Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5016425-93.2021.4.03.6100

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

APELADO: F. M. F. A.
REPRESENTANTE: MIALUNDAMA GONCALVES FRANCISCO

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5016425-93.2021.4.03.6100

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

 

APELADO: F. M. F. A.
REPRESENTANTE: MIALUNDAMA GONCALVES FRANCISCO

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):

 

Trata-se de apelação interposta pela UNIÃO FEDERAL, em procedimento comum ajuizado por FRANCISCO MVUILU FRANCISCO AMARAL, cidadão angolano, incapaz, representado por sua genitora Mialundama Gonçalves Francisco, objetivando a concessão de naturalização provisória.

 

A r. sentença de fls. 103/111, integrada às fls. 128/130, julgou procedente o pedido inicial, para reconhecer o direito do autor ao deferimento do pedido de naturalização, desde que o único motivo para o indeferimento tenha sido o fato de não ter cumprido o requisito de residência fixa antes dos dez anos de idade, ficando sujeita à confirmação posterior quando da aquisição da maioridade. Condenou a União Federal no pagamento de honorários advocatícios, em favor da DPU, no valor de R$1.500,00 (mil e quinhentos reais) e concedeu a tutela antecipada, para imediata concessão da naturalização provisória.

 

Razões recursais da União Federal (fls. 113/117), oportunidade em que pugna pela reforma da sentença, tendo em vista a inocorrência de qualquer ilegalidade por parte da Administração em negar o pedido de naturalização provisória, uma vez que a data de entrada do autor em solo nacional, aposta no passaporte (20/09/2015), não se confunde com o fato de somente ter se regularizado como residente permanente em data posterior (16/08/2019), quando já ultrapassados os dez anos de idade, prazo máximo previsto na legislação para comprovação da residência por tempo indeterminado. Subsidiariamente, defende a impossibilidade de arbitramento de honorários advocatícios em favor da Defensoria Pública da União, em razão de sua atuação contra pessoa jurídica de direito público da qual é integrante, na forma do disposto na Súmula nº 421/STJ.

 

Contrarrazões do autor à fl. 121.

 

Devidamente processado o recurso, subiram os autos a esta Corte.

 

Parecer do Ministério Público Federal (fls. 143/147), no sentido do desprovimento do recurso.

 

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5016425-93.2021.4.03.6100

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

 

APELADO: F. M. F. A.
REPRESENTANTE: MIALUNDAMA GONCALVES FRANCISCO

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):

 

A naturalização é uma forma de aquisição secundária da nacionalidade, que se dá quando um país concede o status de nacional a um estrangeiro, na forma preconizada pelo art. 12 da Constituição Federal:

 

“Art. 12. São brasileiros:

(...)

II – naturalizados:

a) os que, na forma da lei, adquiram a nacionalidade brasileira, exigidas aos originários de países de língua portuguesa apenas residência por um ano ininterrupto e idoneidade moral;

b) os estrangeiros de qualquer nacionalidade, residentes na República Federativa do Brasil há mais de quinze anos ininterruptos e sem condenação penal, desde que requeiram a nacionalidade brasileira”.

 

A seu turno, a Lei nº 13.445/2017 (Lei de Migração) dispõe acerca dos tipos de naturalização (ordinária, extraordinária, especial ou provisória), bem assim as condições para a naturalização provisória, da seguinte forma:

 

“Art. 70: A naturalização provisória poderá ser concedida ao migrante criança ou adolescente que tenha fixado residência em território nacional antes de completar 10 (dez) anos de idade e deverá ser requerida por intermédio de seu representante legal.

Parágrafo único. A naturalização prevista no caput será convertida em definitiva se o naturalizando expressamente assim o requerer no prazo de 2 (dois) anos após atingir a maioridade”.

 

O pedido de naturalização deverá ser apresentado e processado perante o órgão competente do Poder Executivo, sendo, no caso, o Ministério da Justiça e Segurança Pública (art. 71), sendo a concessão da naturalização ato exclusivo do Ministro de Estado.

 

De outra parte, o Decreto nº 9.199/17, que regulamenta a Lei de Migração, atribui ao Ministro de Estado da Justiça e Segurança Pública competência para dispor sobre os documentos e diligências necessários à comprovação dos requisitos para a solicitação de cada tipo de naturalização, ao passo que o art. 221, reportando-se ao prazo de residência estabelecido na legislação ordinária, diz que, para fins de sua contagem, “a residência será considerada fixa, para fins da naturalização provisória prevista no art. 244, a partir do momento em que o imigrante passar a residir no País por prazo indeterminado”.

 

E, ainda:

 

“Art. 244. A naturalização provisória poderá ser concedida ao migrante criança ou adolescente que tenha fixado residência no território nacional antes de completar dez anos de idade e deverá ser requerida por intermédio de seu representante legal.

 

Art. 245. O pedido de naturalização provisória se efetivará por meio da apresentação:

I - da Carteira de Registro Nacional Migratório do naturalizando; e

II - de documento de identificação civil do representante ou do assistente legal da criança ou do adolescente.

 

Art. 246. A naturalização provisória será convertida em definitiva se o naturalizando expressamente assim o requerer ao Ministério da Justiça e Segurança Pública no prazo de dois anos após atingir a maioridade civil.

§ 1º Na avaliação do pedido de conversão de que trata o caput, será exigida a apresentação de certidões de antecedentes criminais expedidas pelos Estados onde o naturalizando tenha residido após completar a maioridade civil e, se for o caso, de certidão de reabilitação.

§ 2º O Ministério da Justiça e Segurança Pública consultará bancos de dados oficiais para comprovar a residência do naturalizando no País”.

 

Da análise da legislação citada, depreende-se que o “tempo de residência” é contado a partir da permanência “por prazo indeterminado”, condição essa expressamente constante da “Carteira de Registro Nacional Migratório”, expedida pela Polícia Federal, admitindo-se, a tanto, outros meios legítimos de prova.

 

No caso em exame, a Carteira de Registro Nacional Migratório (CRNM) expedida em nome do autor em 1º de setembro de 2019, com validade até 16 de agosto de 2028, classifica sua condição como “residente” com prazo “indeterminado” (fls. 21/22).

 

Considerando o nascimento do requerente em 23 de fevereiro de 2009, e a regularização migratória concedida em 16 de agosto de 2019, teria sido, em tese, ultrapassado o prazo dos dez anos de idade para fixação da residência por prazo indeterminado, a contento do disposto no art. 70 da Lei de Migração, a ensejar o indeferimento do pedido de naturalização provisória por parte do órgão competente.

 

Todavia, consigno, como adrede referenciado, que a demonstração da residência do imigrante em território nacional, com ânimos de definitividade, pode se dar por outros meios de prova, e não somente pela emissão do registro nacional migratório.

 

Nessa ordem de ideias, verifico que, tão logo desembarcados em solo brasileiro em data de 20 de setembro de 2015 (anotação no passaporte de fls. 23/29), o autor, seus genitores e um irmão protocolaram, incontinenti, pedido de refúgio, a denotar, inequivocamente, a intenção de fixar residência no país.

 

O documento de fl. 33, emitido pelo Núcleo de Registro de Estrangeiros da Polícia Federal em 13 de março de 2018 (quando o autor contava, portanto, com menos de 10 anos de idade), traduz-se em “Documento Provisório de Identidade de Estrangeiro”, com pedido de “Prorrogação de Refúgio por Extensão” e, em seu bojo, consta, expressamente, a anotação no sentido de que “Este protocolo é documento de identidade válido em todo o território nacional e é prova da condição migratória regular do seu titular”.

 

Disso decorre a conclusão de que, desde 2018, o Estado brasileiro considerava a regularidade da condição migratória do autor no país, tanto que lhe outorgara documento provisório de identidade, porquanto não concluído o processo administrativo de refúgio, cujo desfecho, seja ele qual for, não desnatura os efeitos produzidos até então, dentre eles, ao menos para o que aqui interessa, o de ensejar a permanência do autor por tempo indeterminado em território nacional, aqui fixando residência, como explicitamente demonstrado, inclusive, pela solicitação do reconhecimento da condição de refugiado.

 

Dito isso, e atento às datas tanto da emissão do Documento Provisório de Identidade Estrangeira (13 de março de 2018), como do nascimento do autor (23 de fevereiro de 2009), reputo demonstrada, satisfatoriamente, a fixação de residência no Brasil, por tempo indeterminado, antes de completados 10 anos de idade, a contento da exigência trazida pelo art. 70 da Lei nº 13.445/17.

 

Oportuno transcrever excerto da manifestação ministerial:

 

“Em 13.03.2018 obteve a prorrogação de refúgio por extensão à prorrogação de refúgio de sua mãe, reforçando o desejo de não mais retornar à nação de origem e fixar residência em território brasileiro. (ID 257616642 - Pág. 15/16).

Como se observa, antes de completar 10 anos de idade o autor tem expressado de forma reiterada a vontade de fixar residência no Brasil. Embora tenha ingressado em território nacional com visto de turista, logo em seguida praticou atos tendentes a demonstrar que não estava nesse país como mero visitante, mas sim para fazer dele sua morada”.

 

Trago, ainda, precedente desta 3ª Turma, com destaques meus:

 

“PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. NATURALIZAÇÃO PROVISÓRIA. ESTABELECIMENTO DE RESIDÊNCIA EM TERRITÓRIO NACIONAL. LIMITE TEMPORAL. ANIVERSÁRIO DE 10 ANOS DE IDADE. ADMISSIBILIDADE DE DIVERSOS MEIOS DE COMPROVAÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO DESPROVIDA. REMESSA OFICIAL PROVIDA EM PARTE.

1. Conforme dispõe o art. 64 da Lei 13.445/17 (Lei de Migração), a naturalização reconhecida em favor de estrangeiro poderá ser ordinária, extraordinária, especial ou provisória. Especificamente quanto à última espécie, acrescenta-se: Art. 70. A naturalização provisória poderá ser concedida ao migrante criança ou adolescente que tenha fixado residência em território nacional antes de completar 10 (dez) anos de idade e deverá ser requerida por intermédio de seu representante legal.

2. Informa o requerente que nasceu em Luanda (Angola), em 09.07.2008, sendo filho de pais angolanos e que no início de 2016 estabeleceu residência fixa no Brasil, quando possuía 7 anos de idade. Ocorre que o Ministério da Justiça, em 28.11.2019, no bojo do processo administrativo nº 08505.023051/2019-59 (SEI nº 102964328) indeferiu a concessão de naturalização provisória ao adolescente, por entender que somente em 09.04.2019 teria este obtido autorização para residir em território nacional.

3. O Decreto 9.199/17, em regulamentação à Lei 13.445/17, dispõe que: Art. 221. Para fins de contagem dos prazos de residência mencionados nas exigências para obtenção da naturalização ordinária e extraordinária, serão considerados os períodos em que o imigrante tenha passado a residir no País por prazo indeterminado.

4. Ainda, quanto ao modo de aferição do requisito relacionado ao estabelecimento de residência em território brasileiro, dispõe a Portaria Interministerial nº 11/2018 que poderá ser admitida diversificada prova documental. Conclui-se que a exigência legal para a obtenção da naturalização provisória é a fixação de residência no País antes da criança completar 10 anos, fato que independe de apresentação de pedido formal a autoridades brasileiras, podendo ser comprovado por documentação variada.

5. Os documentos acostados aos autos (ID 193096570) comprovam cabalmente o necessário. Verifica-se, inclusive, declaração de frequência escolar da parte autora em escola da rede pública, desde de 2017 (ID 193096570 - fl. 18). É caso irrefutável de concessão de naturalização provisória.

(...)

7. Apelação desprovida. Remessa oficial provida em parte”.

(AC nº 5010004-24.2020.4.03.6100, Rel. Des. Federal Antonio Cedenho, p. 10/02/2022).

 

Superada tal questão, avanço à insurgência remanescente, qual seja, a possibilidade de condenação da União Federal em honorários advocatícios, tendo em vista que a parte autora está representada pela Defensoria Pública da União.

 

Quanto à distribuição dos ônus sucumbenciais nessa hipótese, o Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp nº 1.199.715/RJ, sob a sistemática de recursos repetitivos (Tema n° 433), fixou entendimento no sentido de que não são devidos honorários advocatícios à Defensoria Pública quando ela atua contra pessoa jurídica de direito público integrante da mesma Fazenda Pública.

 

Tal entendimento resultou na Súmula nº 421, do E. STJ, que assim dispõe: “Os honorários advocatícios não são devidos à Defensoria Pública quando ela atua contra a pessoa jurídica de direito público à qual pertença".

 

Contudo, a matéria foi enfrentada recentemente pelo C. STF, por ocasião do julgamento do RE n° 1.140.005, com repercussão geral (Tema n° 1.002), ocorrido em 26/06/2023, tendo sido firmada a seguinte tese: "1. É devido o pagamento de honorários sucumbenciais à Defensoria Pública, quando representa parte vencedora em demanda ajuizada contra qualquer ente público, inclusive aquele que integra; 2. O valor recebido a título de honorários sucumbenciais deve ser destinado, exclusivamente, ao aparelhamento das Defensorias Públicas, vedado o seu rateio entre os membros da instituição". Segue a ementa do acórdão:

 

"Direito constitucional. Recurso extraordinário. Pagamento de honorários à Defensoria Pública que litiga contra o ente público que integra. Evolução constitucional da instituição. Autonomia administrativa, funcional e financeira. 1. Recurso extraordinário, com repercussão geral, que discute se os entes federativos devem pagar honorários advocatícios sucumbenciais às Defensorias Públicas que os integram.

2. As Emendas Constitucionais nºs 45/2004, 74/2013 e 80/2014 asseguraram às Defensorias Públicas dos Estados e da União autonomia administrativa, funcional e financeira. Precedentes.

3. A partir dessa evolução constitucional, a Defensoria Pública tornou-se órgão constitucional autônomo, sem subordinação ao Poder Executivo. Não há como se compreender que a Defensoria Pública é órgão integrante e vinculando à estrutura administrativa do Estado-membro, o que impediria o recebimento de honorários de sucumbência. Superação da tese da confusão. Necessidade de se compreender as instituições do Direito Civil à luz da Constituição.

4. A missão constitucional atribuída às Defensorias Públicas de garantir o acesso à justiça dos grupos mais vulneráveis da população demanda a devida alocação de recursos financeiros para aparelhamento da instituição. No entanto, após o prazo de oito anos concedido pelo art. 98 do ADCT, os dados sobre a situação da instituição revelam que os recursos destinados pelos cofres públicos não são suficientes para a superação dos problemas de estruturação do órgão e de déficit de defensores públicos.

5. As verbas sucumbenciais decorrentes da atuação judicial da Defensoria Pública devem ser destinadas exclusivamente para a estruturação de suas unidades, contribuindo para o incremento da qualidade do atendimento à população carente, garantindo, desta maneira, a efetividade do acesso à justiça. 6. Recurso extraordinário provido, com a fixação das seguinte teses de julgamento: “1. É devido o pagamento de honorários sucumbenciais à Defensoria Pública, quando representa parte vencedora em demanda ajuizada contra qualquer ente público, inclusive aquele que integra; 2. O valor recebido a título de honorários sucumbenciais deve ser destinado, exclusivamente, ao aparelhamento das Defensorias Públicas, vedado o seu rateio entre os membros da instituição”."

(STF, Pleno, RE nº 1.140.005, Relator Ministro Roberto Barroso, j.26.06.2023).

 

Assim, diante do julgamento do Tema n° 1.002 pelo C. STF, mostra-se possível o pagamento de honorários sucumbenciais à Defensoria Pública da União.

 

Ante o exposto, nego provimento à apelação interposta pela União Federal, a fim de manter hígida a r. sentença de primeiro grau de jurisdição. Majoro os honorários advocatícios em 1% (um por cento), na forma do disposto no art. 85, §11º, do CPC.

 

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. ESTRANGEIRO. PEDIDO DE NATURALIZAÇÃO PROVISÓRIA. RESIDÊNCIA POR TEMPO INDETERMINADO ANTES DOS DEZ ANOS DE IDADE. COMPROVAÇÃO. PEDIDO DE REFÚGIO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EM FAVOR DA DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO. LITÍGIO CONTRA ENTE PÚBLICO. CONDENAÇÃO. POSSIBILIDADE. DESTINAÇÃO EXCLUSIVA AO APARELHAMENTO DA DEFENSORIA PÚBLICA. VEDADO O RATEIO ENTRE SEUS MEMBROS. TEMA STF 1002. RECURSO DA UNIÃO DESPROVIDO.

1 – A naturalização é uma forma de aquisição secundária da nacionalidade, que se dá quando um país concede o status de nacional a um estrangeiro, na forma preconizada pelo art. 12 da Constituição Federal, e regulamentada pela Lei nº 13.445/2017 (art. 70) e Decreto nº 9.199/2017 (art. 244). No caso de criança ou adolescente, é necessário que tenha fixado residência em território nacional antes de completar 10 (dez) anos de idade e deverá ser requerida por intermédio de seu representante legal.

2 - O pedido de naturalização deverá ser apresentado e processado perante o órgão competente do Poder Executivo, sendo, no caso, o Ministério da Justiça e Segurança Pública (art. 71), sendo a concessão da naturalização ato exclusivo do Ministro de Estado.

3 - De outra parte, o Decreto nº 9.199/17, que regulamenta a Lei de Migração, atribui ao Ministro de Estado da Justiça e Segurança Pública competência para dispor sobre os documentos e diligências necessários à comprovação dos requisitos para a solicitação de cada tipo de naturalização, ao passo que o art. 221, reportando-se ao prazo de residência estabelecido na legislação ordinária, diz que, para fins de sua contagem, “a residência será considerada fixa, para fins da naturalização provisória prevista no art. 244, a partir do momento em que o imigrante passar a residir no País por prazo indeterminado”.

4 - Da análise da legislação citada, depreende-se que o “tempo de residência” é contado a partir da permanência “por prazo indeterminado”, condição essa expressamente constante da “Carteira de Registro Nacional Migratório”, expedida pela Polícia Federal, admitindo-se, a tanto, outros meios legítimos de prova.

5 - No caso em exame, a Carteira de Registro Nacional Migratório (CRNM) expedida em nome do autor em 1º de setembro de 2019, com validade até 16 de agosto de 2028, classifica sua condição como “residente” com prazo “indeterminado”.

6 - Considerando o nascimento do requerente em 23 de fevereiro de 2009, e a regularização migratória concedida em 16 de agosto de 2019, teria sido, em tese, ultrapassado o prazo dos dez anos de idade para fixação da residência por prazo indeterminado, a contento do disposto no art. 70 da Lei de Migração, a ensejar o indeferimento do pedido de naturalização provisória por parte do órgão competente. Todavia, consigne-se que a demonstração da residência do imigrante em território nacional, com ânimos de definitividade, pode se dar por outros meios de prova, e não somente pela emissão do registro nacional migratório.

7 - Nessa ordem de ideias, verifica-se que, tão logo desembarcados em solo brasileiro em data de 20 de setembro de 2015 (anotação no passaporte), o autor, seus genitores e um irmão protocolaram, incontinenti, pedido de refúgio, a denotar, inequivocamente, a intenção de fixar residência no país.

8 - O documento emitido pelo Núcleo de Registro de Estrangeiros da Polícia Federal em 13 de março de 2018 (quando o autor contava, portanto, com menos de 10 anos de idade), traduz-se em “Documento Provisório de Identidade de Estrangeiro”, com pedido de “Prorrogação de Refúgio por Extensão” e, em seu bojo, consta, expressamente, a anotação no sentido de que “Este protocolo é documento de identidade válido em todo o território nacional e é prova da condição migratória regular do seu titular”.

9 - Disso decorre a conclusão de que, desde 2018, o Estado brasileiro considerava a regularidade da condição migratória do autor no país, tanto que lhe outorgara documento provisório de identidade, porquanto não concluído o processo administrativo de refúgio, cujo desfecho, seja ele qual for, não desnatura os efeitos produzidos até então, dentre eles, ao menos para o que aqui interessa, o de ensejar a permanência do autor por tempo indeterminado em território nacional, aqui fixando residência, como explicitamente demonstrado, inclusive, pela solicitação do reconhecimento da condição de refugiado.

10 - Dito isso, e atento às datas tanto da emissão do Documento Provisório de Identidade Estrangeira (13 de março de 2018), como do nascimento do autor (23 de fevereiro de 2009), reputa-se demonstrada, satisfatoriamente, a fixação de residência no Brasil, por tempo indeterminado, antes de completados 10 anos de idade, a contento da exigência trazida pelo art. 70 da Lei nº 13.445/17. Precedente desta Turma.

11 - Quanto à distribuição dos ônus sucumbenciais, o Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp nº 1.199.715/RJ, sob a sistemática de recursos repetitivos (Tema n° 433), fixou entendimento no sentido de que não são devidos honorários advocatícios à Defensoria Pública quando ela atua contra pessoa jurídica de direito público integrante da mesma Fazenda Pública.

12 - Tal entendimento resultou na Súmula nº 421, do E. STJ, que assim dispõe: “Os honorários advocatícios não são devidos à Defensoria Pública quando ela atua contra a pessoa jurídica de direito público à qual pertença".

13 - Contudo, a matéria foi enfrentada recentemente pelo C. STF, por ocasião do julgamento do RE n° 1.140.005, com repercussão geral (Tema n° 1.002), ocorrido em 26/06/2023, tendo sido firmada a seguinte tese: "1. É devido o pagamento de honorários sucumbenciais à Defensoria Pública, quando representa parte vencedora em demanda ajuizada contra qualquer ente público, inclusive aquele que integra; 2. O valor recebido a título de honorários sucumbenciais deve ser destinado, exclusivamente, ao aparelhamento das Defensorias Públicas, vedado o seu rateio entre os membros da instituição".

14 - Assim, diante do julgamento do Tema n° 1.002 pelo C. STF, mostra-se possível o pagamento de honorários sucumbenciais à Defensoria Pública da União.

15 - Majoração da verba honorária em 1% (um por cento), na forma do disposto no art. 85, §11º, do CPC.

16 – Apelação interposta pela União Federal desprovida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação interposta pela União Federal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.