedimentos de apuração de infrações e de aplicação da penalidade de multa, estabelecidos na Lei nº 13.445, de 24 de maio de 2017, e no Decreto nº 9.199, de 20 de novembro de 2017, estabelece em seu artigo 14 a necessidade de se concluir o processo de apuração de infração para se finalizar a tramitação de processos de autorização de residência, além de condicionar ao pagamento das multas aplicadas com fundamento na lei de migração, in verbis

 

Art. 14. O processo de apuração de infração, salvo expressa previsão legal em contrário, deve ser concluído antes de finalizar a tramitação de processos de autorização de residência, ficando condicionada ao pagamento das multas aplicadas com fundamento no disposto nos seguintes normativos: 

 I - na Lei nº 13.455, de 2017; e  

II - no Decreto nº 9.199, de 2017. 

(...) 

 

Ao condicionar o processamento do pedido de autorização de residência à finalização do procedimento de apuração de infração administrativa, a norma invade o princípio da reserva legal, na medida em que impõe uma condição não prevista em lei. Nesse sentido, já se decidiu no âmbito da 4ª Turma desta corte regional: 

 

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ESTRANGEIRO. PROCESSAMENTO DO PEDIDO DE REFÚGIO. RESTRIÇÕES IMPOSTAS POR PORTARIAS INTERMINISTERIAIS. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. RECURSO PROVIDO.  

- Necessários o fundamento relevante e o perigo da demora para a concessão da tutela de urgência (artigo 300 do Código de Processo Civil), o que foi demonstrado pelo recorrente.  

- A inabilitação ao pedido de refúgio prevista no ato normativo destoa dos preceitos estabelecidos na Lei de Migração, assim como o princípio da proibição de rechaço ao refugiado contemplado na Convenção das Nações Unidas sobre o Estatuto dos Refugiados (1951)  

- As Portarias Interministeriais nº 652 e nº 655/2021 extrapolaram os limites que lhe cabiam, enquanto ato regulamentar, notadamente porque no âmbito da Lei nº 13.979/2020, editada especialmente para disciplinar sobre medidas de enfrentamento da pandemia pela covid-19, nada foi disposto quanto à solicitação de refúgio. O mesmo se diga quanto à Portaria Interministerial nº 666/2022, que substitui as demais.  

- Agravo de instrumento provido.  

(TRF3, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO/SP 5024188-15.2021.4.03.0000, Relator(a) Desembargador Federal ANDRE NABARRETE NETO, Órgão Julgador 4ª Turma, Data do Julgamento 03/08/2022, Data da Publicação/Fonte Intimação via sistema DATA: 18/08/2022) 

 

Dessa forma, nos termos da legislação de regência da matéria e da jurisprudência citada, não merece reparos a sentença.

 

Ante o exposto, nego provimento à remessa oficial.

 

É como voto.

 

 

 



E M E N T A

 

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. REGULARIZAÇÃO MIGRATÓRIA. PROCESSAMENTO DO PEDIDO DE AUTORIZAÇÃO DE RESIDÊNCIA OBSTADO. CONCLUSÃO DE PROCEDIMENTO QUE APURA INFRAÇÃO ADMINISTRATIVA. CONDIÇÃO NÃO ESTABELECIDA POR LEI. SENTENÇA MANTIDA. 

- Mandamus impetrado por Cláudio Atanasildo Correa Roldos com o objetivo de determinar que seu requerimento de autorização de residência seja processado antes da resposta de seu recurso administrativo, ocasião em que o impetrante discordou da imposição de multa por estada irregular no Brasil.

- Está comprovado nos autos que a parte autora reside no Brasil há anos, onde se casou com uma brasileira no ano de 2010 (ID. 269612015) e com ela teve três filhos nascidos no país entre os anos de 2012 e 2019 (ID 269612018, ID 269612022 e ID 269612024). 

- Em cumprimento aos comandos constitucionais, foi editada a Lei nº 13.445/2017 (Lei de Migração), que estabeleceu, entre seus princípios e garantias previstos no artigo 3º, o direito à reunião familiar como forma de dar efetividade aos pilares que regem a política migratória brasileira.

- Constata-se que a Constituição consagra a cidadania e a dignidade da pessoa humana como fundamentos do Estado Democrático de Direito, que constitui a República Federativa do Brasil. Daí decorre que o Estado tem também a finalidade de promover o bem-estar de todos, reduzir as desigualdades sociais, proteger a família, afastar qualquer situação de tratamento desumano e prestar assistência social aos necessitados. 

- O impetrante tem esposa e filhos brasileiros, o que impede de ser expulso do território nacional.

- O óbice para o processamento do pedido de autorização de residência não se encontra na lei e sim em ato infralegal. A Instrução Normativa nº 198-DG/PF, que disciplina os procedimentos de apuração de infrações e de aplicação da penalidade de multa, estabelecidos na Lei nº 13.445, de 24 de maio de 2017, e no Decreto nº 9.199, de 20 de novembro de 2017, estabelece em seu artigo 14 a necessidade de se concluir o processo de apuração de infração para se finalizar a tramitação de processos de autorização de residência, além de condicionar ao pagamento das multas aplicadas com fundamento na lei de migração.

- Ao condicionar o processamento do pedido de autorização de residência à finalização do procedimento de apuração de infração administrativa, a norma invade o princípio da reserva legal, na medida em que impõe uma condição não prevista em lei (Precedente).

- Remessa necessária desprovida.

 

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, à unanimidade, decidiu negar provimento à remessa oficial, nos termos do voto do Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE (Relator), com quem votaram a Des. Fed. MÔNICA NOBRE e o Des. Fed. WILSON ZAUHY. Ausente, justificadamente, por motivo de férias, o Des. Fed. MARCELO SARAIVA. , nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.