Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001343-76.2022.4.03.6103

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO

APELANTE: AUTOCOM COMPONENTES AUTOMOTIVOS DO BRASIL LTDA

Advogado do(a) APELANTE: LEONARDO BRIGANTI - SP165367-A

APELADO: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM SÃO JOSÉ DOS CAMPOS//SP, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001343-76.2022.4.03.6103

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO

APELANTE: AUTOCOM COMPONENTES AUTOMOTIVOS DO BRASIL LTDA

Advogado do(a) APELANTE: LEONARDO BRIGANTI - SP165367-A

APELADO: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM SÃO JOSÉ DOS CAMPOS//SP, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):

 

Trata-se de apelação interposta por AUTOCOM COMPONENTES AUTOMOTIVOS DO BRASIL LTDA., em mandado de segurança impetrado contra ato do DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM SÃO JOSÉ DOS CAMPOS-SP, objetivando reconhecer em definitivo o direito de a impetrante aplicar a alíquota de 2% (dois por cento), sobre os produtos exportados e que se enquadram no Anexo do Decreto nº 8.415/2015, em razão da violação aos princípios da anterioridade nonagesimal e anual e da legalidade e estrita legalidade.”

 

A r. sentença ID 261850589 denegou a segurança. Sem condenação em honorários advocatícios. Custas na forma da lei.

 

Em suas razões recursais (ID 261850593), a recorrente pugna pela reforma da sentença, ao fundamento de que as alterações promovidas pelo Decreto n.º 9.393/18, a partir de 30/05/2018, no âmbito do REINTEGRA, violaram os princípios da anterioridade nonagesimal e anual, além da legalidade.

 

Argumenta que, com a modificação das alíquotas, houve majoração indireta da carga tributária suportada, sendo que “jamais pode um decreto presidencial restringir direito do contribuinte assegurado em lei”.

 

Aduz, ainda, que “não restam dúvidas de que a Apelante possui o direito líquido e certo de manter a utilização do percentual de 2% (dois por cento) para os próximos pedidos de reconhecimento do crédito referente ao benefício do REINTEGRA”.

 

Devidamente processado o feito, com contrarrazões, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal. 

 

O Ministério Público Federal, não vislumbrando interesse público que justificasse sua intervenção, manifestou-se pelo prosseguimento do feito (ID 262127973).

 

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001343-76.2022.4.03.6103

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO

APELANTE: AUTOCOM COMPONENTES AUTOMOTIVOS DO BRASIL LTDA

Advogado do(a) APELANTE: LEONARDO BRIGANTI - SP165367-A

APELADO: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM SÃO JOSÉ DOS CAMPOS//SP, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

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V O T O

 

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):

 

 

Da pendência de julgamento do Tema de Repercussão Geral n.º 1.108/STF

 

 

Inicialmente, cabe registrar que não se verifica impedimento para julgamento recursal em razão da pendência de julgamento pelo e. STF do Tema de Repercussão Geral n.º 1.108 (“Aplicabilidade do princípio da anterioridade geral (anual ou de exercício) em face das reduções de benefícios fiscais previstos no Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para as Empresas Exportadoras (Reintegra)” - ARE nº 1.285.177), haja vista que, em que pese imperativo legal expresso no artigo 1.035, § 5º, do CPC, não houve determinação da Corte Suprema para suspensão da tramitação dos processos que versem sobre a questão (confira-se: STF, Pleno, RE/RG-QO 966177, relator Ministro Luiz Fux, j. 07.06.2017: “2. A suspensão de processamento prevista no §5º do art. 1.035 do CPC não é consequência automática e necessária do reconhecimento da repercussão geral realizada com fulcro no caput do mesmo dispositivo, sendo da discricionariedade do relator do recurso extraordinário paradigma determiná-la ou modulá-la.”).

 

 

Do mérito

 

 

A Lei nº 13.043/2014 reinstituiu o Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para as Empresas Exportadoras – REINTEGRA com o objetivo de devolver parcial ou integralmente o resíduo tributário remanescente na cadeia de produção de bens exportados.

 

A apuração dos créditos tributários foi prevista para a exportação de determinados bens por meio da aplicação de percentual estabelecido pelo Poder Executivo, limitado entre 0,1% (um décimo por cento) e 3% (três por cento) sobre a receita auferida com a operação internacional (art. 22, §1º).

 

Para a regulamentação do REINTEGRA, foi editado pela Presidência da República o Decreto nº 8.415/2015, que originalmente definiu referidos percentuais em (i) 1% entre 01/03/2015 e 31/12/2016; (ii) 2% entre 01/01/2017 e 31/12/2017; e (iii) 3% entre 01/01/2018 e 31/12/2018, nos termos de seu art. 2º, § 7º, I, II, III e IV. Tais incisos sofreram alterações sucessivas, fruto da edição dos Decretos nº 8.543/2015, nº 9.148/2017 e nº 9.393/2018.

 

Em síntese, com o advento do Decreto nº 8.543/2015, os percentuais passaram a ser de 1%, de 01.03.2015 a 30.11.2015; 0,1%, de 01.12.2015 a 31.12.2016; 2%, de 01.01.2017 a 31.12.2017; e 3%, entre 01.01.2018 a 31.12.2018. Já o Decreto nº 9.148/2017 modificou o percentual para 2% no período de 01.01.2017 a 31.12.2018. O Decreto nº 9.393/2018, por sua vez, manteve o percentual de 2% de 01.01.2017 a 31.05.2018, minorando-o para 0,1% a partir de 01.06.2018.

 

O poder constituinte originário conferiu ao Estado o poder de tributar os contribuintes, para obter recursos para financiar suas atividades. A fim de que o exercício desse poder estatal seja legítimo, contudo, deve-se observar não só os limites da competência atribuída pela Constituição Federal a cada ente da federação, como também as imunidades e as garantias individuais do contribuinte previstas principalmente no artigo 150 da Constituição Federal.

 

Na seara tributária, isso se reflete na vedação do Estado de promover modificações legislativas repentinas, com efeitos concretos imediatos, que elevem a carga tributária. Assegura, ainda, ao contribuinte, um tempo mínimo para conhecer a modificação na legislação tributária e planejar a atividade econômica para suportar seus efeitos.

 

É justamente para impedir tais “surpresas”, que o artigo 150, III, da Constituição Federal confere ao contribuinte a proteção dos princípios da anterioridade genérica e da anterioridade.

 

Em sua modalidade genérica, o princípio da anterioridade veda que a lei que institua ou majore tributo produza efeitos no mesmo exercício financeiro em que ela foi publicada, nos termos do artigo 150, III, alínea ‘b’ da Constituição Federal. Já de acordo com o princípio da anterioridade nonagesimal, a lei que institui ou majora tributos só produz efeitos após 90 (noventa) dias da data de sua publicação.

 

A matéria em questão, inicialmente, foi apenas tratada como limitação ao poder de tributar, consoante decorre explicitamente do texto constitucional. No entanto, passou-se também a questionar a aplicação principiológica para os benefícios fiscais concedidos.

 

O debate faz sentido na medida em que a retirada de benesses fiscais - tal como a criação ou aumento dos tributos –, da mesma forma, é passível de gerar surpresa aos contribuintes, caracterizando, na realidade, espécie de majoração indireta de tributos.

 

Não se questiona a possibilidade de eventual alteração legislativa ou mesmo da reedição de atos infralegais que tenham por consequência a supressão de benefícios, seja pela alteração do entendimento do Parlamento ou mesmo por diversa compreensão da Administração.

 

A bem da verdade, compreende-se com naturalidade que se sucedam modificações normativas, inclusive, em curto espaço tempo, o que decorre de novos cenários e demandas. Todavia, preza-se, apenas, pela aplicação dos mesmos princípios constitucionais para situação equivalente, isto é, de exasperação da carga tributária.

 

Assim, a legislação que estabelece restrição a benefício fiscal, que implique na sua redução ou revogação, está sujeita ao princípio da anterioridade, seja a anterioridade de exercício (artigo 150, III, b, da CF), seja a anterioridade nonagesimal (alínea c), de acordo com o respectivo tributo (§ 1º).

 

Nesse raciocínio, a redução da alíquota de incentivo do Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para as Empresas Exportadoras – REINTEGRA, por ser caracterizada como modalidade de majoração indireta da carga tributária, impõe a necessidade de observância da anterioridade geral e nonagesimal, entendimento atualmente respaldado tanto no Supremo Tribunal Federal como nesta E. Corte. Confira-se:

 

“DIREITO TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. INCENTIVO FISCAL. REVOGAÇÃO. MAJORAÇÃO INDIRETA. ANTERIORIDADE.

1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal concebe que não apenas a majoração direta de tributos atrai a eficácia da anterioridade nonagesimal, mas também a majoração indireta decorrente de revogação de benefícios fiscais. Precedentes. 2. Agravo interno a que se nega provimento, com aplicação da multa prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC/2015”

(RE 1053254 AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, 1ª Turma, DJe 13.11.2018).”

 

“REINTEGRA – DECRETO Nº 9.393/2018 – BENEFÍCIO – REDUÇÃO DO PERCENTUAL – ANTERIORIDADE – PRECEDENTES.

Alcançado aumento indireto de tributo mediante redução da alíquota de incentivo do Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para as Empresas Exportadoras – Reintegra, cumpre observar o princípio da anterioridade, geral e nonagesimal, versado nas alíneas “b” e “c” do inciso III do artigo 150 da Constituição Federal. Precedente: medida cautelar na ação direta de inconstitucionalidade nº 2.325/DF, Pleno, relator ministro Marco Aurélio, acórdão publicado no Diário da Justiça de 6 de outubro de 2006.”

(STF, 1ª Turma, Ag.Reg.RE 1,263,840/RS, Rel.: Min. Marco Aurélio, Data de Julg.: 05.08.2020)

 

TRIBUTÁRIO. CRÉDITOS DO REINTEGRA. REGULAMENTAÇÃO PELO DECRETO 8.415/2015. ALÍQUOTAS ALTERADAS POR DECRETOS POSTERIORES. DECRETO 9.393/2018. MAJORAÇÃO INDIRETA DE TRIBUTO MEDIANTE REDUÇÃO DE INCENTIVO FISCAL. NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA ANTERIORIDADE (ART. 150, III, “B” E “C”, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL).

1. A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.101.727/PR, sob a sistemática dos recursos repetitivos, firmou compreensão no sentido de que a dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas (Tema 17 dos recursos repetitivos). A orientação em apreço encontra idêntica previsão na Súmula 490 do STJ.

2. Dessa forma, a sentença ilíquida deve ser submetida à remessa necessária, nos termos do artigo 496, I, §§ 1º e 2º do CPC.

3. A presente ação foi ajuizada em 30/03/2021 com o objetivo de obter provimento jurisdicional que reconheça o direito à aplicação do princípio da anterioridade, anual ou nonagesimal, sobre a redução do benefício fiscal do REINTEGRA trazida Decreto 9.393/2018, bem como à repetição dos valores que deixaram de ser aproveitados.

4. A questão atinente à aplicabilidade do princípio da anterioridade geral (anual ou de exercício) em face das reduções de benefícios fiscais previstos no REINTEGRA foi afetada pelo STF à sistemática da repercussão geral, porém o mérito do representativo de controvérsia (ARE 1.285.177) ainda não foi analisado pelo Pretório Excelso, tampouco houve determinação de suspensão da tramitação dos processos pendentes. Não há, portanto, impedimento à análise da matéria por este órgão fracionário.

5. O REINTEGRA (Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para as Empresas Exportadoras), instituído pela Lei 12.546/2011 e reinstituído pelo art. 21 da Lei 13.043/2014, concerne a um incentivo fiscal que tem por objetivo reintegrar valores referentes a custos tributários federais residuais existentes nas cadeias de produção de bens exportados.

6. O art. 22, § 1º, da lei em vigor permite a apuração de créditos na exportação de determinados bens em percentuais que variam entre 0,1% (um décimo por cento) e 3% (três por cento), nos termos explicitados no art. 2º, § 7º, I, II, III e IV do Decreto 8.415/2015, que atualmente regulamenta o benefício em apreço. Na redação original do referido decreto, os percentuais restaram assim definidos: (i) um por cento entre 01/03/2015 e 31/12/2016; (ii) dois por cento entre 01/01/2017 e 31/12/2017; (iii) três por cento entre 01/01/2018 e 31/12/2018.

7. A norma infralegal referida no item anterior sofreu alterações pelos Decretos 8.543/2015, 9.148/2017 e 9.393/2018. Na vigência do Decreto 9.148/2017, foi prevista a alíquota de um décimo por cento entre 01/12/2015 e 31/12/2016, bem como de dois por cento entre 01/01/2017 e 31/12/2018.

8. O Decreto 9.393/2018, por sua vez, previu um percentual de um décimo por cento entre 01/12/2015 e 31/12/2016, assim também um importe de dois por cento no interregno compreendido entre 01/01/2017 e 31/05/2018. A mesma norma estabeleceu a incidência de uma alíquota de um décimo por cento a partir de 01/06/2018. (Transcrição do disposto no art. 2º, § 7º, I, II, III e IV do Decreto 8.415/2015, com indicação das alterações sofridas ao longo do tempo pelos decretos acima referidos).

9. Em atenção ao pedido apresentado na exordial, cumpre destacar que, na dicção do Decreto 9.148/2017, o percentual de dois por cento estava previsto para vigorar até 31/12/2018, entretanto o Decreto 9.393/2018 alterou esse percentual a partir de 01/06/2018, reduzindo-o para um décimo por cento (redação atual do inciso IV do § 7º do art. 2º do Decreto 8.415/2015).

10. O fato de o art. 22, § 1º, da Lei 13.043/2014 estabelecer que o percentual referido no caput poderá variar entre 0,1% (um décimo por cento) e 3% (três por cento) não induz à conclusão de que as variações permitidas pela lei possam ter efeitos imediatos, sobretudo ao se considerar que há princípios constitucionais que balizam o poder de tributar, os quais devem ser observados também quando o aumento da carga tributária aperfeiçoa-se de forma reflexa.

11. Em síntese, as modificações legislativas em debate consubstanciaram verdadeira majoração indireta de tributo, realizada mediante redução de alíquota de benefício fiscal, motivo por que devem obedecer aos princípios da anterioridade anual e nonagesimal, previstos no art. 150, III, “b” e “c”, da Constituição Federal.

12. Na hipótese vertente, e em sintonia com o pedido apresentado na exordial, cumpre reconhecer que o Decreto 9.393/2018 consubstanciou ofensa aos referidos princípios, pois entrou em vigor na data de sua publicação (30/05/2018). Por conseguinte, o pleito do contribuinte comporta acolhimento. Precedentes do TRF3.

13. O contribuinte poderá realizar a compensação administrativa após o trânsito em julgado da ação (art. 170-A do CTN), com atualização dos valores mediante aplicação da taxa Selic (art. 39, § 4º, da Lei 9.250/1995) e observância do disposto no art. 74 da Lei 9.430/1996 e demais dispositivos vigentes na data da propositura da ação. Deve ser observada a prescrição quinquenal. É ressalvado ao contribuinte o direito de proceder a essa compensação em conformidade com as normas posteriores, desde que atendidos os requisitos próprios (REsp 1.137.738/SP – Tema 265 dos recursos repetitivos).

14. A análise e exigência da documentação necessária, bem como os critérios para a efetivação da compensação cabem ao Fisco, nos termos da legislação de regência, observando-se a revogação do parágrafo único do art. 26 da Lei 11.457/2007, pelo art. 8º da Lei 13.670 de 30 de maio de 2018, que também incluiu o art. 26-A da Lei 11.457/2007, elucidando a aplicabilidade do disposto no art. 74 da Lei 9.430/1996.

15. Considerando que o d. Juízo deferiu também a restituição, cumpre afastar a possibilidade de sua efetivação na esfera administrativa, ante a compreensão sedimentada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 1.420.691, alçado à sistemática da repercussão geral, no bojo do qual restou firmado entendimento no sentido de que não se mostra admissível a restituição administrativa do indébito reconhecido na via judicial, sendo indispensável a observância do regime constitucional de precatórios, nos termos do art. 100 da Constituição Federal (Tese 1262).

16. Incabível a fixação de honorários recursais no caso concreto, tendo em vista que, ao apreciar o Tema 1059 dos recursos repetitivos, o Superior Tribunal de Justiça firmou orientação no sentido de que a majoração dos honorários de sucumbência prevista no art. 85, § 11, do CPC pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido pelo tribunal, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente, de forma que não se aplica o art. 85, § 11, do CPC em caso de provimento total ou parcial do recurso, ainda que mínima a alteração do resultado do julgamento ou limitada a consectários da condenação.

17. Apelação da União improvida. Remessa oficial parcialmente provida.

(TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000851-82.2021.4.03.6115, Rel. Desembargador Federal CONSUELO YATSUDA MOROMIZATO YOSHIDA, julgado em 22/04/2024, DJEN DATA: 25/04/2024)”

 

Assim, a parte autora faz jus à fruição dos percentuais previstos na legislação, observado o critério da anterioridade anual e nonagesimal.

 

Observado o prazo quinquenal de prescrição disposto no artigo 168, I, do CTN, contado da data do ajuizamento desta ação, reconheço o direito à compensação dos valores recolhidos indevidamente.

 

Quanto ao ponto, o reconhecimento do direito à compensação não é de cunho meramente declaratório, mas, sim, condenatório, uma vez que obriga a União a suportar a compensação daquilo cuja conclusão, em regra, implicaria execução nos próprios autos. 

 

Na forma dos artigos 39, § 4º, da Lei n.º 9.250/95 e 3º da Emenda Constitucional n.º 113/2021, bem como das teses fixadas nos Temas n.º 810/TSF e 905/STJ, os créditos serão atualizados pela taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia – Selic (composta de taxa de juros moratórios e correção monetária), calculada a partir do recolhimento indevido (Súmula STJ n.º 162) até o mês anterior ao da repetição, vedada sua cumulação com quaisquer outros índices. 

 

Após o trânsito em julgado (artigo 170-A do CTN), poderá ser requerida a compensação do indébito administrativamente junto à Secretaria da Receita Federal do Brasil, observando-se o disposto nos artigo 74 da Lei n.° 9.430/96 e artigo 26-A da Lei n.º 11.457/2007, vigentes na data da propositura da ação, ressalvando-se o direito de proceder à compensação em conformidade com normas posteriores, desde que atendidos os requisitos próprios, nos termos da tese firmada pelo c. STJ no julgamento do Tema Repetitivo n.º 265 (REsp n.º 1.137.738/SP).

 

Ressalta-se que compete à Secretaria da Receita Federal do Brasil disciplinar os procedimentos necessários para o requerimento administrativo da compensação (artigo 74, § 14, da Lei n.° 9.430/96 e artigo 26-A, § 2º, da Lei n.º 11.457/2007).

 

No que tange à restituição, em espécie, do indébito, tem-se que, na via administrativa, encontra-se expressamente assegurada e regulamentada nos artigos 165 do CTN, 66, § 2º, da Lei n.º 8.383/91 e 73 da Lei 9.430/96:

 

CTN: “Art. 165. O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento, ressalvado o disposto no § 4º do artigo 162, nos seguintes casos:  

I - cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maior que o devido em face da legislação tributária aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido; [...]” (g.n..)  

 

Lei n.º 8.383/91: “Art. 66. Nos casos de pagamento indevido ou a maior de tributos, contribuições federais, inclusive previdenciárias, e receitas patrimoniais, mesmo quando resultante de reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória, o contribuinte poderá efetuar a compensação desse valor no recolhimento de importância correspondente a período subseqüente. [...]

§ 2º É facultado ao contribuinte optar pelo pedido de restituição. [...]” (g.n.)

 

Lei n.º 9.430/96: “Art. 73. A restituição e o ressarcimento de tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil ou a restituição de pagamentos efetuados mediante DARF e GPS cuja receita não seja administrada pela Secretaria da Receita Federal do Brasil será efetuada depois de verificada a ausência de débitos em nome do sujeito passivo credor perante a Fazenda Nacional.” 

 

Contudo, na hipótese da restituição decorrente de decisão judicial, estabeleceu-se dissenso jurisprudencial quanto à possibilidade de sua realização na via administrativa, ainda que não houvesse óbice da Administração Tributária.

 

A questão resulta do quanto disposto no artigo 100 da Constituição, que estabelece que os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim.

 

O e. Supremo Tribunal Federal, em 08.08.2015, no julgamento do Tema de Repercussão Geral n.º 831, delimitado como “obrigatoriedade de pagamento, mediante o regime de precatórios, dos valores devidos pela Fazenda Pública entre a data da impetração do mandado de segurança e a efetiva implementação da ordem concessiva”, reafirmou sua jurisprudência e firmou tese no sentido de que “o pagamento dos valores devidos pela Fazenda Pública entre a data da impetração do mandado de segurança e a efetiva implementação da ordem concessiva deve observar o regime de precatórios previsto no artigo 100 da Constituição Federal”.

 

Posteriormente, em 13.09.2019, a Corte Suprema julgou procedente a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n.º 250/DF para estabelecer a necessidade de uso de precatórios no pagamento de dívidas da Fazenda Pública, independente de o débito ser proveniente de decisão concessiva de mandado de segurança, ressalvada a exceção prevista no § 3º do art. 100 da Constituição da República (obrigações definidas em leis como de pequeno valor):

 

“ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. CONCESSÃO DE MANDADO DE SEGURANÇA. VALORES DEVIDOS. EXCLUSÃO DO REGIME DE PRECATÓRIO. LESÃO AOS PRECEITOS FUNDAMENTAIS DA ISONOMIA, DA IMPESSOALIDADE E OFENSA AO DEVIDO PROCESSO CONSTITUCIONAL. ATRIBUIÇÃO DE EFEITO VINCULANTE À ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL SOBRE A MATÉRIA. ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL JULGADA PROCEDENTE. 1. Apesar de ter sido dirimida a controvérsia judicial no julgamento do Recurso Extraordinário n. 889.173 (Relator o Ministro Luiz Fux, Plenário virtual, DJe 14.8.2015), a decisão proferida em recurso extraordinário com repercussão geral não estanca, de forma ampla e imediata, situação de lesividade a preceito fundamental resultante de decisões judiciais: utilidade da presente arguição de descumprimento de preceito fundamental. 2. Necessidade de uso de precatórios no pagamento de dívidas da Fazenda Pública, independente de o débito ser proveniente de decisão concessiva de mandado de segurança, ressalvada a exceção prevista no § 3º do art. 100 da Constituição da República (obrigações definidas em leis como de pequeno valor). Precedentes. 3. Arguição de descumprimento de preceito fundamental julgada procedente.” (STF, Pleno, ADPF 250, relatora Ministra Cármen Lúcia, j. 13.09.2019) 

 

Ainda, em 10.02.2010, no julgamento pelo c. Superior Tribunal de Justiça do Tema Repetitivo n.º 228 (REsp n.ºs 1.114.404/MG e 937.890/SP), delimitado como “questiona-se se é facultado ao contribuinte que detém crédito contra a Fazenda Pública por tributo indevidamente pago optar pela restituição via precatório ou compensação, conforme previsão legal do ente tributante”, e assim analisado, fixou-se a tese no sentido de que “o contribuinte pode optar por receber, por meio de precatório ou por compensação, o indébito tributário certificado por sentença declaratória transitada em julgado”, posteriormente convertida na Súmula STJ n.º 461. 

 

É importante frisar que, após o decidido pelo e. STF, a Secretaria da Receita Federal do Brasil passou a obstar a restituição, na via administrativa, de valores decorrentes de condenação judicial, conforme se verifica no Parecer PGFN/CAT n.º 2.093/2011, na Solução de Consulta COSIT n.º 239/2019, e posteriores redações das Instruções Normativas que regulam a restituição tributária na via administrativa, em relação àquela que constava do artigo 70 da revogada Instrução Normativa RFB n.º 900/2008.

 

Não obstante, a Corte Superior vinha adotando entendimento no sentido de que o contribuinte pode optar pela restituição na via administrativa, mormente em sede de mandado de segurança, conforme precedentes de suas 1ª e 2ª Turmas:

 

“PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CRÉDITOS PRESUMIDOS DE ICMS. EXCLUSÃO DA BASE DE CÁLCULO DO IRPJ/CSLL. MANDADO DE SEGURANÇA OBJETIVANDO A DECLARAÇÃO DO DIREITO À RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO NA VIA ADMINISTRATIVA. CABIMENTO. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO NO STJ. OMISSÃO E CONTRADIÇÃO. INEXISTÊNCIA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS. [...]  

4. Também em relação à possibilidade de se assegurar, na via administrativa, o direito à restituição do indébito tributário reconhecido por decisão judicial em mandado de segurança, o acórdão embargado seguiu a jurisprudência firmada por ambas as turmas integrantes da Primeira Seção de que "o mandado de segurança é via adequada para declarar o direito à compensação ou restituição de tributos, sendo que, em ambos os casos, concedida a ordem, os pedidos devem ser requeridos na esfera administrativa, restando, assim, inviável a via do precatório, sob pena de conferir indevidos efeitos retroativos ao mandamus" (AgInt no REsp 1.895.331/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 24/05/2021, DJe 11/06/2021). [...]” (STJ, 1ª Turma, EDcl/REsp 1951855, relator Ministro Paulo Sérgio Domingues, j. 13.03.2023)

 

“TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO INCIDENTE SOBRE A COMERCIALIZAÇÃO DA PRODUÇÃO RURAL. MANDADO DE SEGURANÇA. ADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. POSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO OU RESTITUIÇÃO ADMINISTRATIVA DO INDÉBITO TRIBUTÁRIO. 1. Conforme consignado na decisão agravada, o acórdão recorrido encontra-se em sintonia com a jurisprudência do STJ, que se firmou no sentido de que a opção pela compensação ou restituição do indébito, na forma da Súmula 461 do STJ c/c os arts. 66, § 2º, da Lei 8.383/1991 e 74, caput, da Lei 9.4390/1996, se refere à restituição administrativa do indébito, e não à restituição por precatório ou RPV. Isso porque a pretensão manifestada na via mandamental de condenação da Fazenda Nacional à restituição de tributo indevidamente pago no passado, possibilitando o posterior recebimento desse valor pela mediante precatório, implica utilização do Mandado de Segurança como substitutivo da ação de cobrança, o que não se admite, conforme entendimento cristalizado na Súmula 269 do STF. 2. Agravo Interno não provido.” (STJ, 2ª Turma, AgInt/AREsp 1945394, relator Ministro Herman Benjamin, j. 21.02.2022)  

 

Sedimentando a questão, o Tribunal Pleno do e. Supremo Tribunal Federal reconheceu repercussão geral à matéria (Tema n.º 1.262 – RE 1.420.691) e, reafirmando sua jurisprudência, firmou tese no sentido de que “não se mostra admissível a restituição administrativa do indébito reconhecido na via judicial, sendo indispensável a observância do regime constitucional de precatórios, nos termos do art. 100 da Constituição Federal”: Segue a ementa do acórdão:

 

“Recurso extraordinário. Representativo da controvérsia. Direito constitucional e tributário. Restituição administrativa do indébito reconhecido na via judicial. Inadmissibilidade. Observância do regime constitucional de precatórios (CF, art. 100). Questão constitucional. Potencial multiplicador da controvérsia. Repercussão geral reconhecida com reafirmação de jurisprudência. Decisão recorrida em dissonância com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Recurso extraordinário provido. 1. Firme a jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal no sentido de que os pagamentos devidos pela Fazenda Pública em decorrência de pronunciamentos jurisdicionais devem ser realizados por meio da expedição de precatório ou de requisição de pequeno valor, conforme o valor da condenação, consoante previsto no art. 100 da Constituição da República 2. Recurso extraordinário provido. 3. Fixada a seguinte tese: Não se mostra admissível a restituição administrativa do indébito reconhecido na via judicial, sendo indispensável a observância do regime constitucional de precatórios, nos termos do art. 100 da Constituição Federal.” (STF, Pleno, relatora Ministra Rosa Weber, j. 21.08.2023)  

 

Em consonância com o entendimento da Corte Suprema, a quem compete assegurar o devido atendimento dos preceitos da Carta, entendo que é incabível a restituição, em espécie, na via administrativa.

 

Assim, uma vez reconhecida judicialmente a existência de valores de tributos recolhidos indevidamente ou a maior, cabe ao contribuinte optar pela sua compensação, na via administrativa, ou por sua restituição, por meio de precatório.

 

Quanto ao ponto, cabe destacar a situação peculiar do contribuinte que, por opção própria, elege a via judicial mandamental para satisfação de seus direitos.

 

Previsto na Constituição (artigo 5º, LXIX) como garantia fundamental para proteção de direito líquido e certo, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público, o mandado de segurança não se confunde – nem pode ser confundido – com ação de cobrança, sob pena de se aviltar seu caráter garantidor de direitos fundamentais especialmente protegidos pela Carta.

 

Nesse sentido, a Corte Suprema já editara os enunciados de Súmula n.ºs 269 (“O mandado de segurança não é substitutivo de ação de cobrança”) e 271 (“Concessão de mandado de segurança não produz efeitos patrimoniais em relação a período pretérito, os quais devem ser reclamados administrativamente ou pela via judicial própria”).

 

Destaca-se que a Lei n.º 12.016/2009, que disciplina o mandado de segurança, estabeleceu em seu artigo 14, § 4º, que “o pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias assegurados em sentença concessiva de mandado de segurança a servidor público da administração direta ou autárquica federal, estadual e municipal somente será efetuado relativamente às prestações que se vencerem a contar da data do ajuizamento da inicial”.

 

Nessa compreensão de executoriedade, na própria via mandamental, de valores devidos a partir da impetração, reafirmada pelo e. STF para o quanto devido pela Fazenda Pública independentemente da natureza jurídica do crédito, entendo que somente seria possível a restituição do indébito tributário, por meio de cumprimento de sentença nos próprios autos do mandado de segurança, apenas dos valores devidos a partir da impetração, até a efetiva implementação da ordem concessiva, e, quanto aos valores pretéritos à impetração reconhecidos na ordem concessiva, caberia ao contribuinte, nas vias próprias, pugnar pela restituição por meio de precatório. 

 

Contudo, com ressalva deste entendimento pessoal, em respeito ao princípio da colegialidade, adoto o entendimento firmado por esta 3ª Turma no sentido de que a restituição do indébito tributário é cabível, inclusive, por meio de cumprimento de sentença nos próprios autos do mandado de segurança (confira-se: TRF3, 3T, ApCiv 5000980-25.2023.4.03.6113, relator Desembargador Federal Nery Junior, j. 22.11.2023).

 

Custas na forma da lei. Sem condenação em honorários advocatícios, conforme disposição do artigo 25 da Lei n.º 12.016/09.

 

 

Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação da impetrante, para conceder parcialmente a segurança, a fim de lhe assegurar a possibilidade de, nos termos da Lei nº 13.043/2014, apurar crédito a título de benefício fiscal do REINTEGRA, mediante a aplicação da alíquota de 2% sobre a receita auferida com a exportação de bens para o exterior, desde a data da edição do Decreto nº 9.393/18 (30/05/2018) até 31/12/2018, data que encerra a necessidade de observância do princípio da anterioridade anual; condenar a União na devolução dos valores recolhidos indevidamente, observado o lapso prescricional quinquenal contado da data do ajuizamento desta ação, devidamente atualizados pela Selic, desde a data do recolhimento indevido até o mês anterior ao da repetição, bem como reconhecer o direito do contribuinte à opção pela restituição, exclusivamente por meio do regime de precatórios, ou pela compensação, a ser realizada na via administrativa de acordo com os parâmetros supra definidos.

 

 

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

TRIBUTÁRIO. CRÉDITOS DO REINTEGRA. TEMA 1.108/STF. REGULAMENTAÇÃO. DECRETO 8.415/2015. ALTERAÇÕES SUCESSIVAS. DECRETOS 8.543/2015, 9.148/2017 E 9.393/2018. REDUÇÃO DAS ALÍQUOTAS. MAJORAÇÃO INDIRETA DE TRIBUTO. NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA ANTERIORIDADE ANUAL E NONAGESIMAL. COMPENSAÇÃO. RESTITUIÇÃO EXCLUSIVAMENTE POR PRECATÓRIO. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.

1 - Cabe registrar que não se verifica impedimento para julgamento recursal em razão da pendência de julgamento pelo e. STF do Tema de Repercussão Geral n.º 1.108 (“Aplicabilidade do princípio da anterioridade geral (anual ou de exercício) em face das reduções de benefícios fiscais previstos no Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para as Empresas Exportadoras (Reintegra)” - ARE nº 1.285.177), haja vista que, em que pese imperativo legal expresso no artigo 1.035, § 5º, do CPC, não houve determinação da Corte Suprema para suspensão da tramitação dos processos que versem sobre a questão (confira-se: STF, Pleno, RE/RG-QO 966177, relator Ministro Luiz Fux, j. 07.06.2017: “2. A suspensão de processamento prevista no §5º do art. 1.035 do CPC não é consequência automática e necessária do reconhecimento da repercussão geral realizada com fulcro no caput do mesmo dispositivo, sendo da discricionariedade do relator do recurso extraordinário paradigma determiná-la ou modulá-la.”).

2 - A Lei nº 13.043/2014 reinstituiu o Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para as Empresas Exportadoras – REINTEGRA com o objetivo de devolver parcial ou integralmente o resíduo tributário remanescente na cadeia de produção de bens exportados.

3 - A apuração dos créditos tributários foi prevista para a exportação de determinados bens por meio da aplicação de percentual estabelecido pelo Poder Executivo, limitado entre 0,1% (um décimo por cento) e 3% (três por cento) sobre a receita auferida com a operação internacional (art. 22, §1º).

4 - Para a regulamentação do REINTEGRA, foi editado pela Presidência da República o Decreto nº 8.415/2015, que originalmente definiu referidos percentuais em (i) 1% entre 01/03/2015 e 31/12/2016; (ii) 2% entre 01/01/2017 e 31/12/2017; e (iii) 3% entre 01/01/2018 e 31/12/2018, nos termos de seu art. 2º, § 7º, I, II, III e IV. Tais incisos sofreram alterações sucessivas, fruto da edição dos Decretos nº 8.543/2015, nº 9.148/2017 e nº 9.393/2018.

5 - Em síntese, com o advento do Decreto nº 8.543/2015, os percentuais passaram a ser de 1%, de 01.03.2015 a 30.11.2015; 0,1%, de 01.12.2015 a 31.12.2016; 2%, de 01.01.2017 a 31.12.2017; e 3%, entre 01.01.2018 a 31.12.2018. Já o Decreto nº 9.148/2017 modificou o percentual para 2% no período de 01.01.2017 a 31.12.2018. O Decreto nº 9.393/2018, por sua vez, manteve o percentual de 2% de 01.01.2017 a 31.05.2018, minorando-o para 0,1% a partir de 01.06.2018.

6 - O poder constituinte originário conferiu ao Estado o poder de tributar os contribuintes, para obter recursos para financiar suas atividades. A fim de que o exercício desse poder estatal seja legítimo, contudo, deve-se observar não só os limites da competência atribuída pela Constituição Federal a cada ente da federação, como também as imunidades e as garantias individuais do contribuinte previstas principalmente no artigo 150 da Constituição Federal.

7 - Na seara tributária, isso se reflete na vedação do Estado de promover modificações legislativas repentinas, com efeitos concretos imediatos, que elevem a carga tributária. Assegura, ainda, ao contribuinte, um tempo mínimo para conhecer a modificação na legislação tributária e planejar a atividade econômica para suportar seus efeitos. É justamente para impedir tais “surpresas”, que o artigo 150, III, da Constituição Federal confere ao contribuinte a proteção dos princípios da anterioridade genérica e da anterioridade. Em sua modalidade genérica, o princípio da anterioridade veda que a lei que institua ou majore tributo produza efeitos no mesmo exercício financeiro em que ela foi publicada, nos termos do artigo 150, III, alínea ‘b’ da Constituição Federal. Já de acordo com o princípio da anterioridade nonagesimal, a lei que institui ou majora tributos só produz efeitos após 90 (noventa) dias da data de sua publicação.

8 - A matéria em questão, inicialmente, foi apenas tratada como limitação ao poder de tributar, consoante decorre explicitamente do texto constitucional. No entanto, passou-se também a questionar a aplicação principiológica para os benefícios fiscais concedidos. O debate faz sentido na medida em que a retirada de benesses fiscais - tal como a criação ou aumento dos tributos –, da mesma forma, é passível de gerar surpresa aos contribuintes, caracterizando, na realidade, espécie de majoração indireta de tributos.

9 - Não se questiona a possibilidade de eventual alteração legislativa ou mesmo da reedição de atos infralegais que tenham por consequência a supressão de benefícios, seja pela alteração do entendimento do Parlamento ou mesmo por diversa compreensão da Administração. A bem da verdade, compreende-se com naturalidade que se sucedam modificações normativas, inclusive, em curto espaço de tempo, o que decorre de novos cenários e demandas. Todavia, preza-se, apenas, pela aplicação dos mesmos princípios constitucionais para situação equivalente, isto é, de exasperação da carga tributária.

10 - A Lei que estabelece restrição a benefício fiscal, que implique na sua redução ou revogação, está sujeita ao princípio da anterioridade, seja a anterioridade de exercício (artigo 150, III, b, da CF), seja a anterioridade nonagesimal (alínea c), de acordo com o respectivo tributo (§ 1º).

11 – A redução da alíquota de incentivo do Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para as Empresas Exportadoras – REINTEGRA, por ser caracterizada como modalidade de majoração indireta da carga tributária, impõe a necessidade de observância da anterioridade geral e nonagesimal, entendimento atualmente respaldado tanto no Supremo Tribunal Federal como nesta E. Corte.

12 - Assim, a parte autora faz jus à fruição dos percentuais previstos na legislação, observado o critério da anterioridade anual e nonagesimal.

13 – Observado o prazo quinquenal de prescrição disposto no artigo 168, I, do CTN, contado da data do ajuizamento desta ação, reconhecido o direito à compensação dos valores recolhidos indevidamente.

14 - O reconhecimento do direito à compensação não é de cunho meramente declaratório, mas, sim, condenatório, uma vez que obriga a União a suportar a compensação daquilo cuja conclusão, em regra, implicaria execução nos próprios autos.

15 - Na forma dos artigos 39, § 4º, da Lei n.º 9.250/95 e 3º da Emenda Constitucional n.º 113/2021, bem como das teses fixadas nos Temas n.º 810/TSF e 905/STJ, os créditos serão atualizados pela taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia – Selic (composta de taxa de juros moratórios e correção monetária), calculada a partir do recolhimento indevido (Súmula STJ n.º 162) até o mês anterior ao da repetição, vedada sua cumulação com quaisquer outros índices.

16 - Após o trânsito em julgado (artigo 170-A do CTN), poderá ser requerida a compensação do indébito administrativamente junto à Secretaria da Receita Federal do Brasil, observando-se o disposto nos artigo 74 da Lei n.° 9.430/96 e artigo 26-A da Lei n.º 11.457/2007, vigentes na data da propositura da ação, ressalvando-se o direito de proceder à compensação em conformidade com normas posteriores, desde que atendidos os requisitos próprios, nos termos da tese firmada pelo c. STJ no julgamento do Tema Repetitivo n.º 265 (REsp n.º 1.137.738/SP).

17 - Ressalta-se que compete à Secretaria da Receita Federal do Brasil disciplinar os procedimentos necessários para o requerimento administrativo da compensação (artigo 74, § 14, da Lei n.° 9.430/96 e artigo 26-A, § 2º, da Lei n.º 11.457/2007).

18 - O e. Supremo Tribunal Federal, em 08.08.2015, no julgamento do Tema de Repercussão Geral n.º 831, delimitado como “obrigatoriedade de pagamento, mediante o regime de precatórios, dos valores devidos pela Fazenda Pública entre a data da impetração do mandado de segurança e a efetiva implementação da ordem concessiva”, reafirmou sua jurisprudência e firmou tese no sentido de que “o pagamento dos valores devidos pela Fazenda Pública entre a data da impetração do mandado de segurança e a efetiva implementação da ordem concessiva deve observar o regime de precatórios previsto no artigo 100 da Constituição Federal”. Em 13.09.2019, a Corte Suprema julgou procedente a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n.º 250/DF para estabelecer a necessidade de uso de precatórios no pagamento de dívidas da Fazenda Pública, independente de o débito ser proveniente de decisão concessiva de mandado de segurança, ressalvada a exceção prevista no § 3º do art. 100 da Constituição da República (obrigações definidas em leis como de pequeno valor). Ainda, em 10.02.2010, no julgamento pelo c. Superior Tribunal de Justiça do Tema Repetitivo n.º 228 (REsp n.ºs 1.114.404/MG e 937.890/SP), delimitado como “questiona-se se é facultado ao contribuinte que detém crédito contra a Fazenda Pública por tributo indevidamente pago optar pela restituição via precatório ou compensação, conforme previsão legal do ente tributante”, e assim analisado, fixou-se a tese no sentido de que “o contribuinte pode optar por receber, por meio de precatório ou por compensação, o indébito tributário certificado por sentença declaratória transitada em julgado”, posteriormente convertida na Súmula STJ n.º 461.  Sedimentando a questão, o Tribunal Pleno do e. Supremo Tribunal Federal reconheceu repercussão geral à matéria (Tema n.º 1.262 – RE 1.420.691) e, reafirmando sua jurisprudência, firmou tese no sentido de que “não se mostra admissível a restituição administrativa do indébito reconhecido na via judicial, sendo indispensável a observância do regime constitucional de precatórios, nos termos do art. 100 da Constituição Federal”.

19- Em consonância com o entendimento da Corte Suprema, a quem compete assegurar o devido atendimento dos preceitos da Carta, entende-se ser incabível a restituição, em espécie, na via administrativa. Assim, uma vez reconhecida judicialmente a existência de valores de tributos recolhidos indevidamente ou a maior, cabe ao contribuinte optar pela sua compensação, na via administrativa, ou por sua restituição, por meio de precatório.

20 - Adota-se o entendimento firmado por esta 3ª Turma no sentido de que a restituição do indébito tributário é cabível, inclusive, por meio de cumprimento de sentença nos próprios autos do mandado de segurança.

21 - Apelação parcialmente provida. Segurança parcialmente concedida.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, deu parcial provimento à apelação da impetrante, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.