Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5029795-08.2022.4.03.6100

RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

APELADO: FBM FUNDICAO BRASILEIRA DE METAIS LTDA

Advogado do(a) APELADO: JULIANA ALENCAR DE ANDRADE SILVA - SP290437-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5029795-08.2022.4.03.6100

RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA

APELANTE: . DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA EM SÃO PAULO, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, DELEGADO DA DELEGACIA DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL (DERAT/SPO)

 

APELADO: FBM FUNDICAO BRASILEIRA DE METAIS LTDA

Advogado do(a) APELADO: JULIANA ALENCAR DE ANDRADE SILVA - SP290437-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

Trata-se de remessa necessária e apelação interposta pela União contra sentença que julgou parcialmente procedente o pedido e concedeu parcialmente a segurança pleiteada nesta ação, para reconhecer o direito da impetrante ao creditamento dos valores de PIS e COFINS recolhidos na apuração da base de cálculo na aquisição de insumos recicláveis, bem como assegurar o direito à compensação do indébito na esfera administrativa, a qual deverá ser formalizada somente após o trânsito em julgado (art. 170-A do CTN), em conformidade com o disposto na legislação vigente ao tempo do encontro de contas e art. 26-A da Lei nº 11.457/2007, com incidência da taxa SELIC a partir do recolhimento indevido e respeitada a prescrição quinquenal.

Deixou de condenar a impetrante em honorários, nos moldes do artigo 25 da Lei 12.016/2009. 

Apelou a União, alegando que: a) não houve o trânsito em julgado da decisão que julgou o recurso paradigmático (Tema 304/STF) e a União opôs embargos de declaração, os quais, caso julgados favoravelmente ao Fisco, podem não apenas limitar temporalmente os efeitos do julgado, como restringir seu alcance do ponto de vista do direito material, uma vez que a partir da publicação do acórdão restou claro que ele contém várias omissões e obscuridades, as quais, caso não sanadas, dificultarão imensamente a aplicação da tese fixada no tema 304/STF; b) por prudência e em homenagem aos princípios da segurança jurídica e da economia processual, resta claro que é forçosa a suspensão do presente processo para se evitar a aplicação inadequada de uma decisão ainda sujeita a alterações, principalmente no que tange aos seus aspectos temporais e para impedir a movimentação desnecessária da máquina pública; c) "nada mais condizente com o objetivo principal da não cumulatividade do PIS e da Cofins: evitar a incidência em cascata das contribuições. A partir do momento em que não houve incidência na etapa anterior, não haveria razão alguma em se conceder um creditamento. Na hipótese de desoneração da operação anterior, o gravame simplesmente não se impôs, e o bem é adquirido livre da tributação prévia. Nada há, pois, a creditar. O raciocínio, como se sabe, já se revela sedimentado no âmbito desse Supremo Tribunal Federal. Nessa linha – e a despeito das diferenças das fórmulas de não- cumulatividade das contribuições e do IPI/ICMS (já discorridas acima) – parece acertado afirmar que, no que toca à pretensão de aproveitamento de créditos (só se aproveita o que for gerado na operação anterior), a mesma lógica tributária deve ser observada"; d) "não é possível inferir que haja prejuízo aos valores constitucionalmente protegidos quanto ao meio-ambiente quanto à tributação questionada. Outrossim, é impossível afirmar que, necessariamente, diante da legislação tributária questionada, seria economicamente mais vantajoso comprar insumos da indústria fornecedora de celulose obtida da madeira do que adquirir matéria-prima de catadores de materiais recicláveis. Portanto, inexiste de qualquer mácula na vedação de creditamento (das aquisições de desperdícios, resíduos ou aparas de papel) no contexto da não cumulatividade do PIS e da Cofins, haja vista a perfeita sintonia e conformidade com a lógica desta sistemática e com as balizas constitucionais aplicáveis às contribuições"; e) "Na hipótese de ser autorizado à parte autora apropriar dos créditos de PIS e COFINS sobre entradas de reciclados/sucatas, impede destacar que não é possível realizar o aproveitamento extemporâneo dos créditos de PIS e de COFINS, mediante apropriação/contabilização em período posterior ao de competência. Com efeito, inexiste dispositivo legal que permita apropriação/contabilização em período posterior ao de competência, não se prestando a esse fim o §4º do art. 3º das Leis nº 10.637/02 e 10.833/03, como se constata pela simples leitura do dispositivo".

Com contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.

O Ministério Público Federal manifestou-se pelo prosseguimento do feito.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5029795-08.2022.4.03.6100

RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA

APELANTE: . DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA EM SÃO PAULO, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, DELEGADO DA DELEGACIA DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL (DERAT/SPO)

 

APELADO: FBM FUNDICAO BRASILEIRA DE METAIS LTDA

Advogado do(a) APELADO: JULIANA ALENCAR DE ANDRADE SILVA - SP290437-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

A apelação e a remessa necessária não devem ser providas. 

 

A matéria em discussão nestes autos foi afetada pelo Supremo Tribunal Federal à sistemática da repercussão geral (Tema 304 - RE 607.109). Como se verá adiante, a decisão de mérito já foi proferida, estando pendente apenas o julgamento dos embargos de declaração opostos pela União, por meio do qual esta pretende a modulação de efeitos daquela decisão. Todavia, não houve determinação de suspensão do trâmite de todos os processos que versem sobre a questão, de modo que não há impedimento ao exame da matéria por este Tribunal.

 

A apelante, por meio do presente Mandado de Segurança, objetiva "seja declarada a inconstitucionalidade dos artigos 47 e 48 da Lei n°. 11.196/05, para que seja reconhecido o direito da Impetrante de apurar os créditos de PIS e COFINS na aquisição de desperdícios, resíduos e aparas"; e "Em razão do acolhimento do pedido, seja a Impetrante autorizada a fazer a compensação de todos os valores indevidamente recolhidos, inclusive nos cinco anos anteriores ao ajuizamento deste mandamus, valendo-se dos mesmos índices de correção adotados pela Fazenda Pública Nacional para a cobrança de seus créditos (SELIC), acrescidos da incidência de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir de cada recolhimento indevido".

 

O art. 47 da Lei 11.196/2005 veda o direito ao creditamento de desperdícios, resíduos ou aparas utilizados como insumos:

 

Art. 47. Fica vedada a utilização do crédito de que tratam o inciso II do caput do art. 3º da Lei nº 10.637, de 30 de dezembro de 2002, e o inciso II do caput do art. 3º da Lei nº 10.833, de 29 de dezembro de 2003, nas aquisições de desperdícios, resíduos ou aparas de plástico, de papel ou cartão, de vidro, de ferro ou aço, de cobre, de níquel, de alumínio, de chumbo, de zinco e de estanho, classificados respectivamente nas posições 39.15, 47.07, 70.01, 72.04, 74.04, 75.03, 76.02, 78.02, 79.02 e 80.02 da Tabela de Incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados – TIPI, e demais desperdícios e resíduos metálicos do Capítulo 81 da Tipi.

 

O art. 48 da Lei 11.196/2005, por sua vez, prevê hipótese de suspensão do PIS/COFINS, nestes termos:

 

Art. 48. A incidência da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins fica suspensa no caso de venda de desperdícios, resíduos ou aparas de que trata o art. 47 desta Lei, para pessoa jurídica que apure o imposto de renda com base no lucro real. (Vigência) Parágrafo único. A suspensão de que trata o caput deste artigo não se aplica às vendas efetuadas por pessoa jurídica optante pelo Simples.

 

A impetrante alega que a vedação imposta pelo art. 47 Lei nº 11.196/05 incorre em nítida ofensa aos parâmetros estabelecidos para a não-cumulatividade do PIS/COFINS, especialmente se analisados em conjunto com a necessidade de preservação do meio-ambiente, no sentido de que produtos com menor potencial ambiental, como no caso da sucata, deve ter tratamento que incentive o seu desenvolvimento, e não o contrário, bem como a isonomia tributária, na medida em que a ausência do direito ao crédito sobre os insumos, a despeito de uma pretensa solução tributária neutra para o segmento da reciclagem, estabelece uma distorção para toda a cadeia produtiva – e por esse motivo deve ser afastada.

 

O C. Supremo Tribunal Federal, no RE 607.109 - Tema 304, submetido à sistemática prevista no art. 543-B do CPC/73, art. 1036 do CPC/15, examinou a questão posta a julgamento e firmou a tese no sentido de que: "São inconstitucionais os arts. 47 e 48 da Lei 11.196/2005, que vedam a apuração de créditos de PIS/Cofins na aquisição de insumos recicláveis". O acórdão encontra-se assim ementado:

 

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. DIREITO TRIBUTÁRIO AMBIENTAL. 2. Tema 304 da sistemática da Repercussão Geral. 3. Artigos 47 e 48 da Lei federal 11.196/2005. Possibilidade de apuração de créditos de PIS/Cofins na aquisição de insumos recicláveis. 4. Coexistência dos regimes cumulativo e não cumulativo da contribuição ao PIS/Cofins. Dualidade de alíquotas. Prejuízos econômicos ao contribuinte industrial dedicado à reciclagem. 5. Inconstitucionalidade de tratamento tributário prejudicial à indústria de reciclagem. Princípio do protetor recebedor. Possibilidade concreta de os créditos fiscais superarem o valor do PIS/Cofins recolhido na etapa anterior da cadeia de produção. Afronta aos princípios da isonomia tributária, neutralidade fiscal e ao regime tributário favorecido e simplificado devido à microempresa e à empresa de pequeno porte. 6. Ética ambiental. Estado Socioambiental de Direito. Sustentabilidade ecológica e social. Direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Artigos 170, inciso VI, e 225, da Constituição Federal. Vinculação do Legislador ordinário. Impossibilidade do esvaziamento do substrato axiológico dos direitos fundamentais ambientais. Inconstitucionalidade de tratamento tributário mais gravoso ao elo mais frágil da cadeia produtiva. População de baixa renda. Afronta às normas fundamentais de defesa do meio ambiente e da valorização do trabalho humano. 7. Fixação da tese: “São inconstitucionais os arts. 47 e 48 da Lei 11.196/2005, que vedam a apuração de créditos de PIS/Cofins na aquisição de insumos recicláveis". Recurso extraordinário provido. (STF, RE 607.109, rel. Ministro Gilmar Mendes, DJe 13.08.2021).

 

 

A partir da leitura do voto condutor do julgamento, de lavra do e. Min. Gilmar Mendes, extrai-se que a vedação imposta pelo art. 47 Lei 11.196/05 viola o disposto no art. 170, inciso VI, da CF e as normas constitucionais relacionadas com a promoção e a proteção do meio ambiente ecologicamente equilibrado, pois impõe tratamento tributário prejudicial às empresas que, realizando os objetivos previstos na Política Nacional de Resíduos Sólidos (art. 7º da Lei 12.305/10), investiram em métodos industriais menos lesivos ao meio ambiente, bem como fere a isonomia tributária, ao discriminar empresas que concorrem em um mesmo segmento econômico com base em um critério de distinção ilegítimo.

 

Na ocasião, e. Min. Gilmar Mendes enfatizou que "a proibição de abatimento de créditos na aquisição de insumos reutilizáveis (art. 47 da Lei 11.196/2005) não é suficientemente compensada pela isenção de PIS/Cofins concedida em benefício das cooperativas de catadores (art. 48), resultando em uma elevação da carga tributária total incidente sobre o processo de reciclagem".

 

Dessa forma, o argumento de que o direito ao creditamento somente deve ser reconhecido caso tenha havido incidência da contribuição na etapa anterior não merece prosperar. No julgamento de mérito do RE 607.109, o Supremo Tribunal enfrentou e rebateu o aludido argumento, para reconhecer o direito ao creditamento independentemente da incidência da contribuição na etapa anterior.

 

Por oportuno, vale destacar os seguintes excertos do voto do e. Min. Gilmar Mendes: 

 

"(...) Como visto, o benefício tributário assegurado pelas Leis 10.637/2002 e 10.833/2003 consiste basicamente no seguinte: as empresas recolhem as contribuições para o PIS e Cofins por uma alíquota mais elevada, de 9,25%, mas, a título de compensação, têm o direito de abater os créditos assegurados pela legislação tributária. No presente recurso extraordinário, a discussão cinge-se à constitucionalidade de dispositivos legais que, destoando dessa lógica, proíbem empresas submetidas ao regime não cumulativo – sujeitas, portanto, à alíquota majorada – de compensarem créditos oriundos da aquisição de insumos recicláveis. (...) Não há espaço, contudo, para o esvaziamento do substrato axiológico da norma prevista no art. 170, inciso VI, da CF, mediante a imposição de tratamento tributário prejudicial às empresas que, realizando os objetivos previstos na Política Nacional de Resíduos Sólidos (art. 7º da Lei 12.305/10), investiram em métodos industriais menos lesivos ao meio ambiente. O prejuízo causado pelo art. 47 da Lei 11.196/2005 às cadeias de produção dedicadas à reciclagem de resíduos sólidos foi minuciosamente descrito pela eminente Ministra Rosa Weber. Contudo, na visão de Sua Excelência, uma “ interpretação conjunta dos arts. 47 e 48 da Lei nº 11.196 /2005 afasta o alegado tratamento tributário mais gravoso para a aquisição de produtos não recicláveis” . Por essa perspectiva, não haveria “ violação ao princípio da isonomia, ou menoscabo da proteção ao meio ambiente (ainda que se admita que este pudesse ser aplicado para afastar incidência tributária, o que não me parece ser o caso)... Peço vênia para dissentir das conclusões da eminente relatora, pois, como demonstrei no decorrer do voto, parece-me que a proibição de abatimento de créditos na aquisição de insumos reutilizáveis (art. 47 da Lei 11.196/2005) não é suficientemente compensada pela isenção de PIS/Cofins concedida em benefício das cooperativas de catadores (art. 48), resultando em uma elevação da carga tributária total incidente sobre o processo de reciclagem. O resultado é estarrecedor. Hoje, do ponto de vista tributário, há maiores incentivos econômicos para os produtores que investem em tecnologias convencionais, assentadas no manejo florestal, do que para aqueles que adotam alternativas menos agressivas ao meio ambiente. (...) A injustiça desse sistema é perversa, pois, em rigor, os maiores prejudicados por tamanho desatino serão justamente os agentes econômicos que compõem elo mais frágil da cadeia produtiva, no caso, as cooperativas de catadores de materiais recicláveis, formadas por pessoas físicas de baixa renda. São elas que, invariavelmente, suportarão as consequências nocivas da política tributária instituída pela Lei 11.196/2005, já que, no limite, serão obrigadas a reduzir sua margem de lucro para compensar a elevação da carga tributária gerada pelo impedimento à compensação de créditos fiscais. (...) Assim, as empresas do ramo de reciclagem retornarão para o regime geral do PIS/Cofins, aplicável indiscriminadamente aos demais agentes econômicos, afastando o risco de o Tribunal incorrer em casuísmo e, involuntariamente, agravar as imperfeições sistêmicas da legislação tributária.

 

(...) embora o legislador tenha visado a beneficiar os catadores de papel, a legislação provocou graves distorções que acabam por desestimular a compra de materiais reciclados. Hoje, do ponto de vista tributário, é economicamente mais vantajoso comprar insumos da indústria extrativista do que adquirir matéria-prima de cooperativas de catadores de materiais recicláveis. Trata-se, portanto, de legislação que, na tentativa de beneficiar as cooperativas de catadores, introduziu externalidades negativas na indústria de reciclagem, obliterando as vantagens competitivas dos agentes econômicos que a integram. Dito de outro modo, os dispositivos impugnados espraiam efeitos nocivos na indústria da celulose, fomentando as produtoras de celulose a migrarem para o método extrativista, o qual, mesmo quando promovido de forma sustentável, produz maior grau de degradação ambiental. Veja que, nesse contexto, para ganharem sobrevida no mercado, as cooperativas de materiais reciclados são obrigadas a reduzir o valor de seus produtos, na proporção necessária à  neutralização das externalidades geradas pelos arts. 47 e 48 da Lei 11.196/2005. Do contrário, perdem espaço para a indústria extrativista, que, por um descuido do legislador, é favorecida pela legislação tributária. (...) Há, aqui, ofensa frontal ao princípio da isonomia em matéria tributária, previsto no art. 150, inciso II, da Constituição a Federal, na linha do parecer elaborado pelo professor Humberto Ávila (eDOC 1, p. 237257). Nele, demonstra o parecerista que a legislação impugnada discrimina empresas que concorrem em um mesmo segmento econômico (fabricação de celulose) com base em um critério de distinção ilegítimo".

 

De acordo com o precedente vinculante da Suprema Corte, os arts. 47 e 48 da Lei 11.196/2005 são inconstitucionais sob a ótica ambiental, bem como pela ótica tributária, ao malferir o princípio da igualdade/isonomia tributária.

 

No caso em apreço, a impetrante tem por objeto social (Id. 289637348) principalmente 'as atividades de fundição de metais não-ferrosos e suas ligas, e secundariamente: a) produção de alumínio fundido em formas e peças; b) produção de bronze fundido em formas e peças; c) produção de cobre fundido em formas e peças; d) serviços de fundição de metais não ferrosos; e) produção de ligas de metais não ferrosos fundidas em formas e peças; f) produção de peças fundidas de metais não ferrosos  e suas ligas; g) comércio atacadista de resíduos industriais; h) comércio atacadista de sucata não metálica; i) a coleta, classificação e a separação (sem transformação) de resíduos e sucatas metálicas, para obtenção de peças para serem reutilizadas e comercializadas; j) comércio atacadista de resíduos e sucatas metálicos; k) comércio atacadista de sucata metálica'.

 

Como visto, pretende creditar-se do montante despendido com a aquisição de desperdícios, resíduos e aparas, na apuração da base de cálculo do PIS e da COFINS, afastando-se a ilegítima e inconstitucional vedação prevista no art. 47 da Lei 11.196/05. 

 

Resta evidente que tais bens devem ser reputados como insumos, segundo o teste de essencialidade a que se refere o paradigma firmado no REsp 1.221.770, julgado sob rito repetitivo.

 

Além disso, a atividade econômica da impetrante enquadra-se na previsão legal de produção de bens, assim atendendo à especificação setorial da previsão de creditamento constante do artigo 3º,  caput, II, das Leis 10.637/2002 e 10.833/2003 ("bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda").

 

Diante da declaração de inconstitucionalidade do dispositivo legal, o creditamento deve ser viabilizado, em observância ao precedente vinculante.

 

Finalmente, com a declaração da inconstitucionalidade do artigo 48 da Lei 11.196/2005, a aquisição de tais bens passa a ser tributada a título de PIS/COFINS, cumprindo, assim, o requisito previsto no artigo 3º, § 2º, das Leis 10.637/2002 e 10.833/2003.

 

O pedido da Impetrante, formulado para que seja autorizada a fazer a compensação de todos os valores indevidamente recolhidos, inclusive nos cinco anos anteriores ao ajuizamento deste mandamus, valendo-se dos mesmos índices de correção adotados pela Fazenda Pública Nacional para a cobrança de seus créditos (SELIC), acrescidos da incidência de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir de cada recolhimento indevido, deve ser acolhido.

 

Nessa hipótese, o contribuinte poderá realizar a compensação administrativa após o trânsito em julgado da ação (art. 170-A do CTN), com atualização dos valores mediante aplicação da taxa Selic (art. 39, § 4º, da Lei 9.250/1995) e observância do disposto no art. 74 da Lei 9.430/1996 e demais dispositivos vigentes na data da propositura da ação. É ressalvado ao contribuinte o direito de proceder a essa compensação em conformidade com as normas posteriores, desde que atendidos os requisitos próprios (REsp 1.137.738/SP – Tema 265 dos recursos repetitivos).

 

A análise e exigência da documentação necessária para apuração do valor, bem como os critérios para a efetivação da compensação cabem ao Fisco, nos termos da legislação de regência, observando-se a revogação do parágrafo único do art. 26 da Lei 11.457/2007, pelo art. 8º da Lei 13.670 de 30 de maio de 2018, que também incluiu o art. 26-A da Lei 11.457/2007, elucidando a aplicabilidade do disposto no art. 74 da Lei 9.430/96, vedando a compensação com as contribuições previdenciárias nele mencionadas.

 

Em relação à correção monetária, pacífico é o entendimento segundo o qual esta se constitui mera atualização do capital, e visa restabelecer o poder aquisitivo da moeda, corroída pelos efeitos nocivos da inflação, de forma que os créditos do contribuinte devem ser atualizados monetariamente desde a data do recolhimento indevido (Súmula STJ 162) até a data da compensação, com a aplicação da taxa SELIC, com fulcro no art. 39, § 4º da Lei 9.250/95, afastada a aplicação de qualquer outro índice a título de juros e de correção monetária.

 

Em face do exposto, nego provimento à apelação da União e à remessa necessária, nos termos da fundamentação acima. 

 

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

DIREITO CONSTITUCIONAL, TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. PIS/COFINS. CREDITAMENTO. ARTS. 47 E 48 DA LEI 11.196/2005. INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA. APLICAÇÃO DO ENTENDIMENTO MANIFESTADO PELO STF NO TEMA 304 DA REPERCUSSÃO GERAL. COMPENSAÇÃO. PARÂMETROS.

1.   A matéria em discussão nestes autos foi afetada pelo Supremo Tribunal Federal à sistemática da repercussão geral (Tema 304 - RE 607.109), tendo sido proferida decisão de mérito, pendente apenas o julgamento dos embargos de declaração opostos pela União, por meio do qual pretende a modulação de efeitos daquela decisão. Todavia, não houve determinação de suspensão do trâmite de todos os processos que versem sobre a questão, de modo que não há impedimento ao exame da matéria por este Tribunal.

2. O art. 47 da Lei 11.196/2005 veda o direito ao creditamento de desperdícios, resíduos ou aparas utilizados como insumos.

3. O C. Supremo Tribunal Federal, no RE 607.109 - Tema 304, submetido à sistemática prevista no art. 543-B do CPC/73, art. 1036 do CPC/15, examinou a questão posta a julgamento e firmou a tese no sentido de que: "São inconstitucionais os arts. 47 e 48 da Lei 11.196/2005, que vedam a apuração de créditos de PIS/Cofins na aquisição de insumos recicláveis".

4. Extrai-se do voto condutor de lavra do e. Min. Gilmar Mendes que a vedação imposta pelo art. 47 Lei 11.196/05 viola o disposto no art. 170, inciso VI, da CF e as normas constitucionais relacionadas com a promoção e a proteção do meio ambiente ecologicamente equilibrado, pois impõe tratamento tributário prejudicial às empresas que, realizando os objetivos previstos na Política Nacional de Resíduos Sólidos (art. 7º da Lei 12.305/10), investiram em métodos industriais menos lesivos ao meio ambiente, bem como fere a isonomia tributária, ao discriminar empresas que concorrem em um mesmo segmento econômico com base em um critério de distinção ilegítimo.

5. Enfatizou-se  que "a proibição de abatimento de créditos na aquisição de insumos reutilizáveis (art. 47 da Lei 11.196/2005) não é suficientemente compensada pela isenção de PIS/Cofins concedida em benefício das cooperativas de catadores (art. 48), resultando em uma elevação da carga tributária total incidente sobre o processo de reciclagem".

6. O argumento de que o direito ao creditamento somente deve ser reconhecido caso tenha havido incidência da contribuição na etapa anterior não merece prosperar. No julgamento de mérito do RE 607.109, o Supremo Tribunal enfrentou e rebateu o aludido argumento, para reconhecer o direito ao creditamento independentemente da incidência da contribuição na etapa anterior.

7. A impetrante tem por objeto social (Id. 289637348) principalmente 'as atividades de fundição de metais não-ferrosos e suas ligas, e secundariamente: a) produção de alumínio fundido em formas e peças; b) produção de bronze fundido em formas e peças; c) produção de cobre fundido em formas e peças; d) serviços de fundição de metais não ferrosos; e) produção de ligas de metais não ferrosos fundidas em formas e peças; f) produção de peças fundidas de metais não ferrosos  e suas ligas; g) comércio atacadista de resíduos industriais; h) comércio atacadista de sucata não metálica; i) a coleta, classificação e a separação (sem transformação) de resíduos e sucatas metálicas, para obtenção de peças para serem reutilizadas e comercializadas; j) comércio atacadista de resíduos e sucatas metálicos; k) comércio atacadista de sucata metálica'.

8. Resta evidente que tais bens devem ser reputados como insumos, segundo o teste de essencialidade a que se refere o paradigma firmado no REsp 1.221.770, julgado sob rito repetitivo.

9. Além disso, a atividade econômica da impetrante enquadra-se na previsão legal de produção de bens, assim atendendo à especificação setorial da previsão de creditamento constante do artigo 3º,  caput, II, das Leis 10.637/2002 e 10.833/2003 ("bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda").

10. Diante da declaração de inconstitucionalidade do dispositivo legal, o creditamento deve ser viabilizado, em observância ao precedente vinculante.

11. Finalmente, com a declaração da inconstitucionalidade do artigo 48 da Lei 11.196/2005, a aquisição de tais bens passa a ser tributada a título de PIS/COFINS, cumprindo, assim, o requisito previsto no artigo 3º, § 2º, das Leis 10.637/2002 e 10.833/2003.

12.  pedido da Impetrante, formulado para que seja autorizada a fazer a compensação de todos os valores indevidamente recolhidos, inclusive nos cinco anos anteriores ao ajuizamento deste mandamus, valendo-se dos mesmos índices de correção adotados pela Fazenda Pública Nacional para a cobrança de seus créditos (SELIC), acrescidos da incidência de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir de cada recolhimento indevido, deve ser acolhido.

13. O contribuinte poderá realizar a compensação administrativa após o trânsito em julgado da ação (art. 170-A do CTN), com atualização dos valores mediante aplicação da taxa Selic (art. 39, § 4º, da Lei 9.250/1995) e observância do disposto no art. 74 da Lei 9.430/1996 e demais dispositivos vigentes na data da propositura da ação. É ressalvado ao contribuinte o direito de proceder a essa compensação em conformidade com as normas posteriores, desde que atendidos os requisitos próprios (REsp 1.137.738/SP – Tema 265 dos recursos repetitivos).

14. A análise e exigência da documentação necessária para apuração do valor, bem como os critérios para a efetivação da compensação cabem ao Fisco, nos termos da legislação de regência, observando-se a revogação do parágrafo único do art. 26 da Lei 11.457/2007, pelo art. 8º da Lei 13.670 de 30 de maio de 2018, que também incluiu o art. 26-A da Lei 11.457/2007, elucidando a aplicabilidade do disposto no art. 74 da Lei 9.430/96, vedando a compensação com as contribuições previdenciárias nele mencionadas.

15. Em relação à correção monetária, pacífico é o entendimento segundo o qual esta se constitui mera atualização do capital, e visa restabelecer o poder aquisitivo da moeda, corroída pelos efeitos nocivos da inflação, de forma que os créditos do contribuinte devem ser atualizados monetariamente desde a data do recolhimento indevido (Súmula STJ 162) até a data da compensação, com a aplicação da taxa SELIC, com fulcro no art. 39, § 4º da Lei 9.250/95, afastada a aplicação de qualquer outro índice a título de juros e de correção monetária.

16. Apelação da União e remessa necessária desprovidas. 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação da União e à remessa necessária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.