Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
5ª Turma

HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Nº 5008361-56.2024.4.03.0000

RELATOR: Gab. 17 - DES. FED. MAURICIO KATO

PACIENTE: LUAN SILVA RIOS
IMPETRANTE: EDUARDO PEREIRA DOS SANTOS, SANDRA SILVA SAMPAIO CONCEICAO

Advogado do(a) PACIENTE: SANDRA SILVA SAMPAIO CONCEICAO - BA51367-A

IMPETRADO: 10ª VARA FEDERAL CRIMINAL DE SÃO PAULO, SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 10ª VARA FEDERAL CRIMINAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
5ª Turma
 

HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Nº 5008361-56.2024.4.03.0000

RELATOR: Gab. 17 - DES. FED. MAURICIO KATO

PACIENTE: LUAN SILVA RIOS
IMPETRANTE: EDUARDO PEREIRA DOS SANTOS, SANDRA SILVA SAMPAIO CONCEICAO

Advogado do(a) PACIENTE: SANDRA SILVA SAMPAIO CONCEICAO - BA51367-A

IMPETRADO: 10ª VARA FEDERAL CRIMINAL DE SÃO PAULO, SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 10ª VARA FEDERAL CRIMINAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado por Sandra Silva Sampaio Conceição em favor de Luan Silva Rios, contra ato imputado ao Juízo Federal da 10ª Vara Criminal em São Paulo/SP, nos autos do Inquérito Policial nº 5006540-40.2020.4.03.6181.

Sustenta a impetrante, em síntese, que:

a) o paciente foi preso em 30/01/2024, em razão de decisão proferida pelo Juízo Federal da 4ª Vara Federal Criminal de São Paulo/SP, suspeito de furto mediante fraude por meio de dispositivo eletrônico ou informático, com a utilização de servidor mantido fora do território nacional, lavagem de dinheiro e participação em organização criminosa, atuando, em tese, como programador e operador de arquivos maliciosos enviados por e-mails de phishing para as vítimas com o objetivo de invadir computadores e roubar seus dados para futuras fraudes qualificadas;

b) a decisão que decretou a prisão preventiva do paciente está fundamentada em prova não constante dos autos, o que viola a Súmula Vinculante 14, do STF, vez que não foi fornecido à defesa do acusado o acesso integral aos documentos da investigação;

c) em 11/03/2024 o paciente foi denunciado pelo Ministério Público apenas pelos delitos dos Arts. 154-A e 155, §4º, II, ambos do CP, requerendo o órgão ministerial a promoção do arquivamento do feito em relação ao delito de lavagem de dinheiro;

d) o juízo da 4ª Vara Federal Criminal de São Paulo, atuante como juiz de garantias, determinou a redistribuição do feito; entretanto, a 10ª Vara Federal Criminal de São Paulo, a quem foi redistribuído o feito, declinou da competência para o Juízo Federal de Osasco, que, por sua vez, devolveu os autos ao Juízo da 10ª Vara Federal Criminal, designado por este Tribunal para apreciar questões urgentes até decisão final no Conflito de Jurisdição nº 5031024-33-2023.4.03.0000, de Relatoria do Des. Fed. Ali Mazloum, pendente de decisão desde novembro de 2023;

e) há excesso de prazo de prisão, considerando que a denúncia não foi sequer recebida até a presente data, bem como em razão da demora para definição do juízo competente para processamento do feito;

f) o pedido de substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar e/ou aplicação de medidas cautelares diversas da prisão, pelo fato de o paciente ser o único responsável pelos filhos menores, foi indeferido pela autoridade impetrada em decisão lacônica para garantia da ordem pública, sem fundamentação em fatos concretos, já que não estão mais presentes os requisitos da prisão preventiva previstos no art. 312, do Código de Processo Penal, além da ausência de indícios mínimos de autoria e materialidade delitivas;

g) o paciente é primário, possui bons antecedentes, residência fixa, ocupação lícita e não foi denunciado pelos crimes de organização criminosa ou lavagem de dinheiro, sendo que os supostos delitos pelos quais é acusado não foram cometidos com violência ou grave ameaça;

h) o paciente é o único responsável por duas filhas menores de 12 anos e único provedor do lar; os avós maternos e paternos, residentes de outros estados, não possuem a menor condição, até mesmo financeira, para cuidar das infantes; a companheira do paciente e mãe das crianças não possui capacidade para cuidar das filhas, pois sofre de surtos psíquicos, nunca trabalhou, não tem estudo, não possui qualquer renda e está vivendo de pedinte e catados em feira e lixão, sem quaisquer condições mínimas de subsistência; salienta que ela e as crianças em estado de miserabilidade e vulnerabilidade nos quesitos básicos, sendo que a filha de 11 (onze) anos já foi diagnosticada com leve síndrome de depressão ante a ausência do pai e não quer mais frequentar a escola;

i) a prisão preventiva só pode ser decretada em casos excepcionais, podendo ser aplicadas, no caso, as medidas cautelares alternativas à prisão previstas no art. 319, do Código de Processo Penal;

j) houve quebra de cadeia de custódia, ante a ausência de relatório da polícia federal sobre a coleta, transporte e extração de dados do material apreendido na residência do paciente, sendo nulas as provas colhidas, as quais devem ser desentranhadas dos autos;

Requer a impetrante, assim, a concessão de liminar para o fim de substituir a prisão preventiva do paciente por prisão domiciliar ou sua revogação mediante a aplicação de medidas cautelares diversas da prisão, mormente inclusive à proibição total de acesso à internet e monitoramento eletrônico. No mérito, pleiteia a concessão da ordem.

Foram juntados documentos.

O pedido liminar foi indeferido (Id 287873071).

Informações prestadas pela autoridade impetrada (Id 287995133).

Em decisão Id 288072058 foi acolhido os embargos de declaração Id 288005265, opostos pela impetrante, apenas para corrigir erro material.

O pedido de reconsideração da decisão liminar foi indeferido (Id 290296624).

A Procuradora Regional da República, Dra. Rosane Cima Campiotto, manifestou-se pela denegação da ordem (Id 289056669).

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 


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PACIENTE: LUAN SILVA RIOS
IMPETRANTE: EDUARDO PEREIRA DOS SANTOS, SANDRA SILVA SAMPAIO CONCEICAO

Advogado do(a) PACIENTE: SANDRA SILVA SAMPAIO CONCEICAO - BA51367-A

IMPETRADO: 10ª VARA FEDERAL CRIMINAL DE SÃO PAULO, SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 10ª VARA FEDERAL CRIMINAL

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V O T O

 

 

Trata-se de habeas corpus impetrado em favor de Luan Silva Rios objetivando a substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar e/ou aplicação de medidas cautelares alternativas à prisão, em razão da decisão do Juízo da 10ª Vara Criminal Federal em São Paulo/SP que, nos autos do inquérito policial nº 5006540-40.2020.4.03.6181, manteve a prisão preventiva do paciente.

A prisão cautelar deve ser considerada exceção, já que, por meio desta medida, priva-se o réu de sua liberdade antes do pronunciamento condenatório definitivo, consubstanciado na sentença transitada em julgado. É por isso que tal medida constritiva só se justifica caso demonstrada sua real indispensabilidade para assegurar a ordem pública, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal, nos termos do artigo 312 do Código de Processo penal.

Contudo, a presunção de inocência não é incompatível com a prisão processual e nem impõe ao paciente uma pena antecipada, porque não deriva do reconhecimento da culpabilidade, mas aos fins do processo, como medida necessária à garantia da ordem pública, à conveniência da instrução criminal e/ou para assegurar a aplicação da lei penal.

Consta dos autos principais que foi instaurado Inquérito Policial nº 5006540-40.2020.4.03.6181 (IPL 2020.0119534), pela Polícia Federal, em 2020, a fim de investigar supostas fraudes bancárias por meio de crimes cibernéticos, tendo em vista relatos do gerente da Caixa Espanhola que identificou atividades suspeitas de trojans e malwares em território espanhol, visando roubar informações bancárias e pessoais dos usuários, que já geraram cerca de 3,6 milhões de euros em prejuízo.

Em 16/01/2024 a autoridade impetrada deferiu, nos autos do Pedido de Prisão Temporária nº 5009693-76.2023.4.03.6181, a representação formulada pela Autoridade Policial para afastamento de sigilos de dados, sequestro de bens, bloqueio de valores, expedição de mandados de busca e apreensão, bem como expedição de mandados de prisão temporária dos investigados Luan Silva Rios, Leonardo Leandro, Fernando Damásio, Edson Cavenaghi e Sandro Pontes. Em relação ao investigado LUAN, o juízo a quo ressaltou que, segundo representação da autoridade policial, este teria contratado diretamente os serviços ligados à infraestrutura de duas campanhas do malware “GRANDOREIRO”, além de que se verificou nas caixas de e-mail utilizadas por LUAN, diversos documentos que comprovam ações de phishing e outras ações suspeitas, bem como boletos e comunicação de instituições financeiras sobre a suspensão de serviços por suspeita de fraudes.

Em 30/01/2024 foi deflagrada a Operação Grandoreiro pela Polícia Federal, ocasião em que foram cumpridas referidas medidas de busca e apreensão e as prisões deferidas, apreendendo-se diversos documentos, aparelhos de telefone celular, computadores, valores em espécie e veículos em poder dos investigados, conforme se observa do Id 285936402.

Segundo Representação da Autoridade Policial para Decretação da Prisão Preventiva dos investigados, nos autos nº 5000899-32.2024.4.03.6181, no momento da deflagração da operação e cumprimento das medidas cautelares nos autos nº 5009693-76.2023.4.03.6181, a equipe de investigação realizou análise preliminar nos equipamentos eletrônicos de uso direto de Luan Silva, Leonardo Leandro e Edson Cavenaghi, considerando que esses seriam os possíveis executores do malware bancário.

Narra a autoridade policial que o Notebook da marca Samsung foi identificado como computador de Luan Silva Rios e acessado diretamente por meio de pen-drive SanDisk para copiar arquivos relacionados à investigação, bem como executado o programa KAPE para a obtenção de histórico de navegação e outras informações. A máquina encontrava-se ligada com o usuário “rox 2022” ativo e o nome do usuário foi identificado em uma das contas de e-mail cadastradas na empresa No-IP para o serviço de DNS dinâmico no Relatório de Análise de Alta Tecnologia (RAAT) 04/2022 - NUCAT/DRCC/CGFAZ/DICOR/PF, produzido pelo Perito Criminal. Foram encontrados diversos indícios sobre a utilização do malware Grandoreiro, como o arquivo “hfs.exe” e “Contador_cliente.exe, que corrobora com o programa malicioso malwere. Registrou, ainda, que a data da última modificação é 11/01/2024 (“bbg mexico.txt”, por exemplo), o que confirma a atualidade e contemporaneidade nas atuações criminosas e prováveis vítimas no México.

O Juízo da 4ª Vara Federal Criminal de São Paulo/SP deferiu representação da autoridade policial para decretar a prisão preventiva do paciente, cuja legalidade da decisão já foi objeto dos autos do habeas corpus nº 5004624-45.2024.4.03.0000, de minha relatoria, onde indeferi o pedido liminar para revogação da prisão preventiva do paciente.

 O Ministério Público Federal, em 07/03/2024, ofereceu denúncia, perante o juízo da 4ª Vara Criminal Federal, em desfavor de Edson Cavenaghi Junior, Luan Silva Rios e Leonardo Leandro pela prática, em concurso material entre os tipos, e na forma do art. 29 do Código Penal, dos crimes previstos nos arts. 154-A, §3º, e 155, §4º-B, c.c. §4º-C, inciso I, do Código Penal, por um número de vezes indefinido, mas certamente acima de sete, em continuidade delitiva (art. 71 do Código Penal), por causarem prejuízo no importe de pelo menos 125.785 euros. O órgão ministerial, ainda, promoveu o arquivamento do inquérito em relação ao suposto delito previsto no art. 1º da Lei 9613/98 (lavagem de capitais).

Após fixação da competência provisória do juízo da 10ª Vara Criminal Federal de São Paulo para apreciação de atos urgentes, conforme decido por este Eg. Tribunal (Id 318979234, dos autos principais), a autoridade impetrada manteve a prisão preventiva do paciente, nos seguintes termos (Id 287744755):

 “Trata-se de inquérito policial instaurado mediante portaria originariamente para apurar supostos crimes previstos nos arts. 2° da Lei 12.850/2013 e arts. 154-A e 155, §4°, II, ambos do CP (ID 43267874, p. 1).

A investigação teve início a partir de pedido de informações formulado pela adidância da Polícia Federal em Madri, com informações encaminhadas pela CaixaBank, instituição financeira com sede na Espanha, narrando ocorrência de fraudes bancárias eletrônicas, com vítimas no Brasil, cometidas a partir do uso de artefato malicioso da família GRANDOREIRO, um malware desenvolvido por programadores brasileiros e capaz de atacar instituições financeiras em todo o mundo (ID 43267874, p.3-57).

A autoridade policial elaborou relatório das investigações (ID 316702242, p. 60 a ID 316702243, p.4) e a 4ª Vara Federal Criminal de São Paulo determinou a intimação do MPF (ID 316715727).

O MPF ofereceu denúncia contra EDSON CAVENAGHI JUNIOR, LUAN SILVA RIOS e LEONARDO LEANDRO, imputando-lhes a prática dos crimes previstos nos arts. 154-A, §3º, e 155, §4º-B, c.c. §4º-C, inciso I, do Código Penal, por um número de vezes indefinido, mas certamente acima de sete, em continuidade delitiva (art. 71 do CP). Arrolou quatro testemunhas (ID 317497936, p.4-18).

Em cota, manifestou-se pelo reconhecimento da incompetência da Subseção Judiciária de São Paulo. Requereu que, antes do recebimento da denúncia, fosse formalizada consulta ao relator Conflito de Jurisdição n. 5031024-33.2023.4.03.0000 ainda pendente de julgamento perante o TRF da 3ª Região do caso, a fim de que esclareça se o recebimento da denúncia encontra-se no rol de “decisões urgentes” para qual o juízo foi liminarmente designado para tomar enquanto não resolvido o conflito. Alternativamente, caso o juízo entenda que há novo panorama fático, o MPF requereu o declínio de competência à Subseção Judiciária de Osasco/SP. Requereu ainda a apreciação dos seguintes pedidos: (i) promoção de arquivamento das investigações com relação ao crime de lavagem de dinheiro; (ii) informou que deixou de oferecer os benefícios da transação penal, do acordo de não persecução penal e da suspensão condicional do processo uma vez que os requisitos objetivos (ante às penas cominadas aos delitos, já somadas) e subjetivos (ante à gravidade em concreto dos injustos) não se encontram preenchidos; (iii) após o recebimento da denúncia, requereu seja determinado à PF que produza e traga aos autos relatório descritivo de todas as fraudes identificadas perpetradas pelos denunciados, individualmente, indicando data, valor e nome da vítima, a fim de complementar a prova a ser produzida em Juízo; (iv) após o recebimento da denúncia, requereu a instauração de novo inquérito policial destinado à continuidade das investigações conforme indicadas pela autoridade policial em seu relatório final; (v) pugnou pela juntada de folhas de antecedentes criminais e certidões em nome dos denunciados; (vi) requereu o indeferimento dos pedidos de liberdade formulados pelas defesas de EDSON nos autos n. 5009693-76.2023.4.03.6181 e 5000899-32.2024.4.03.6181 (ID 317497936, p.1-3).

promoção de arquivamento com relação aos crimes de lavagem de dinheiro encontra-se encartada nos ID 317497937 e 317573236.

Diante do oferecimento da denúncia nestes autos, com fundamento no art. 1°, §3°, da Resolução CJF3R n. 117/2024, a 4ª Vara Federal Criminal de São Paulo determinou a redistribuição do inquérito policial principal e de seus dependentes (Autos n. 5005172-88.2023.4.03.6181 - quebra, n. 5009693-76.2023.4.03.6181 – prisão temporária e n. 5000899-32.2024.4.03.6181 – prisão preventiva) a uma das demais varas da Subseção Judiciária de São Paulo (ID 317517119, p.2-3).

Os autos vieram redistribuídos a esta 10ª Vara Federal Criminal em 12/3/2024.

Em decisão proferida em 13/3/2024, esta 10ª Vara Federal Criminal de São Paulo acolheu a promoção de arquivamento formulada pela MPF com relação aos supostos crimes de lavagem de dinheiro e declinou da competência deste inquérito policial principal e de seus dependentes à Subseção Judiciária de Osasco/SP, nos termos do art. 70 do CPP, conforme requerido pelo próprio MPF (ID 317780668).

No mesmo dia 13/3/2024, os autos foram remetidos ao CEDIS e distribuídos por sorteio à 1ª Vara Federal Criminal de Osasco/SP.

Em decisão proferida em 18/3/2024, a 1ª Vara Federal Criminal de Osasco declarou-se incompetente para processamento dos autos e determinou a remessa deste inquérito policial e de seus dependentes a esta 10ª Vara Federal Criminal de São Paulo (ID 318274916).

Em decisão proferida em 19/3/2024, esta 10ª Vara Federal Criminal suscitou conflito de competência em face da 1ª Vara Federal Criminal de Osasco/SP, com determinação de remessa dos autos ao TRF da 3ª Região para designar juízo competente para adoção das medidas urgentes (ID 318475523).

Em decisão proferida em 21/3/2024, o Exmo. Desembargador Federal André Nekatschalow informou a inadequação do conflito instaurado por este juízo, ao entender que a discussão acerca da competência já é objeto do Conflito de Jurisdição n. 5031024-33.2023.4.03.0000. Determinou a devolução dos autos para que esta 10ª Vara Federal Criminal de São Paulo proceda a cópia das peças processuais que entender pertinentes a fim de instruir o Conflito de Jurisdição n. 5031024-33.2023.4.03.0000 e designou este juízo competente para decidir eventuais medidas urgentes (ID 318976311).

Em decisão proferida em 22/3/2024, foi determinada a intimação do MPF sobre os pedidos defensivos formulados pelas defesas de LUAN SILVA RIOS, LEONARDO LEANDRO e EDSON CAVENAGHI JUNIOR para apreciação por esta 10ª Vara, designada pelo E. TRF da 3ª Região para apreciar eventuais medidas urgentes no âmbito da Operação Grandoreiro (ID 319067995).

O MPF requereu o indeferimento dos pleitos de liberdade e de nulidade apresentados pelos acusados. Requereu, ainda, o encaminhamento de documentos que reforçam a competência territorial da Justiça Federal de Osasco ao E. TRF da 3ª Região para fins de instrução do conflito de jurisdição n. 5031024-33.2023.4.03.0000 (ID 319482442).

Finalmente, importante registrar que nos autos nos autos 5000899-32.2024.4.03.6181 (feito incidente de pedido de prisão preventiva), a defesa de LUAN requereu a concessão da liberdade provisória no ID 314731437 (em 15/02/2024), tendo seu pedido indeferido pela 4ª Vara Criminal no ID 315219690 (em 20/02/2024).

Nos mesmos autos, a defesa de EDSON requereu a revogação da prisão preventiva no ID 314554652 (em 14/02/2024), com seu pleito indeferido pelo mesmo juízo no ID 314868404 (em 16/02/2024).

Já a defesa de LEONARDO pleiteou a liberdade no ID 315810407 (em 26/02/2024), com decisão de indeferimento no ID 316195014 (em 28/02/2024)

Outrossim, extrai-se deste autos, que, irresignada, a defesa de LUAN interpôs Habeas Corpus perante o eg. Tribunal Regional Federal da 3ª Região, distribuído sob n. 5004624-45.2024.403.0000, requerendo novamente a revogação da prisão preventiva e a concessão de liberdade, tendo da mesma forma, seu pedido liminar indeferido em 02/03/2024, em decisão proferida pela 5ª Turma do TRF e juntada no ID 317601201, destes autos, estando desde o dia 20/03/2024 na conclusão para julgamento da egrégia corte.

É a síntese do necessário.

Fundamento e decido.

Em 2/2/2024, a 4ª Vara Federal Criminal de São Paulo decretou as prisões preventivas de EDSON CAVENAGHI JUNIOR, LUAN SILVA RIOS e LEONARDO LEANDRO com a seguinte fundamentação (ID 313594300 do pedido de prisão preventiva n. 5000899-32.2024.403.6181):

(...)

A prisão preventiva em matéria criminal visa garantir o normal desenvolvimento do inquérito policial ou a instrução processual, para eficaz aplicação do direito de punir.

Há várias modalidades de prisão provisória previstas no Código de Processo Penal, como flagrante (arts. 301 a 310), preventiva (311 a 316), em razão de pronúncia (art. 408, § 1º), resultante de condenação sem recurso em liberdade (art. 393, I) e a temporária (Lei 7690/89).

Há, também, espécies diversas de prisão, como a civel, e a criminal afeta à matéria militar (art. 5º, LXI, da Constituição) e as decorrentes do Estado de Defesa e de Sítio (arts. 136, § 3º e 139, II, da Constituição), estranhas a este feito. Lembre-se, também, das circunstâncias excepcionais da recaptura do réu evadido (art. 684 do CPP) e das questões eleitorais (previstas em lei específica).

O presente caso versa sobre prisão preventiva, que pode ser decretada pelo juiz em qualquer fase do inquérito ou da instrução criminal, ao teor do art. 311 do CPP. Não há que se falar em incompatibilidade entre a prisão cautelar e a presunção de não culpabilidade do réu, expressa no art. 5º, LVII, da Constituição Federal, já que ela própria prevê tal prisão em caso de flagrante, no inciso LXI do mesmo artigo. Sobre o assunto, observe-se a Súmula 09 do E.STJ.

O art. 312 do CPP autoriza a decretação da Prisão Preventiva nas seguintes hipóteses: “ART. 312. A PRISÃO PREVENTIVA PODERÁ SER DECRETADA COMO GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA, DA ORDEM ECONÔMICA, POR CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL, OU PARA ASSEGURAR A APLICAÇÃO DA LEI PENAL, QUANDO HOUVER PROVA DA EXISTÊNCIA DO CRIME E INDÍCIO SUFICIENTE DE AUTORIA.” (grifo nosso)

No entanto, como decisão acautelatória, há vários outros elementos condicionando a decretação da prisão preventiva.

Desse modo, é possível extrair, como requisitos para a decretação da prisão preventiva, o fumus delicti (probabilidade da ocorrência de um delito atribuído à pessoa determinada), e o periculum in mora (perigo ao normal desenvolvimento do processo, como fuga, destruição de prova, repercussão social e reiteração delitiva, bem como o perigo à ordem social e econômica). Há também as condições de admissibilidade, na forma da Lei processual penal.

O fumus delicti exige, assim, a existência de sinais exteriores (vale dizer, fáticos) que, por meio de raciocínio razoável e plausível, permitem afirmar a probabilidade real (não a mera possibilidade, mas também não a certeza, cabível apenas ao final do feito criminal) acerca da ocorrência de um delito e de sua autoria por um sujeito concreto culpável.

No caso dos autos, ao meu sentir, está presente o fumus delicti, pois manuseando o Inquérito Policial e seus processos incidentais, pode-se chegar a um raciocínio "prima facie", de que os investigados LUAN SILVA, LEONARDO LEANDRO e EDSON CAVENAGHI atuam na execução do malware bancário GRANDOEIRO.

Sobre indícios de autoria, a conduta delitiva vem satisfatoriamente descrita e individualizada na representação policial, com ricos detalhes.

Indo adiante, para a caracterização do periculum in mora, o fator determinante não é o tempo, mas sim a situação de perigo revelada pela conduta do (s) agente (s) supostamente criminoso (s).

No caso dos autos, considerando a quantidade de investigado (s), passo a o (s) analisar individualmente.

1. EDSON CAVENAGHI JUNIOR - CPF 000.875.262-12

Identificado como um dos responsáveis por operar o malware da família "GRANDOREIRO" e executar fraudes bancárias eletrônicas.

Na análise realizada no computador de uso de EDSON, apreendido em cumprimento ao mandado de busca e apreensão, foram encontrados arquivos cuja presença é forte indício de que EDSON não é apenas operador da fraude, mas também desenvolvedor de partes do malware.

Além dos programas executáveis “Operador.exe”, foram encontrados arquivos de mesmo nome e extensões “.csproj”, “.sln” e “.pdb”, comumente geradas quando se utiliza interfaces de desenvolvimento de software. Operador.exe – é um programa para comando e controle (C2) dos malwares que infectaram com sucesso os computadores, encontrado na máquina virtual 2021- 10-18_PP13082021.vhd. Dispõe de uma lista de computadores infectados - contendo informações como a qual banco está conectado, navegador utilizado e endereço IP - e comandos para controle remoto do computador infectado.

Segundo consta na representação, foi encontrado também um programa de nome “Enviador Terra 2019.exe”, que se trata de um agente de e-mail com capacidade de envio de e-mails em massa, o que é a primeira etapa da cadeia de infecção do malware: o envio de phishing realiza a primeira infecção do Grandoreiro.

Ainda, de acordo com a representação, durante a análise do computador apreendido verificou-se diversas transações em janeiro de 2024 de pagamentos a empresas que fornecem hospedagem de máquinas virtuais em nuvem e DNS dinâmico, a indicar fortemente que EDSON mantinha infraestrutura para a execução das fraudes até a data da diligência, o que confirma a contemporaneidade nas atuações criminosas.

2 - LUAN SILVA RIOS - CPF 404.307.928-16

Identificado como sócio da empresa União Distribuidora de Bebidas e Alimentos Ltda - CNPJ: 40.478.744/0001-30), sendo apontado como núcleo da associação criminosa.

Segundo aponta a representação policial, da análise do notebook apreendido durante o cumprimento do mandado de busca e apreensão na residência de LUAN, é possível afirmar que LUAN continua operando o malware, visto que foi identificado que a máquina virtual contém programas de comando e controle do malware que se encontravam em execução no momento do acesso.

Conforme consta na representação os IPs que se encontravam conectados no momento da diligência eram todos do México, sendo possível que esses IPs conectados digam respeito a vítimas no México infectadas com o malware Grandoreiro e vulneráveis à fraude executada nesse esquema, sendo que a data da última modificação é 11/01/2024 (“bbg mexico.txt”, por exemplo), o que confirma a atualidade e contemporaneidade nas atuações criminosas.

3- LEANDRO LEONARDO - CPF 320.073.188-57

Identificado como sócio da empresa UNIAO DISTRIBUIDORA DE BEBIDAS E ALIMENTOS LTDA, CNPJ: 40.478.744/0001-30, havendo indícios de que o núcleo do grupo criminoso seja composto pela empresa referida, sendo que LEANDRO é apontado como um dos responsáveis por contratar diretamente serviços ligados à infraestrutura de duas campanhas do malware “GRANDOREIRO”.

Houve o cumprimento de mandado de busca e apreensão endereço do investigado, constando dos autos que as máquinas virtuais hospedadas na nuvem com a infraestrutura do malware mantida pelo investigado estavam acessíveis e em execução na data da diligência (30/01/2024).

Da análise do notebook de uso do investigado, apreendido durante o cumprimento do mandado de busca e apreensão em sua residência, foram localizados dois arquivos abertos, um de nome "cartao loja”, com informações sobre valores e saldos, e outro de nome “bloco”, com uma listagem de endereços do domínio "freedynamicdns.org", endereços IP associados a usuário e senha, bem como informações de terceiros como nome, CPF, banco, conta, agência, etc, sendo que o arquivo “bloco” contém credenciais de máquinas virtuais hospedadas na nuvem.

Consoante a representação, as máquinas foram acessadas e verificou-se que continuavam acessíveis na data da diligência e que o arquivo também continha dados de contas bancárias de bancos da Espanha. Também foram encontrados arquivos REPETIDOR e arquivos de configuração do Grandoreiro com datas de 03/01/2024, os quais seriam similares aos encontrados com LUAN, o que confirma a contemporaneidade nas atuações criminosas.

Além disso, foram identificadas conversas via Telegram com referência a “CONEXÃO BRASIL EUROPA”, com compartilhamento de dados de contas de bancos espanhóis.

Como condições de admissibilidade, temos a possibilidade de decretação, em regra, apenas em casos de crimes dolosos punidos com reclusão (embora seja aceita em casos punidos com detenção, tratando-se de reincidência, ou acusado vadio, ou com dúvidas acerca de sua identidade), ao teor do art. 313 do CPP. Assim, não é aceita a prisão em casos nos quais o réu pode se livrar solto, contravenções ou crimes culposos.

No presente caso, tratam-se de crime (s) doloso (s), cuja (s) pena (s) máxima é (são) superior (es) a 04 (quatro) anos, portanto se enquadra na hipótese do artigo 313, I, do Código de Processo Penal.

Com o cumprimento das diligências deferidas nos autos n. 5009693-76.2023.4.03.6181, efetivadas no dia 30/01/2023, restou identificado a plena execução do malware bancário nos equipamentos eletrônicos dos investigados, sendo possível constatar que os investigados continuam praticando as fraudes.

Assim, por se tratar de delito complexo, via digital, que envolve uma verdadeira associação criminosa digital (art. 1º, inciso III, alínea I da Lei 7.960/89); considerando a gravidade concreta da (s) conduta (s); a atualidade dos fatos e a comprovação de que, soltos, continuam a delinquir, resta patente que nenhuma das medidas constantes do art. 319 do Código de Processo Penal é suficiente para afastar os riscos que a liberdade dos investigados acarreta à pacificação social, motivo pelo qual a prisão preventiva é de rigor.

Portanto, das razões de decidir supra, resta demonstrado a necessidade de se manter a custódia dos investigados, para garantia da ordem pública (art. 312, CPP), a fim de paralisar as fraudes bancárias transnacionais.

Caso contrário, soltos, diante da sofisticação do delito digital perpetrado (s) e colocado à disposição para a continuidade delitiva, a pacificação social não se atingirá.

Ante o exposto, DEFIRO O PEDIDO DE PRISÃO PREVENTIVA de:

a) EDSON CAVENAGHI JUNIOR, nascido ao 29/08/1992, filho de Edson Cavenaghi e Margarete de Lima Sanches Cavenaghi, portador do RG 6618406/GO e do CPF nº 000.875.262-12;

b) LUAN SILVA RIOS, nascido ao 17/03/1989, filho de Reinaldo Lima Rios e Tania Maria Trindade da Silva, portador do RG nº 465827172/SP e CPF 404.307.928-16;

c) LEONARDO LEANDRO, nascido ao 15/08/1983, filho de Gilberto Leandro e Dulce da Silva Leandro, portador do RG nº 43651460/SP e do CPF nº 320.073.188-57. ...”

Vê-se que a decisão da 4ª Vara, que decretou a prisão preventiva, tratou de forma individualizada as condutas praticadas por EDSON, LUAN e LEONARDO, e foi fundamentada na garantia da ordem pública (art. 312, CPP) a fim de paralisar as fraudes bancárias transnacionais.

Assim, verifico que não houve alteração fática desde a decisão que determinou a prisão preventiva dos acusados, bastante recente inclusive, que pudesse afastar o risco à ordem pública verificada.

Sobre as alegadas nulidades no cumprimento do mandado de busca e apreensão, registro que não merecem acolhida. Com efeito, a Informação de Polícia Judiciária n. 444646/2024 destaca as diligências realizadas no endereço de cada um dos acusados (ID 316702240, p.5-23). Ao final concluiu a autoridade policial que:

37. As diligências foram realizadas no cumprimento dos Mandados de Busca e Apreensão do processo 5009693-76.2023.4.03.6181 (cautelar) e 5006540-40.2020.4.03.6181. Foram identificados os computadores de uso dos investigados LUAN SILVA RIOS, LEONARDO LEANDRO e EDSON CAVENAGHI JUNIOR e foram realizadas buscas por indícios da continuidade da ação delitiva por parte destes.

38. Foram encontrados diversos indícios da utilização do malware Grandoreiro no computador dos investigados que continham relação com os programas examinados no Laudo 1999/2023 – SETEC/SP. Foram encontrados arquivos com diversas credenciais de e-mail e outras contas, sendo que algumas delas foram objeto de análise das Informações Nº 31782665/2023/SIAD/CCAT e Nº 31916000/2023/SIAD/CCAT.

39. O computador de LUAN contém credencial de um servidor hospedado na nuvem que se encontrava disponível no IP 198.50.195.215. Quando acessado, verificou-se que havia programas da infraestrutura do malware em execução bem como a conexão IP desses programas com potenciais vítimas do México (Figura 6, Figura 7 e Figura 8).

40. O computador de LEANDRO contém credencial de um servidor hospedado na nuvem que se encontrava disponível no IP 198.50.234.238. Quando acessado, verificou-se que havia programas da infraestrutura do malware em execução (Figura 12 e Figura 13). Foi encontrada conversa no Telegram com JEREMIAS (usuário JMATARAZO) em que LEANDRO recebe dados de contas de terceiros na Espanha (Figura 15).

41. O computador de EDSON contém credencial de conta de PayPal relacionada ao email “gdoorcomercio2827@gmail.com” com registro de transações para empresas que fornecem hospedagem em nuvem e serviço de DNS dinâmico em janeiro de 2024, indicando que o investigado mantém a infraestrutura do malware até a data da diligência (Figura 22). Há também arquivos que dão fortes indícios de que EDSON não é apenas operador da fraude, mas potencial desenvolvedor de partes do malware relacionadas ao comando e controle (Figura 17 e §33). Também foram encontradas possíveis credenciais furtadas, inclusive de domínios da Administração Pública - “gov.br” (Figura 23).

Posteriormente, foi elaborada a Informação de Polícia Judiciária n. 734292/2024, em complemento a anterior, que reforçou os elementos de materialidade quanto às supostas fraudes praticadas por LUAN SILVA RIOS e LEONARDO LEANDRO (ID 316702240, p.177-197). Neste sentido, concluiu a autoridade policial que:

“19. Registra-se que há diversas pesquisas no computador de LUAN por materiais de construção (Figura 4) de padrão de qualidade superior em dezembro de 2023 e janeiro de 2024. Os itens pesquisados são condizentes com o acabamento encontrado na cozinha e banheiro da residência de LUAN (Figura 5), aparentemente reformados há pouco tempo. A cozinha também contém eletrodomésticos de qualidade superior, destoando da aparência da residência como um todo. LUAN ainda pesquisa por carros e peças (Figura 7), como pelo modelo EVOQUE (Figura 8) da qual consta como detentor, por estadia em Salvador no período de carnaval (Figura 9) e por imóveis para compra em Carapicuíba e Salvador (Figura 10).

20. O computador de LEONARDO contém conversas do Telegram supostamente com LUAN em que se destaca a atuação de LUAN como fornecedor de contas de laranja, operador da fraude e mantenedor da infraestrutura do malware. LEONARDO também mantém conversa com JEREMIAS (“Je”, “JMATARAZO”, telefone +55 11 95810-1912), que atua supostamente como intermediador entre contas de laranja na Europa e os operadores. Os valores supostamente recebidos por JEREMIAS são de 3.652,00 €, 860,00 €, 488,00 € e 500,00€. Esses valores seriam de laranjas de fraudes operadas por LEONARDO.”

Vê-se, portanto, que as diligências foram devidamente documentadas e objeto de relatório descritivo, não havendo mácula na investigação a ensejar nulidade dos elementos de informação obtidos.

Os demais argumentos apresentados pelas defesas, quer sejam fatos pessoais envolvendo filhos menores, quer sejam antecedentes ou atividades desempenhadas, não justificam a alteração da decretação da prisão preventiva, notadamente porque já foram apreciados e indeferidos pela 4ª Vara Federal Criminal, bem como pelo fato de que perdura o risco concreto de reiteração criminosa, notadamente por se tratar de fraudes mediante uso de um malware bancário.

Assim, diante da não alteração da situação fática e jurídica, entendo pela necessidade de manutenção da prisão preventiva decretada pela 4ª Vara Federal Criminal para a garantia da ordem pública e a fim de evitar a reiteração delitiva.

Ademais, especificamente quanto a LUAN,já existe mais um pedido de revogação da prisão preventiva com a consequente concessão de liberdade provisória, pendente de julgamento pela 5ª Turma do TRF da 3ª Região nos autos distribuídos sob n. 5004624-45.2024.403.0000.

Registro ainda que, a aplicação de qualquer medida cautelar diversa da prisão (art. 319 do CPP) ou de prisão domiciliar não é apta a afastar o risco à garantia da ordem pública e a reiteração delitiva, diante do modus operandi do suposto crime praticado, praticado mediante acesso à internet. A proibição de acesso à internet também não é passível de ser fiscalizada por este juízo, a impor a manutenção do recolhimento dos presos.

Ante todo o exposto, acolho a manifestação do MPF, INDEFIRO os pedidos formulados pelas defesas e MANTENHO a prisão preventiva decretada contra EDSON CAVENAGHI JUNIOR, LUAN SILVA RIOS e LEONARDO LEANDRO, pelos fundamentos indicados pela 4ª Vara Federal Criminal de São Paulo, acrescidos pela fundamentação acima, nos termos dos artigos 312 c.c. 313, inciso I, ambos do Código de Processo Penal.

Em complementação aos documentos encaminhados ao E. TRF da 3ª Região no ID 319348820, DEFIRO o pedido formulado pelo MPF e determino o encaminhamento ao E. TRF da 3ª Região para fins de instrução do conflito de jurisdição n. 5031024-33.2023.4.03.0000 dos documentos de IDs 319482442 e 317497936 deste inquérito e dos IDs 292178194 e 294605326 dos autos n. 5005172-88.2023.4.03.6181.

 (...)”

 

Não está configurado o alegado constrangimento ilegal.

Reputo fundamentada a decisão que manteve a prisão preventiva do paciente ante a inexistência de alteração fática.

Com efeito, a necessidade de fundamentação das decisões justifica-se na medida em que só podem ser impugnadas pelas partes se as razões que as motivaram forem devidamente apresentadas pelo juízo, permitindo-se avaliar se a racionalidade da decisão predominou sobre o poder, com observância do devido processo legal.

Nada impede, contudo, que o juiz se utilize da técnica ad relationem para fundamentar suas decisões, na qual faz alusão apenas aos fundamentos de outras manifestações lançadas nos autos pelas partes ou decisões anteriores para o fim de adotá-las como razões de decidir, o que não vulnera o disposto no art. 93, IX, da Constituição Federal e não enseja a nulidade do ato decisório.

Observo que uma vez comprovada a existência delitiva, os indícios suficientes de autoria e a presença dos requisitos previstos pelo artigo 312 do Código de Processo Penal, é possível manter a prisão preventiva, com o objetivo de garantir-se a ordem pública, a ordem econômica ou assegurar-se a aplicação da lei penal.

Provas conclusivas da materialidade e da autoria do crime são necessárias apenas para a formação de um eventual juízo condenatório. Embora não se admita a instauração de processos temerários e levianos ou despidos de qualquer sustentáculo probatório, nessa fase processual deve ser privilegiado o princípio do in dubio pro societate.

Nesse sentido, entendo que não são somente os delitos praticados mediante violência ou grave ameaça que podem colocar em risco a ordem pública, mas também quando se evidencia, ainda que por indícios, que o acusado, se solto, poderá voltar a fazê-lo.

As razões invocadas na decisão para embasar a manutenção da ordem de prisão do ora paciente estão contextualizadas em dados concretos dos autos a demonstrar, a princípio, a necessidade da segregação cautelar, tendo em vista a gravidade do crime por ele praticado (envio de vírus, códigos, programas maliciosos, furtos de dados bancários e de comércio eletrônico, crimes que buscam roubar ou danificar os dados dos usuários) e as circunstâncias do fato (por meio da internet).

No caso, verifica-se dos autos principais que, durante a análise do Notebook apreendido, LUAN continuava operando o malware, visto que foi identificado na sua máquina virtual programas de comando e controle do malware que se encontravam em execução no momento do acesso durante a diligência policial, o que confirma a contemporaneidade nas atuações criminosas.

O preenchimento dos requisitos subjetivos como primariedade, residência fixa e ocupação lícita não implica, necessariamente, na revogação da prisão preventiva, se presentes as circunstâncias do artigo 312 do Código de Processo Penal.

A pena máxima prevista para os crimes supostamente praticados pelo paciente supera quatro anos, o que autoriza a sua segregação cautelar, nos termos do art. 313, I, do Código de Processo Penal.

A manutenção da custódia cautelar do paciente atende, assim, aos requisitos dos artigos 312 e 313, ambos do Código de Processo Penal, destinando-se à garantia da ordem pública e à aplicação da lei penal, conforme fundamentado na decisão impugnada.

Aduz a impetrante que a decisão que decretou a prisão preventiva está baseada em prova não juntada aos autos, cujo acesso não foi concedido à defesa, violando, pois, o devido processo legal, contraditório, ampla defesa e Súmula Vinculante 14 do STF. Entretanto, a impetrante, em sua petição inicial, sequer informa qual ou quais documento seriam esses, o que impede este juízo de verificar a veracidade de suas alegações.

Sustenta a impetrante, ainda, excesso de prazo da prisão, considerando que o paciente está preso desde 30/01/2024, sem que a denúncia tenha sido recebida até a presente data em virtude da pendência de decisão em conflito de jurisdição, em trâmite neste Tribunal, desde novembro de 2024.

Os prazos indicados na legislação processual penal para a conclusão dos atos processuais não são peremptórios, motivo pelo qual devem ser aferidos dentro dos critérios da razoabilidade. Nestes termos, o princípio da duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII, da CF) deve ser interpretado em harmonia e consonância com outros princípios constitucionais.

Não há uma definição unívoca quanto ao que seja razoável duração de um processo. É certo que tal conceito deve ser aferido, com cautela, no caso concreto, levando-se em conta peculiaridades de cada hipótese.

No caso o paciente foi preso em 30/01/2024 e a denúncia oferecida em 11/03/2024. No dia 12/03/2024 o Juízo Federal da 4ª Vara Criminal de São Paulo, que atuou no feito como juiz de garantias, considerando o oferecimento de denúncia e promoção do arquivamento pelo delito de lavagem de dinheiro, determinou a redistribuição do feito para outra Vara de competência criminal da Subseção Judiciária de São Paulo.

Em 13/03/2024 o Juízo da 10ª Vara Criminal Federal em São Paulo, a quem foi redistribuído o feito, acolheu a promoção de arquivamento do inquérito policial pelo delito de lavagem de dinheiro e declinou a competência do inquérito policial e de seus dependentes à Subseção Judiciária de Osasco/SP, nos termos do art. 70 do CPP, conforme requerido pelo MPF.

Em 18/03/2024, o juízo da 1ª Vara Federal de Osasco/SP determinou a remessa do feito ao Juízo da 10ª Vara Criminal Federal da Subseção Judiciária de São Paulo/SP para processar o presente feito até que seja julgado o conflito de jurisdição n° 5031024-33.2023.4.03.0000, fixando a competência territorial.

Na mesma data o Juízo Federal da 10ª Vara Criminal Federal de São Paulo suscitou conflito negativo de competência, sendo que o Desembargador Federal ALI MAZLOUM, em 21/03/2024, diante da duplicidade de conflitos de jurisdição, determinou o retorno dos autos ao primeiro grau ao juízo oficiante para eventuais medidas urgentes, que, em 02/04/2024, apreciou os pedidos das defesas e manteve a prisão preventiva decretada contra Edson Cavenaghi Junior, Luan Silva Rios e Leonardo Leandro pelo juiz de garantias.

Após decisão no Conflito de Jurisdição nº 5031024-33.2023.4.03.0000, em sessão de julgamento realizada em 16/05/2024 pela 4ª Seção desta Corte Regional, o Juízo da 10ª Vara Federal de São Paulo recebeu a denúncia, em 23/05/2024.

Nestes termos, a movimentação processual tem se dado com a observância do princípio da razoabilidade em razão das peculiaridades do caso concreto, não podendo se falar em excesso de prazo para a formação da culpa do paciente, que se encontra preso há pouco mais de quatro meses.

No tocante à alegação de quebra da cadeia de custódia, também não assiste razão à impetrante.

Segundo o disposto no art. 158-A do CPP, “Considera-se cadeia de custódia o conjunto de todos os procedimentos utilizados para manter e documentar a história cronológica do vestígio coletado em locais ou em vítimas de crimes, para rastrear sua posse e manuseio a partir de seu reconhecimento até o descarte”.

Por sua vez, os arts. 158-B a 158-F, todos do CPP, detalham as etapas da cadeia de custódia, como o rastreamento dos vestígios, a coleta, o acondicionamento, o transporte, o lugar para onde devem ser encaminhados, o recebimento, etc., tudo de forma a garantir a sua inviolabilidade e a idoneidade da prova para que não haja dúvida quanto à sua origem, até sua análise pelo magistrado, garantindo-se a todos os acusados o devido processo legal e os recursos a ele inerentes, como a ampla defesa, o contraditório e, principalmente, o direito à prova lícita.

Com efeito, as provas digitais necessitam de registro documental acerca dos procedimentos adotados pela polícia para preservação da integridade, da autenticidade e da confiabilidade dos elementos informáticos.

Segundo a decisão impugnada, a Informação da Polícia Judiciária n. 444646/2024 destacou as diligências realizadas nas residências de cada um dos acusados. Já na Informação da Polícia Judiciária n. 734292/2024, a autoridade policial reforçou os elementos de materialidade, mencionando as diligências que foram documentadas e objeto de relatório descritivo.

Cabe ressaltar que a quebra da cadeia de custódia não implica, de maneira obrigatória, a inadmissibilidade ou a nulidade da prova colhida. Nessas hipóteses, eventuais irregularidades devem ser observadas pelo juízo em conjunto com os demais elementos de provas produzidos na instrução criminal, a fim de decidir se a prova questionada ainda pode ser considerada confiável. Só após essa confrontação é que o magistrado, caso não encontre sustentação na prova cuja cadeia de custódia foi violada, poderá retirá-la dos autos ou declará-la nula. 

Ademais, a análise do caminho percorrido pela prova é matéria que demanda dilação probatória, medida incabível na via estreita do habeas corpus por total incompatibilidade com as regras e limites próprios da ação mandamental, de maneira que as teses alegadas pela impetrante devem ser dirimidas pelo juízo da causa, sob o contraditório judicial, ou deduzidas em eventual recurso de apelação a ser interposto pelo réu na ação penal, em caso de condenação, quando poderão, então, ser analisadas com maior profundidade.

Por fim, as hipóteses de cabimento da prisão domiciliar, inspiradas em razões humanitárias, estão previstas no art. 318 do CPP:

Art. 318.  Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for:        

I - maior de 80 (oitenta) anos;         

II - extremamente debilitado por motivo de doença grave;          

III - imprescindível aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 (seis) anos de idade ou com deficiência; (Incluído pela Lei 12.403, de 2016) - (Grifei)       

IV - gestante;          

V - mulher com filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos;          

VI - homem, caso seja o único responsável pelos cuidados do filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos.  (Incluído pela Lei 12.403, de 2016) -  (Grifei)       

Parágrafo único.  Para a substituição, o juiz exigirá prova idônea dos requisitos estabelecidos neste artigo.          

Não é demais ressaltar que a Lei 13.769/18, por sua vez, alterou o Código de Processo Penal para fazer inserir o art. 318-A:

Art. 318-A.  A prisão preventiva imposta à mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência será substituída por prisão domiciliar, desde que (Grifei)

I - não tenha cometido crime com violência ou grave ameaça a pessoa;                

II - não tenha cometido o crime contra seu filho ou dependente.                

A prisão domiciliar, introduzida pela Lei nº 12.403/11, veio como substituta da prisão preventiva anteriormente decretada e somente será cabível quando rigorosamente cumpridos os requisitos legais previstos no art. 318, do CPP.

A Lei 13.257/16, por sua vez, ao normatizar tratamento cautelar diferenciado à gestante e à mulher com filhos até 12 anos, ou pai (quando único responsável pela criança), incorporou ao ordenamento jurídico novo critério geral para a concessão da prisão domiciliar, a fim de impedir que a criança, na primeira infância, fique em situação de vulnerabilidade em razão da segregação do único responsável pelos seus cuidados.

Assim, todas essas circunstâncias devem constituir objeto de adequada ponderação, em ordem a que a adoção da medida excepcional da prisão domiciliar efetivamente satisfaça o princípio da proporcionalidade e respeite o interesse maior da criança.

Contudo, da dicção legal dos incisos VI do art. 318, CPP, o agente, para gozar da benesse, deve preencher cumulativamente dois requisitos, a saber: a) possuir filho com até 12 (doze) anos de idade incompletos; b) ser o único responsável pelos seus cuidados.

De fato, os elementos dos autos não indicam a presença dos requisitos necessários à substituição da prisão preventiva imposta ao paciente por prisão domiciliar, tal como possibilitado pelo artigo 318, VI, do Código de Processo Penal.

Não se desconhece a decisão exarada nos autos do Habeas Corpus Coletivo n. 143.641, de relatoria do Ministro Ricardo Lewandowski ou o Habeas Corpus Coletivo nº 165.704, de Relatoria do Ministro Gilmar Mendes, em que se concedeu a mulheres grávidas e provedoras dos cuidados aos filhos menores de 12 anos (aplicada por analogia ao pai quando único responsável), o direito de serem presas em regime domiciliar, resguardando-se os direitos dos próprios menores.

No entanto, observo que a impetrante não logrou comprovar que o paciente, a despeito de possuir filhas menores, que é o único responsável pelas crianças ou que a mãe não seja capaz de cuidar das filhas, considerando que a criança se encontra, inclusive, assistida por psicólogo em razão dos danos emocionais e problemas de relacionamento pessoal e escolar causados pela prisão do pai.

Neste passo, tenho que estando presente a necessidade concreta da manutenção da custódia cautelar, a bem do resguardo da ordem pública e visando impedir a reiteração delitiva, as medidas cautelares alternativas à prisão, introduzidas com a Lei n.º 12.403/2011, não se mostram suficientes e adequadas à prevenção e repressão dos crimes em comento diante do modus operandi do suposto crime praticado, já que a medida cautelar de proibição de acesso à internet não é passível de ser fiscalizada pelo juízo, razão pela qual é inaplicável ao caso em análise o art. 319, do CPP.

Ante o exposto, denego a ordem de habeas corpus requerida.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

PENAL. PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. ARTS. 154-A, §3º, e 155, §4º-B, C.C. §4º-C, INCISO I, DO CÓDIGO PENAL. PRISÃO PREVENTIVA. REQUISITOS DO ART. 312 DO CPP. MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS PREVISTAS NO ART. 319, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. EXCESSO DE PRAZO. QUEBRA DE CADEIA DE CUSTÓDIA. PRISÃO DOMICILIAR INCABÍVEL. ORDEM DENEGADA.

1. A prisão preventiva é necessária para garantir a ordem pública, por conveniência da instrução criminal e para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria.

2. O preenchimento dos requisitos subjetivos não implica, necessariamente, a revogação da prisão preventiva, se presentes os requisitos do artigo 312 do Código de Processo Penal.

3. Não se aplicam as medidas cautelares diversas da prisão, previstas no art. 319, do Código de Processo Penal, quando as circunstâncias do fato e as condições pessoais do agente não forem favoráveis.

4. Os prazos indicados na legislação processual penal para a conclusão dos atos processuais não são peremptórios, motivo pelo qual devem ser aferidos dentro dos critérios da razoabilidade. Nestes termos, o princípio da duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII, da CF) deve ser interpretado em harmonia e consonância com outros princípios constitucionais.

5. A existência de controvérsias quanto aos fatos e a análise do caminho percorrido pela prova com eventual quebra de cadeia de custódia é matéria que demanda dilação probatória, medida incabível na via estreita do habeas corpus por total incompatibilidade com as regras e limites próprios da ação mandamental.

6. Para a concessão de prisão domiciliar prevista no art. 318, III e VI, do CPP, necessária a demonstração inequívoca que o paciente seja o único responsável pelos cuidados do filho menor de 12 (doze) anos de idade ou que a criança menor de 6 (seis) anos de idade esteja em situação de vulnerabilidade familiar ou social.

7. Ordem denegada.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quinta Turma, por unanimidade decidiu denegar a ordem de habeas corpus requerida, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.