APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002567-96.2020.4.03.6110
RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
APELANTE: MONISE NICOLAU
Advogado do(a) APELANTE: IGOR THOMAZELLA CHEQUE DE CAMPOS - SP354087-N
APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
Advogados do(a) APELADO: INGRID KUWADA OBERG FERRAZ PIMENTA DE SOUZA - RJ99589-A, ITALO SERGIO PINTO - SP184538-A, JORGE DONIZETI SANCHEZ - SP73055-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002567-96.2020.4.03.6110 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO APELANTE: MONISE NICOLAU Advogado do(a) APELANTE: IGOR THOMAZELLA CHEQUE DE CAMPOS - SP354087-N APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL Advogados do(a) APELADO: INGRID KUWADA OBERG FERRAZ PIMENTA DE SOUZA - RJ99589-A, ITALO SERGIO PINTO - SP184538-A, JORGE DONIZETI SANCHEZ - SP73055-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O A Excelentíssima Senhora Juíza Federal convocada SILVIA FIGUEIREDO MARQUES (Relatora): Cuida-se de ação de reintegração de posse ajuizada pela Caixa Econômica Federal (CEF), em face de Monise Nicolau, com pedido liminar, tendo por objeto imóvel arrendado por meio do Programa de Arrendamento Residencial (PAR). Deferido o pedido liminar para determinar a reintegração de posse da CEF no imóvel em discussão, devendo a ré, ou quem estiver habitando o bem, desocupar o imóvel no prazo de 30 dias. Em face de tal decisão, a parte ré interpôs agravo de instrumento, ao qual foi dado parcial provimento para autorizar a reintegração de posse pretendida pela parte agravante, cabendo ao magistrado competente designar, com a devida celeridade, audiência de conciliação para fixar como e quando se dará a desocupação do imóvel, sendo do Poder Judiciário o ônus de assim decidir caso as partes não entrem em acordo (observados os moldes da liminar proferida na ADPF 828 e da Lei nº 14.216/2021, notadamente o prazo de 30/06/2022. A r. sentença julgou procedente o pedido, para determinar a reintegração de posse da CEF no imóvel localizado no Residencial Cambuí, situado à Rua Juraci Manoel Ferreira, nº 201, Qd I, Rua 10, Itapetininga/SP, matrícula nº 68.302 do Cartório de Registro de Imóveis de Itapetininga/SP, devendo a parte ré, ou quem estiver habitando o bem, desocupar o imóvel no prazo de 30 (trinta) dias, findos os quais, providencie-se a imediata reintegração na posse da CEF no mencionado imóvel. Concedeu a tutela antecipada, determinando a expedição de mandado de reintegração de posse, ficando, desde logo, autorizado o emprego de força policial, nos estritos limites do necessário à implementação da ordem. A parte ré apresentou apelação. Aduz que a notificação realizada não é válida, visto que recebida por terceiros, além de haver sido efetuada por empresa privada, estranha ao contrato. Requer a concessão de tutela antecipada, determinando-se a manutenção na posse do imóvel, até que haja decisão definitiva; subsidiariamente, que seja concedido prazo razoável para a desocupação. Com contrarrazões, subiram os autos a este E. Tribunal. É o breve relatório. Passo a decidir.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002567-96.2020.4.03.6110 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO APELANTE: MONISE NICOLAU Advogado do(a) APELANTE: IGOR THOMAZELLA CHEQUE DE CAMPOS - SP354087-N APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL Advogados do(a) APELADO: INGRID KUWADA OBERG FERRAZ PIMENTA DE SOUZA - RJ99589-A, ITALO SERGIO PINTO - SP184538-A, JORGE DONIZETI SANCHEZ - SP73055-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A Excelentíssima Senhora Juíza Federal convocada SILVIA FIGUEIREDO MARQUES (Relatora): A Lei n. 10.188/2001, visando suprir necessidade de moradia da população de baixa renda, criou o Programa de Arrendamento Residencial, estabelecendo arrendamento residencial com opção de compra, ao qual são aplicáveis as regras do arrendamento mercantil, no que for cabível. Por “arrendamento residencial” deve ser entendida a operação que tenha por objeto o arrendamento com opção de compra de bens imóveis adquiridos para fins de moradia. A arrendatária será a pessoa física que atenda aos requisitos estabelecidos pelo Ministério das Cidades do Poder Executivo Federal, e seja habilitada pela CEF. A gestão desse Programa cabe ao Ministério das Cidades, enquanto sua operacionalização à Caixa Econômica Federal – CEF, para o que essa instituição financeira receberá remuneração em razão das atividades exercidas, conforme critérios estabelecidos pelo Executivo Federal. Para a operacionalização desse Programa, a CEF está autorizada a criar e fazer a gestão de fundo financeiro com o fim exclusivo de segregação patrimonial e contábil dos haveres financeiros e imobiliários destinados ao Programa, cabendo a fiscalização ao Banco Central do Brasil. O patrimônio do fundo financeiro em questão será constituído pelos bens e direitos adquiridos pela CEF no âmbito do Programa instituído pela Lei 10.188/2001. Esses bens e direitos (incluídos seus frutos e rendimentos) não se comunicam com o patrimônio da CEF, observadas, quanto a tais bens e direitos, as seguintes restrições: não integram o ativo da CEF; não respondem direta ou indiretamente por qualquer obrigação da CEF; não compõem a lista de bens e direitos da CEF, para efeito de liquidação judicial ou extrajudicial; não podem ser dados em garantia de débito de operação da CEF; não são passíveis de execução por quaisquer credores da CEF, por mais privilegiados que possam ser; não podem ser constituídos quaisquer ônus reais sobre os imóveis. Por esse motivo, no título aquisitivo e no registro de imóveis, a CEF fará constar essas restrições e destacará que o bem adquirido constitui patrimônio do fundo a que se refere o art. 2º, caput, da Lei 10.188/2001. De acordo com o art. 2º, § 7º, da Lei 10.188/2001, a alienação dos imóveis pertencentes ao patrimônio desse fundo financeiro será efetivada diretamente pela CEF, e o instrumento de alienação é documento hábil para cancelamento das averbações pertinentes às restrições e destaque perante o Cartório de Registro de Imóveis. A CEF está autorizada a expedir os atos necessários à operacionalização do Programa de Arrendamento Residencial, a definir os critérios técnicos a serem observados na aquisição e no arrendamento com opção de compra dos imóveis destinados ao Programa, a assegurar que os resultados das aplicações sejam revertidos para o fundo e que as operações de aquisição de imóveis sujeitar-se-ão aos critérios técnicos definidos para o Programa, e a promover, em nome do arrendador, o registro dos imóveis adquiridos. Complementando sua ampla atuação nesse Programa de Arrendamento Residencial, o art. 4º, VI, da Lei 10.188/2001 atribui à CEF a função de representar o arrendador ativa e passivamente, judicial e extrajudicialmente; Dispõe o art. 8º, da Lei nº. 10.188/2001, que o contrato de aquisição de imóveis pelo arrendador, as cessões de posse e as promessas de cessão, bem como o contrato de transferência do direito de propriedade ou do domínio útil ao arrendatário, serão celebrados por instrumento particular com força de escritura pública e registrados em Cartório de Registro de Imóveis competente. Se de um lado esse programa estabelece um cenário favorável à aquisição de imóveis pela população de baixa renda, impõe, em contrapartida, o rigoroso cumprimento da obrigação assumida pelos arrendatários, admitindo, nos dizeres do art. 9º, da Lei 10.188/2001, que “na hipótese de inadimplemento no arrendamento, findo o prazo da notificação ou interpelação, sem pagamento dos encargos em atraso, fica configurado o esbulho possessório que autoriza o arrendador a propor a competente ação de reintegração de posse”. É legítimo que a Lei nº. 10.188/2001 tenha atribuído à CEF a possibilidade de propor ação de reintegração de posse, pois como responsável pelo fundo financeiro e pelos bens que integram o Programa de Arrendamento Residencial, essa ação proporciona que o proprietário do bem exerça a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha, consoante previsão contida no art. 1.228 do Código Civil. A reintegração de posse prevista no art. 9º da Lei 10.188/2001 terá lugar diante da posse precária do arrendatário inadimplente, que descumpriu sua parte na avença, autorizando o pedido de recuperação do imóvel pela CEF. A jurisprudência se consolidou no sentido do cabimento da rescisão contratual e da reintegração de posse em casos de inadimplência das prestações pecuniárias devidas. Nesse sentido, trago à colação os seguintes julgados: CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. PROGRAMA DE ARRENDAMENTO RESIDENCIAL - PAR. SINISTRO DE MORTE. QUITAÇÃO DAS TAXAS DE ARRENDAMENTO POR COBERTURA SECURITÁRIA. PRESCRIÇÃO: NÃO COMPROVADA. ACIDENTE POSTERIOR À ASSINATURA DO CONTRATO. RISCO COBERTO. NORMAS DO CDC: INAPLICABILIDADE. NOTIFICAÇÃO PESSOAL DO ARRENDATÁRIO. ESBULHO CARACTERIZADO. TAXAS CONDOMINIAIS: OBRIGAÇÃO VINCULADA AO CONTRATO. HONORÁRIOS RECURSAIS: NÃO CABIMENTO. RECURSOS NÃO PROVIDOS. 1. O lapso prescricional anual tem início a partir da ciência inequívoca quanto à incapacidade e se suspende entre a comunicação do sinistro e a data da recusa do pagamento da indenização. Precedentes obrigatórios que, embora se refiram à sinistro de invalidez permanente, permitem aplicação analógica aos casos de sinistro de morte. 2. No caso dos autos, o óbito do arrendatário ocorreu em 05/02/2003 e, muito embora tenha havido a devida comunicação do sinistro à seguradora, o formulário não foi datado, sendo impossível determinar se a comunicação deu-se posteriormente ao decurso de um ano a partir do sinistro. Como a prova da prescrição é ônus de quem a alega, caberia à Caixa Seguradora S/A demonstrar que a comunicação do sinistro deu-se após 05/02/2004, o que não logrou comprovar. 3. A tese defendida pela apelante, no sentido da impossibilidade de outorgar a cobertura securitária a eventos decorrentes de moléstia preexistente ao contrato, não se aplica ao caso dos autos, no qual consta o óbito do arrendatário decorrente de acidente posterior à assinatura do contrato, risco expressamente coberto pela apólice contratada. 4. O contrato de arrendamento residencial é regulado pelas normas da Lei nº 10.188/2001, que instituiu o Programa de Arrendamento Residencial - PAR para atendimento da necessidade de moradia da população de baixa renda, sob a forma de arrendamento residencial com opção de compra. 5. Tratando-se de um programa de governo destinado a ampliar o acesso das populações mais carentes à moradia, impossível a aplicação das normas do Código de Defesa do Consumidor aos contratos vinculados ao PAR, na medida em que referidos contratos não caracterizam relação de consumo nem tampouco apresentam conotação de serviço bancário, mas sim consubstanciam-se em programa habitacional custeado com recursos públicos. 6. O escopo da notificação é possibilitar ao arrendatário purgar a mora, sendo que, à falta do pagamento, converter-se-á o arrendamento em esbulho. 7. Não havendo a quitação das prestações contratuais e, mesmo após a notificação extrajudicial, permanecendo inerte o arrendatário, configura-se a posse injusta, surgindo o direito à propositura da reintegração de posse para a retomada do bem. Precedente. 8. No caso em exame, foi realizada a notificação pessoal da arrendatária. De fato, a lei não exige a notificação por meio de Cartório de Notas, sendo suficiente a notificação pessoal para a constituição do devedor em mora. A apelante não nega o inadimplemento da obrigação relativa às taxas condominiais, caracterizando o esbulho e a amparando o direito da CEF à reintegração da posse do bem. 9. Não prospera a alegação de ilegitimidade da CEF para cobrar as taxas condominiais, ao argumento de que o condomínio é representado pelo síndico. Referida taxa integra o rol dos encargos mensais, de responsabilidade dos arrendatários (Cláusula Quinta) e, nos precisos termos da Cláusula Décima Segunda, seu pagamento é obrigação vinculada ao contrato. 10. Considerando que o recurso foi interposto sob a égide do CPC/1973 e, nos termos do Enunciado Administrativo nº 7, elaborado pelo Superior Tribunal de Justiça para orientar a comunidade jurídica acerca da questão do direito intertemporal, tratando-se de recurso interposto contra decisão publicada anteriormente a 18/03/2016, não é possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do artigo 85, § 11, do CPC/2015. 11. Apelações não providas. (ApCiv 0021438-23.2005.4.03.6100. RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA, TRF3 - PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/07/2017). APELAÇÃO - PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE - PROGRAMA DE ARRENDAMENTO RESIDENCIAL - LEI 10.188/2001 - INADIMPLEMENTO DAS OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS - RECURSO IMPROVIDO. I - É possível a cumulação da demanda possessória com a pretensão equivalente de cobrança das prestações vencidas, de taxas de arrendamento residencial e condominiais. Inteligência do art. 921 do CPC/73. II - Assim também caminha a jurisprudência do STJ, anotada na RSTJ 22/252, consignando que a expressão "perdas e danos" compreende todos os prejuízos, inclusive o que a própria coisa tenha sofrido. III - Não basta a simples pretensão de aplicabilidade das normas consumeristas, de maneira genérica, sendo necessário que o réu discrimine, de maneira individualizada, quais são, efetivamente, as cláusulas abusivas do contrato e o porquê de tal abusividade, com o que se torna possível a revisão contratual. IV - Ademais, a simples aplicação do CDC, por si só, não permite que o Julgador faça, de ofício, a anulação de cláusulas contratuais firmadas entre as partes, cabendo ao réu, se o caso, apontar expressamente quais são aquelas que entende abusivas e porque as são. Súmula 381 do STJ. V - O Programa de Arrendamento Residencial, instituído pela Lei nº. 10.188/2001, estabelece, em seu art. 9º, que, na hipótese de inadimplemento no arrendamento, findo o prazo de notificação ou interpelação, sem pagamento dos encargos em atraso, fica configurado o esbulho possessório que autoriza o arrendador a propor a competente ação de reintegração. VI - Constatada a inadimplência dos arrendatários com encargos pertinentes ao contrato celebrado, relativos ao condomínio e às prestações e, considerando que, os réus devidamente notificados, não purgaram a mora, há que ser mantida a procedência do pedido de reintegração de posse formulado pela CEF. VII - A cláusula décima nona estabelece as hipóteses em que o contrato de arredamento considerar-se-á rescindido no caso de descumprimento de quaisquer cláusulas ou condições estipuladas na avença. VIII - O contrato também prevê, em sua cláusula vigésima, que o inadimplemento dos arrendatários quanto ao pagamento das obrigações contratuais assumidas constitui causa de vencimento antecipado da dívida. IX - Diante desse contexto, se tanto a lei quanto o contrato estabelecem que o caso de inadimplemento configura rescisão do contrato, autorizando a arrendadora a propor a competente ação de reintegração de posse, não há plausibilidade jurídica. X - Não apreciada a alegação de abusividade na cobrança contida nas cláusulas décima terceira, décima quinta, parágrafo único, décima sexta, parágrafo oitavo e vigésima quinta, vez que os requeridos deixaram de se pronunciar a esse respeito na contestação, de sorte que as pretensões ora deduzidas encontram-se acobertadas pela preclusão, sendo que o atendimento de tais pretensões, neste momento processual, implicaria em admitir uma inovação recursal e violação ao princípio do contraditório e da ampla defesa. XI - Apelação desprovida. (ApCiv 0018342-24.2010.4.03.6100, RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL COTRIM GUIMARÃES, TRF3 - SEGUNDA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:01/03/2018). Alega a parte ré que não foi regularmente notificada. Sobre a necessidade da prévia notificação pessoal de arrendatário inadimplente como requisito essencial ao manejo da ação de reintegração de posse pelo arrendador, trata-se de matéria pacífica, que não comporta maiores discussões, notadamente diante da literalidade do art. 9º, da Lei nº 10.188/2001. Sua exigência se justifica como meio de se garantir ao arrendatário a oportunidade de purgar a mora, preservando o bem adquirido, ante à iminência da retomada do imóvel pela instituição financeira em caso de configuração do esbulho possessório. Nesse sentido, o enunciado da Súmula 369, do E.STJ, segundo o qual, “no contrato de arrendamento mercantil (leasing), ainda que haja cláusula resolutiva expressa, é necessária a notificação prévia do arrendatário para constituí-lo em mora”, entendimento aplicável ao arrendamento residencial por força do art. 10, da mesma Lei nº 10.188/2001, que determina a incidência da legislação pertinente ao arrendamento mercantil também ao arrendamento residencial, no que couber. Não há, no entanto, nenhum impeditivo legal a que uma terceira empresa proceda à notificação prevista no art. 9º, da Lei nº 10.188/2001, desde que atendida a finalidade de dar ciência ao arrendatário de que a ausência de regularização de sua situação de inadimplência, no prazo fixado para essa finalidade, terá por consequência a configuração do esbulho possessório, autorizando o arrendador a propor a competente ação de reintegração de posse. Nesse sentido, trago à colação o seguinte julgado: ADMINISTRATIVO. SFH. EFEITO SUSPENSIVO. CDC. PROGRAMA DE ARRENDAMENTO RESIDENCIAL. NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL. LEGITIMIDADE. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. INADIMPLEMENTO. ESBULHO. POSSIBILIDADE. TAXAS CONDOMINIAIS. LEGITIMIDADE PASSIVA. REVISÃO CONTRATUAL COM BASE NA QUEBRA OBJETIVA DO CONTRATO. DIREITO À MORADIA. FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE. - O parágrafo único do artigo 995 do NCPC permite que a eficácia da decisão recorrida possa ser suspensa por decisão do relator, se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a possibilidade de provimento do recurso. - O CDC é aplicável aos contratos do SFH. - Esta Corte já reconheceu a validade da notificação extrajudicial, procedida por empresa privada, por indicação da Caixa Econômica Federal, uma vez que inexiste a exigência legal de realização do ato por meio de Cartório de Registro de Títulos e Documentos. - Uma vez comprovado o descumprimento do contrato pelo inadimplemento no arrendamento, configurado, desse modo, o esbulho possessório, cabível a reintegração de posse. - A CEF, na qualidade de proprietária do imóvel, tem direito de cobrar não só a taxa de arrendamento, como também todas e quaisquer taxas a ele referentes, nos termos contratuais, que, no caso de rescisão do contrato por inadimplência, obrigam o arrendatário a pagar as taxas de arrendamento vencidas atualizadas, bem como a quitação das demais obrigações contratuais. A instituição financeira, gerenciadora do programa PAR, uma vez rescindido o contrato e reintegrada no imóvel, tem direito a receber os valores em atraso, relativos ao condomínio, juntamente com a taxa de arrendamento, nos termos do contrato. - A teoria do rompimento da base objetiva do negócio jurídico tem por requisito a ocorrência de um fato superveniente ao contrato, de caráter geral e capaz de produzir o desequilíbrio contratual, onerando o consumidor e beneficiando o prestador de serviços. A hipótese de desemprego do devedor não se enquadra neste conceito. - O direito à moradia previsto na Constituição Federal não impede a reintegração na posse do imóvel, e o bem em questão foi adquirido em programa governamental voltado à população de baixa renda. Permitir o inadimplemento dos encargos relativos ao imóvel seria desviar a função social da propriedade, não podendo, por esse motivo, ser invocada para manter a parte ré no imóvel objeto da lide. (Apelação Cível nº 5048313-02.2017.4.04.7100/RS, RELATOR: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, TRF4, 28/04/2021). No caso dos autos, em 27/12/2006, as partes firmaram Contrato por instrumento particular de arrendamento residencial com opção de compra, tendo por objeto imóvel adquirido com recursos do PAR — Programa de Arrendamento Residencial, por meio do qual foi objeto de arrendamento residencial com opção de compra, mediante aquisição com recursos do Programa de Arrendamento Residencial, o seguinte imóvel: um prédio residencial que recebeu o nº 201, no emplacamento da Rua 10, no loteamento denominado Residencial Cambuí, constituído pelo lote 14, da quadra I, devidamente descrito e caracterizado na matrícula nº 68.302, do 1º Registro de Imóveis de Itapetininga/SP (id 287704147). A cláusula Décima Nona do contrato prevê a rescisão em caso de descumprimento de quaisquer cláusulas ou condições estipuladas, com advertência no sentido de que a resistência em devolver o bem constitui esbulho possessório. Entre as obrigações cujo descumprimento autorizam a rescisão, estão o pagamento das taxas de arrendamento mensais, dos prêmios de seguro e das taxas de condomínio, consoante o disposto na cláusula décima quarta, bem como destinação dada ao bem que não seja a moradia do arrendatário e de seus familiares. Consta ainda dos autos que a arrendatária teria cessado o pagamento das taxas de arrendamento a partir de 11/2017, motivando assim a notificação a que faz menção a cláusula vigésima do contrato, para efetuar o pagamento dos valores em atraso, sob pena de configuração de esbulho possessório, com o consequente ajuizamento de ação de reintegração de posse, o que de fato se busca por meio da presente ação. A petição inicial foi instruída com o contrato mencionado, termo de recebimento, matrícula do imóvel, demonstrativo de débito e notificação extrajudicial da arrendatária (ids 287704147 a 287704152). Verifica-se que a notificação extrajudicial foi enviada em 10/02/2020, ao endereço do imóvel, tendo retornado com aviso de recebimento assinado por terceira pessoa em 20/02/2020 (ids 287704151 e 287704152). Portanto, foi providenciado o envio de notificação dando ciência à arrendatária da ausência de pagamento das taxas de arrendamento, no período de 11/2017 a 01/2020, informando ainda a necessidade de regularização no prazo máximo de 5 dias, sob pena de restar configurado esbulho possessório, autorizando o ajuizamento de ação de reintegração de posse. O endereço ao qual a notificação foi encaminhada é o mesmo do imóvel objeto do contrato de arrendamento residencial, razão pela qual deve ser dada como cumprida a exigência legal. Logo, restou comprovado o inadimplemento das taxas de arrendamento, o que caracteriza esbulho possessório e enseja a rescisão contratual, ao mesmo tempo em que não há irregularidade na notificação da arrendatária. Ademais, observa-se que foi realizada tentativa de citação da parte ré no endereço do imóvel, entretanto, conforme certidão da Oficial de Justiça, deixou de intimá-la, “tendo em vista que fui atendida por Liandra Inara de Andrade Carneiro, a qual declarou que o imóvel é alugado, aproximadamente, há sete meses reside no local e desconhece a pessoa da requerida” (id 287704167, p. 46), o que também caracteriza descumprimento contratual e o consequente esbulho possessório. Tendo em vista a manutenção da r. sentença, fica prejudicado o pedido de tutela antecipada. No mais, o prazo de 30 dias concedido para a desocupação do imóvel é razoável, considerando-se que há informações de que a arrendatária sequer reside no local. Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação. Tendo como base o decidido no Tema 1.059/STJ, e em vista o trabalho adicional desenvolvido na fase recursal e considerando o conteúdo da controvérsia, com fundamento no art. 85, § 11, do CPC, a verba honorária fixada em primeiro grau de jurisdição deve ser majorada em 10%, respeitados os limites máximos previstos nesse mesmo preceito legal, e observada a publicação da decisão recorrida a partir de 18/03/2016, inclusive (E.STJ, Agravo Interno nos Embargos de Divergência 1.539.725/DF, Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, 2ª seção, DJe de 19/10/2017). Observe-se o art. 98, § 3º, do CPC, em vista de a parte ser beneficiária de gratuidade. É o voto.
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. PROCESSUAL CIVIL. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. PROGRAMA DE ARRENDAMENTO RESIDENCIAL. INADIMPLEMENTO.
- O Programa de Arrendamento Residencial – PAR foi instituído pela Lei nº 10.188/2001 com o objetivo de suprir a falta de oferta de moradia à população de baixa renda, competindo sua operacionalização à Caixa Econômica Federal.
- No Programa de Arrendamento Residencial, a Caixa Econômica Federal detém a propriedade fiduciária dos imóveis, estabelecendo o art. 9º, da Lei n. 10.188/2001, que na hipótese de inadimplemento no arrendamento, findo o prazo da notificação ou interpelação, sem pagamento dos encargos em atraso, fica configurado o esbulho possessório que autoriza o arrendador a propor a competente ação de reintegração de posse.
- Não há nenhum impeditivo legal a que uma terceira empresa proceda à notificação prevista no art. 9º, da Lei nº 10.188/2001, desde que atendida a finalidade do ato.
- Foi providenciado o envio de notificação dando ciência à arrendatária da ausência de pagamento das taxas de arrendamento, informando ainda a necessidade de regularização no prazo máximo de 5 dias, sob pena de restar configurado esbulho possessório, autorizando o ajuizamento de ação de reintegração de posse.
- O endereço ao qual a notificação foi encaminhada é o mesmo do imóvel objeto do contrato de arrendamento residencial, razão pela qual deve ser dada como cumprida a exigência legal.
- Restou comprovado o inadimplemento das taxas de arrendamento, o que caracteriza esbulho possessório e enseja a rescisão contratual, ao mesmo tempo em que não há irregularidade na notificação da arrendatária.
- Apelação desprovida.