APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0047495-84.2009.4.03.6182
RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA
APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
APELADO: EDENRED SOLUÇÕES DE PAGAMENTOS HYLA S/A
Advogados do(a) APELADO: CLAUDIA DE CASTRO CALLI - SP141206-A, RODRIGO OLIVEIRA SILVA - SP287687-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0047495-84.2009.4.03.6182 RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: EDENRED SOLUÇÕES DE PAGAMENTOS HYLA S/A Advogados do(a) APELADO: CLAUDIA DE CASTRO CALLI - SP141206-A, RODRIGO OLIVEIRA SILVA - SP287687-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso de apelação em face da r. sentença de fls. 1.531/1.546 (id 163815181, p. 83/112) que julgou parcialmente procedentes os embargos, reconhecendo a existência de crédito compensável da embargante no total de R$ 436.220,99 composto pelo recolhimento de IRRF, por conta própria por meio de DARF, durante o período-base de 2001, que deverá ser excluído da execução. Ambas as partes foram condenadas ao pagamento de honorários advocatícios: (1) a cargo da parte embargada, o cálculo obedece ao art. 85, parágrafo 3º, I, do CPC, arbitrando-se os honorários sobre o valor indevidamente não compensado R$ 436.220,99, atualizado, no mínimo legal; (2) a cargo da parte embargante, respeita a legislação especial, nos termos do Decreto-lei n. 1.025/1969, em 20% do valor exequendo, devidamente atualizado. Aduz a União, em síntese, que o crédito do embargante não foi devidamente comprovado pelo documento hábil, conforme previsão do Decreto nº 3.000/99. Alega que não cabe ao Poder Judiciário substituir a análise da autoridade fiscal no sentido de promover a compensação tributária, devendo, assim, ser "afastado o direito credito reconhecido ao embargante, uma vez que não comprovado nos autos." Requer a reforma integral da sentença. Regularmente intimada, a parte apelada apresentou suas contrarrazões (fls. 1.554/1.560). É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0047495-84.2009.4.03.6182 RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: EDENRED SOLUÇÕES DE PAGAMENTOS HYLA S/A Advogados do(a) APELADO: CLAUDIA DE CASTRO CALLI - SP141206-A, RODRIGO OLIVEIRA SILVA - SP287687-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O decreto, enquanto norma reguladora e secundária, não pode dispor de forma diferente da norma jurídica primária ao qual ele se originou, ou seja, não pode ampliar, contrariar ou restringir direitos, sob pena de incorrer em ofensa aos princípios da legalidade e da hierarquia das normas. No caso concreto, observa-se que a r. sentença não afastou a legalidade do Decreto nº 3.000/99 como afirma a União. O que ficou constatado é que o §2º do art. 87 do Decreto nº 3.000/99 restringiu a previsão contida no art. 2º, §4º, II da Lei nº 9.460/1966. Por certo, não se pode alegar que os comprovantes de recolhimento dos tributos não tem valor probatório ante a exigência regulamentar de apresentação de comprovante anual de retenção de imposto de renda retido na fonte. Em que pese a exigência de comprovantes de retenção para fins de compensação, a busca pela verdade material deve ser almejada, e a documentação apresentada pelo contribuinte indica a veracidade de suas alegações. Assim, não procede a alegação da União de que o crédito tributário não foi devidamente comprovado por documento hábil conforme estabelece o regulamento do imposto de renda vigente à época, pois o contribuinte apresentou os comprovantes de pagamento. A comprovação do crédito sob discussão se deu mediante perícia judicial, que analisou os comprovantes de pagamento do IRRF juntados pela parte embargante (fl. 1228). O perito judicial é pessoa de confiança do Juiz, a favor de quem milita a presunção de imparcialidade, pois, sem interesse na demanda, permanece equidistante das partes. Portanto, a r. sentença não merece reforma nessa questão. Quanto a alegação de que não cabe ao Judiciário substituir a análise da autoridade fiscal, no sentido de promover a compensação tributária, na verdade a r. sentença reconheceu, após perícia judicial, a omissão da Receita Federal no reconhecimento da compensação de crédito da embargante consistente no recolhimento de IRRF, por conta própria por meio de DARF, durante o período-base de 2001, no total de R$ 436.220,99, que deverá ser excluído da execução. Confira-se o seguinte trecho da r. sentença, que analisou detidamente a questão que ora adoto como fundamento de decidir: "Quando da edição da Lei n. 6.830, a praxe impedia a compensação de créditos, se um deles fosse de natureza tributária. Já o Código Civil enunciara o princípio geral de que, como regra, o encontro de contas seria inviável, a menos que norma específica o autorizasse. A mesma idéia, essencialmente, figurou em nossa lei complementar tributária. Portanto, quando do advento da LEF, a compensação do indébito tributário, no âmbito do lançamento por homologação, era desconhecida. Só veio a ser autorizada - como é sobejamente conhecido - a partir de 1991, com a Lei n. 8.383 (art.66) e a copiosa legislação que se seguiu.Este é o primeiro ponto: a se entender que a LEF estaria a se referir à compensação do indébito, ter-se-ia que atribuir dons proféticos ao legislador - em outras palavras, teria tratado de instituto inexistente.A que se reporta, então, o precitado art. 16, par. 3º? Em nosso modo de sentir, a resposta é simples: refere-se à oposição de um crédito de qualquer origem, de que seja sujeito passivo a Fazenda Pública exeqüente. Por exemplo, o que adviesse da execução de contrato administrativo, por algum motivo não solvido. Neste caso, em face da proibição legal, estaria o Juiz impedido de conhecer do pedido, inclusive porque estranho à questão da liqüidez intrínseca do título (de modo algum afetada, porque a lei material impedia a extinção recíproca dos créditos). Restaria ao executado em tela haver o que lhe couber manejando a competente ação de conhecimento (e submetendo-se ao regime de precatório). É dizer, a compensação de um crédito qualquer com o crédito fiscal sempre foi vedada, em linha de princípio. Assim sendo, não poderia o devedor, aproveitando a natureza de ação dos embargos, deduzir pleito no sentido de que o magistrado provesse sentença declarando reciprocamente extintos os créditos. Isto pode bem suceder em demanda regida pelo direito comum. Mas não em matéria de dívida ativa, porque no mais das vezes sua origem é tributária. Daí o preceito da Lei de Execuções Fiscais, que veio a esclarecer e espelhar, no campo do processo, o que já era previsto pelo direito material. Acontece que, como vimos, nossa tradição jurídica sempre admitiu a hipótese - estéril durante décadas - de que lei especial viesse a autorizar alguma forma de compensação. E isto se materializou de fato, a partir de 1991, beneficiando os contribuintes que houvessem realizado pagamento a maior. Neste caso, como fixou a jurisprudência, o sujeito passivo da obrigação tributária que, simultaneamente, fosse credor de tributo da mesma espécie, poderia declarar a compensação em sua própria contabilidade. É que a instrumentalização do ato, no âmbito do autolançamento, é relativamente simples (pelo menos para as pessoas jurídicas e em relação a certos impostos sobre produção e circulação, bem como contribuições sociais). Posteriormente e, dentro do qüinqüênio decadencial, caberia ao Fisco verificar a correção dos valores, lançando ex-officio no caso de incorreção quantitativa (exempli gratia, por divergência de critérios atinentes a juros ou correção monetária) ou qualitativa (exemplos desta última: os tributos não eram da mesma espécie; não tinham a mesma destinação constitucional; não havia reciprocidade etc.). Ademais, pode suceder que a Fazenda reste inerte durante o prazo de caducidade: nesta hipótese, fala-se em homologação tácita do lançamento. Que dizer se uma das descritas situações foi alegada pelo executado? Agora, não se pode assumir que esteja requerendo o encontro de crédito seu, incompensável com aquele espelhado pela certidão de dívida ativa. Está, sim, a ponderar, que o título executivo não goza de liqüidez e certeza, porque a inscrição louvou-se em crédito inexistente, normalmente porque o Poder Público deixou transcorrer os cinco anos in albis. Esta compensação do indébito mediante autolançamento não é aquela cogitada pela LEF, art. 16, e, portanto, sua dedução não está, aprioristicamente, afastada.É claro que nossa conclusão não dispensa o executado do ônus da prova. Deve exigir reste evidenciada a natureza e os montantes compensados, porque não são raras as postulações temerárias. Há que frisar que não se trata de proceder compensação no seio do processo (porque precisamente isto é o que veda a norma de regência) mas de declarar acerto de contas que se verificou no passado. Assim, ganha importância o debate em torno dos valores envolvidos, que, nas ações de cognição e nos mandados de segurança manejados para discutir compensação do indébito são, ao contrário, irrelevantes. DA COMPENSAÇÃO - CONSIDERAÇÕES GERAIS A compensação consiste em modalidade de extinção de créditos até onde se encontrem, podendo portanto ser total ou parcial. Pressupõe que os mesmos créditos sejam líquidos, certos, vencidos, exigíveis e homogêneos. Observado este último requisito, a diferença de causa (de título jurídico) não impede, em princípio, a compensação, mas a lei civil exceptuava certas situações, de modo absoluto, como os alimentos e outras de modo relativo - os fiscais, enquanto não fosse objeto de regulação especial. O CTN, da mesma forma, remeteu a questão à lei especial e de acordo com as exigências impostas pela situação concreta (art. 170). A situação permaneceu, na órbita da União, em potência, até que sobrevieram as Leis 8.212/91 e 8.383/91 (e suas alterações: Leis n. 9.032/95, 9.069/95, 9.129 e 9.250/95). Diante das copiosas normas, pode-se vislumbrar que, observados os princípios gerais que o instituto já conhecia no âmbito do direito privado, a compensação tributária tem as seguintes características: - é direito subjetivo público do contribuinte, de natureza potestativa; - consiste no encontro de créditos decorrentes de pagamento indevido com créditos fiscais ou previdenciários;- tal encontro deve dar-se entre créditos de mesma espécie, ou seja, de tributos que tenham a mesma hipótese de incidência e a mesma destinação; - não pode ser condicionada por exigências que não decorram de lei formal ou de medida provisória, como as constantes da Circ. 01.600.0 n. 40/94; - pode ser efetuada pelo próprio contribuinte, em sua contabilidade fiscal, quando dá inicio ao lançamento dito "por homologação"; - portanto, independe de precatório e sua realização não vulnera o art. 100 da Constituição Federal, na medida em que não se trata de pretensão havida por meio de decisão judicial condenatória e sim de modalidade lícita tutela autônoma pelo interessado; - nada obstante, sua perfeição final depende da homologação expressa ou tácita (pelo decurso do prazo decadencial) pelo ente tributante, o qual é livre para fiscalizar a exatidão dos valores. COMPENSAÇÃO E CONTROLE JUDICIAL DOS ATOS DA RECEITA FEDERAL Nem se alegue a competência administrativa da Receita para proceder o lançamento do tributo. Ninguém está a negar essa atribuição exclusiva da Administração Tributária. Mas o Poder Judiciário pode e deve rever os atos e omissões ilegais, desviados ou abusivos de qualquer setor da Administração Pública, porque essa é sua missão constitucional. ÔNUS DA PROVA EM MATÉRIA DE COMPENSAÇÃO Como já se tratou em tópico anterior, embora a argüição de compensação-autolançamento seja EM TESE admissível, ela não dispensa a observância das regras processuais que regem a distribuição do ônus da prova. Assim, seja porque o embargante está alegando fato constitutivo de seu direito de compensar (art. 373, I, NCPC), seja porque assevera fato extintivo do crédito exeqüendo, têm o inteiro ônus de demonstrar a exatidão do procedimento observado. Em primeiro lugar, há de demonstrar que iniciou o autolançamento em sua escrita fiscal, de maneira regular.Em segundo, a exatidão dos valores deve restar inequívoca, o que envolve complexas operações que se afeiçoam à prova pericial contábil. É preciso verificar se e até que ponto o crédito fiscal foi absorvido pela compensação. Diferentemente, portanto, de outras ações em que se discute o direito em tese à compensação, aqui se trata de demonstrar sua operacionalização em concreto, inclusive para que se saiba se há saldo. DO CASO CONCRETO A embargante aduz ter formulado pedido de compensação de todos os débitos em execução por meio do processo administrativo n. 10880.722109/2008-52. A compensação haveria de ser efetuada com saldo credor de IRPJ a que teria direito em função de recolhimentos indevidos que foram realizados durante o ano-calendário de 2001, no qual a empresa teve resultado negativo. Mas o seu pedido foi deferido apenas parcialmente. Dos R$ 565.209,95 cuja compensação era pretendida foi reconhecido o direito apenas à compensação de R$ 18.195,78, correspondentes ao saldo negativo de IRPJ considerado comprovado pela SRF por meio da apresentação das DIRFs emitidas pelas fontes pagadoras. Vejamos a fundamentação da decisão da SRF no processo n. 11831.006542/2002-08, que grifei: "3 - Da apuração do direito creditório 15. Avaliando a apuração do suposto saldo negativo IRPJ do ano-calendário 2001, no montante de R$ 565.209,95, declarado na ficha 12ª da DIPJ 2002 à fls. 62, verifica-se que: . O contribuinte não apurou IRPJ devido, antes de descontar as deduções, por ter tido um prejuízo fiscal no montante de R$ 748.693,16, conforme ficha 09ª da DIPJ 2002 à fls. 65; . Foi utilizado na apuração do IRPJ do exercício e nas estimativas de IRPJ, IR/Fonte no montante de R$ 2.857.356,12 conforme declarado nas fichas 09ª e 11 da DIPJ 2002 (fls. 62/63). De acordo com consulta ao sistema Sief/DIRF (fls. 68 a 106), foi comprovado IRRF, declarado pelas fontes pagadoras, em valor (R$ 18.195,78) menor do que o utilizado pelo contribuinte. As receitas correspondentes ao IRRF comprovado foram devidamente oferecidas à tributação, conforme detalhamento a seguir. Desta forma, o valor que deve ser utilizado na apuração do IRPJ do exercício é de R$ 0,00, pois R$ 18.195,78 foi utilizado nas estimativas de IRPJ" (...) . Foi apurado IRPJ estimativa a pagar, de acordo com o quadro a seguir, na ficha 11 da DIPJ 2002 Entretanto, não foi declarada estimativa de IRPJ em DCTF (fls. 66), e nem foi encontrado algum pagamento referente a estimativas de IRPJ nesse ano (fls. 66) (...) Portanto, efetuando os ajustes necessários para refletirem no cálculo do IRPJ do período os valores efetivamente comprovados temos: Considerando que o saldo negativo de IRPJ do ano-calendário 2001, após ajuste descrito neste despacho, no montante de R$ 18.195,78 (dezoito mil, cento e noventa e cinco reais e setenta e oito centavos), foi devidamente comprovado. .17. PROPONHO O RECONHECIMENTO do direito creditório contra a Fazenda (...) na importância de R$ 18.195,78 (dezoito mil, cento e noventa e cinco reais e setenta e oito centavos), referente a saldo credor de IRPJ apurado em 31/12/2001... 18. PROPONHO também a HOMOLOGAÇÃO da compensação presente nos PER/DCOMP´s em análise neste despacho até o limite do crédito reconhecido, sendo que os PER/DCOMP´s só devem utilizar crédito do período indicado nos mesmos. Inconformada com a decisão administrativa, a embargante insiste que faria jus ao deferimento integral de seu pedido, tendo em conta que teria comprovado créditos a título de recolhimento indevido de IRPJ no ano-base de 2001, que somariam saldo negativo de R$ 565.209,95 e não apenas R$ 18.195,78. A quantia em créditos teria por origem: i. Saldo negativo de IRPJ verificado em períodos anteriores a 2001 no montante de R$ 97.300,80 - (v. p. 9 da DIPJ de 2002); ii. Valores recolhidos a título de IRPJ-Fonte pela própria embargante, por meio de DARF (código receita 8045) no total de R$ 361.772,53; iii. Valores recolhidos a título de IRPJ-Fonte pela própria embargante, por meio de DARF (código receita 3426) no total de R$ 74.448,46; iv. Valores retidos pelos clientes da ora embargante a título de IRRF no montante de R$ 10.966,76 (recolhidos tanto sob o código de receita 8045, como sob o código de receita 1708); v. Valores recolhidos pela embargante no montante principal de R$ 20.721,40 (código de receita 8045 - docs anexos). Por sua vez, a embargada reitera o posicionamento apresentado pela SRF, defendendo que a embargante somente comprovou possuir crédito compensável no total de R$ 18.195,78, que, como dito, é o valor obtido pela somatória dos recolhimentos de IRRF efetuados por meio de DIRF pelas fontes que efetuaram pagamentos à embargante. Diz também que a parcela de débitos cuja compensação foi autorizada já foi computada antes mesmo da inscrição em dívida dos créditos em execução; e que o restante não compensado corresponde aos créditos cobrados na execução fiscal. Determinada a produção de prova pericial para o esclarecimento da controvérsia, o experto apresentou seu laudo técnico, onde teceu as seguintes conclusões: . Os valores exigidos nos autos da execução fiscal n. 0024827-22.009.403.6182 foram objeto dos pedidos de restituição e compensação realizados pela embargante no processo administrativo n. 11831.006542/2002-08, que diz respeito ao reconhecimento e compensação de crédito tributário consistente em saldo credor de IRPJ no ano-calendário 2001 (quesito 07 do laudo pericial - fls. 1.210) . A embargante declarou em sua DIPJ possuir crédito a título de saldo negativo de IRPJ no total de R$ 565.209,95 (quesito 08 do laudo pericial - fls. 1.213); . A embargante comprovou nos autos possuir créditos referentes a saldo negativo do IRPJ que não foram reconhecidos pela Receita Federal que perfazem o montante de R$ 456.942,39. Este valor não reconhecido diz respeito a valores pagos a título de IRRF pela própria embargante, por meio de DARF (código de retenção 8045), na soma total de R$ 456.942,39 (quesito 10 do Laudo Pericial - fls. 1.221). Não foi identificada nos autos, contudo, a prova de um alegado pagamento de R$ 97.300,80 a título de IRPJ, que foi lançado na sua contabilidade a título de estimativa. Neste ponto, o perito anota que a contabilidade está irregular, pois não há prova efetiva do pagamento, mas apenas seu provisionamento (conclusão do laudo pericial - fls. 1.229); . Isto posto, do valor originalmente pleiteado no pedido de restituição/compensação - de R$ 565.209,95 - houve somente a comprovação de créditos no montante de R$ 475.138,17, que é composto pela soma do valor reconhecido contabilmente e não reconhecido pela Receita Federal de R$ 456.942,39 (IRRF recolhido pela própria embargante, por meio de DARF), com o montante reconhecido administrativamente pela Receita Federal do Brasil de R$ 18.195,78 (IRPJ-Fonte recolhido por terceiros pagadores, por meio de DIRF); . Descontados estes créditos, ainda resta a ser executado um saldo de R$ 90.071,78 (fls. 1.229). Pois então. Ao que consta, além de a discussão dos embargos passar pela comprovação dos valores recolhidos, ela envolve principalmente a questão sobre se os valores de IRRF recolhidos pela própria embargante dariam ou não direito a crédito. É dizer: seria determinante a forma de recolhimento de um tributo não devido para o fim de reconhecer os seus valores como compensáveis? A embargada pugna pela negativa. Aduz que somente reconheceu como crédito os valores de IRRF recolhidos por fontes pagadoras e comprovados por meio da apresentação de DIRF, pois assim determina de forma expressa o art. 87, 2º do Decreto 3.000/99: Art. 87. Do imposto apurado na forma do artigo anterior, poderão ser deduzidos [...] 2º O imposto retido na fonte somente poderá ser deduzido na declaração de rendimentos se o contribuinte possuir comprovante de retenção emitido em seu nome pela fonte pagadora dos rendimentos, ressalvado o disposto nos arts. 7º, 1º e 2º, e 8º, 1º (grifei) Na visão da embargada, a expressão "somente poderá" induz a uma interpretação restritiva do dispositivo, segundo a qual a única forma possível de se considerar o recolhimento de imposto de renda retido na fonte para o fim de dedução consistiria na apresentação, como diz o texto, de "comprovante de retenção emitido em seu nome pela fonte pagadora dos rendimentos" - que seria no caso a tal DIRF. Em sentido contrário, a embargante diz que a forma de recolhimento não pode ser relevante para o fim de reconhecimento do crédito, pois de qualquer modo os valores teriam ingressado no Erário. Isto não bastasse, a Lei 9.430/96, que também trata de compensação, e é hierarquicamente superior ao Decreto 3.000/99, não faz tal restrição em seu art. 2º, 4º, III: Art. 2º A pessoa jurídica sujeita a tributação com base no lucro real poderá optar pela pagamento do imposto, em cada mês, determinado sobre base de cálculo estimada, mediante a aplicação dos percentuais de que trata o art. 15 da Lei no 9.249, de 26 de dezembro de 1995, sobre a receita bruta definida pela art. 12 do Decreto-Lei no 1.598, de 26 de dezembro de 1977, auferida mensalmente, deduzida das devoluções, vendas canceladas e dos descontos incondicionais concedidos, observado o disposto nos 1o e 2o do art. 29 e nos arts. 30, 32, 34 e 35 da Lei no 8.981, de 20 de janeiro de 1995 (...) §4º Para efeito de determinação do saldo de imposto a pagar ou a ser compensado, a pessoa jurídica poderá deduzir do imposto devido o valor: (...) III - do imposto de renda pago ou retido na fonte, incidente sobre receitas computadas na determinação do lucro real; Na leitura da embargante, ao se referir ao imposto de renda "pago ou retido na fonte", o dispositivo estaria a se referir tanto ao IRRF recolhido pelas fontes pagadoras por meio de DIRF, quanto ao recolhido diretamente pela beneficiária dos rendimentos, por meio de DARF. Assiste razão à embargante. Ao regular a forma de comprovação do recolhimento de IRRF para o fim de dedução ou compensação o Decreto 3.000/99 acabou sendo mais restritivo do que a Lei 9.430/96 que ele regulamenta. Por conseguinte, acabou por limitar de forma ilegal o exercício do direito à dedução/compensação, de modo que devem prevalecer as disposições da lei ordinária, que não confina o reconhecimento de créditos dedutíveis de IRRF a uma forma específica de recolhimento do tributo. O decreto ultrapassou limites que lhe são próprios, pois, como leciona MIGUEL REALE, "[...] não são leis os regulamentos ou decretos, porque estes não podem ultrapassar os limites postos pela norma legal que especificam ou a cuja execução se destinam". E ainda: Tudo o que nas normas regulamentares ou executivas esteja em conflito com o disposto na lei não tem validade, e é susceptível de impugnação por quem se sinta lesado. A ilegalidade de um regulamento importa, em última análise, num problema de inconstitucionalidade, pois é a Constituição que distribui as esferas e a extensão do poder de legislar, conferindo a cada categoria de ato normativo a força obrigatória que lhe é própria." (REALE, Miguel - Lições Preliminares de Direito, São Paulo, 1980, p.163) Parece certo que, ao regulamentar a matéria, o legislador administrativo acabou dizendo menos do que deveria, pois não seria mesmo razoável que o Fisco pudesse se locupletar com os recolhimentos de um tributo indevido, opondo ao contribuinte óbice de ordem meramente formal ao seu reconhecimento como crédito dedutível. Não há dúvida de que a forma de recolhimento usual de um tributo ao qual esteja atrelada obrigação acessória de recolhimento na fonte é o seu cálculo e entrega pela própria fonte pagadora. Mas isto não obsta a atribuição da obrigação de auto-retenção ao próprio recebedor do pagamento, o contribuinte de fato. É o que ocorre no caso das comissões, na forma da IN SRF n. 153/87. Ou ainda, a possibilidade de o próprio contribuinte de fato proceder ao recolhimento na hipótese de o contribuinte de direito se omitir. O fim da obrigação de recolhimento na fonte, afinal, é instrumentalizar a arrecadação do imposto. Relevante, portanto, é que o imposto tenha sido pago de modo aceito pela legislação e que haja prova deste pagamento. É compreensível que o Fisco tenha negado o reconhecimento dos recolhimentos com base na interpretação literal do Decreto 3.000/99, pois que a ele não compete operar interpretações complexas das normas, tampouco decidir sobre a justiça do lançamento. A sua atividade se resume à verificação da ocorrência dos fatos imponíveis e a projetar sobre eles o conteúdo das normas tributárias, constituindo o crédito. A principal razão desse pragmatismo na aplicação da norma reside no fato de que a atividade tributante implica a aplicação das normas tributárias em massa, de modo contínuo, e de ofício, de maneira que o administrador não poderia, sem a autorização legal específica, considerar meios de prova que considerasse atender aos mesmos fins daqueles previstos expressamente na norma. O Judiciário, por sua vez, não pode se valer deste pragmatismo ao determinar suas soluções. Isto em função de seu desenho institucional e dever constitucional de encontrar a norma particularizada para cada caso que lhe é submetido, sendo-lhe imposta a obrigação de análise de todo ordenamento com o fim de produzir uma norma densa e particularizada que resolva a situação concreta com o mais alto grau de justiça material. Com base no exposto, concluo que o reconhecimento de créditos dedutíveis a título de recolhimento indevido de IRRF não há de ser limitado à sua comprovação por meio de DIRF, devendo também ser aceitos os recolhimentos efetuados por meio de DARF. Quanto aos recolhimentos comprovados, aqueles efetuados por meio de DIRF já foram considerados no processo administrativo. No que toca aos efetuados por meio de DARF, segundo a perícia constam dos autos comprovantes que totalizam a quantia de R$ 456.942,39. Ocorre que, para chegar a esta soma, o perito acabou considerando recolhimentos que sequer foram apresentados ao crivo do Fisco, por terem sido realizados muito após o encerramento do processo administrativo em que se requereu a compensação. São eles: DATA DA ARRECADAÇÃO... VENCIMENTO....CÓDIGO.........VALOR TOTAL R$ 20.721,40 A consideração destes valores como compensáveis nestes embargos esbarra nos termos do art. 16, par. 3º, da Lei n. 6.830/80, que veda a tentativa de se proceder à compensação no seio do processo. Como já exposto, em sede de embargos à execução a alegação de compensação há de ser vista como causa de pedir da correção de atos ou omissões ilegais por parte da Administração Tributária. Sucede que se os valores em questão nem mesmo foram apresentados para compensação, porque sequer tinham sido recolhidos àquele tempo, não há que se falar, a esse respeito, em omissão do Fisco, de modo que não podem ser objeto de análise aqui. Firme nestas premissas, reconheço a omissão da embargada no reconhecimento da compensação de crédito da embargante consistente no recolhimento de IRRF, por conta própria por meio de DARF, durante o período-base de 2001, no total de R$ 436.220,99, que deverá ser excluído da execução. Portanto, a r. sentença deve ser mantida. Nos termos do § 11 do art. 85 do CPC, majoro em 1% (um por cento) o montante dos honorários advocatícios fixados na sentença a favor da parte apelada. Em face do exposto, nego provimento ao recurso de apelação da União, nos termos fundamentados. É como voto.
09/02/2009........................02/03/01.......8045.....R$ 1.404,88
09/02/2009........................04/04/01.......8045.....R$ 1.779,55
09/02/2009........................03/05/01.......8045.....R$ 3.139,27
09/02/2009........................30/05/01.......8045.....R$ 683,36
09/02/2009........................29/08/01.......8045.....R$ 960,41
09/02/2009........................04/01/02.......8045.....R$ 12.753,93
E M E N T A
DIREITO TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO. EMBARGOS A EXECUÇÃO FISCAL. SALDO NEGATIVO. IMPOSTO DE RENDA RETIDO NA FONTE. COMPENSAÇÕES. COMPROVANTES DE PAGAMENTO. PERÍCIA JUDICIAL. RECONHECIMENTO. SENTENÇA MANTIDA.
1 - A comprovação do crédito sob discussão se deu mediante perícia judicial, que analisou os comprovantes de pagamento do IRRF juntados pela parte embargante (fl. 1228).
2 - O perito judicial é pessoa de confiança do Juiz, a favor de quem milita a presunção de imparcialidade, pois, sem interesse na demanda, permanece equidistante das partes.
3 - Quanto a alegação de que não cabe ao Judiciário substituir a análise da autoridade fiscal, no sentido de promover a compensação tributária, na verdade a r. sentença reconheceu, após perícia judicial, a omissão da Receita Federal no reconhecimento da compensação de crédito da embargante consistente no recolhimento de IRRF, por conta própria por meio de DARF, durante o período-base de 2001, no total de R$ 436.220,99, que deverá ser excluído da execução.
4 - "Ao regular a forma de comprovação do recolhimento de IRRF para o fim de dedução ou compensação o Decreto 3.000/99 acabou sendo mais restritivo do que a Lei 9.430/96 que ele regulamenta".
5 - "Por conseguinte, acabou por limitar de forma ilegal o exercício do direito à dedução/compensação, de modo que devem prevalecer as disposições da lei ordinária, que não confina o reconhecimento de créditos dedutíveis de IRRF a uma forma específica de recolhimento do tributo".
6 - Recurso de apelação desprovido.