Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Seção

EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE (421) Nº 0007812-28.2018.4.03.6181

RELATOR: Gab. 44 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA

EMBARGANTE: PAULO SOARES SILVA

Advogados do(a) EMBARGANTE: MARIA AMELIA FREITAS ALONSO - SP167825-A, PAULO SOARES SILVA - SP151545-A

EMBARGADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

OUTROS PARTICIPANTES:

INTERESSADO: GINA CRISTINA DE SOUZA, JOANA CELESTE BONFIGLIO DE OLIVEIRA
 

ADVOGADO do(a) INTERESSADO: WILSON CARDOSO NUNES - SP242179-A

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Seção
 

EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE (421) Nº 0007812-28.2018.4.03.6181

RELATOR: Gab. 44 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA

EMBARGANTE: PAULO SOARES SILVA

Advogados do(a) EMBARGANTE: MARIA AMELIA FREITAS ALONSO - SP167825-A, PAULO SOARES SILVA - SP151545-A

EMBARGADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

INTERESSADO: GINA CRISTINA DE SOUZA, JOANA CELESTE BONFIGLIO DE OLIVEIRA
 ADVOGADO do(a) INTERESSADO: WILSON CARDOSO NUNES - SP242179-A

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

O Exmo. Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA (Relator):

 

Trata-se de Embargos Infringentes interpostos por PAULO SOARES BRANDÃO, atualmente denominado PAULO SOARES SILVA (consoante alteração de sobrenome em razão de casamento, conforme informado nos IDs 279243194, 279243203 e 279243207) em face do acórdão não unânime proferido pela E. Quinta Turma deste Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que “decidiu negar provimento à apelação da defesa e, de ofício, reduzir a pena de prestação pecuniária substitutiva para 03 (três) salários-mínimos vigentes à época dos fatos, a serem corrigidos monetariamente e, por maioria, decidiu, dar parcial provimento ao recurso de apelação da acusação para condenar Paulo Soares Brandão à pena de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de reclusão, regime inicial aberto, e 13 (treze) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, por prática do crime do art. 171, § 3º, c. c. o art. 29, ambos do Código Penal, substituída a pena privativa de liberdade por 2 (duas) restritivas de direitos, consistentes em prestação pecuniária de 3 (três) salários mínimos em favor de entidade beneficente (CP, art. 43, I, c. c. o art. 45, §§ 1º e 2º) e prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas (CP, art. 43, IV, c. c. o art. 46), pelo mesmo tempo da pena privativa de liberdade, cabendo ao Juízo das Execuções Penais definir a entidade beneficiária, o local de prestação de serviços e observar as aptidões do réu, nos termos do voto do Des. Fed. Mauricio Kato, acompanhado pelo Des. Fed. André Nekatschalow”, vencido o E. Desembargador Federal Paulo Fontes que negava provimento ao recurso de apelação da acusação.

 

Segue a ementa do julgado (ID 159533005):

 

E M E N T A

PENAL. PROCESSUAL PENAL. ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO. ARTIGO 171, § 3º, DO CÓDIGO PENAL. PRESCRIÇÃO VIRTUAL. AUTORIA E MATERIALIDADE. DOSIMETRIA. PENA-BASE. PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA.

1. A extinção da punibilidade por prescrição fundada em condenação apenas hipotética é vedada por falta de previsão legal, a teor da Súmula nº 438 do STJ.

2. Os indícios colhidos durante o inquérito policial, corroborados pela prova técnica e pelos depoimentos testemunhais judiciais, demonstram que parte dos réus obtiveram vantagem indevida da autarquia previdenciária ao instruir requerimento de benefício assistencial com declarações falsas que fundamentaram sua concessão.

3. Quando há dúvida razoável acerca dos elementos essenciais do crime, não cabe a condenação do agente, de modo que lhe é garantido, no processo penal, o benefício da dúvida, consubstanciado nos primados do princípio do in dubio pro reo.

4. Em se tratando de espécie de pena restritiva de direito que tem como finalidade o pagamento em pecúnia à vítima do crime ou a entidade pública ou privada com fim social, a prestação pecuniária deve ser reduzida quando se mostra desproporcional e não se coaduna com os dados concretos a respeito da situação financeira do agente.

5. Apelação da defesa desprovida. Recurso da acusação parcialmente provido.

 

 

Pretende a embargante a prevalência do voto vencido (ID 154264917), pela absolvição, alegando “não há nos autos provas suficientes para condenação de Paulo Soares Brandão”. Aduz que “mantendo o voto vencedor, nitidamente haverá violação aos artigos 155 e 156 do CPP, tendo em vista que o voto vencedor se baseou nas provas de inquéritos policiais e não nas provas produzidas em relação ao fato aqui apurado”. Afirma que “não há que se falar em dolo do Recorrente, sequer eventual, mas no máximo uma negligência de sua conduta” e “não bastante, tal conduta foi plenamente justificada pelo fato de que a assinatura da beneficiária estava com firma reconhecida, trazendo confiabilidade ao procurador”. Defende “no presente caso, vigorou uma presunção de dolo na conduta do Recorrente sem qualquer substrato processual ou probatório suficiente para tanto”, sendo “necessário invocar a norma-regra constitucional da presunção de inocência (art. 5º, LVII, CF/88), dado que, diante da clara insuficiência probatória para corroborar a narrativa do Parquet Federal, deve prevalecer, como muitíssimo bem ponderado pelo voto divergente, a máxima do in dubio pro reo”.

 

Contrarrazões do Ministério Público Federal pelo desprovimento do recurso (ID 251733468).

 

É o relatório.

 

À revisão, nos termos regimentais.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE (421) Nº 0007812-28.2018.4.03.6181

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INTERESSADO: GINA CRISTINA DE SOUZA, JOANA CELESTE BONFIGLIO DE OLIVEIRA
 ADVOGADO do(a) INTERESSADO: WILSON CARDOSO NUNES - SP242179-A

 

 

DECLARAÇÃO DE VOTO

 

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ALI MAZLOUM: Cuida-se de embargos infringentes em que se discute a existência de suficiência probatória para amparar a responsabilização criminal de advogado atuante em procedimento administrativo de solicitação de benefício assistencial a idoso, cujo deferimento embasou-se na prestação de informações incongruentes à realidade.

Com a devida vênia, divirjo do judicioso voto apresentado pelo E. Relator, voltado ao desprovimento recursal e consequente preservação do decreto condenatório que pesa em relação ao embargante, pela prática de estelionato contra a Previdência Social. 

De logo, lembro que no processo penal, para que haja uma condenação, é essencial que seja atingido o standard probatório minimamente satisfatório, obtendo-se “prova além da dúvida razoável”.

Sobre a hipótese de falta de prova para o decreto condenatório, escreveu FERNANDO DA COSTA TOURINHO FILHO, in “Código de Processo Penal Comentado”, volume I, 3ª edição, 1998, p. 635/636:

 

“Não existir prova suficiente para a condenação. Aqui se trata de um favor rei. Para que o Juiz possa proferir um decreto condenatório é preciso haja prova da materialidade delitiva e da autoria. Na dúvida, a absolvição se impõe. Evidente que a prova deve ser séria, ao menos sensata.(....)”

 

Nesse mesmo sentido também é a jurisprudência:

 

“PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ROUBO QUALIFICADO. ART. 157, §2º, INCISOS II E III, DO CP. MATERIALIDADE INCONTROVERSA. AUTORIA NÃO COMPROVADA. ABSOLVIÇÃO MANTIDA, NOS TERMOS DO ART. 386, INC. V, DO CPP. RECURSO NÃO PROVIDO.

1.A materialidade do delito é inconteste e está devidamente demonstrada pelo Boletim de Ocorrência, Auto de Reconhecimento, Auto de Exibição e Apreensão e Laudo Pericial, bem como pelos depoimentos testemunhais e do próprio réu.

2. O conjunto probatório carreado, nos autos, confirmou a ocorrência dos fatos. No entanto, não foi capaz de comprovar a responsabilidade da acusada pela autoria, vez que não existe prova suficiente para sua condenação, devendo prevalecer o princípio in dubio pro reo.

3. Vale dizer que as circunstâncias dos fatos não são de molde a afirmar categoricamente a inocência do réu, embora, certamente, não se possa de igual modo, permitir afirmar a sua culpabilidade.

4. Outrossim, sendo prova entendida como sinônimo de certeza, neste caso em discussão, vejo que as provas coligidas são insuficientes para constituir a certeza, sabendo-se que a condição essencial de toda condenação é a demonstração completa dos fatos arguidos.

5. Conclui-se, então, que a prova acusatória não é subsistente e hábil a comprovar a autoria, devendo ser mantida a absolvição, nos termos do art. 386, inc. V, do Código de Processo Penal.

6. Recurso não provido”.(TRF 3ª Região, 5ª Turma, ApCrim - APELAÇÃO CRIMINAL - 0008273-97.2018.4.03.6181, Rel. Desembargador Federal PAULO GUSTAVO GUEDES FONTES, julgado em 29/06/2022, Intimação via sistema DATA: 01/07/2022)

 

“DIREITO PENAL. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO TRANSNACIONAL DE DROGAS. MATERIALIDADE DELITIVA INCONTROVERSA. AUTORIA DELITIVA EM RELAÇÃO AO CORRÉU CARLOS HUGO INCONTROVERSA. AUTORIA DELITIVA EM RELAÇÃO AO CORRÉU MARCELINO. ABSOLVIÇÃO QUE SE IMPÕE. ELEMENTOS DE PERSUASÃO RACIONAL, COLACIONADOS NO CURSO DA ETAPA INSTRUTÓRIA, INSUFICIENTES PARA A EDIÇÃO DE UM ÉDITO DE NATUREZA CONDENATÓRIA. (...)

- Autoria delitiva. Réu MARCELINO. Absolvição. Elementos probatórios produzidos no curso da etapa instrutória são frágeis e deles não se extrai a segurança necessária que se deve haver para a edição de um édito de natureza condenatória. Em outras palavras, do teor dos testemunhos e do interrogatório do increpado, produzidos sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, não é possível deduzir que o réu detinha ciência acerca da existência de substâncias psicotrópicas escondidas no caminhão.

- Em se tratando de condenação penal, não se pode aceitar nada menos do que a absoluta e convicta certeza da autoria do delito, notadamente ao considerarmos a existência do princípio in dubio pro reo vigente em nosso ordenamento jurídico. (...)

A prova indiciária quando indicativa de mera probabilidade, como ocorre in casu, não serve como prova substitutiva e suficiente de autoria não apurada de forma concludente no curso da instrução criminal. Dessa maneira, embora não haja prova contundente da inocência do réu, não existe nos autos outros elementos probatórios aptos a corroborar a tese acusatória, havendo assim uma insuficiência de provas para impor uma condenação, põe-se em dúvida a participação dele na prática delitiva, imperando-se a aplicação do princípio in dubio pro reo”. (...)(APELAÇÃO CRIMINAL. CLASSE: ApCrim 5008657-96.2019.4.03.6000, Desembargador Federal FAUSTO MARTIN DE SANCTIS, TRF3 - 11ª Turma, Intimação via sistema DATA: 14/05/2021)

 

No caso dos autos, na esteira do voto vencido, cuido que a prova acusatória coligida não é suficiente e hábil a descortinar a presença de dolo na conduta do embargante e, por essa razão, o recurso comporta acolhida, com a supremacia do voto minoritário.

É certo que o embargante, na condição de patrono da beneficiária, procedeu ao protocolo do requerimento do benefício de amparo assistencial devido ao idoso, havendo inclusive a confirmação de que são de sua lavra as assinaturas contidas no documento em questão.

Todavia, não está devidamente caracterizado no caderno processual que haja ele ingerido, de qualquer forma, no preenchimento das informações (que depois se revelaram inverídicas) necessárias à solicitação do benefício referido, depreendendo-se do conjunto probatório que sequer contato dele houve com a beneficiária da prestação em causa, Madalena Tonon de Barros.

O que ecoa dos autos é que sua atuação se restringiu ao protocolo da benesse, subsistindo fundada dúvida se era de seu conhecimento a mendacidade dos dados apresentados para a fruição da benesse assistencial.

Decerto se pode cogitar que, no cumprimento de seu dever de ofício, deixou  o advogado, corréu na ação penal, de conferir se a documentação que levava ao INSS era idônea, mas tal espécie de falha não se confunde com a demonstração da presença do elemento volitivo necessário à responsabilização criminal.

Diante desse contexto, conclui-se que a prova acusatória não é efetiva e hábil a confirmar a perpetração de conduta desembaraçada e consciente de engodar a vítima (INSS), no específico escopo de obter uma vantagem ilícita para si ou para outrem.

Repise-se: não há certeza de que o embargante PAULO SOARES BRANDÃO (atualmente denominado PAULO SOARES SILVA conforme alteração de sobrenome em razão de casamento - IDs 279243194, 279243203 e 279243207) estava cônscio das informações inverídicas, ou mesmo que tenha orientado a beneficiária a inserir substratos fáticos falseados para lograr o deferimento do benefício.

Em situações assemelhadas e implicando o mesmo réu, já decidiu este e. Tribunal:

 

“PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ESTELIONATO PRATICADO EM DETRIMENTO DO INSTITUTO NACIONAL DE SEGURO SOCIAL - INSS. ARTIGO 171, §3º, DO CÓDIGO PENAL. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO. COMPROVADOS. DOSIMETRIA DA PENA. MULTA. REGIME ABERTO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS. APELOS PROVIDOS EM PARTE. NÃO COMPROVAÇÃO DO DOLO. ABSOLVIÇÃO DO RÉU. APELO PROVIDO.

I. Narra a exordial acusatória que os réus obtiveram vantagem indevida para si e para outrem em prejuízo da autarquia previdenciária, consistente na concessão irregular do benefício assistencial de amparo ao idoso (LOAS) para Eouko Sasai, induzindo e mantendo em erro o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS.

II. O crime de estelionato exige os seguintes requisitos: a) conduta dolosa do sujeito ativo; b) mediante ardil ou qualquer outro meio fraudulento; c) obtenção de vantagem ilícita; d) induzimento de terceiro em erro.

III. O fato em exame nesses autos se insere num amplo contexto de crimes cometidos dentro da Agência da Previdência Social de Vila Prudente, em São Paulo/SP apurados nas Operações Gerocômio e Ostrich deflagradas pela Polícia Federal.

IV. A materialidade e autoria delitiva restaram devidamente comprovadas nos autos.

V. Não há nos autos, prova suficiente a evidenciar o elemento subjetivo do tipo, visto que não se demonstrou, de forma robusta, que o réu PAULO SOARES BRANDÃO mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento tenha mantido em erro o INSS.

VI. O ônus da prova, para fins de condenação na seara penal, é incumbência do órgão acusatório, devendo se operar a absolvição quando não houver, entre outros, prova suficiente de que o réu perpetrou os fatos elencados na denúncia - como no caso em apreço - especialmente em respeito à presunção de inocência.

VII. Destarte, absolvo o réu PAULO SOARES BRANDÃO da imputação do crime do artigo 171, §3º, do Código Penal, com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal.

VIII. Os corréus PAULO THOMAZ DE AQUINO, MÁRCIA HELENA RODRIGUES SANTOS e DAIANA SPIRANO SANTOS SILVA agiram com o dolo necessário para a configuração do delito de estelionato, com o fim de obter o benefício assistencial indevido em nome de terceiro.

IX. Dosimetria da pena. Acolho parcialmente o pedido da acusação, para aplicar a valoração desfavorável das circunstâncias judiciais referentes à culpabilidade e consequências do crime para o réu PAULO THOMAZ DE AQUINO e consequências do crime para as corrés MÁRCIA HELENA RODRIGUES SANTOS e DAIANA SPIRANO SANTOS SILVA. Na segunda fase, não há circunstâncias agravantes e atenuantes para o corréu PAULO THOMAZ DE AQUINO; deve ser mantida a agravante prevista no artigo 61, inciso II, alínea “g”, do Código Penal, para a ré MÁRCIA HELENA RODRIGUES SANTOS e reconhecida, de ofício, a incidência da circunstância atenuante prevista no artigo 65, inciso III, alínea "d" do Código Penal na fração de um sexto (1/6) para a ré DAIANA SPIRANO SANTOS SILVA. Na terceira fase, resta mantida a causa de aumento do §3º do artigo 171 do Código Penal, à fração de 1/3 (um terço). Dessa maneira, redimensiono a pena definitiva dos réus, respectivamente, para 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de reclusão, 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão e 1 (um) ano e 8 (oito) meses de reclusão.

X. Em obediência à proporcionalidade que a pena de multa deve guardar com a pena privativa de liberdade, bem como de acordo com o sistema trifásico de dosimetria da pena, altero a r. sentença para fixar em 26 (vinte e seis) dias-multa para o réu PAULO THOMAZ DE AQUINO; 22 (vinte e dois) dias-multa para a ré MÁRCIA HELENA RODRIGUES SANTOS e 16 (dezesseis) dias-multa para a ré DAIANA SPIRANO SANTOS SILVA, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos.

XI. Embora as circunstâncias do artigo 59 do Código Penal não sejam totalmente favoráveis aos réus, verifico ser proporcional e razoável a fixação do regime aberto para início de cumprimento da pena, nos termos do artigo 33, §2º, alínea "c", do Código Penal.

XII. Entendo, ainda, que as mesmas circunstâncias judiciais desfavoráveis não se mostram suficientes para afastar a substituição prevista no artigo 44 do Código Penal. Destarte, mantenho a substituição da pena corporal por duas restritivas de direitos consistentes em prestação de serviços à comunidade, conforme critérios a serem estabelecidos pelo Juízo da Execução, e prestação pecuniária, destinada à entidade beneficente apontada pelo Juízo da Execução.

XIII. Por outro lado, a prestação pecuniária, que nos termos do artigo 45, §1º, do Código Penal, será fixada entre 1 e 360 salários mínimos, deve ser reduzida para o equivalente a 1 (um) salário mínimo, por se mostrar proporcional à situação financeira dos réus.

XIV. Apelo do réu PAULO SOARES BRANDÃO provido; apelo do Ministério Público Federal provido em parte; apelo das corrés MÁRCIA HELENA RODRIGUES SANTOS e DAIANA SPIRANO SANTOS SILVA provido em parte e apelo do réu PAULO THOMAZ DE AQUINO desprovido”.

(TRF 3ª Região, 11ª Turma, ApCrim - APELAÇÃO CRIMINAL - 0001211-69.2019.4.03.6181, Rel. Desembargador Federal JOSE MARCOS LUNARDELLI, julgado em 07/06/2022, DJEN DATA: 14/06/2022 – destaquei)

 

                                       

“PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ESTELIONATO MAJORADO. ART. 171, §3º, DO CÓDIGO PENAL. INSS. MATERIALIDADE COMPROVADA. AUTORIA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS PROBATÓRIOS. ABSOLVIÇÃO. APELAÇÃO PROVIDA.

(…)

2. PAULO SOARES BRANDÃO foi a pessoa que efetivamente protocolizou o requerimento de benefício de Amparo ao Idoso nº 88/541.633.207-3, em favor de Adélia Lazarini Guerreiro, conforme consta do formulário e das cópias dos documentos juntados às fls. 08/21 (ID 206609719). No entanto, conforme restou indicado nos laudos periciais nº 4915/2015 (ID 206609720), PAULO não foi o responsável pelo preenchimento do requerimento de concessão do benefício em tela.  

3. Das declarações da vítima Adélia, infere-se que ele nunca teve contato com a vítima, visto que Adélia entregou sua documentação para Claudino Antônio da Silva, que, por sua vez, afirma que simplesmente indicou os serviços de Paulo Thomaz de Aquino e para ele entregou a documentação de Adélia. Somente por meio de Paulo Thomaz de Aquino e/ou Claudino Antônio da Silva pode ter acesso aos documentos da vítima.

4. Ter o acusado atuado como procurador do benefício, conforme comprovado, não assegura automaticamente que tenha partido dele a orientação para o preenchimento dos documentos com as informações fraudulentas ou que possuía ele conhecimento das falsidades, mas que com elas concordou, a fim de auxiliar na prática da fraude.

5. Os elementos contidos nos autos não são suficientes para comprovar que o acusado não tinha conhecimento das falsidades e, com consciência e vontade, incorreu no crime, mas tampouco são suficientes para comprovar a autoria delitiva do acusado, sendo a absolvição medida de rigor com base na máxima constitucional do in dubio pro reo.

6. Absolvição.

7. Apelação da defesa provida”. 

(TRF 3ª Região, 5ª Turma, ApCrim - APELAÇÃO CRIMINAL - 0011994-28.2016.4.03.6181, Rel. Desembargador Federal PAULO GUSTAVO GUEDES FONTES, julgado em 10/04/2023, Intimação via sistema DATA: 12/04/2023 – destaquei).

     

Ante o exposto, DOU PROVIMENTO aos embargos infringentes, com a prevalência do voto vencido que preservou o decreto absolutório prolatado em relação ao acusado.

É como voto.

 


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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
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RELATOR: Gab. 44 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA

EMBARGANTE: PAULO SOARES SILVA

Advogados do(a) EMBARGANTE: MARIA AMELIA FREITAS ALONSO - SP167825-A, PAULO SOARES SILVA - SP151545-A

EMBARGADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

 

OUTROS PARTICIPANTES:

INTERESSADO: GINA CRISTINA DE SOUZA, JOANA CELESTE BONFIGLIO DE OLIVEIRA
 

ADVOGADO do(a) INTERESSADO: WILSON CARDOSO NUNES - SP242179-A

 

 

 

 

V O T O - VISTA 

 

 

 

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:

Pedi vista dos autos para melhor analisar o conjunto probatório e, após analisar com detença os fatos e o plexo normativo pertinente à matéria, acompanho integralmente as conclusões do e. Relator.

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

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EMBARGANTE: PAULO SOARES SILVA

Advogados do(a) EMBARGANTE: MARIA AMELIA FREITAS ALONSO - SP167825-A, PAULO SOARES SILVA - SP151545-A

EMBARGADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

INTERESSADO: GINA CRISTINA DE SOUZA, JOANA CELESTE BONFIGLIO DE OLIVEIRA
 ADVOGADO do(a) INTERESSADO: WILSON CARDOSO NUNES - SP242179-A

 

 

 

V O T O

 

O Exmo. Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA (Relator):

 

O objeto dos presentes embargos infringentes versa sobre a existência de prova suficiente para a condenação do embargante, pelo delito de estelionato consumado contra a Previdência Social, pugnando a Defesa pela prevalência do voto vencido, mantenedor do decreto absolutório de primeiro grau.

 

O recorrente Paulo Soares Brandão, atualmente denominado Paulo Soares Silva, atuou como advogado no pedido fraudulento do benefício de prestação continuada (LOAS) da pretensa segurada Madalena Tonon de Barros, no ano de 2010, com a concessão do pleito administrativo pela servidora do INSS Joanã Celeste Bonfiglio de Oliveira, gerando prejuízos da ordem de mais de vinte e um mil reais aos cofres públicos.

 

Da análise dos autos, entendo que os fundamentos adotados no voto vencedor são os que melhor se colocam para a hipótese sob exame. Transcrevo o trecho pertinente do voto vencedor da E. Relator Desembargador Federal Maurício Kato (IDD 159533004 - Pág. 7/13):

 

 

(...) a materialidade delitiva está devidamente demonstrada.

Com efeito, na hipótese dos autos, o crime de estelionato majorado restou patente por meio dos seguintes elementos:

a) Cópia do Processo Administrativo relacionado ao benefício nº 88/542.085.906-4, com o requerimento de LOAS apresentado no INSS em 06.08.2010, em benefício de Madalena Tono de Barros, com carimbo da funcionária Joanã Bonfiglio, assim como Declaração sobre composição do grupo e renda familiar, indicando como endereço de Madalena a Rua Visconde de Cairu, nº 9, Conjunto nº 2, Jardim Paulista, na cidade de Guarulhos/SP e informando que ela vivia sozinha, com o auxílio de doações da igreja. Também consta do processo, documentos pessoais da beneficiária, uma conta de energia elétrica em nome de Maria Cristina Hernandez Lovitto, com uma declaração também em seu nome dizendo que Madalena residia no endereço apontado no comprovante e uma procuração assinada por Madalena em favor de Paulo Soares Brandão, com data de 19.07.2010 (id. 148534807);

b) Cópia da sentença proferida nos autos do processo nº 2006.61.00.014247-8, que autorizou Paulo Soares Brandão a protocolar requerimentos de benefício previdenciário sem prévio agendamento, além de impedir o limite de requerimentos (id. 148534807);

c) Dados do DATAPREV em nome de Madalena e seu marido, Sr. João Sebastião de Barros, indicando que este último recebia aposentadoria especial no valor de R$ 2.039,64 (dois mil e trinta e nove reais e sessenta e quatro centavos) em outubro de 2012 (id. 148534807);

d) Termo de Declarações de Madalena Tonon de Barros perante o INSS, em que afirmou ter contratado Gina Cristina para tratar de seu benefício. Informou ter pagado a ela a quantia correspondente aos quatro primeiros meses de benefício, por meio de depósito bancário em nome de Matheus Souza Oliveira. Afirmou, também, que nunca se separou do seu marido e tampouco residiu no endereço apontado no requerimento (id. 148534807);

e) Documento do INSS informando sobre a suspensão do benefício de Madalena devido à constatação de ausência dos requisitos e cálculo dos valores recebidos indevidamente no lapso de 06.08.2010 a 04.10.2013, no total de R$ R$ 21.883,00 (vinte e um mil, oitocentos e oitenta e três reais) (id. 148534807);

f) Relatório Conclusivo Individual do processo nº 35366.000536/2013-93, relativo ao benefício de Madalena Tonon de Barros (id. 148534807);

g) Laudos Periciais – Documentoscopia nº 3842/2014, nº 4896/2015 e nº 5044/2016, com a conclusão de que a assinatura de Maria Cristina Hernandez Lovitto na Declaração de Residência apresentada no processo administrativo previdenciário é autêntica, assim como que partiram do punho de Paulo Soares Brandão os lançamentos apostos na procuração nos campos “local e data” e “assinatura do procurador” (id. 148534807 e 148534808) e

h) Cópias do Relatório Final da Operação Ostrich (id. 148534816).

Por outro lado, no tocante à autoria delitiva entendo que há elementos suficientes quantos aos réus Gina Cristina de Souza e Paulo Soares Brandão, senão vejamos:

Tanto em sede policial quanto em juízo a testemunha Maria Cristina Hernandez Lovitto confirmou residir na Rua Visconde de Cairu, nº 09, Jardim Paulista, na cidade de Guarulhos/SP, porém negou ter realizado qualquer declaração de que Madalena Tonon também morava neste endereço. Conquanto tenha confirmado em sede policial a autenticidade da assinatura lançada na declaração do INSS, em juízo alterou sua versão.  Por fim, alegou não conhecer nenhum dos acusados (id. 148534807 e 148534940).

A beneficiária Madalena Tonon de Barros informou durante o inquérito policial e depois confirmou judicialmente que procurou a Dra. Gina para intermediar seu pedido de benefício junto ao INSS. Alegou que foi ela quem lhe entregou os documentos para assinatura e confirmou não ter lido o seu teor, muito embora não se recorde se o papel recebido estava em branco. Esclareceu que tomou conhecimento do serviço prestado por Gina por meio de uma vizinha, que acredita chamar-se Lucia. Declarou, ainda, que viu Gina apenas uma vez, quando foi ao banco fazer o cartão para recebimento do benefício. Confirmou ter feito o pagamento dos valores acertados com ela por meio de depósito na conta de Matheus de Souza Oliveira, filho de Gina. Admitiu ser suas as assinaturas presentes nos documentos do INSS, contudo relatou que o endereço neles indicado não é verdadeiro. Também confirmou nunca ter se separado do seu marido até o falecimento dele, em 2012. Ao final, disse que não conhecia Paulo Soares Brandão e, devido ao tempo que passou, não teria condições de reconhecer Gina (id. 148534807 e 148534939).

A informante Edilrene Santiago Carlos, confirmou judicialmente ter trabalhado no escritório de Paulo Soares Brandão de 2006 até abril de 2008. Relata que no ano de 2010 foi procurada por Paulos Soares para lhe auxiliar no protocolo de alguns pedidos de benefício previdenciário, sendo que recebeu a quantia de R$ 7.000,00 (sete mil reais) para tal serviço. Declarou que foi instruída por ele a procurar, na agência do INSS, a servidora Joanã, o que ela efetivamente fez. Também mencionou que assinou alguns requerimentos de benefício, conforme orientação da servidora, porém não os leu. Por fim, afirmou não conhecer a pessoa de Gina Cristina (id. 148534941).

As testemunhas de defesa Odete dos Santos Borges e Katia Aparecida da Silva limitaram-se a atestar a boa conduta de Gina Cristina (id. 148534942 e 148534943).

Ouvida em Juízo, a acusada Gina Cristina forneceu basicamente a mesma versão dos fatos já apresentada no âmbito policial, no sentido de negar a conduta delitiva. Relatou que é vendedora há cerca de 20 anos e que foi casada com Paulo Thomaz de Aquino, o qual era proprietário de um escritório que atuava no ramo de requerimentos de benefícios junto ao INSS. Disse que nunca trabalhou no mencionado escritório, mas admite que lá estava algumas vezes a pedido do seu ex-marido devido à alta rotatividade de funcionários, ocasião em que chegou a receber alguns documentos entregues em envelopes fechados. Ao ser indagada sobre o uso da conta bancária do seu filho para depósitos da beneficiária Madalena Tonon, disse que Paulo Thomaz usava a conta do seu filho (na época menor de idade) para fazer movimentação de algumas despesas. Relatou que não fazia o controle da conta, logo não imaginava que havia valores depositados por terceiros, pois somente a utilizava para sacar o valor que o pai do seu filho ia depositar. Disse não conhecer Paulo Soares Brandão, Joanã Celeste Bonfiglio de Oliveira ou Madalena Tonon de Barros. Também negou ter ido à residência de qualquer pessoa para retirar ou entregar documentos e tampouco acompanhá-las no banco (id. 148534807 e 148534944).

O réu Paulo Soares Brandão igualmente negou a prática dos fatos. Durante o inquérito policial o réu esclareceu que seu escritório possuía uma liminar que o autorizava a protocolar requerimentos de benefícios sem limitação de números e sem prévio agendamento. Devido a tal circunstância, vários intermediários passaram a procurá-lo. Neste caso, recebia os formulários preenchidos, os conferia e depois entregava no INSS. Negou ter solicitado a qualquer pessoa que se dirigisse a uma servidora específica da autarquia. Admitiu que Edilrene trabalhou em seu escritório e informou que pediu a ela que protocolasse “pouquíssimos” benefícios. Também mencionou que os requerimentos chegavam em suas mãos já preenchidos e que não sabia que os selos de tabelião eram falsificados. Disse não se recordar de Paulo Thomaz de Aquino e negou as acusações que ele lhe fez, no sentido de que o teria chamado para arregimentar pessoas para requerimentos previdenciários fraudulentos. Por fim, confirmou ler o conteúdo de todos os requerimentos, alegando nunca ter desconfiado das contradições neles existentes (id. 148534807).

Durante a audiência de instrução e julgamento, esclareceu que apenas atuou como procurador de Madalena, tendo recebido os documentos já preenchidos e com firma reconhecida. Declarou que, muito embora tenha feito o requerimento do benefício no INSS, nunca conversou com a beneficiária. Relatou que o escritório de Paulo Thomaz de Aquino servia como intermediário entre seu escritório e os potenciais clientes da área previdenciária, assim como ocorria com outros parceiros. Disse que conheceu Paulo Thomaz devido à liminar que seu escritório tinha, que permitia o requerimento de vários benefícios por dia sem necessidade de prévio agendamento. Também informou que Paulo Thomaz lhe pagava em espécie, já que ele costumava acompanhar os segurados até o banco, oportunidade na qual estes últimos o pagavam pelos serviços prestados. Questionado, afirmou ter trabalhado com Paulo Thomaz de Aquino até 2010, quando seu escritório deixou de atuar na área previdenciária. Por derradeiro, confirmou ser sua a assinatura contida na procuração e declarou não conhecer a acusada Gina Cristina (id. 148534945 e 148534946).

Não obstante a negativa dos acusados, das declarações acima é possível extrair todo o modus operandi do grupo criminoso que atuou em prejuízo do INSS.

(...)

Quanto ao réu Paulo Soares Brandão, também não vejo como afastá-lo dos fatos criminosos.

A prova pericial confirmou ter partido do seu punho a assinatura presente na procuração exibida no requerimento administrativo de Madalena, sendo tal circunstância também admitida pelo acusado.

O réu ainda confessou judicialmente que trabalhava com Paulo Thomaz de Aquino, ex-marido da ré Gina, sendo que este exercia função de intermediário com os segurados. Negou, no entanto, que soubesse algo a respeito das falsificações presentes nos requerimentos.

Sua parceria com Paulo Thomaz de Aquino também foi confirmada por este que o acusou de tê-lo auxiliado nas fraudes, tanto que tal questão foi objeto de questionamento no interrogatório do réu Paulo Soares durante o inquérito policial.

Também do próprio interrogatório de Paulo Soares se extrai a comprovação do dolo, ao menos eventual.

A versão de que ele recebia os documentos já preenchidos e, portanto, não teria condições de averiguar a veracidade de cada requerimento e declaração, se mostra pouco plausível. Isso porque ele afirmou em sede policial que conferia os documentos antes de levá-los para o protocolo, além disso é pouco provável que um advogado não percebesse que a documentação apresentada por seus intermediadores possuíssem quase sempre as mesmas letras, apontassem um estado civil dos requerentes geralmente opostos àqueles indicados nas certidões de casamento juntadas e ainda exibissem frequentemente declarações de que os beneficiários eram sustentados por doações e moravam na casa de terceiros.

(...)

Assim, de rigor a condenação dos réus Gina Cristina de Souza e Paulo Soares Brandão pela prática do crime do art. 171, § 3º, do Código Penal (...).

 

 

Com efeito, na apreciação do conjunto probatório produzido nos autos à luz do contraditório e da ampla defesa, não vislumbro dúvida razoável sobre a presença de provas bastantes para a condenação, a fim de acolher-se a motivação exposta no voto vencido.

 

Em primeiro ponto, não se trata de punir um “modus operandi” indiligente do embargante, nas palavras do E. Desembargador Federal Paulo Fontes, de maneira a tangenciar a responsabilidade objetiva. Mas, no conjunto apreciativo da prova produzida, identificar-se de maneira clara a construção de um esquema fraudatório bem-sucedido, visando burlar o sistema de controle da autarquia previdenciária, para a concessão fraudulenta de benefícios previdenciários de prestação continuada (LOAS), mediante a padronização dos requerimentos, com uso de endereços falsos para simular que o pretenso beneficiário morava sozinho, e ostentava estado civil solteiro, sem vínculo com familiares que lhe pudessem prover a subsistência.

 

O réu, advogado, nascido em 25.01.1962, contava com 48 anos de idade na data do fato, fomentando a conclusão de dotar de experiência de vida, especialmente porque as lides jurídicas lhe proporcionam a melhor compreensão da vida cotidiana e de seus meandros, inclusive os da seara do Direito, capacitando-o a perscrutar pelo caminho compatível com referidos conhecimentos. É dizer, a ingenuidade não lhe socorre.

 

O recorrente manteve relações profissionais com quatro escritórios de advocacia para formalizar os pedidos previdenciários na autarquia, pela facilidade nos protocolos sem restrição de quantidade, dada a obtenção de liminar judicial autorizando-o a dar entrada em mais de um requerimento por vez. Assim, prestava serviços a outros colegas advogados, que lhe enviavam a documentação para os pedidos.

 

Recebia a documentação padronizada para instruir os pedidos de concessão de prestação continuada, com informações praticamente idênticas dos pretensos segurados.

 

Sabia da padronização, conforme declarado em interrogatório, declarando ler toda a documentação que embasava os pedidos. Aliás, quanto ao exame da documentação, era de fácil percepção a contradição entre o estado civil casada da segurada e cliente Madalena Tonon de Barros, conforme certidão de casamento, e a informação de ser ela solteira no pedido do benefício. O réu Paulo era remunerado pelo protocolo dos requerimentos.

 

A Sra. Edilrene, advogada, ouvida em juízo como informante, prestando serviço ao réu, esclareceu ter sido instruída pelo embargante a procurar especificamente a servidora do INSS de nome Joanã, a qual tinha familiaridade com os pedidos do “Dr. Paulo”.

 

Digno de nota ter sido o pleito administrativo de prestação continuada de Madalena Tonon de Barros, patrocinado pelo embargante, examinado no mesmo dia da entrada, com deferimento imediato pela servidora do INSS Joanã.

 

Narrou Edilrene ter recebido vultosa quantia, sete mil reais por dois dias, nos anos de 2010 e 2011 (sete mil reais correspondia a 12,84 salários-mínimos em 2011) pelo trabalho prestado ao Dr. Paulo, ora embargante, consistente em dar entrada nos requerimentos perante o INSS.

 

Dessa forma, depreende-se que a associação profissional entre os escritórios era bastante lucrativa, porque o trabalho freelance de Edilrene por dois dias, teria lhe rendido sete mil reais, ao passo que o dono do escritório - o ora embargante -, por certo, é remunerado com a maior parte do lucro auferido.

 

A instrução do embargante à Edilrene para procurar determinada funcionária do INSS não é à toa. Joanã, apesar de absolvida nestes autos, conta com condenações judiciais e foi demitida do serviço público em virtude de participar do estratagema criminoso de concessões fraudulentas de benefícios. 

 

No caso concreto, o embargante atuou como o advogado da beneficiária Madalena Tonon de Barros, que lhe outorgou procuração. A assinatura do embargante na procuração é verdadeira e foi reconhecida por ele em juízo.

 

Desta maneira, sequer a alegação de que recebia os documentos prontos, com firma reconhecida, é capaz de eximi-lo da responsabilidade penal, porquanto agiu em nome próprio como procurador, no interesse de sua cliente, e não como terceiro, prestando favor a outros advogados.

 

Logo, a instrução do pedido de benefício previdenciário é de sua autoria, a entrever-se a fragilidade do argumento de estar alheio à contrafação documental utilizada.

 

Por amor ao debate, se fosse a hipótese de acolher-se o argumento do desconhecimento da falsidade documental e da falsidade das informações pessoais dos segurados, ainda assim estaria caracterizado o dolo eventual, assumindo o recorrente o risco de providenciar a entrada de inúmeros pedidos de benefícios de prestação continuada, com documentos padronizados, repetidos na aparência, na indicação de endereço, de profissão e de condições pessoais dos segurados, mediante o pagamento de quantias monetárias significativas, pedidos direcionados especificamente a uma servidora da autarquia previdenciária, a qual, de pronto, deferia os requerimentos, estratégia fraudatória perpetuada para o pleito do benefício de prestação continuada da Sra. Madalena Tonon de Barros.

 

No mais, adoto igualmente como razão de decidir a motivação exposta no minucioso voto exarado pelo E. Desembargador Federal Maurício Kato, transcrito no início, ao qual me reporto (ID 159533004 - Pág. 4/13).

 

Dessa maneira e por todas as considerações apostas, entendo perfeitamente demonstrada a autoria imputada a Paulo Soares Brandão no delito de estelionato contra a Previdência Social.

 

Ante o exposto, nego provimento aos embargos infringentes.

 

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


E M E N T A

PENAL. PROCESSO PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES. ESTELIONATO CONTRA A PREVIDÊNCIA SOCIAL. PEDIDO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. COMPLEIÇÃO DE CENÁRIO DE FUNDADA DÚVIDA QUANTO À PRESENÇA DE DOLO NA CONDUTA DO EMBARGANTE, PATRONO DA BENEFICIÁRIA.  EMBARGOS INFRINGENTES PROVIDOS.
1. Embargos infringentes adstritos à suficiência probatória para amparar a responsabilização criminal de advogado atuante em procedimento administrativo de solicitação de benefício assistencial a idoso, cujo deferimento embasou-se na prestação de informações incongruentes à realidade.
2. No processo penal, para que haja uma condenação, é essencial que seja atingido standard probatório minimamente satisfatório, obtendo-se “prova além da dúvida razoável”.
3. Caso em que a prova acusatória coligida não é suficiente e hábil a descortinar a presença de dolo na conduta do embargante.
4. Compulsando o caderno processual, não se vislumbra devidamente comprovada eventual ingerência do patrono da beneficiária no preenchimento das informações (que depois se revelaram inverídicas) necessárias à solicitação da prestação assistencial vindicada.
5. Subsistência de fundada dúvida se era de  conhecimento do advogado a mendacidade dos dados apresentados para a fruição da benesse assistencial. Precedentes.
6. Preponderância do voto minoritário, que preservara o decreto absolutório tirado em relação ao acusado. 
7. Pertinência da proclamação imediata de deliberação favorável ao réu, face à consolidação de situação de empate apta a propiciar a aplicação da nova redação do art. 615, § 1º, do CPP, trazida pela Lei nº 14.836/2024.
8. Embargos infringentes providos.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI e o voto do Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS, acompanhando o relator, foi proclamada a seguinte decisão: a Quarta Seção, diante do empate na votação e em atenção ao disposto no § 1º do Art. 615 do Código de Processo Penal (redação dada pela Lei nº 14.836, de 08 de abril de 2024), DEU PROVIMENTO aos Embargos Infringentes e de Nulidade, nos termos do voto do Desembargador Federal ALI MAZLOUM, que lavrará o acórdão, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.