APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001095-16.2023.4.03.6123
RELATOR: Gab. 45 - DES. FED. ANTONIO MORIMOTO
APELANTE: SINDICATO DOS SERVIDORES PUBLICOS MUNICIPAIS,CAMARA MUNICIPAL E AUTARQUIAS DE ATIBAIA
Advogados do(a) APELANTE: DANILO LADINI - SP353078-N, EDGARD CORREIA DA SILVA JUNIOR - SP150663-N, VALDOMIRO PEREIRA DE CAMARGO JUNIOR - SP336591-N
APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001095-16.2023.4.03.6123 RELATOR: Gab. 45 - DES. FED. ANTONIO MORIMOTO APELANTE: SINDICATO DOS SERVIDORES PUBLICOS MUNICIPAIS,CAMARA MUNICIPAL E AUTARQUIAS DE ATIBAIA Advogados do(a) APELANTE: DANILO LADINI - SP353078-N, EDGARD CORREIA DA SILVA JUNIOR - SP150663-N, VALDOMIRO PEREIRA DE CAMARGO JUNIOR - SP336591-N APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO MORIMOTO (RELATOR): Trata-se de apelação interposta pelo SINDICATO DOS SERVIDORES PUBLICOS MUNICIPAIS,CAMARA MUNICIPAL E AUTARQUIAS DE ATIBAIA em face de sentença que, no bojo de ação civil pública ajuizada pelo apelante, julgou extinto o feito sem resolução do mérito sob o fundamento de inadequação da via eleita. Alega, em suas razões, que, por ser sindicato, detém legitimidade extraordinária para representar a categoria profissional respectiva, nos termos do art. 8º, III, da CF. Por essa razão e tendo como base a jurisprudência colacionada, a vedação estampada no parágrafo único do art. 1º da Lei nº 7.347/85 não se aplica aos substitutos processuais. Com contrarrazões da CEF (ID 280234390), os autos foram remetidos a este E. Tribunal. Aduz, em suma, que há vedação expressa quanto à utilização de ação civil pública para se discutir o FGTS e que o instrumento não se presta à declaração de inconstitucionalidade por Tribunal que não seja a Suprema Corte. Parecer do MPF (ID 280436103) opina pelo provimento do recurso, haja vista que a previsão de que questões tributárias, contribuições e FGTS não podem ser objeto de ações coletivas, não pode e não deve ser aplicada cegamente, sob pena de se negar acesso à justiça. Cita, ainda, precedentes desta E. Corte. É o relatório. jsm
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001095-16.2023.4.03.6123 RELATOR: Gab. 45 - DES. FED. ANTONIO MORIMOTO APELANTE: SINDICATO DOS SERVIDORES PUBLICOS MUNICIPAIS,CAMARA MUNICIPAL E AUTARQUIAS DE ATIBAIA Advogados do(a) APELANTE: DANILO LADINI - SP353078-N, EDGARD CORREIA DA SILVA JUNIOR - SP150663-N, VALDOMIRO PEREIRA DE CAMARGO JUNIOR - SP336591-N APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO MORIMOTO (RELATOR): Busca o apelante a declaração de nulidade da sentença que julgou extinto o feito sem resolução do mérito sob o fundamento de que a ação civil pública não seria o instrumento processual adequado para se discutir questões referentes ao FGTS por expressa previsão legal (art. 1º, parágrafo único, Lei nº 7.347/85). Entendo pertinente trazer à discussão o Tema 850/STF que definiu a possibilidade de o Ministério Público, por força dos arts. 127 e 129, III da CF, ajuizar civil pública para veicular pretensões que envolvam tributos, contribuições previdenciárias, o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS ou outros fundos de natureza institucional. CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PRETENSÃO DESTINADA À TUTELA DE DIREITOS INDIVIDUAIS DE ELEVADA CONOTAÇÃO SOCIAL. ADOÇÃO DE REGIME UNIFICADO OU UNIFICAÇÃO DE CONTAS DO FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO (FGTS). MINISTÉRIO PÚBLICO. PARTE ATIVA LEGÍTIMA. DEFESA DE INTERESSES SOCIAIS QUALIFICADOS. ARTS. 127 E 129, III, DA CF. REAFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. 1. No julgamento do RE 631.111 (Rel. Min. TEORI ZAVASCKI, DJe de 30/10/2014), sob o regime da repercussão geral, o PLENÁRIO firmou entendimento no sentido de que certos interesses individuais, quando aferidos em seu conjunto, de modo coletivo e impessoal, têm o condão de transcender a esfera de interesses estritamente particulares, convolando-se em verdadeiros interesses da comunidade, emergindo daí a legitimidade do Ministério Público para ajuizar ação civil pública, com amparo no art. 127 da Constituição Federal, o que não obsta o Poder Judiciário de sindicar e decidir acerca da adequada legitimação para a causa, inclusive de ofício. 2. No RE 576.155 (Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, DJe de 1º/2/2011), também submetido ao rito da repercussão geral, o PLENÁRIO cuidou da questão envolvendo a vedação constante do parágrafo único do art. 1º da Lei 7.347/1985, incluído pela MP 2.180-35/2001, oportunidade em que se reconheceu a legitimidade do Ministério Público para dispor da ação civil pública com o fito de anular acordo de natureza tributária firmado entre empresa e o Distrito Federal, pois evidente a defesa ministerial em prol do patrimônio público. 3. A demanda intenta o resguardo de direitos individuais homogêneos cuja amplitude possua expressiva envergadura social, sendo inafastável a legitimidade do Ministério Público para ajuizar a correspondente ação civil pública. 4. É o que ocorre com as pretensões que envolvam tributos, contribuições previdenciárias, o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS ou outros fundos de natureza institucional cujos beneficiários podem ser individualmente determinados (parágrafo único do art. 1º da Lei 7.347/1985). 5. Na hipótese, o Tribunal Regional Federal da 5ª Região, pautado na premissa de que o direito em questão guarda forte conotação social, concluiu que o Ministério Público Federal detém legitimidade ativa para ajuizar ação civil pública em face da Caixa Econômica Federal, uma vez que se litiga sobre o modelo organizacional dispensado ao FGTS, máxime no que se refere à unificação das contas fundiárias dos trabalhadores. 6. Recurso Extraordinário a que nega provimento. Tese de repercussão geral proposta: o Ministério Público tem legitimidade para a propositura de ação civil pública em defesa de direitos sociais relacionados ao FGTS. (g.n.) (RE 643978, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 09-10-2019, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-232 DIVULG 24-10-2019 PUBLIC 25-10-2019) Em complemento a este precedente, necessário lembrar do princípio da legitimidade ativa coletiva concorrente expresso no art. 129, §1º, da CF. Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: (...) § 1º - A legitimação do Ministério Público para as ações civis previstas neste artigo não impede a de terceiros, nas mesmas hipóteses, segundo o disposto nesta Constituição e na lei. (...) Entendo, portanto, que o E. STF, ao autorizar o Ministério Público a propor ação civil pública com o fim de se discutir o FGTS, também estendeu essa permissão a todos os legitimados concorrentes, incluindo os sindicatos. Esta E. Corte já possuía entendimento nesse sentido, permitindo o ajuizamento de ACP por sindicatos nessa mesma matéria, pois a legitimidade extraordinária dada a eles pela Constituição Federal não comportaria restrições infraconstitucionais. ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. FGTS. CORREÇÃO MONETÁRIA. CABIMENTO. 1. Precedentes jurisprudenciais sinalizam para o cabimento da ação civil pública por entidade sindical para postular diferenças de atualização monetária de saldos de contas vinculadas do FGTS de trabalhadores integrantes da respectiva categoria profissional (STJ, REsp n. 838353, Rel. Min. Teori Zavascki, j. 24.10.06). A jurisprudência deste Tribunal Regional Federal da 3ª Região, do mesmo modo, admite o emprego da ação civil pública por entidade sindical para cobrança de diferenças de correção monetária do FGTS (TRF da 3ª Região, AC n. 04035045619974036103, Rel. Des. Fed. Cecília Mello, j. 13.09.11; AC n. 00012194719954036000, Rel. Des. Fed. Luiz Stefanini, j. 07.02.06; AC n. 06030716219974036105, Rel. Des. Fed. Peixoto Júnior, j. 05.04.05; C n. 97030208479, Rel. Des. Fed. Ramza Tartuce, j. 05.05.98). 2. Apelações providas. (g.n.) (TRF 3ª Região, QUINTA TURMA - 1A. SEÇÃO, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 467094 - 0602486-78.1995.4.03.6105, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRÉ NEKATSCHALOW, julgado em 10/09/2012, e-DJF3 Judicial 1 DATA:19/09/2012 ) DIREITOS TRANSINDIVIDUAIS. POSSIBILIDADE DE AJUIZAMENTO DE AÇÃO COLETIVA POR SINDICATO, NA QUALIDADE DE SUBSTITUTO PROCESSUAL, PARA DEFESA DE DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS DE SEUS ASSOCIADOS. ART. 1.013, §3º, I, DO CPC - CAUSA MADURA. ADMINISTRATIVO. CORREÇÃO MONETÁRIA DE SALDOS DE CONTA VINCULADA AO FGTS. APLICAÇÃO DA TR. JUROS REMUNERATÓRIOS. ART. 13 DA LEI Nº 8.036/90. ART. 17 DA LEI N° 8.177/91. (...) 2. O sindicato apelante propôs ação coletiva, objetivando a condenação da Caixa Econômica Federal - CEF ao pagamento, a favor de cada trabalhador substituído pelo autor, o valor correspondente às diferenças de FGTS em razão da aplicação da correção monetária pelo INPC nos meses em que a TR foi zero ou inferior a inflação do período, nas parcelas vencidas desde 1999 ou alternativamente, que em lugar do INPC seja aplicado o IPCA ou qualquer outro índice de correção monetária que reponha as perdas inflacionárias nas contas do autor, desde janeiro de 1999. Não vislumbro óbice à ação coletiva, desde que se cumpram os requisitos de cabimento da mesma. Com efeito, os sindicatos têm legitimidade ad causam para defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas, nos termos da norma prevista no art. 8º, III, da Constituição Federal. Trata-se de legitimidade extraordinária decorrente da titularidade da ação para a defesa de direito alheio, denominada substituição processual, estando implícito no art. 5º, XXI, da Constituição Federal. Por outro lado, consoante entendimento firmado por este Tribunal, a vedação inserida no art. 1º, parágrafo único, da Lei nº 7.347/85, cujas disposições são expressas ao determinar que: "não será cabível ação civil pública para veicular pretensões que envolvam o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço", não alcançou as entidades sindicais, por força do art. 8º, III, da Constituição da República. Além disso, os precedentes jurisprudenciais são no sentido do cabimento da ação civil pública por entidade sindical para postular diferenças de atualização monetária de saldos de contas vinculadas do FGTS de trabalhadores integrantes da respectiva categoria profissional. Preliminar rejeitada. (...) (g.n.) (TRF 3ª Região, QUINTA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1956601 - 0011662-18.2013.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES, julgado em 05/11/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:12/11/2018 ) Quanto à questão da declaração de inconstitucionalidade trazida pela CEF em suas contrarrazões, não vejo como a decisão sobre o caso concreto usurparia a competência da Suprema Corte, até porque, diferentemente do que alega, o pedido do Sindicato-Autor não possui abrangência nacional. Ainda que assim não fosse, a interpretação da legislação em conformidade com a Constituição Federal não se confunde com o juízo de inconstitucionalidade sobre a referida normativa. AGRAVO INTERNO NA RECLAMAÇÃO. ALEGAÇÃO DE OFENSA À SÚMULA VINCULANTE Nº 10. ACÓRDÃO PROFERIDO EM JULGAMENTO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO QUE CONFIRMA MEDIDA ACAUTELATÓRIA DE PRESERVAÇÃO DO MEIO AMBIENTE. IRRADIAÇÃO DE NORMA CONSTITUCIONAL QUE NÃO SE CONFUNDE COM JUÍZO DE INCONSTITUCIONALIDADE. AUSÊNCIA DE OFENSA À CLÁUSULA DE RESERVA DE PLENÁRIO QUANDO SE TRATA DE DECISÃO DE NATUREZA PRECÁRIA. PRECEDENTES. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. A mera interpretação de preceitos constitucionais, sem negativa de vigência a qualquer diploma normativo, não tem o condão de representar ofensa à cláusula de reserva de plenário e, por conseguinte, ao enunciando da Súmula Vinculante nº 10. 2. In casu, a decisão reclamada, proferida em sede liminar, não se fundamentou na declaração de inconstitucionalidade de qualquer ato normativo, mas na interpretação dos fatos à luz da Constituição da República. 3. A Súmula Vinculante 10 se aplica apenas a situações em que haja declaração final de inconstitucionalidade de norma, não abarcando as decisões interlocutórias. Precedentes: Rcl 21723 ED-AgR, Rel. Min. Teori Zavascki, Segunda Turma, julgado em 15/09/2015; Rcl 17288 AgR, Rel. Min. Dias Toffoli, Primeira Turma, DJe de 26/08/2014. 4. Agravo interno desprovido. (Rcl 25294 AgR, Relator(a): LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 16-05-2017, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-120 DIVULG 07-06-2017 PUBLIC 08-06-2017) Ademais, a temática já foi levada para análise da Suprema Corte, o que resultou na tese fixada pelo Tema 850 com repercussão geral. Ante o exposto, dou provimento à apelação para anular a sentença e determinar o regular prosseguimento do feito em 1º grau, nos termos da fundamentação supra. É o voto.
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. FGTS. AJUZAMENTO POR ENTIDADE SINDICAL. LEGITIMIDADE EXTRAORDINÁRIA DOS SINDICATOS. SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL. PRINCÍPIO DA LEGITIMIDADE ATIVA COLETIVA CONCORRENTE. ART. 129, §1º, CF. TEMA 850/STF COM REPERCUSSÃO GERAL. INTERPRETAÇÃO DA LEGISLAÇÃO À LUZ DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. SENTENÇA REFORMADA PARA O REGULAR PROSSEGUIMENTO DO FEITO.
- Busca o apelante a declaração de nulidade da sentença que julgou extinto o feito sem resolução do mérito sob o fundamento de que a ação civil pública não seria o instrumento processual adequado para se discutir questões referentes ao FGTS por expressa previsão legal (art. 1º, parágrafo único, Lei nº 7.347/85).
- O Tema 850/STF definiu a possibilidade de o Ministério Público, por força dos arts. 127 e 129, III da CF, ajuizar civil pública para veicular pretensões que envolvam tributos, contribuições previdenciárias, o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS ou outros fundos de natureza institucional.
- Em complemento a este precedente, necessário lembrar do princípio da legitimidade ativa coletiva concorrente expresso no art. 129, §1º, da CF.
- O E. STF, ao autorizar o Ministério Público a propor ação civil pública com o fim de se discutir o FGTS, também estendeu essa permissão a todos os legitimados concorrentes, incluindo os sindicatos.
- Esta E. Corte já possuía entendimento nesse sentido, permitindo o ajuizamento de ACP por sindicatos nessa mesma matéria, pois a legitimidade extraordinária dada a eles pela Constituição Federal não comportaria restrições infraconstitucionais. Precedentes.
- Quanto à questão da declaração de inconstitucionalidade trazida pela CEF em suas contrarrazões, a decisão sobre o caso concreto não usurpa a competência da Suprema Corte, até porque, diferentemente do que alega, o pedido do Sindicato-Autor não possui abrangência nacional. A interpretação da legislação em conformidade com a Constituição Federal não se confunde com o juízo de inconstitucionalidade sobre a referida normativa. Precedente do E. STF.
- De rigor a nulidade da r. sentença, devendo os autos retornarem à vara de origem para o regular prosseguimento do feito.
- Apelação provida.