AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5003695-12.2024.4.03.0000
RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO
AGRAVANTE: DAMM PRODUTOS ALIMENTICIOS LTDA
Advogados do(a) AGRAVANTE: DAVID ROCHA VEIGA - SP236012-A, DENIS ARAUJO - SP222498-A
AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5003695-12.2024.4.03.0000 RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO AGRAVANTE: DAMM PRODUTOS ALIMENTICIOS LTDA Advogados do(a) AGRAVANTE: DAVID ROCHA VEIGA - SP236012-A, DENIS ARAUJO - SP222498-A AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR): Trata-se de agravo de instrumento interposto por DAMM PRODUTOS ALIMENTÍCIOS LTDA. contra decisão proferida pelo Juízo Federal da 1ª Vara de Osasco/SP que, em sede de mandado de segurança impetrado contra ato do DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM OSASCO/SP, objetivando “reconhecer que é indevida a inclusão nas bases de cálculo do PIS e da COFINS dos valores correspondentes ao benefício fiscal de Crédito Outorgado de ICMS de que a Impetrante é – e venha a ser – titular, outorgados pelo Estado de São Paulo”, indeferiu a liminar. Em suas razões recursais (ID 285603922), a parte agravante sustenta, em síntese: “(...) Conforme se verifica dos documentos juntados, mais especificamente os denominados GIAS (Campo 007 – outros créditos) acostados na peça exordial e ao presente recurdo, o benefício do credito outorgado do ICMS recebido pela Impetrante gira em torno de R$ 1.200,000,00 (hum milhão e duzentosmil reais) mensais, valor este substancialmente elevado, que acarretará um excessivo aumento da base de cáclculo das das contribuiçoes PIS e COFINS. (...) Além do mais, caso não efetue o recolhimento do PIS e COFINS com a inclusão do crédito outorgado do ICMS na base de cálculo, a Agravante estará sujeita as penalidades de multa, negativa de emissão de CND, inscrição do débito no CADINS e dívida ativa, além de constrição de bens e ativos financeiros em caso de execução, elementos que por sí só já caracterizam o “periculun in mora”. (...) O benefício fiscal de ICMS não é faturamento do estabelecimento e, pois, não deve ser incluído na base de cálculo do PIS e da COFINS, sob pena de se permitir que a União retire, por via oblíqua, o incentivo que o Estado-membro outorgou no exercício de sua competência tributária privativa”. O pedido de concessão da antecipação da pretensão recursal foi deferido (ID 285829985). A União interpôs agravo interno (ID 287160025) e apresentou contraminuta de agravo de instrumento (ID 287160024). Contrarrazões ao agravo interno em ID 288812376. O Ministério Público Federal, não vislumbrando interesse público que justificasse sua intervenção, manifestou-se pelo regular processamento do feito (ID 289129138). É o relatório.
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5003695-12.2024.4.03.0000 RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO AGRAVANTE: DAMM PRODUTOS ALIMENTICIOS LTDA Advogados do(a) AGRAVANTE: DAVID ROCHA VEIGA - SP236012-A, DENIS ARAUJO - SP222498-A AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR): Discute-se a inclusão, na base de cálculo do Programa de Integração Social – PIS e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – COFINS, dos valores relativos a créditos presumidos de Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS, decorrentes de incentivos e benefícios fiscais ou financeiro-fiscais concedidos pelos respectivos entes tributantes. É certo que e. STF reconheceu repercussão geral ao Tema n.º 843 (“possibilidade de exclusão da base de cálculo do PIS e da COFINS dos valores correspondentes a créditos presumidos de ICMS decorrentes de incentivos fiscais concedidos pelos Estados e pelo Distrito Federal” – RE n.º 835.818), determinando a suspensão nacional dos feitos em tramitação sobre a matéria, com base no art. 1.037, II, do CPC. Apesar da previsão contida no dispositivo, também é certo que não há impedimento para a análise de tutelas provisórias de urgência, como sói ocorrer in casu. A propósito, confira-se precedentes do próprio STJ e desta Turma: “(...) Não obstante o inciso II do art. 1.037 do CPC/2015 preceituar que o relator ‘determinará a suspensão do processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a questão e tramitem no território nacional’, sem explicitar o alcance dessa suspensão, deve-se fazer uma leitura sistemática do diploma processual vigente. Assim, as normas que tratam da suspensão dos processos, constantes do art. 313 combinado com o art. 314 do CPC/215, bem como do art. 982, § 2º, do CPC/2015, que cuida da suspensão dos feitos no Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas - IRDR, devem também ser aplicadas aos recursos repetitivos, tendo em vista que ambos compõem um mesmo microssistema (de julgamento de casos repetitivos), conforme se depreende do art. 928 do CPC/2015 (...) Dos dispositivos transcritos, torna-se patente que a suspensão do processamento dos processos pendentes, determinada no art. 1.037, II, do CPC/2015, não impede que os Juízos concedam, em qualquer fase do processo, tutela provisória de urgência, desde que satisfeitos os requisitos contidos no art. 300 do CPC/2015, e deem cumprimento àquelas que já foram deferidas (...) (QO na ProAfR no REsp n. 1.657.156/RJ, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, julgado em 24/5/2017, DJe de 31/5/2017)”. “PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÕES DESTINADAS A TERCEIROS. BASE DE CÁLCULO. LIMITAÇÃO A 20 SALÁRIOS-MÍNIMOS. TEMA 1.079/STJ. AFETAÇÃO E SUSPENSÃO NACIONAL. ANTECIPAÇÃO DA TUTELA. REQUISITOS ESPECÍFICOS NÃO ATENDIDOS. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. 1. A questão de fundo é objeto do Tema 1.079/STJ e há determinação de suspensão do processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem acerca da questão delimitada e tramitem no território nacional. 2. Entretanto, a suspensão prevista pelo art. 1.037, II, do CPC não constitui óbice à concessão da tutela de urgência, quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, nos termos do que dispõe o art. 300 do mesmo CPC. (...)” (TRF 3ª Região, 3ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5024300-13.2023.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal CONSUELO YATSUDA MOROMIZATO YOSHIDA, julgado em 24/11/2023, DJEN DATA: 29/11/2023)”. Assim, passo à análise do mérito recursal. O poder constituinte originário conferiu ao Estado o poder de tributar os contribuintes, para obter recursos para financiar suas atividades. A fim de que o exercício desse poder estatal seja legítimo, contudo, deve-se observar não só os limites da competência atribuída pela Constituição Federal a cada ente da federação, como também as imunidades e as garantias individuais do contribuinte previstas principalmente no artigo 150 da Constituição Federal. As competências tributárias deverão ser exercidas em fiel observância às normas constitucionais, que preveem, especificamente, limitações ao poder de tributar, com a consagração de princípios, imunidades, restrições e possibilidades de concessão de isenções, incentivos e benefícios fiscais (confira-se: STF, Pleno, ADI 2357/DF, rel. Min. Alexandre de Moraes, j. 30.08.2019). Ressalta-se que distribuições de competências tributárias visa atender o princípio federativo, de sorte a garantir, na forma do artigo 18 da CF, a autonomia da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Nos termos do artigo 155, II, da Carta, compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior. A Carta impõe a observância da não-cumulatividade na tributação pelo ICMS (artigo 155, § 2º, I), visando impedir a múltipla incidência tributária (tributação em cascata) nas diversas fases da produção e circulação dos bens, de forma a desonerar sua cadeia econômica. Também se previu na Constituição a possibilidade de observância do princípio da seletividade, em função da essencialidade das mercadorias e dos serviços (inciso III), sem que isso implique em ofensa à isonomia. Conforme disposto no artigo 155, § 2º, I, da CF, a não-cumulatividade do ICMS se dá por meio de compensação do que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal. Ressalta-se que, salvo legislação em contrário, a isenção ou a não incidência não implicará crédito para compensação com o montante devido nas operações ou prestações seguintes (inciso II, a), bem como, acarretará a anulação do crédito relativo às operações anteriores (alínea b). A operacionalização da sistemática da não-cumulatividade somente se dá com créditos efetivamente existentes ou mediante presunção legal de sua existência (créditos presumidos). Cumpre ressaltar que, segundo disposto no seu artigo 155, XII, g, a Constituição determinou caber à lei complementar regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados. Quanto ao ponto, o artigo 150, § 6º, da Carta, com redação dada pela Emenda Constitucional n.º 03/1993, estabelece que “qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no referido artigo 155, § 2.º, XII, g”. Nesse contexto, foi editada a Lei Complementar n.º 160/2017, que dispôs sobre “convênio que permite aos Estados e ao Distrito Federal deliberar sobre a remissão dos créditos tributários, constituídos ou não, decorrentes das isenções, dos incentivos e dos benefícios fiscais ou financeiro-fiscais instituídos em desacordo com o disposto na referida alínea g, do inciso XII, do § 2º, do artigo 155, da Constituição Federal e a reinstituição das respectivas isenções, incentivos e benefícios fiscais ou financeiro-fiscais”. Dentre suas disposições, a LC n.º 160/2017 promoveu alteração na Lei n.º 12.973/2014, para o fim de incluindo o §4º no seu artigo 30, determinar que, para fins de tributação do IRPJ e CSLL, os incentivos e os benefícios fiscais ou financeiro-fiscais relativos ao ICMS são considerados subvenções para investimento, vedada a exigência de outros requisitos ou condições não previstos no mesmo artigo. Por seu turno, o referido artigo 30 da Lei n.º 12.973/2014 estabelece que não serão computadas na determinação do lucro real as subvenções para investimento concedidas como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos e as doações feitas pelo poder público, desde que seja registrada em reserva de lucros. Ainda, em seu § 2º, dispõe que haverá tributação caso lhes seja dada destinação diversa. “Art. 30. As subvenções para investimento, inclusive mediante isenção ou redução de impostos, concedidas como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos e as doações feitas pelo poder público não serão computadas na determinação do lucro real, desde que seja registrada em reserva de lucros a que se refere o art. 195-A da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, que somente poderá ser utilizada para: I - absorção de prejuízos, desde que anteriormente já tenham sido totalmente absorvidas as demais Reservas de Lucros, com exceção da Reserva Legal; ou II - aumento do capital social. § 1º Na hipótese do inciso I do caput, a pessoa jurídica deverá recompor a reserva à medida que forem apurados lucros nos períodos subsequentes. § 2º As doações e subvenções de que trata o caput serão tributadas caso não seja observado o disposto no § 1º ou seja dada destinação diversa da que está prevista no caput, inclusive nas hipóteses de: I - capitalização do valor e posterior restituição de capital aos sócios ou ao titular, mediante redução do capital social, hipótese em que a base para a incidência será o valor restituído, limitado ao valor total das exclusões decorrentes de doações ou subvenções governamentais para investimentos; II - restituição de capital aos sócios ou ao titular, mediante redução do capital social, nos 5 (cinco) anos anteriores à data da doação ou da subvenção, com posterior capitalização do valor da doação ou da subvenção, hipótese em que a base para a incidência será o valor restituído, limitada ao valor total das exclusões decorrentes de doações ou de subvenções governamentais para investimentos; ou III - integração à base de cálculo dos dividendos obrigatórios. § 3º Se, no período de apuração, a pessoa jurídica apurar prejuízo contábil ou lucro líquido contábil inferior à parcela decorrente de doações e de subvenções governamentais e, nesse caso, não puder ser constituída como parcela de lucros nos termos do caput , esta deverá ocorrer à medida que forem apurados lucros nos períodos subsequentes. § 4º Os incentivos e os benefícios fiscais ou financeiro-fiscais relativos ao imposto previsto no inciso II do caput do art. 155 da Constituição Federal, concedidos pelos Estados e pelo Distrito Federal, são considerados subvenções para investimento, vedada a exigência de outros requisitos ou condições não previstos neste artigo. (Incluído pela Lei Complementar nº 160, de 2017) § 5º O disposto no § 4º deste artigo aplica-se inclusive aos processos administrativos e judiciais ainda não definitivamente julgados. (Incluído pela Lei Complementar nº 160, de 2017)” Isto posto, no âmbito da tributação do IRPJ e da CSLL, resultou relevante distinguir se a concessão pelos Estados e Distrito Federal de créditos presumidos de ICMS, em decorrência de incentivos e benefícios fiscais ou financeiro-fiscais, implicaria acréscimo patrimonial tributável, haja vista que, se caracterizada, em tese, a hipótese de incidência tributária para fins de apuração do lucro real sujeito à tributação do IRPJ e da CSLL, o contribuinte se sujeitararia à observância do quanto disposto no artigo 30, § 2º, da Lei n.º 12.973/2014. A fim de uniformizar o entendimento de suas Turmas, a 1ª Seção do c. Superior Tribunal de Justiça estabeleceu, no julgamento dos Embargos de Divergência em Recurso Especial n.º 1.547.492, que não são caracterizados como renda ou lucro os créditos presumidos outorgados no contexto de incentivo fiscal, inclusive sob pena de violação ao princípio federativo. Segue a ementa do acórdão: “TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. ICMS. CRÉDITOS PRESUMIDOS CONCEDIDOS A TÍTULO DE INCENTIVO FISCAL. INCLUSÃO NAS BASES DE CÁLCULO DO IMPOSTO SOBRE A RENDA DA PESSOA JURÍDICA - IRPJ E DA CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO LÍQUIDO - CSLL. INVIABILIDADE. PRETENSÃO FUNDADA EM ATOS INFRALEGAIS. INTERFERÊNCIA DA UNIÃO NA POLÍTICA FISCAL ADOTADA POR ESTADO-MEMBRO. OFENSA AO PRINCÍPIO FEDERATIVO E À SEGURANÇA JURÍDICA. BASE DE CÁLCULO. OBSERVÂNCIA DOS ELEMENTOS QUE LHES SÃO PRÓPRIOS. RELEVÂNCIA DE ESTÍMULO FISCAL OUTORGADO POR ENTE DA FEDERAÇÃO. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO FEDERATIVO. ICMS NA BASE DE CÁLCULO DO PIS E DA COFINS. INCONSTITUCIONALIDADE ASSENTADA EM REPERCUSSÃO GERAL PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (RE N. 574.706/PR). AXIOLOGIA DA RATIO DECIDENDI APLICÁVEL À ESPÉCIE. CRÉDITOS PRESUMIDOS. PRETENSÃO DE CARACTERIZAÇÃO COMO RENDA OU LUCRO. IMPOSSIBILIDADE. I - Controverte-se acerca da possibilidade de inclusão de crédito presumido de ICMS nas bases de cálculo do IRPJ e da CSLL. II - O dissenso entre os acórdãos paradigma e o embargado repousa no fato de que o primeiro manifesta o entendimento de que o incentivo fiscal, por implicar redução da carga tributária, acarreta, indiretamente, aumento do lucro da empresa, insígnia essa passível de tributação pelo IRPJ e pela CSLL; já o segundo considera que o estímulo outorgado constitui incentivo fiscal, cujos valores auferidos não podem se expor à incidência do IRPJ e da CSLL, em virtude da vedação aos entes federativos de instituir impostos sobre patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros. III - Ao considerar tal crédito como lucro, o entendimento manifestado pelo acórdão paradigma, da 2ª Turma, sufraga, em última análise, a possibilidade de a União retirar, por via oblíqua, o incentivo fiscal que o Estado-membro, no exercício de sua competência tributária, outorgou. IV - Tal entendimento leva ao esvaziamento ou redução do incentivo fiscal legitimamente outorgado pelo ente federativo, em especial porque fundamentado exclusivamente em atos infralegais, consoante declinado pela própria autoridade coatora nas informações prestadas. V - O modelo federativo por nós adotado abraça a concepção segundo a qual a distribuição das competências tributárias decorre dessa forma de organização estatal e por ela é condicionada. VI - Em sua formulação fiscal, revela-se o princípio federativo um autêntico sobreprincípio regulador da repartição de competências tributárias e, por isso mesmo, elemento informador primário na solução de conflitos nas relações entre a União e os demais entes federados. VII - A Constituição da República atribuiu aos Estados-membros e ao Distrito Federal a competência para instituir o ICMS - e, por consequência, outorgar isenções, benefícios e incentivos fiscais, atendidos os pressupostos de lei complementar. VIII - A concessão de incentivo por ente federado, observados os requisitos legais, configura instrumento legítimo de política fiscal para materialização da autonomia consagrada pelo modelo federativo. Embora represente renúncia a parcela da arrecadação, pretende-se, dessa forma, facilitar o atendimento a um plexo de interesses estratégicos para a unidade federativa, associados às prioridades e às necessidades locais coletivas. IX - A tributação pela União de valores correspondentes a incentivo fiscal estimula competição indireta com o Estado-membro, em desapreço à cooperação e à igualdade, pedras de toque da Federação. X - O juízo de validade quanto ao exercício da competência tributária há de ser implementado em comunhão com os objetivos da Federação, insculpidos no art. 3º da Constituição da República, dentre os quais se destaca a redução das desigualdades sociais e regionais (inciso III), finalidade da desoneração em tela, ao permitir o barateamento de itens alimentícios de primeira necessidade e dos seus ingredientes, reverenciando o princípio da dignidade da pessoa humana, fundamento maior da República Federativa brasileira (art. 1º, III, C.R.). XI - Não está em xeque a competência da União para tributar a renda ou o lucro, mas, sim, a irradiação de efeitos indesejados do seu exercício sobre a autonomia da atividade tributante de pessoa política diversa, em desarmonia com valores éticos-constitucionais inerentes à organicidade do princípio federativo, e em atrito com o princípio da subsidiariedade, que reveste e protege a autonomia dos entes federados. XII - O abalo na credibilidade e na crença no programa estatal proposto pelo Estado-membro acarreta desdobramentos deletérios no campo da segurança jurídica, os quais não podem ser desprezados, porquanto, se o propósito da norma consiste em descomprimir um segmento empresarial de determinada imposição fiscal, é inegável que o ressurgimento do encargo, ainda que sob outro figurino, resultará no repasse dos custos adicionais às mercadorias, tornando inócua, ou quase, a finalidade colimada pelos preceito legais, aumentando o preço final dos produtos que especifica, integrantes da cesta básica nacional. XIII - A base de cálculo do tributo haverá sempre de guardar pertinência com aquilo que pretende medir, não podendo conter aspectos estranhos, é dizer, absolutamente impertinentes à própria materialidade contida na hipótese de incidência. XIV - Nos termos do art. 4º da Lei n. 11.945/09, a própria União reconheceu a importância da concessão de incentivo fiscal pelos Estados-membros e Municípios, prestigiando essa iniciativa precisamente com a isenção do IRPJ e da CSLL sobre as receitas decorrentes de valores em espécie pagos ou creditados por esses entes a título de ICMS e ISSQN, no âmbito de programas de outorga de crédito voltados ao estímulo à solicitação de documento fiscal na aquisição de mercadorias e serviços. XV - O STF, ao julgar, em regime de repercussão geral, o RE n. 574.706/PR, assentou a inconstitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS, sob o entendimento segundo o qual o valor de ICMS não se incorpora ao patrimônio do contribuinte, constituindo mero ingresso de caixa, cujo destino final são os cofres públicos. Axiologia da ratio decidendi que afasta, com ainda mais razão, a pretensão de caracterização, como renda ou lucro, de créditos presumidos outorgados no contexto de incentivo fiscal. XVI - Embargos de Divergência desprovidos.” (STJ, 1ª Seção, EREsp 1517492, relator Ministro Og Fernandes, relatora para o acórdão Ministra Regina Helena Costa, j. 08.11.2017) [g.n.] No voto condutor do posicionamento majoritário, a Ministra Regina Helena Costa pontuou: “[...] Cabe lembrar que a Constituição da República hospeda vários dispositivos dedicados a autorizar certos níveis de ingerência estatal na atividade produtiva com vista a reduzir desigualdades regionais, alavancar o desenvolvimento social e econômico do país, inclusive mediante desoneração ou diminuição da carga tributária. [...] Tem-se, portanto, que a outorga de crédito presumido de ICMS insere-se em contexto de envergadura constitucional, instituída por legislação local específica do ente federativo tributante. [...] É esse crédito, em torno do qual gravitam tais aspectos, que se pretende ver incluído nas bases de cálculo do IRPJ e da CSLL. Com a devida vênia, ao considerar tal crédito como lucro, o entendimento manifestado pelo acórdão paradigma, da 2ª Turma, sufraga, em última análise, a possibilidade de a União retirar, por via oblíqua, o incentivo fiscal que o Estado-membro, no exercício de sua competência tributária, outorgou. Com efeito, tal entendimento leva ao esvaziamento ou redução do incentivo fiscal legitimamente outorgado pelo ente federativo [...] Outrossim, remarque-se que a competência tributária consiste na aptidão para instituir tributos, descrevendo, por meio de lei, as suas hipóteses de incidência. No Brasil, o veículo de atribuição de competências, inclusive tributárias, é a Constituição da República. Tal sistemática torna-se especialmente relevante em um Estado constituído sob a forma federativa, com a peculiaridade do convívio de três ordens jurídicas distintas: a federal, a estadual/distrital e a municipal. Não por outra razão, cuidou o legislador constituinte originário de alçar a Federação à categoria de cláusula pétrea, tornando-a intangível pelo Poder Constituinte Derivado, conforme o disposto no art. 60, § 4º, I. [...] Como sabido, o princípio republicano, assim como o princípio da legalidade, constitui decorrência do princípio da segurança jurídica, que se apoia nas ideias de certeza e igualdade. No modelo federativo fiscal, a Constituição dita o que pode cada pessoa política realizar em matéria tributária, demarcando os respectivos âmbitos de atuação, no intuito de evitar conflitos entre a União, os Estados-membros, o Distrito Federal e os Municípios. O modelo federativo por nós adotado abraça a concepção segundo a qual a distribuição das competências tributárias decorre dessa forma de organização estatal e por ela é condicionada. A rigor, em sua formulação fiscal, revela-se o princípio federativo um autêntico sobreprincípio regulador da repartição de competências tributárias e, por isso mesmo, elemento informador primário na solução de conflitos nas relações entre a União e os demais entes federados. Como corolário desse fracionamento de competências, o art. 155, XII, g, da Constituição da República, atribuiu aos Estados-membros e ao Distrito Federal a competência para instituir o ICMS – e, por consequência, outorgar isenções, benefícios e incentivos fiscais, atendidos os pressupostos de lei complementar. Anote-se tratar-se de tributo que, por constituir uma das principais fontes de receita para custeio do aparato estatal, assegura condições para o exercício desembaraçado da autonomia constitucionalmente conferida às unidades da Federação. A concessão de incentivo por Estado-membro, observados os requisitos legais, configura, portanto, instrumento legítimo de política fiscal para materialização dessa autonomia consagrada pelo modelo federativo. Embora represente renúncia a parcela da arrecadação, pretende-se, dessa forma, facilitar o atendimento a um plexo de interesses estratégicos para a unidade federativa, associados às prioridades e às necessidades locais coletivas. No caso concreto, verifica-se, de fato, interferência na política fiscal adotada pelo Estado-membro mediante o exercício de competência federal. Examinada a questão sob valores ético-constitucionais da Federação, limitadores do próprio exercício dessa competência, como também pelo princípio da subsidiariedade, fator de salvaguarda da autonomia dos entes federados perante a atividade tributante federal, constata-se que a concorrência desses elementos, adiante sopesados, é capaz de inibir a pretensão de incidência tributária defendida pela União. Com efeito, o juízo de validade quanto ao exercício da competência tributária há de ser implementado em comunhão com os objetivos da Federação, insculpidos no art. 3º da Constituição da República, dentre os quais se destaca a redução das desigualdades sociais e regionais (inciso III), finalidade da desoneração em tela, ao permitir o barateamento de itens alimentícios de primeira necessidade e dos seus ingredientes, reverenciando o princípio da dignidade da pessoa humana, fundamento maior da República Federativa brasileira (art. 1º, III, C.R.). Desse modo, a tributação pela União de valores correspondentes a incentivo fiscal estimula competição indireta com o Estado-membro, em desapreço à cooperação e à igualdade, pedras de toque da Federação. Naturalmente, não está em xeque a competência da União para tributar a renda ou o lucro, mas, sim, a irradiação de efeitos indesejados do seu exercício sobre a autonomia da atividade tributante de pessoa política diversa, em desarmonia com valores éticos-constitucionais inerentes à organicidade do princípio federativo, e em atrito com a subsidiariedade, "um princípio de bom senso", no dizer do professor André Franco Montoro (Federalismo e o fortalecimento do Poder Local no Brasil e na Alemanha. Coleção Debates da Fundação Konrad Adenauer: Rio de Janeiro, 2002. p. 59), que reveste e protege a autonomia dos Estados-membros. [...] Dessarte, é razoável que a exegese em torno do exercício de competência tributária federal, no contexto de estímulo fiscal legitimamente concedido por Estado-membro, tenha por vetor principal um juízo de ponderação dos valores federativos envolvidos. [...] É induvidoso, ademais, o caráter extrafiscal conferido pelo legislador estadual à desoneração, consistindo a medida em instrumento tributário para o atingimento de finalidade não arrecadatória, mas, sim, incentivadora de comportamento, com vista à realização de valores constitucionalmente contemplados, conforme apontado. Outrossim, o abalo na credibilidade e na crença no programa estatal proposto pelo Estado-membro, a seu turno, acarreta desdobramentos deletérios no campo da segurança jurídica, os quais não podem ser desprezados. Deveras, se o propósito da norma consiste em descomprimir um segmento empresarial de determinada imposição fiscal, é inegável que o ressurgimento do encargo, ainda que sob outro figurino, resultará no repasse dos custos adicionais às mercadorias, tornando inócua, ou quase, a finalidade colimada pelos preceito legais, aumentando o preço final dos produtos que especifica, integrantes, como assinalado, da cesta básica nacional. Importante realçar que a relação jurídica de outorga de incentivo fiscal difere da dogmática da relação obrigacional tributária convencional, porquanto, naquela, o contribuinte, ao atender aos requisitos normativos, titulariza o papel de credor do Estado, enquanto o Fisco torna-se devedor do cumprimento das obrigações legais assumidas [...] A base de cálculo, inquestionavelmente, haverá sempre de guardar pertinência com aquilo que pretende medir, não podendo conter aspectos estranhos, é dizer, absolutamente impertinentes à própria materialidade contida na hipótese de incidência. [...] Por fim, cumpre registrar, dada a estreita semelhança axiológica com o presente caso, que o Supremo Tribunal Federal, ao julgar, em regime de repercussão geral, o RE n. 574.706/PR, assentou a inconstitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS. Entendeu o Plenário da Corte, por maioria, que o valor de ICMS não se incorpora ao patrimônio do contribuinte, constituindo mero ingresso de caixa, cujo destino final são os cofres públicos [...] Note-se que, na linha de raciocínio esposada pelo Supremo Tribunal Federal, os créditos presumidos de ICMS, concedidos no contexto de incentivo fiscal, não teriam, com ainda mais razão, o condão de integrar as bases de cálculo de outros tributos, como quer a ora Embargante, em relação ao IRPJ e à CSLL, quer porque não representam lucro, quer porque tal exigência tem fundamento em meras normas infralegais, quer ainda, à vista de fundamento não menos importante, por malferir o princípio federativo. [...]” (g.n.) Ainda que não objeto de julgamento sob a sistemática dos temas representativos de controvérsia de natureza repetitiva, verifica-se que tal entendimento foi ratificado no julgamento, em 26.04.2023, do Tema Repetitivo n.º 1.182 (REsp n.ºs 1.945.110/RS e 1.987.158/SC), cuja delimitação se cingiu, justamente, à possibilidade de extensão do entendimento firmado no EREsp 1.517.492/PR aos demais benefícios fiscais relacionados ao ICMS, tais como redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, imunidade, diferimento, entre outros. Restou firmada a seguinte tese: “1. Impossível excluir os benefícios fiscais relacionados ao ICMS, - tais como redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, diferimento, entre outros - da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, salvo quando atendidos os requisitos previstos em lei (art. 10, da Lei Complementar n. 160/2017 e art. 30, da Lei n. 12.973/2014), não se lhes aplicando o entendimento firmado no ERESP 1.517.492/PR que excluiu o crédito presumido de ICMS das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL. 2. Para a exclusão dos benefícios fiscais relacionados ao ICMS, - tais como redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, diferimento, entre outros - da base de cálculo do IRPJ e da CSLL não deve ser exigida a demonstração de concessão como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos. 3. Considerando que a Lei Complementar 160/2017 incluiu os §§ 4º e 5º ao art. 30 da Lei 12.973/2014 sem, entretanto, revogar o disposto no seu § 2º, a dispensa de comprovação prévia, pela empresa, de que a subvenção fiscal foi concedida como medida de estímulo à implantação ou expansão do empreendimento econômico não obsta a Receita Federal de proceder ao lançamento do IRPJ e da CSSL se, em procedimento fiscalizatório, for verificado que os valores oriundos do benefício fiscal foram utilizados para finalidade estranha à garantia da viabilidade do empreendimento econômico.” [g.n.] Segundo voto condutor da tese firmada no Tema n.º 1.182, do relator Ministro Benedito Gonçalves, assim se diferenciou os créditos presumidos decorrentes de benefícios fiscais das suas demais espécies: “[...] Considerando que a questão controvertida posta consiste em definir se é possível a extensão do entendimento firmado no ERESP 1.517.492/PR, que excluiu o crédito presumido de ICMS das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL, de modo que também sejam excluídos outros benefícios fiscais relacionados ao ICMS, - tais como redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, imunidade, diferimento, entre outros -, revela-se de fundamental importância a investigação das eventuais diferenças existentes entre as espécies de benefícios fiscais, de um lado, e o crédito presumido, do outro. De partida, é preciso destacar que a Primeira Seção considerou, ao julgar o ERESP 1.517.492/PR, que a concessão do crédito presumido de ICMS representa renúncia a parcela de arrecadação, de modo a tributação pela União desses valores significaria “a irradiação de efeitos indesejados do seu exercício sobre a autonomia da atividade tributante de pessoa política diversa, em desarmonia com valores éticos-constitucionais inerentes à organicidade do princípio federativo” (trecho da ementa do precedente da Seção). De acordo com a doutrina especializada, em virtude do chamado “efeito de recuperação” que é próprio do regime da não-cumulatividade, benefícios ou incentivos fiscais que desonerem determinadas operações representam tão somente diferimentos de incidência. O efeito de recuperação é um fenômeno próprio de sistemas que adotam a não cumulatividade do tipo “imposto sobre imposto”, como foi a opção brasileira para o ICMS. Adotado o método “imposto sobre imposto”, uma alíquota inferior, redução de base de cálculo ou uma isenção, por exemplo, aplicadas no curso do ciclo a que está sujeito o produto, não beneficia o consumidor, na ponta final. É que a diferença é recuperada pelo Fisco através da aplicação de incidência mais elevada nas operações posteriores, diante da ausência da possibilidade de apuração de crédito de imposto destacado na nota fiscal. Esse é o chamado efeito de recuperação, representado no diferimento da incidência. A respeito do tema do efeito da recuperação no contexto da não-cumulatividade do ICMS, o professor Hugo de Brito Machado assevera que: “As isenções, como as imunidades, de determinadas operações, ficam transformadas em simples diferimentos de incidência. Para que isto não ocorresse, necessário seria que ficasse assegurado o crédito do imposto para as operações seguintes.” (MACHADO, Hugo de Brito. Não-incidência, imunidades e isenções no ICMS. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, n. 18, p. 27-39, mar. 1997. p. 39). Como assertivamente apontado pelo professor, somente a efetiva criação de crédito presumido será capaz de afastar esse efeito de recuperação. No mesmo sentido, ensina Ivan Ozai que “a isenção do imposto em relação a determinada operação implica a ausência de créditos para pagamento do imposto incidente na operação seguinte, produzindo o fenômeno que conhecemos por efeito de recuperação” (OZAI, Ivan Ozawa. Benefícios fiscais do ICMS. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2019. p.148). Aqui reside a peculiar diferença que aparta a espécie de benefício fiscal do crédito presumido das demais espécies de incentivos fiscais de ICMS: a atribuição de crédito presumido ao contribuinte efetivamente representa um dispêndio de valores por parte do Fisco, afastando o chamado efeito da recuperação. Os demais benefícios fiscais de desoneração de ICMS não possuem a mesma característica, pois o Fisco, não obstante possa induzir determinada operação, se recuperará por meio do efeito de recuperação. Oportuno relembrar, a respeito dessa característica do sistema brasileiro da não cumulatividade (aplicável tanto ao ICMS como ao IPI, no que interessa a este debate), do teor da Súmula Vinculante n. 58 do STF: “Inexiste direito a crédito presumido de IPI relativamente à entrada de insumos isentos, sujeitos à alíquota zero ou não tributáveis, o que não contraria o princípio da não cumulatividade”. Em outras palavras, a instituição de benefícios fiscais de desoneração de determinada operação não gera, automaticamente, o credito presumido mais à frente. Por isso, em regra, o Fisco irá se recuperar dos valores que deixaram de ser recolhidos, salvo se efetivamente resolva criar um benefício de crédito presumido. Diante disso, podemos concluir que a questão da não inclusão do crédito presumido de ICMS na base de cálculo do IRPJ e da CSLL, do modo como compreendido pela Primeira Seção no ERESP 1.517.492/PR, não tem a mesma aplicabilidade para todos os demais benefícios fiscais. O entendimento da Primeira Seção segundo o qual a tributação do crédito presumido terminaria por representar uma incursão do Fisco Federal em valores que o Fisco Estadual resolveu despender, não tem a mesma aplicabilidade para benefícios fiscais de desoneração. Vale dizer, dadas as características da não-cumulatividade adotada no sistema tributário brasileiro, a atribuição do crédito presumido tem peculiaridades que apartam esse benefício daqueles outros que não representam a atribuição de crédito, mas a desoneração (isenção, redução de base de cálculo, dentre outros). [...]” (g.n.) Em que pese o contorno constitucional dado pelo c. STJ à questão, registra-se que o e. Supremo Tribunal Federal, em 18.08.2017, no julgamento do Tema n.º 957 estabeleceu, majoritariamente, que “a controvérsia relativa à inclusão de créditos presumidos de ICMS na base de cálculo do IRPJ e da CSLL não possui repercussão geral, tendo em vista sua natureza infraconstitucional”, ainda que apontado no posicionamento minoritário que, em 27.08.2015, a Corte entendeu pela existência de repercussão geral ao Tema n.º 843 (“possibilidade de exclusão da base de cálculo do PIS e da COFINS dos valores correspondentes a créditos presumidos de ICMS decorrentes de incentivos fiscais concedidos pelos Estados e pelo Distrito Federal” – RE n.º 835.818), cuja ratio essendi seria assemelhada. Ressalta-se que há, inclusive, determinação de suspensão nacional quanto ao referido Tema n.º 843. Por outro lado, ainda que o deslinde a ser conferido pelo e. STF ao Tema de Repercussão Geral n.º 843 possa afetar a interpretação dos contornos constitucionais que o c. STJ deu à questão relativa à incidência do IRPJ e da CSLL sobre créditos presumidos decorrentes de incentivos fiscais – aliás, como expressamente aventado na própria decisão de suspensão nacional do Tema n.º 843 –, fato é que, no cenário jurídico atual relativo à tributação do IRPJ e da CSLL, a Corte Suprema conferiu à Corte Superior a última palavra quanto a esta matéria, dada sua competência constitucional para uniformização da interpretação da legislação infraconstitucional. Em consonância com o decidido pelo c. STJ vem decidindo esta Corte Regional: “TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. CRÉDITO PRESUMIDO DE ICMS. EREsp 1.517.492. NÃO INCLUSÃO NAS BASES DE CÁLCULO DO IRPJ E DA CSLL. 1. Revogação do sobrestamento do feito, tendo em vista que a pretensão manifestada nestes autos (exclusão dos créditos presumidos de ICMS da base de cálculo do IRPJ e da CSLL) não se confunde com aquela afetada pelo Superior Tribunal de Justiça ao Tema 1008 dos recursos repetitivos (Possibilidade de inclusão de valores de ICMS nas bases de cálculo do Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica - IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL, quando apurados pela sistemática do lucro presumido). Por conseguinte, o agravo interno da União restará prejudicado. 2. Delimitação do objeto da lide: o contribuinte apresenta nestes autos pretensão restrita aos créditos presumidos de ICMS, não requerendo provimento jurisdicional atinente aos demais benefícios fiscais de ICMS. Por esta razão, o feito não comporta sobrestamento pelo Tema 1182 dos recursos repetitivos (STJ). 3. Pelo mesmo motivo, o apelo fazendário não será conhecido, pois a insurgência nele apresentada se refere unicamente aos chamados benefícios fiscais negativos (tais como isenções, reduções de base de cálculo e redução de alíquota). As razões apresentadas na apelação da União, portanto, encontram-se dissociadas da discussão travada nos autos e dos fundamentos da sentença, restando inobservado o princípio da dialeticidade recursal, circunstância que obsta o seu conhecimento. 4. O provimento jurisdicional que segue se refere especificamente aos créditos presumidos de ICMS e será exarado em atenção à remessa oficial. 5. Por ocasião do julgamento do EREsp 1.517.492, o Superior Tribunal de Justiça firmou compreensão no sentido de que os benefícios fiscais concedidos pelos Estados membros (ou pelo Distrito Federal), consistentes em créditos presumidos de ICMS, constituem instrumentos legítimos de política fiscal que materializam sua autonomia. Nesse contexto, a tributação de tais valores pela União caracteriza interferência que viola o pacto federativo, por restringir a eficácia de incentivo fiscal concedido por outro ente federado, de modo a ofender também a segurança jurídica. 6. Restou salientado no referido precedente que a descaracterização desses créditos presumidos como renda ou lucro tornou-se mais evidente a partir da orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal no RE 574.706, ante a compreensão de que o valor do ICMS não se incorpora ao patrimônio do contribuinte. 7. Referida Corte Superior tem se manifestado também no sentido de que a inovação legislativa trazida pelos arts. 9º e 10 da Lei Complementar 160/2017 (inclusão dos §§ 4º e 5º ao art. 30 da Lei 12.973/2014) não se mostra hábil a alterar referido entendimento. Sobre o tema: AgInt no AREsp n. 2.020.374/RS, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 29/8/2022, DJe de 31/8/2022. 8. Em síntese, comporta acolhimento a pretensão de exclusão, das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL, dos valores atinentes aos créditos presumidos (também conhecidos como créditos outorgados) de ICMS, não se afigurando necessária a observância, nesta situação, das disposições do art. 30 da Lei 12.973/2014. 9. O contribuinte poderá realizar compensação administrativa após o trânsito em julgado da ação (art. 170-A do CTN), com atualização dos valores mediante aplicação da taxa Selic (art. 39, § 4º, da Lei 9.250/1995) e observância do disposto no art. 74 da Lei 9.430/1996 e demais dispositivos vigentes na data da propositura da ação. Deve ser observada a prescrição quinquenal. É ressalvado ao contribuinte o direito de proceder a essa compensação em conformidade com as normas posteriores, desde que atendidos os requisitos próprios (REsp 1.137.738/SP – Tema 265 dos recursos repetitivos). 10. A análise e exigência da documentação necessária, bem como os critérios para a efetivação da compensação cabem ao Fisco, nos termos da legislação de regência, observando-se a revogação do parágrafo único do art. 26 da Lei 11.457/2007, pelo art. 8º da Lei 13.670 de 30 de maio de 2018, que também incluiu o art. 26-A da Lei 11.457/2007, elucidando a aplicabilidade do disposto no art. 74 da Lei 9.430/96. 11. Os parâmetros da compensação acima especificados foram observados pela sentença. 12. Sobrestamento revogado. Agravo interno prejudicado. Apelação da União não conhecida. Remessa oficial improvida.” (TRF3, 3ª Turma, ApelRemNec 5002071-70.2020.4.03.6109, j. 20.05.2023) “PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. INCENTIVOS FISCAIS DE ICMS. SENTENÇA REDUZIDA AOS LIMITES DO PEDIDO. CRÉDITO PRESUMIDO ICMS. BASE DE CÁLCULO DO IRPJ E CSLL. CONDIÇÕES ESTABELECIDAS PELA LEI Nº 12.973/14. IRRELEVÂNCIA. COMPENSAÇÃO. POSSIBILIDADE. RESTITUIÇÃO. INVIABILIDADE. APELAÇÕES DESPROVIDAS. REMESSA OFICIAL PARCIALMENTE PROVIDA. I - Depreende-se não ter a impetrante realizado pedido de exclusão de todos os incentivos fiscais de ICMS da base de cálculo do IRPJ e da CSLL (matéria com determinação de sobrestamento nacional – tema nº 1.182/STJ), mas somente dos créditos outorgados de ICMS, também chamados de créditos presumidos. Redução da sentença aos limites do pedido. II - No julgamento dos EREsp. Nº 1.517.492/PR o Superior Tribunal de Justiça entendeu por excluir o crédito presumido de ICMS das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL ao fundamento de violação do Pacto Federativo (art. 150, VI, "a", da CF/88). III -É irrelevante a discussão a respeito do enquadramento do referido incentivo/benefício fiscal como "subvenção para custeio", "subvenção para investimento" ou "recomposição de custos" para fins de determinar essa exclusão, já que o referido benefício/incentivo fiscal foi excluído do próprio conceito de Receita Bruta Operacional previsto no art. 44, da Lei n. 4.506/64. IV – São irrelevantes as alterações produzidas pelos arts. 9º e 10, da Lei Complementar n. 160/2017 (provenientes da promulgação de vetos publicada no DOU de 23.11.2017) sobre o art. 30, da Lei n. 12.973/2014, ao adicionar-lhe os §§ 4º e 5º, que tratam de uniformizar ex lege a classificação do crédito presumido de ICMS como "subvenção para investimento" com a possibilidade de dedução das bases de cálculo dos referidos tributos desde que cumpridas determinadas condições (REsp. n. 1.605.245/RS, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 25.06.2019). V - A data do fato gerador (posterior ou anterior ao advento da LC nº 160/2017) não tem o condão de influenciar no resultado do julgamento, já que o crédito em questão não se trata de receita bruta operacional. Precedentes. VI – É direito da impetrante a compensação dos valores recolhidos indevidamente, observados os critérios estabelecidos em sentença, ressalvado o direito da autoridade administrativa em proceder à plena fiscalização acerca da existência ou não de créditos a serem compensados, exatidão dos números e documentos comprobatórios, "quantum" a compensar e conformidade do procedimento adotado com a legislação de regência. VII - O ressarcimento do contribuinte em razão de indébito fiscal, na hipótese de condenação judicial em mandado de segurança, somente admite a possibilidade de declaração de compensação ao se considerar o disposto nas Súmulas 269 e 271 do STF. VIII – Apelações desprovidas e remessa oficial parcialmente provida.” (TRF3, 6ª Turma, ApelRemNec 5005468-27.2021.4.03.6102, j. 15.05.2023) Na ideia dos precedentes que se construíram em torno do IRPJ e das CSSL, tem-se que apenas os valores relativos aos créditos presumidos de ICMS decorrentes de benefícios fiscais afastariam a incidência tributária, posto que implicariam violação ao pacto federativo; ao passo que os demais valores decorrentes de benefícios fiscais na tributação pelo ICMS, dado o efeito de recuperação próprio ao diferimento da respectiva incidência tributária, sofreriam a regular incidência dos tributos de competência da União. E, quanto ao ponto, as disposições previstas na Lei n.º 14.789/2023, com produção de efeitos a partir de 01.01.2024, inclusive quanto à revogação do citado artigo 30 da Lei n.º 12.973/2014, nada alteram o entendimento relativo à violação ao pacto federativo. Nesta senda, as razões de decidir para fins da incidência do IRPJ e da CSSL se aplicam, igualmente, às contribuições ao PIS e COFINS, posto que somente caberá o afastamento da respectiva incidência tributária na hipótese em que implicaria, por meios oblíquos, na violação ao princípio federativo; assim, a não incidência é restrita aos valores relativos aos créditos presumidos de ICMS decorrentes de benefícios fiscais. Nesse sentido, a jurisprudência do C. STJ: “PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. CRÉDITO PRESUMIDO DE ICMS. EXCLUSÃO DA BASEDE CÁLCULO DO IRPJ, DA CSLL, DO PIS E DA COFINS. DESPROVIMENTO DO AGRAVO INTERNO MANUTENÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA. ENTENDIMENTO FIXADO PELA PRIMEIRA SEÇÃO DO STJ NO ÂMBITO DOS ERESP N 1.517.492/PR, DJE 1º/2/2018. I - Na origem, trata-se de mandado de segurança em que a parte autora pretende provimento jurisdicional para afastar a inclusão dos créditos presumidos de ICMS da base de cálculo do IRPJ, da CSLL do PIS e da COFINS. Na sentença a segurança foi concedida. No Tribunal a quo, a sentença foi mantida. II - A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que o crédito presumido de ICMS não integra a base de cálculo do IRPJ e da CSLL, bem como do PIS e da Cofins, observado que tal crédito não caracteriza, a rigor, acréscimo de faturamento capaz de repercutir na base de cálculo da contribuição. Verifica-se ainda que a inclusão do referido crédito, na base de cálculo dos referidos tributos, acaba por violar o pacto federativo, pois a medida impõe uma limitação na eficácia de benefícios fiscais concedidos pelos estados. Nesse mesmo sentido, destacam-se: (AgInt no AgInt no REsp n. 1.673.954/SC, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 22/6/2020, DJe 24/6/2020, AgInt no AgInt no REsp n. 1.657.064/PE, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 29/4/2020, DJe 4/5/2020 e AgInt no REsp n. 1.813.047/RS, relatora Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, julgado em 10/3/2020, DJe 17/3/2020.) III - No mérito, compulsando detidamente os autos, verifica-se que a decisão proferida pelo Tribunal de origem, de que o crédito presumido de ICMS não integra a base de cálculo do IRPJ e CSLL, tendo em vista que não caracteriza acréscimo de faturamento que repercuta na base de cálculo da contribuição, vai ao encontro da jurisprudência do STJ. Nesse sentido: AgInt no REsp 1.813.018/RS, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 27/9/2021, DJe 1º/10/2021; e AgInt no AREsp 1.898.563/RS, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 13/12/2021, DJe 17/12/2021. IV - Registra-se que a novel legislação (Lei Complementar n. 160/2017), que acrescentou os §§ 4º e 5º ao art. 30 da Lei n. 12.973/2014, estabeleceu condições para excluir os benefícios fiscais de ICMS considerados subvenção para investimento da base de cálculo da tributação incidente sobre o lucro real. V - Deve ser afastada a tese da Fazenda Nacional sobre a aludida incidência. VI - Agravo interno improvido.” (AgInt no AREsp n. 1.958.353/SC, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 13/6/2022, DJe de 15/6/2022.) Assim, em análise sumária, própria às tutelas de natureza precária, reconheço a inexistência de relação jurídico-tributária que obrigue a parte impetrante ao recolhimento das contribuições ao PIS e à COFINS apenas no que tange à subvenção de investimento consubstanciada em crédito presumido de ICMS. Ante o exposto, dou provimento ao agravo de instrumento, para determinar a exclusão da base de cálculo e, consequentemente, a suspensão da exigibilidade do PIS e da COFINS incidente sobre os valores referentes à subvenção de investimento consubstanciada em crédito presumido de ICMS e julgo prejudicado o agravo interno. É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. LIMINAR EM MANDADO DE SEGURANÇA. PIS. COFINS. BASE DE CÁLCULO. EXCLUSÃO DE BENEFÍCIOS FISCAIS DE ICMS. CRÉDITO PRESUMIDO. TEMA 843/STF. SUSPENSÃO NACIONAL. POSSIBILIDADE DE ANÁLISE DE TUTELA PROVISÓRIADE URGÊNCIA. PRINCÍPIO FEDERATIVO. NÃO INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA.AGRAVO DE INSTRUMENTOPROVIDO. AGRAVO INTERNO PREJUDICADO.
1. Discute-se a inclusão, na base de cálculo do Programa de Integração Social – PIS e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – COFINS, dos valores relativos a créditos presumidos de Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS, decorrentes de incentivos e benefícios fiscais ou financeiro-fiscais concedidos pelos respectivos entes tributantes.
2. É certo que e. STF reconheceu repercussão geral ao Tema n.º 843 (“possibilidade de exclusão da base de cálculo do PIS e da COFINS dos valores correspondentes a créditos presumidos de ICMS decorrentes de incentivos fiscais concedidos pelos Estados e pelo Distrito Federal” – RE n.º 835.818), determinando a suspensão nacional dos feitos em tramitação sobre a matéria, com base no art. 1.037, II, do CPC. Apesar da previsão contida no dispositivo, também é certo que não há impedimento para a análise de tutelas provisórias de urgência, como sói ocorrer in casu. Precedentes.
3. O poder constituinte originário conferiu ao Estado o poder de tributar os contribuintes, para obter recursos para financiar suas atividades. A fim de que o exercício desse poder estatal seja legítimo, contudo, deve-se observar não só os limites da competência atribuída pela Constituição Federal a cada ente da federação, como também as imunidades e as garantias individuais do contribuinte previstas principalmente no artigo 150 da Constituição Federal. As competências tributárias deverão ser exercidas em fiel observância às normas constitucionais, que preveem, especificamente, limitações ao poder de tributar, com a consagração de princípios, imunidades, restrições e possibilidades de concessão de isenções, incentivos e benefícios fiscais (confira-se: STF, Pleno, ADI 2357/DF, rel. Min. Alexandre de Moraes, j. 30.08.2019). Ressalta-se que distribuições de competências tributárias visa atender o princípio federativo, de sorte a garantir, na forma do artigo 18 da CF, a autonomia da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
4. Nos termos do artigo 155, II, da Carta, compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior.
5. A Carta impõe a observância da não-cumulatividade na tributação pelo ICMS (artigo 155, § 2º, I), visando impedir a múltipla incidência tributária (tributação em cascata) nas diversas fases da produção e circulação dos bens, de forma a desonerar sua cadeia econômica. Também se previu na Constituição a possibilidade de observância do princípio da seletividade, em função da essencialidade das mercadorias e dos serviços (inciso III), sem que isso implique em ofensa à isonomia. Conforme disposto no artigo 155, § 2º, I, da CF, a não-cumulatividade do ICMS se dá por meio de compensação do que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal. Ressalta-se que, salvo legislação em contrário, a isenção ou a não incidência não implicará crédito para compensação com o montante devido nas operações ou prestações seguintes (inciso II, a), bem como, acarretará a anulação do crédito relativo às operações anteriores (alínea b).
6. A operacionalização da sistemática da não-cumulatividade somente se dá com créditos efetivamente existentes ou mediante presunção legal de sua existência (créditos presumidos). No que tange à outorga de créditos presumidos em decorrência de incentivos e benefícios fiscais ou financeiro-fiscais, cumpre ressaltar que, segundo disposto no seu artigo 155, XII, g, a Constituição determinou caber à lei complementar regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados. Quanto ao ponto, o artigo 150, § 6º, da Carta, com redação dada pela Emenda Constitucional n.º 03/1993, estabelece que “qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no referido artigo 155, § 2.º, XII, g”.
7. Nesse contexto, foi editada a Lei Complementar n.º 160/2017, que dispôs sobre “convênio que permite aos Estados e ao Distrito Federal deliberar sobre a remissão dos créditos tributários, constituídos ou não, decorrentes das isenções, dos incentivos e dos benefícios fiscais ou financeiro-fiscais instituídos em desacordo com o disposto na referida alínea g, do inciso XII, do § 2º, do artigo 155, da Constituição Federal e a reinstituição das respectivas isenções, incentivos e benefícios fiscais ou financeiro-fiscais”. Dentre suas disposições, a LC n.º 160/2017 promoveu alteração na Lei n.º 12.973/2014, para o fim de incluindo o §4º no seu artigo 30, determinar que, para fins de tributação do IRPJ e CSLL, os incentivos e os benefícios fiscais ou financeiro-fiscais relativos ao ICMS são considerados subvenções para investimento, vedada a exigência de outros requisitos ou condições não previstos no mesmo artigo. Por seu turno, o referido artigo 30 da Lei n.º 12.973/2014 estabelece que não serão computadas na determinação do lucro real as subvenções para investimento concedidas como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos e as doações feitas pelo poder público, desde que seja registrada em reserva de lucros. Ainda, em seu § 2º, dispõe que haverá tributação caso lhes seja dada destinação diversa.
8. No âmbito da tributação do IRPJ e da CSLL, resultou relevante distinguir se a concessão pelos Estados e Distrito Federal de créditos presumidos de ICMS, em decorrência de incentivos e benefícios fiscais ou financeiro-fiscais, implicaria acréscimo patrimonial tributável, haja vista que, se caracterizada, em tese, a hipótese de incidência tributária para fins de apuração do lucro real sujeito à tributação do IRPJ e da CSLL, o contribuinte se sujeitariaà observância do quanto disposto no artigo 30, § 2º, da Lei n.º 12.973/2014.
9.A fim de uniformizar o entendimento de suas Turmas, a 1ª Seção do c. Superior Tribunal de Justiça estabeleceu, no julgamento dos Embargos de Divergência em Recurso Especial n.º 1.547.492, que não são caracterizados como renda ou lucro os créditos presumidos outorgados no contexto de incentivo fiscal, inclusive sob pena de violação ao princípio federativo.
10.Ainda que não objeto de julgamento sob a sistemática dos temas representativos de controvérsia de natureza repetitiva, verifica-se que tal entendimento foi ratificado no julgamento, em 26.04.2023, do Tema Repetitivo n.º 1.182 (REsp n.ºs 1.945.110/RS e 1.987.158/SC), cuja delimitação se cingiu, justamente, à possibilidade de extensão do entendimento firmado no EREsp 1.517.492/PR aos demais benefícios fiscais relacionados ao ICMS, tais como redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, imunidade, diferimento, entre outros.Restou firmada a seguinte tese: “1. Impossível excluir os benefícios fiscais relacionados ao ICMS, - tais como redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, diferimento, entre outros - da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, salvo quando atendidos os requisitos previstos em lei (art. 10, da Lei Complementar n. 160/2017 e art. 30, da Lei n. 12.973/2014), não se lhes aplicando o entendimento firmado no ERESP 1.517.492/PR que excluiu o crédito presumido de ICMS das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL. 2. Para a exclusão dos benefícios fiscais relacionados ao ICMS, - tais como redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, diferimento, entre outros - da base de cálculo do IRPJ e da CSLL não deve ser exigida a demonstração de concessão como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos. 3. Considerando que a Lei Complementar 160/2017 incluiu os §§ 4º e 5º ao art. 30 da Lei 12.973/2014 sem, entretanto, revogar o disposto no seu § 2º, a dispensa de comprovação prévia, pela empresa, de que a subvenção fiscal foi concedida como medida de estímulo à implantação ou expansão do empreendimento econômico não obsta a Receita Federal de proceder ao lançamento do IRPJ e da CSSL se, em procedimento fiscalizatório, for verificado que os valores oriundos do benefício fiscal foram utilizados para finalidade estranha à garantia da viabilidade do empreendimento econômico.”. Segundo voto condutor da tese firmada no Tema n.º 1.182, do relator Ministro Og Fernandes, diferenciou-se os créditos presumidos decorrentes de benefícios fiscais das suas demais espécies.
11.Em que pese o contorno constitucional dado pelo c. STJ à questão, registra-se que o e. Supremo Tribunal Federal, em 18.08.2017, no julgamento do Tema n.º 957 estabeleceu, majoritariamente, que “a controvérsia relativa à inclusão de créditos presumidos de ICMS na base de cálculo do IRPJ e da CSLL não possui repercussão geral, tendo em vista sua natureza infraconstitucional”, em que pese apontado no posicionamento minoritário que, em 27.08.2015, a Corte entendeu pela existência de repercussão geral ao Tema n.º 843 (“possibilidade de exclusão da base de cálculo do PIS e da COFINS dos valores correspondentes a créditos presumidos de ICMS decorrentes de incentivos fiscais concedidos pelos Estados e pelo Distrito Federal” – RE n.º 835.818), cujaratio essendiseria assemelhada. Ressalta-se que há, inclusive, determinação de suspensão nacional quanto ao referido Tema n.º 843.
12.Por outro lado, ainda que o deslinde a ser conferido pelo e. STF ao Tema de Repercussão Geral n.º 843 possaafetar a interpretação dos contornos constitucionais que o c. STJ deu à questão relativa à incidência do IRPJ e da CSLL sobre créditos presumidos decorrentes de incentivos fiscais – aliás, como expressamente aventado na própria decisão de suspensão nacional do Tema n.º 843 –, fato é que, no cenário jurídico atual relativo à tributação do IRPJ e da CSLL, a Corte Suprema conferiu à Corte Superior a última palavra quanto a esta matéria, dada sua competência constitucional para uniformização da interpretação da legislação infraconstitucional.
13. Na ideia dos precedentes que se construíram em torno do IRPJ e daCSSL, tem-se que apenas os valores relativos aos créditos presumidos de ICMS decorrentes de benefícios fiscais afastariam a incidência tributária, posto que implicariam violação ao pacto federativo; ao passo que os demais valores decorrentes de benefícios fiscais na tributação pelo ICMS, dado o efeito de recuperação próprio ao diferimento da respectiva incidência tributária, sofreriam a regular incidência dos tributos de competência da União.
14. E, quanto ao ponto, as disposições previstas na Lei n.º 14.789/2023, com produção de efeitos a partir de 01.01.2024, inclusive quanto à revogação do citado artigo 30 da Lei n.º 12.973/2014, nada alteram o entendimento relativo à violação ao pacto federativo.
15. Nesta senda, as razões de decidir para fins da incidência do IRPJ e da CSSL se aplicam, igualmente, às contribuições ao PIS e COFINS, posto que somente caberá o afastamento da respectiva incidência tributária na hipótese em que implicaria, por meios oblíquos, na violação ao princípio federativo; assim, a não incidência é restrita aos valores relativos aos créditos presumidos de ICMS decorrentes de benefícios fiscais.
16. Reconhecida a inexistência de relação jurídico-tributária que obrigue a parte impetrante ao recolhimento das contribuições ao PIS e à COFINS apenas no que tange à subvenção de investimento consubstanciada em crédito presumido de ICMS.
17. Agravo de instrumento provido. Agravo interno prejudicado.